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Ser e dever ser médico: a Gaceta Médica de México como um manual “não sistematizado” de saberes, 1860-1890

Resumo

Discute-se neste artigo o papel desempenhado pela Gaceta Médica de México no processo de institucionalização e profissionalização da medicina científica no país entre 1860 e 1890. A partir da noção de tecnologia literária utilizada por Steven Shapin e Simon Schaffer e da análise qualitativa de relatórios médicos com enunciados típicos, examina-se o modo como os membros da Academia Nacional de Medicina, instituição responsável pelo periódico, e da Escola Nacional de Medicina coletivizaram suas experiências e prescreveram formas de ser e agir por meio de suas publicações. Busca-se demonstrar o caráter de “manual não sistematizado” da publicação, importante instrumento de normatização e regulação dos saberes médicos no México nesse período.

Gaceta Médica de México; história da medicina; normatização científica; México; século XIX

Abstract

This article discusses the role played by the Gaceta Médica de México in the process of institutionalizing and professionalizing scientific medicine in Mexico from 1860 to 1890. From the notion of literary technology utilized by Steven Shapin and Simon Schaffer and qualitative analysis of medical reports containing typical discourse, we examine how members of the Mexican National Academy of Medicine (the institution responsible for this journal) and the National School of Medicine collected their experiences and prescribed ways of being and acting through their publications. The aim is to demonstrate how this periodical acted as an unsystematized manual, an important instrument for normalizing and regulating medical knowledge in Mexico during this period.

Gaceta Médica de México; history of medicine; scientific standardization; Mexico; nineteenth century

O surgimento da clínica na França, na virada do século XVIII para o XIX, modificou paulatinamente as práticas e concepções médicas na Europa Ocidental. Na América, ela encontrou entusiastas ainda nas primeiras décadas dos anos 1800. À medida que os médicos deste lado do Atlântico tiveram contato com esse tipo de medicina, fosse por intermédio dos franceses que aqui estiveram ou por meio de viagens à Europa para estudar ou complementar seus estudos, passaram a implantá-lo em seus respectivos países de acordo com suas especificidades ( Warner, 2003WARNER, John Harley. Against the spirit of system: the French impulse in nineteenth-century American medicine. Baltimore; London: Johns Hopkins University Press, 2003. ; Sáenz, 2018SÁENZ, Luz María Hernández. Carving a niche: the medical profession in Mexico, 1800-1870. Montreal: McGill-Queen’s University Press, 2018. ; Coradini, 2005CORADINI, Odaci Luiz. A formação da elite médica, a Academia Nacional de Medicina e a França como centro de importação. Estudos Históricos, v.1, n.35, p.3-22, 2005. ).

Com a clínica, emergiu o modelo anatomoclínico. Seu princípio epistemológico consistia na análise e na comparação de sinais e sintomas fisiológicos para classificar os chamados corpos normais e patológicos ( Foucault, 2015FOUCAULT, Michel. O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2015. ; Canguilhem, 2015CANGUILHEM, Georges. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2015. ). Sua implantação em terras americanas exigiu certas mudanças de procedimentos e posturas daqueles que tivessem a pretensão de ser aceitos e reconhecidos por seus pares.

No México, Luz María Hernández Sáenz (2018)SÁENZ, Luz María Hernández. Carving a niche: the medical profession in Mexico, 1800-1870. Montreal: McGill-Queen’s University Press, 2018. argumenta que as primeiras movimentações na medicina para implantar o modelo anatomoclínico ocorreram ainda no início dos anos 1800, intensificaram-se após a independência política e foram parcialmente concretizadas na década de 1860, após a invasão francesa. Foi procurando cavar um nicho institucional e profissional que, ao longo de meio século, alguns médicos trilharam um tortuoso caminho até criar e controlar instâncias formativas, normativas e reguladoras da medicina no país. Nesse percurso, um restrito grupo de pessoas se consolidou como elite médico-científica no México e se aglutinou em torno da Escola Nacional de Medicina e da Academia Nacional de Medicina.1 1 A Academia Nacional de Medicina mexicana sofreu algumas modificações em seu nome e em sua forma de organização. Criada em 1864, como a Sección de Medicina da Comisión Científica, Literaria y Artística de México, tornou-se Sociedad Médica de México, em 1865, Academia de Medicina, em 1873, e Academia Nacional de Medicina, em 1887 ( Rodríguez Pérez, 2013 ). Por questões práticas, optou-se por referenciá-la apenas como Academia Nacional de Medicina ou simplesmente Academia. Dominando esses núcleos de produção e divulgação de saberes médicos, tal elite formulou, ajustou e impôs uma série de normas àqueles que porventura almejassem fazer parte da “comunidade médico-científica”.

À medida que a medicina clínica se institucionalizava no México, os médicos também passavam a compreender que, para produzir saberes científicos nos moldes europeus, deveriam escrever seus relatórios pautados na observação do maior número possível de casos para que seus dados fossem tabulados, contabilizados e analisados de maneira empírica. Isso passou a habilitar esses médicos à aprovação dos demais ( Cházaro García, 2000CHÁZARO GARCÍA, Laura. Medir y valorar los cuerpos de una nación: un ensayo sobre la estadística médica del siglo XIX en México. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia e Letras, Universidade Nacional Autônoma do México, Cidade do México, 2000. ; Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ). Entretanto, até meados de 1870, antes que esse modo de atuação estivesse plenamente em vigor na prática e na concepção médica, a principal forma de coletivização de saberes ocorria por meio da publicação de relatórios nos quais eram relatadas experiências individuais de cada médico e possíveis soluções procedimentais que poderiam ser úteis aos demais. Como resultado, alguns médicos mais prestigiados (associados da Academia e professores da Escola de Medicina, sobretudo) acabaram criando alguns constrangimentos sobre como os colegas de profissão deveriam ser e agir. Isso, somado ao alcance que a Gaceta Médica de México 2 2 Os exemplares da Gaceta Médica de México estão disponíveis para consulta na Biblioteca Nicolás León. obteve entre os praticantes da medicina científica naquele país, acabou constituindo esse periódico em uma espécie de manual normativo de saberes médicos – ou simplesmente em um “manual não sistematizado”.

Frente a essas constatações, pretende-se aqui discutir o papel desempenhado pela Gaceta Médica no processo de institucionalização e profissionalização da medicina científica no México entre 1860 e 1890. Ressalta-se a relevância do periódico como um dos mais importantes instrumentos de normatização e estandardização dos saberes médicos mexicanos. Neste artigo, portanto, procura-se demonstrar como os associados da Academia utilizaram a Gaceta para prescrever e discutir modos de ser e dever ser médico. Propõe-se que a Gaceta Médica deve ser entendida como um “manual não sistematizado” de saberes.

Antes de iniciar a discussão, é fundamental que sejam feitas duas ressalvas. Primeiro, não se analisará a efetivação das sugestões médicas nas práticas cotidianas dos médicos. Entende-se que tal proposta seria assunto para outro texto. Como sugerem Steven Shapin e Simon Schaffer (2005), ao analisar o surgimento da vida experimental a partir dos esforços de Robert Boyle e sua bomba de vácuo na Inglaterra do século XVII, tenciona-se aqui, por meio de seus escritos publicados na Gaceta Médica , compreender e apresentar o funcionamento da tecnologia literária empregada pelos médicos mexicanos durante o processo de institucionalização e profissionalização da medicina.

Steven e Shapin (2005, p.57) afirmam que a tecnologia literária foi o meio pelo qual Boyle e seus correligionários deram publicidade aos resultados de seus experimentos àqueles que não os testemunharam diretamente. Boyle escreveu relatos minuciosos de experimentos enfocando os fatos, evitando análises filosóficas obscuras e valendo-se de tonalidade modesta, a fim de angariar aliados para promover sua forma de vida experimental. Até mesmo alguns erros experimentais foram relatados por ele para demonstrar seu comprometimento com essa outra maneira de produzir conhecimentos. Dito isso, pode-se afirmar que algo semelhante ocorreu séculos depois entre os médicos mexicanos, conforme será visto com os exemplos analisados adiante.

A segunda ressalva se refere aos exemplos empregados. Embora a maioria seja de obstetrícia e pediatria, este artigo não conta uma história dessas especialidades médicas tal como fizeram direta e indiretamente Ignacio Ávila Cisneros et al. (1997)ÁVILA CISNEROS, Ignacio et al. (org.). Historia de la pediatría en México. Ciudad de México: FCE, 1997. , Alberto del Castillo Troncoso (2001DEL CASTILLO TRONCOSO, Alberto. Moral médica y secularización: el cuerpo infantil en el discurso médico del porfiriato. Política y Cultura, v.16, p.143-169, 2001. , 2003DEL CASTILLO TRONCOSO, Alberto. La visión de los médicos y el reconocimiento de la niñez en el cambio del siglo XIX al XX. Boletín Mexicano de Historia y Filosofía de la Medicina, v.6, n.2, p.10-16, 2003. , 2006DEL CASTILLO TRONCOSO, Alberto. Conceptos, imágenes y representaciones de la niñez en la Ciudad de México 1880-1920. Ciudad de México: Comex & Instituto Mora, 2006. ), Oliva López Sánchez (2005LÓPEZ SÁNCHEZ, Oliva. Las representaciones técnico-médicas del cuerpo femenino en el discurso de la gineco-obstetricia en el siglo XIX. In: Graf, Norma Blazquez; Florez, Javier. Ciencia, tecnología y género en Iberoamerica. Ciudad de México: Unam, 2005. , 2010LÓPEZ SÁNCHEZ, Oliva. El dolor de Eva: la profesionalización del saber médico en torno al cuerpo femenino en la segunda mitad del siglo XIX en México. Ciudad de México: Unam / FES Iztacala, 2010. , 2017LÓPEZ SÁNCHEZ, Oliva. De la costilla de Adán al útero de Eva: el cuerpo femenino en el imaginario médico y social del siglo XIX. Ciudad de México: Unam / FES Iztacala, 2017. ), Nora Jaffary (2016)JAFFARY, Nora E. Reproduction and its discontents in Mexico: childbirth and contraception from 1750 to 1905. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2016. , Frida Gorbach (2008)GORBACH, Frida. El monstruo, objeto imposible: teratología mexicana, siglo XIX. Ciudad de México: Itaca, UAM-Xochimilco, 2008. , Alanís-Rufino (2009)ALANÍS-RUFINO, Mercedes. Una cuestión de parteras y médicos: mujeres en el Hospital de Maternidad e Infancia en la Ciudad de México, 1861-1905. Boletin Mexicano de Historia y Filosofia de la Medicina, v.12, n.2, p.63-68, 2009. e Laura Cházaro García (2004)CHÁZARO GARCÍA, Laura. Pariendo instrumentos médicos: los fórceps y pelvímetros entre los obstetras del siglo XIX en México. Dynamis: Acta Hispanica ad Medicinae Scientiarumque Historiam Illustrandam, v.24, p.27-51, 2004. , entre outros. Os exemplos analisados foram recuperados por: (1) terem feito parte de outra pesquisa ( Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ); (2) serem elucidativos de como o espaço da Gaceta Médica foi utilizado pelos médicos para expor suas propostas e reflexões; e (3) permitirem a identificação de certas características típicas da medicina mexicana tanto em termos literários como técnicos entre as décadas de 1860 e 1890. Os exemplos utilizados, portanto, carregam consigo estruturas e modos de enunciação característicos dos relatórios clínicos de outras especialidades publicados no periódico no mesmo período.

Estruturou-se este texto da seguinte forma: (1) demonstra-se o que se entende por “manual não sistematizado” e suas diferenças em relação aos demais manuais; (2) discutem-se alguns relatórios médicos relacionados às práticas e aos procedimentos técnicos; e (3) analisam-se outros relatórios relacionados à deontologia médica, ou melhor, a como um médico e a profissão médica eram ou deveriam ser.

O “manual não sistematizado” de saberes médicos

A Gaceta Médica começou a ser publicada em 1864, mesmo ano em que foi criada uma comissão científica, literária e artística que, anos mais tarde, daria origem à Academia Nacional de Medicina. No entanto, esse periódico não era o único editado no país durante a segunda metade do século XIX. Existiam outros, editados por outras instituições médicas ( Rodríguez Pérez, 1997RODRÍGUEZ PÉREZ, Martha Eugenia. Semanarios, gacetas, revistas y periódicos médicos del siglo XIX mexicano. Nueva Época, v.2, n.2, p.61-96, 1997. ). Sua excepcionalidade, entretanto, dá-se por três aspectos: (1) a Gaceta é o periódico da Academia, principal agremiação médica mexicana, na qual se concentrava a elite médica do país; (2) é a publicação científica de maior longevidade no país; e (3) foi o primeiro periódico nacional de medicina a circular por diferentes estados da república mexicana e por outros países latino-americanos e europeus ainda no século XIX ( Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. , p.66-67).

À diferença dos primeiros periódicos médicos brasileiros do século XIX, que tinham como característica a “inserção relativamente frequente de matérias versando sobre temas que pudessem interessar diretamente ao leitor leigo” (Ferreira, out. 1999), desde o início a Gaceta Médica era destinada a um público-alvo especializado, isto é, aos médicos e estudantes de medicina. Essa escolha editorial pode ser explicada pelo fato de a Academia ter sido relativamente respaldada, desde seus anos iniciais de funcionamento, pelo Estado mexicano, tanto durante o Segundo Império (1864-1867) como depois, no Porfiriato (1876-1910),3 3 O Porfiriato corresponde ao período no qual o México foi governado, por aproximadamente três décadas, pelo general Porfírio Díaz, que ascendeu ao poder em 1876 e deixou o cargo em 1910. Sobre tal período, ver Garcíadiego (2010) . já como órgão consultivo oficial ( Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. , p.45).

O conjunto de textos veiculados pela Gaceta Médica a constituiu como referência médica ao longo dos anos. Frequentemente, alguns conteúdos nela publicados foram citados tanto nas teses de final de curso dos estudantes de medicina da Escola Nacional de Medicina, sede da Academia a partir de 1878 e local onde muitos de seus associados lecionavam, como em outros textos publicados na própria Gaceta e em periódicos de outras instituições médico-científicas nacionais (Díaz Robles, Oropeza Sandoval, 2007). Foi nesse cenário que a publicação foi sendo constituída de forma mais ou menos consciente como um “manual não sistematizado” de saberes médicos.

Essa noção de “manual não sistematizado” é empregada neste artigo para classificar determinado conjunto de documentos que organiza, regulariza e normatiza certos saberes (práticas e modos de ser) de maneira distinta dos manuais tradicionais de ciências, nomeados aqui como “convencionais”. Os manuais científicos convencionais geralmente são escritos com intenções pedagógicas, assim como os textos publicados nos “manuais não sistematizados”. Porém, diferentemente destes, aqueles se caracterizam como espaços em que se apresentam formulações escritas mais sucintas e apreensíveis de determinados saberes que a “comunidade científica” acredita dominar.

Nos manuais convencionais, as “informações sobre como foi adquirido o conhecimento (descoberta) e por que foi aceito pela profissão (confirmação) seriam, no mínimo, excesso de bagagem”, como sugere Thomas Kuhn (2011KUHN, Thomas S. A tensão essencial: estudos selecionados sobre tradição e mudança científica. São Paulo: Editora Unesp, 2011. , p.213). Desse modo, são elaborações em que os enunciados que balizaram o processo de produção de saberes já estão mitigados, omitidos, parcial ou imparcialmente. Neles, os produtos finais, resultados de operações complexas, são com frequência apresentados como isentos de controvérsias e embates científicos. Esses manuais são, portanto, reproduções de saberes consolidados e consensuais em determinada “comunidade científica” igualmente consolidada ou em estágio avançado de consolidação.

Em contraste com os manuais convencionais, a evidência dos processos de produção de saberes, assim como suas contradições, debates e polêmicas, é característica fundamental dos “manuais não sistematizados”. Neles, além disso, os entendimentos sobre determinados procedimentos são dinâmicos, em constante transformação, dadas as competições e divergências e as descobertas mais recentes de novas concepções, técnicas e tecnologias. Em outros termos, nos “manuais não sistematizados” os “fatos” ainda são “enunciados”; a caixa de pandora, nos termos de Bruno Latour (1999)LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Editora Unesp, 1999. , ainda é apresentada de maneira semiaberta.

As páginas dos “manuais não sistematizados” são constituídas não apenas como espaços nos quais os sujeitos envolvidos no processo de produção de saberes levantam e testam teorias e métodos que porventura podem gerar manuais convencionais. São também espaços em que os sujeitos envolvidos no processo de produção científica buscam validar e espraiar seus saberes por meio de relatórios com demonstrações empíricas para convencer os demais envolvidos no processo. Esses aspectos destacados sobre a noção de “manual não sistematizado” podem ser encontrados nas publicações da Gaceta Médica .

No México, até meados do século XIX, inexistiam manuais convencionais elaborados por médicos mexicanos. Os manuais empregados nas escolas de medicina do país eram majoritariamente escritos por franceses, prussianos e ingleses e eram utilizados como livros-texto tanto no processo de “formação básica” como no que se chamaria atualmente no Brasil de “especialização”. Obviamente, esses textos estrangeiros eram de suma importância para a formação dos médicos nativos; no entanto, suas circulações eram restritas em decorrência do número de exemplares, além de não serem saberes elaborados para dar conta das demandas da realidade mexicana, fato que gerou algumas reclamações até mesmo na própria Gaceta Médica .

Entre 1860 e 1870, foram publicados alguns manuais convencionais de procedimentos médicos elaborados por associados da Academia. O primeiro deles, de 1869, foi Introducción al estudio de la medicina legal , de Luis Hidalgo y Carpio. Segundo o autor, o manual tinha como objetivo oferecer instrumentos complementares aos manuais estrangeiros de medicina legal usados em aulas como livros-texto por estudantes e catedráticos nativos dos cursos de medicina e de direito.

Em 1877-1878, esse manual foi reeditado por Luis Hidalgo y Carpio em parceria com outro membro da Academia, Gustavo Ruiz y Sandoval, e foi lançado por capítulos com o título de Compendio de medicina legal arreglado a la legislación del Distrito Federal (Hidalgo y Carpio, Sandoval y Ruiz, 1877). Nessa nova edição, foram incorporados alguns estudos que já haviam sido publicados na Gaceta Médica por Hidalgo y Carpio, além de temas debatidos entre os associados da Academia e suscitados pelos novos Códigos Civil e Penal do México que passaram a vigorar entre a publicação do primeiro e a elaboração desse segundo manual.

O Guía clínica del arte de los partos , de Juan María Rodríguez (1878RODRÍGUEZ, Juan María. Guía clínica del arte de los partos. Ciudad de México: Imprenta de Ignacio Escalante, 1878. , 1885RODRÍGUEZ, Juan María. Guía clínica del arte de los partos. Ciudad de México: Imprenta de Francisco Díaz de León, 1885. ), foi outro manual lançado no mesmo período. Embora tenha sido publicado como livro em 1878, parte significativa desse material já havia sido publicada na Gaceta Médica e previamente discutida entre os agremiados da Academia desde 1869. Posteriormente foi republicado numa edição ampliada e levemente modificada, em 1885. Assim como os manuais de Hidalgo y Carpio, Rodríguez alegou que a publicação de seus textos em formato de livro tinha o objetivo de fornecer um material acessível e prático aos médicos e estudantes da disciplina que lecionava: clínica de obstetrícia ( Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ).

Em pouco tempo, ambas as publicações foram empregadas oficialmente como livros-texto na Escola Nacional de Medicina, substituindo e/ou complementando as edições estrangeiras então utilizadas. Também ganharam outras edições durante a segunda metade do século XIX. Trabalhar com esses manuais não é o objetivo deste artigo, embora eles também tenham tido significativa importância no processo de normatização de certos saberes médicos. Do que foi explanado, deve-se reter que: (1) esses livros foram produzidos a partir das publicações na Gaceta Médica ; (2) inexistiam outros manuais elaborados por médicos mexicanos e cientificamente aceitos por eles até as publicações deles; (3) mesmo após publicados, sofreram alterações. Em suas edições posteriores foram incorporadas algumas discussões e alguns experimentos apresentados e debatidos por seus autores nas assembleias da Academia e publicados nas páginas da Gaceta Médica ( Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ). Portanto, a partir disso, afirma-se que as publicações do periódico em questão – do “manual não sistematizado” – desempenharam papel relevante na produção, regulamentação e normatização de saberes entre os médicos e estudantes de medicina do México.

Posto isso, são analisados a seguir alguns relatórios publicados na Gaceta Médica entre 1860 e 1890. Procura-se ressaltar o modo como foram enunciados, assim como o fato de certas características terem contribuído na configuração de determinadas disposições práticas e morais dos médicos mexicanos.

Como deve ser a prática médica

Em 1884, Juan María Rodríguez publicou um texto descrevendo suas experiências após executar, pela primeira vez no México, uma cirurgia cesariana baseada no método de Porro.4 4 Eduardo Porro foi um obstetra que adaptou e realizou pela primeira vez um tipo específico de cirurgia cesariana em Milão, em 1876. Nessa ocasião, Rodríguez relatou que seus esforços não haviam logrado muito sucesso, pois, o que era para ser um procedimento que salvaria as vidas da mulher e de sua prole, acabou malfadado. Ao refletir sobre o caso, afirmou que

quando um professor encara uma árdua empreitada, como a que enfrentei no dia 12 de março ao executar pela primeira vez no México a operação cesariana com as modificações propostas pelos médicos Porro e Müller, é seu dever se sujeitar a um juízo de conduta no qual leve em consideração os meios que o impulsionaram a executar tal prática e se submeter a uma revisão de seus procedimentos. Vistas, estudadas e examinadas as situações à luz da razão, os juízos elaborados a partir disso serão inteligentes. O fracasso desapaixonado que eles ocasionarem servirá de lição no porvir, quer o êxito tenha coroado o rei [isto é, seu esforço alcance resultados positivos] quer o resultado não tenha correspondido à sua intenção ( Rodríguez, 1884RODRÍGUEZ, Juan María. Memorandum de la operación cesarea. Seguida de la amputación del útero y sus anexos conforme a los procedimientos de los doctores Porro y Müller, ejecutada por primera vez en la Ciudad de México por el doctor Juan María Rodríguez, profesor de obstetricia de la Escuela Nacional de Medicina. Gaceta Médica de México, t.19, n.16, p.357-375, ago. 1884. , p.362).5 5 Nessa e nas demais traduções do espanhol a tradução é do autor.

O médico também enfatizou, tal como fizera Boyle em seus textos sobre a bomba de vácuo (Shapin, Shaffer, 2005), que “um relato detalhado e autêntico dos eventos é de suma importância, [pois] os favoráveis mostram o que deve ser feito, e os adversos, o que deve ser evitado”. Isso era “o suficiente para que os homens se tornassem cautelosos, desconfiados e experientes” ( Rodríguez, 1884RODRÍGUEZ, Juan María. Memorandum de la operación cesarea. Seguida de la amputación del útero y sus anexos conforme a los procedimientos de los doctores Porro y Müller, ejecutada por primera vez en la Ciudad de México por el doctor Juan María Rodríguez, profesor de obstetricia de la Escuela Nacional de Medicina. Gaceta Médica de México, t.19, n.16, p.357-375, ago. 1884. , p.362). Em outras palavras, Rodríguez destacou a importância de seus pares compartilharem suas experiências, mesmo que malogradas, porque isso prepararia outros médicos caso encontrassem situações parecidas; ou até mesmo para que buscassem soluções conjuntas para os problemas.

A leitura de relatórios clínicos nos bastidores da produção científica serviria, em uma perspectiva goffmaniana, para transmitir a outros médicos determinadas “interrupções já acontecidas da representação e as prováveis”, assim como para compartilhar as “novidades sobre as equipes de colegas” e a “recepção dada à última representação” (Goffman, 1985, p.163-164). A proposta de Rodríguez para que os médicos compartilhassem suas falhas também tinha dois outros objetivos: (1) diminuir os estigmas dos associados que porventura se sentissem envergonhados ou tecnicamente inferiores por não alcançarem seus objetivos; e (2) aumentar o número de possíveis publicações na Gaceta Médica .

Considerando as publicações até a década de 1890, podem ser destacados outros relatórios pelos quais igualmente foram emitidos determinados juízos normativos acerca da prática médica. Por essa via, com tonalidades discursivas que variavam, quase todos os médicos se manifestaram, tanto para orientar os leitores como para prescrever a utilização de certos métodos e medicamentos. Em alguns relatórios, os autores deixaram seus recados mais explícitos, argumentando textualmente que suas experiências seriam válidas aos demais; em outros, imperou um discurso normativo implícito. Nestes últimos, os autores não sugeriram diretamente aos outros médicos que seguissem seus conselhos, embora tivessem a intenção de formular normas de como executar determinados procedimentos, como ficará mais claro com os exemplos a seguir.

Em 1865, o médico Ramon Ochoa publicou um relatório sobre uma cirurgia realizada em uma parturiente com problemas para dar à luz, segundo seus termos. Ochoa (maio 1865, p.258) descreveu que fora chamado para atender uma mulher de 29 anos, multípara e que estava grávida pela sexta vez. Ao contrário das outras gestações, em que os trabalhos de partos foram eutócicos, nesta última surgiram complicações durante o parto. Tratava-se, portanto, de um parto distócico que deveria sofrer intervenção médica.

Após realizar uma primeira inspeção na mulher, Ochoa relatou ter identificado a posição do feto. Porém, como a hemorragia da parturiente havia aumentado depois que aplicou uma pequena dose de cuernecillo de centeno – atual cornezuelo de centeno (esporão-do-centeio) –, teve que realizar uma nova avaliação. Dessa vez o médico apontou em seu relatório que havia encontrado, bloqueada pela placenta, a cabeça do feto, que estava sendo empurrada pelas contrações uterinas e impedia a dilatação completa do colo do útero. Sabendo disso, ele destacou “a necessidade da [realização da] versão pélvica” (Ochoa, maio 1865, p.258). Depois disso, pôs em prática esse procedimento, que consistia em empurrar “com força a cabeça para a direita”, a fim de desgrudar “a placenta a partir de sua inserção inferior, pegando os pés do feto e extraindo-o pelo procedimento ordinário”. Foi somente assim que conseguiu retirar o feto, que já estava morto (p.258).

A partir disso, o médico passou a inferir em seu relatório sobre o que poderia ter ocorrido naquele atendimento. A partir de alguns sinais fisiológicos, concluiu que o feto morrera pouco tempo antes de sua extração. Sua afirmação se baseava no fato de que o natimorto continha coágulos de sangue obstruindo sua boca. Deixado de lado o pequeno cadáver, Ochoa relatou que extraiu restos da placenta ainda aderidos à parte interior do útero da mulher e outros próximos ao orifício do órgão. Segundo ele, esses últimos tecidos possivelmente eram os causadores da hemorragia da jovem, pois estavam obstruindo a saída do feto. Por fim, concluiu categoricamente que, sem tal operação, a mulher seguramente teria morrido. Com isso, recomendou aos leitores que, se sua observação não fosse útil aos médicos mais experientes, ao menos esperava que fosse aos “jovens professores, que às vezes têm dúvidas de operar em certos casos de obstetrícia nos quais a falta de uma operação causa a morte de mais de uma mulher” (Ochoa, maio 1865, p.259).

Em 1868, Manuel Soriano publicou texto em que relatava um trabalho de parto realizado por ele em uma mulher de cerca de 22 anos de idade que desfrutava de boa saúde, com constituição linfático-sanguínea. Soriano (set. 1868, p.268) comentou que a mulher já tivera três partos e um aborto natural, mas que apenas na última gravidez sofrera bastante, caindo enferma por 15 dias de “laringite crônica” antes de morrer. O médico relatou que, após identificar a posição fetal por meio do tato, procedimento-padrão entre os médicos mexicanos na época, encontrou o colo do útero da parturiente um pouco dilatado. Então, depois de a enferma ter sofrido um ataque de eclampsia, o médico procurou extrair o feto por meio da operação cesariana para tentar salvar sua vida e melhorar seu estado de saúde.

A narrativa de Soriano acerca do procedimento empregado para esvaziar o útero da paciente é minuciosa e exemplar a respeito do “não dito” sobre como os médicos procediam ou deveriam proceder. No relatório, o médico comenta que nesse atendimento “havia chamado um padre para os auxílios espirituais” e seu amigo “sr. Carmona (D. Trindad), para lhe consultar como realizar o parto e o tratamento subsequente” (Soriano, out. 1868, p.282). Assim que Carmona chegou, passou-lhe as informações gerais acerca do estado da enferma, e, após examiná-la, decidiram provocar o parto para “salvar a criança e ver se, com sua retirada, paravam os acidentes da mãe” (p.282). Ademais, segundo Soriano, “o colo do útero não estava dilatado o suficiente, mas era dilatável; a bolsa de água ainda não havia estourado; o feto já estava no estreito inferior: convenientemente colocado” (p.282). Sendo assim, inseriu uma

agulha-estilete no final do canal da vagina e, usando o dedo indicador direito como guia, encontrei a bolsa, mas o estilete não penetrou e deslizou sobre sua superfície lisa. Então descansei meu dedo suave e obliquamente na cabeça do feto, a bolsa cedeu e saiu uma certa quantidade de líquido amniótico, a cabeça se apresentou. Imediatamente, o sr. Carmona me disse para aplicar uma injeção de água quente, porque além de recomendá-lo algum autor, ele havia realizado em sua prática. [Essa prática] tinha duplo objetivo: realizar o parto e batizar a criança, e assim procedi. Imediatamente a cabeça veio, eu introduzi minha mão esquerda com a face palmar no occipital e na parte posterior do pescoço até tomar em minhas mãos as duas axilas com os dedos fazendo imediatamente uma tração coroada com o melhor sucesso ... [até] que a criança saiu em estado de asfixia (p.282).

Assim, cortaram o cordão umbilical e o deixaram sangrar, uma prática comum entre os parteiros mexicanos. Massagearam o peito e lhe fizeram respiração boca a boca. Só voltaram suas atenções à parturiente após terem estabelecido a respiração da criança. Na mulher, procuraram remover imediatamente a placenta, que, segundo o relato, já estava quase totalmente descolada, exceto em um ponto que permanecia preso no útero. Ao constatar isso, Soriano (out. 1868, p.282) relatou que buscou “desanexá-lo inserindo suavemente meu dedo entre os cotilédones e a face interna, como aconselhado por Chailly-Honoré quando a adesão era normal. O tecido interno estava duro, desigual e formava um tipo de fungo com um pouco mais de um peso”. Antes de realizar qualquer procedimento, no entanto, consultou seu companheiro para confirmar suas constatações. Os médicos concluíram o atendimento com os curativos na mulher e a deixaram com a criança respirando bem (p.282).

Além da própria estrutura “manualesca” desse escrito, o relatório de Soriano ilumina outros elementos característicos da prática médica mexicana de meados do século XIX. Dois são particularmente interessantes de serem destacados. O primeiro é a descrição minuciosa do atendimento. Thomas Laqueur (2001LAQUEUR, Thomas W. Corpos, detalhes e narrativa humanitária. In: Hunt, Lynn (org.). A nova história cultural. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p.239-277. , p.240) afirma que esse estilo descritivo, rico em detalhes e com um tom dramático se trata de uma herança de um gênero específico surgido na virada do século XVIII: a narrativa humanitária. Tal narrativa não se assentava sobre os corpos individuais apenas como objetos em que a dor se manifestava, mas para descrever certa ligação, um elo, uma relação estreita entre aqueles que sofriam e aqueles que os estavam salvaguardando.

Outro elemento que chama atenção é a assistência do médico por outros sujeitos. O fato de Soriano ter convidado um colega de ofício e um padre para o assistir pode parecer estranho aos olhos do leitor atual. Entretanto, não era para a época em que o médico escreveu. A “moral médica”, ensinada no curso de medicina da Escola Nacional de Medicina, recomendava aos médicos que solicitassem a vistoria de algum companheiro de ofício em seus atendimentos, sobretudo quando estivessem atendendo pacientes com risco de morte. A presença de uma testemunha ocular era fundamental, por exemplo, para livrar o médico de possíveis acusações, principalmente em uma época em que os saberes médicos científicos tinham pouco prestígio perante a população mexicana, que os via com desconfiança, menoscabo, e muitas vezes denunciava as práticas médicas nos periódicos que circulavam pela capital ( Agostoni, 2005AGOSTONI, Claudia. “Que no traigan al médico”: los profesionales de la salud entre la crítica y la sátira (Ciudad de México, siglos XIX-XX). In: Sacristán, Cristina; Piccato, Pablo (orgs.). Actores, espacios y debates en la historia de la esfera pública en la Ciudad de México. Ciudad de México: Instituto Mora; Unam, 2005. p.97-120. ). Já a presença de um religioso era fundamental não apenas na concepção médica daquela época. A autoridade religiosa era de suma importância para garantir a salvação da alma do nascituro e/ou da parturiente, dando conforto aos corações das famílias católicas caso algo de errado ocorresse ( Vailati, 2010VAILATI, Luiz Lima. A morte menina: infância e morte infantil no Brasil dos oitocentos (Rio de Janeiro e São Paulo). São Paulo: Alameda, 2010. ).

O terceiro exemplo veio a público em 1869, quando Juan María Rodríguez publicou na Gaceta Médica uma série de escritos com indicações acerca de alguns procedimentos de parto. Esses textos constituíram a primeira versão do que depois se tornou o primeiro guia de partos publicado no México em formato de livro, em 1878.

No primeiro relatório dessa série, Rodríguez (jul. 1869) apontou e discutiu os benefícios e riscos da utilização de determinados produtos à saúde das parturientes e dos fetos durante o parto, como o cuernecillo de centeno e o zihuatlpatle . Além disso, defendeu a importância de simplificar os preceitos de medicina obstétrica por meio de quadros explicativos. Tal esquematização, segundo ele, era considerada por médicos europeus como um recurso muito útil à prática médica, pois sua utilização seria simples e objetiva, como frequentemente ela exigia. Outra vantagem da organização dos métodos de partos em quadros apontada por Rodríguez (jul. 1869, p.196) era que eles uniformizavam as doutrinas obstétricas sem exigir um ecletismo dos práticos mexicanos. Tal organização, em suas palavras, incluiria somente os métodos baseados na experiência e observação dos profissionais de renome no mundo científico.

Rodríguez (jul. 1869) publicou todos os seus quadros sinópticos na Gaceta Médica ainda em 1869, e afirmou que eram direcionados aos alunos de clínica de obstetrícia da Escola Nacional de Medicina, matéria que lecionava. Não obstante, pode-se dizer que suas pretensões eram ainda maiores, já que suas lições foram publicadas nas páginas da Gaceta , mídia de divulgação de saberes cujos leitores não eram apenas estudantes. Vale ressaltar que seus quadros não foram aceitos sem questionamentos; alguns pontos específicos da proposta do obstetra foram criticados por seus pares. Apesar disso, nada de muito substancial foi alterado ao longo dos anos. Pelo contrário, Rodríguez, até duas décadas depois, os foi complementando com mais exemplos práticos para aumentar suas amostras e assim poder comprovar suas propostas iniciais ( Silva, 2018SILVA, Julio Cesar P. “Obreros del porvenir”: a instituição da Academia Nacional de Medicina e a produção de saberes médicos no México (1860-1880). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ).

Em 1870, um ano após a publicação dos quadros sinópticos, outro médico obstetra, Ignácio Capetillo, autodenominado discípulo de Rodríguez, tornou pública a reelaboração coletiva de alguns médicos da Casa de Maternidade de um procedimento clínico intitulado “Kiwish”. Por meio de um relato publicado em dois números da Gaceta Médica , Capetillo (out. 1870, nov. 1870) apresentou pormenorizadamente como seus colegas e professores adaptaram esse método a partir do atendimento clínico a uma mulher que morreu com sua prole. Após discorrerem sobre como deveriam ter procedido em tal atendimento e suas diferenças em relação aos médicos europeus, os mexicanos fizeram alguns reajustes no método cirúrgico.

Para provar a eficiência de tal reformulação, ainda no mesmo ano, nos números seguintes da Gaceta , o próprio Juan María Rodríguez (nov. 1870) publicou um extenso relatório clínico detalhando passo a passo o procedimento realizado por ele, por meio do qual, dessa vez, havia salvado a mãe e a criança. Orgulhoso, o catedrático justificou que sua pressa em divulgar tal experiência se dava pelo fato de que, no México, os casos de eclampsia durante os últimos meses de gestação eram recorrentes e que, a partir de então, sabia o antídoto para resolver tal problema. Em suas palavras:

O parto prematuro artificial merece o primeiro lugar entre os vários meios recomendados para combatê-la, por sua eficácia, por sua inocência e pelo grau de simplicidade e perfeição que o método de intervenção inventado por Kiwish alcançou entre nós. Não hesitei em apresentar seus resultados hoje, escolhendo para minha leitura, de acordo com o regulamento, esta razão que submeto com prazer ao julgamento de meus esclarecidos coprofessores (Rodríguez, nov. 1870, p.312-313).

Outro texto relacionado à prática obstétrica que igualmente compôs uma vasta lista de relatórios clínicos publicados na Gaceta Médica foi assinado em 1878 por um dos primeiros obstetras com formação científica atuantes no México, José Pablo Martinez del Río (ago. 1878, p.459). Valendo-se de seu prestígio como um dos pioneiros daquela geração na obstetrícia – e à diferença dos outros médicos já citados –, Martinez del Río compartilhou um relatório prescrevendo o uso correto do clorofórmio na prática médica.

Del Río iniciou seu texto afirmando que havia anos ele próprio recebera as primeiras notícias da Europa sobre as cirurgias realizadas em humanos anestesiados com éter sulfúrico, e não demorou para utilizar o produto em seus pacientes no México. Da mesma forma, argumentou que também fora ele quem recebeu a primeira notícia da aplicação de clorofórmio em procedimentos cirúrgicos realizados em terras europeias e que rapidamente propagou o uso dessa substância entre os mexicanos. Contudo, dizia-se preocupado com a maneira como o clorofórmio estava sendo utilizado no país, sobretudo nos procedimentos obstétricos. Em suas palavras, “ninguém poderá me acusar de forma justa de eu me opor ao procedimento benéfico que nos permite realizar sem dor as mais árduas e terríveis operações de alta cirurgia”, porém, “ao ver o modo como o uso do clorofórmio é frequentemente empregado em operações obstétricas, e às vezes com resultado fatal, acredito que seria conveniente chamar a atenção de meus colegas para os perigos de tal prática” (Martínez Del Río, ago. 1878, p.459).

O perigo do clorofórmio, segundo ele, estava relacionado à aplicação imprudente desse anestésico durante o parto, sobretudo por obstetras menos experientes. Visto que um dos efeitos desse produto era a redução da circulação sanguínea, sua aplicação em excesso poderia inibir as hemorragias que porventura pudessem ocorrer durante o trabalho de parto. Isso poderia impedir que se notasse a real situação da parturiente e, passado o efeito da droga, agravasse o quadro clínico de maneira espantosa, de modo que a levasse à morte.

Martinez del Río, portanto, recomendou que a substância fosse utilizada de forma moderada. Sua aplicação deveria servir apenas para aliviar as dores da paciente durante o parto, com uma posologia de “meia anestesia” ou “à Rainha” (em referência à rainha Vitória). Tal método consistia na inalação rápida ou moderada da substância somente para que retirasse a sensibilidade. O ideal, segundo o obstetra, era que a aplicação fosse realizada pela própria mulher por meio de “um lenço de clorofórmio no momento da contração uterina, deixando as pacientes respirarem nos intervalos livres da dor” (Martínez del Río, ago. 1878, p.460). Ainda com esses cuidados, argumentou que os médicos deveriam sempre estar atentos aos batimentos cardíacos e movimentos respiratórios das parturientes.

Por fim, ao concluir seu relatório, Martinez del Río deixou ainda mais claro seu objetivo. Afirmou que seu apelo certamente chamaria a atenção dos médicos e obstetras mais jovens e os colocaria de resguardo contra os perigos do abuso de tal substância anestésica em mulheres durante o trabalho de parto. Escreveu que se suas reflexões serviam “para evitar alguma desgraça”, acreditando que seu “esforço terá sido muito bem empregado” (Martínez del Río, ago. 1878, p.461).

Os relatórios citados são apenas alguns exemplos que podem ser encontrados na Gaceta Médica nas primeiras décadas de sua publicação. Como demonstrado, eram publicações de experiências particulares, cujos assuntos não necessariamente visavam, de forma explícita, regular e normatizar os saberes médicos na esfera prática. Todos apresentavam certas novidades técnicas e procedimentais desenvolvidas no cotidiano da atividade médica. Porém, esses textos acabam sendo direcionados aos demais médicos e estudantes de medicina e apresentando caráter normativo. Nesse contexto, textos como o de Rodríguez, médico obstetra de grande prestígio científico, tinham mais peso de norma do que o de outros. Como demonstrado, os poderes regulador e normatizador dos relatórios se expressavam tanto de maneira mais explícita (direta e por meio de recomendações) como de maneira implícita (por meio de sugestões de procedimentos ou demonstrando alguma prática como correta). Ao mesmo tempo que publicações da Gaceta Médica versaram sobre as práticas e os procedimentos médicos, algumas acabaram também abordando de forma normativa, direta e indiretamente, outros assuntos relacionados ao dever ser do médico. São alguns desses textos que serão analisados a seguir.

Como um médico deve ser

As publicações da Gaceta Médica , como dito, não contribuíram apenas para a elaboração e transformação das normas e regras relacionadas às práticas médicas. Enquanto publicações que constituíram um “manual não sistematizado” na segunda metade do século XIX, também forneceram elementos que ajudaram a consolidar outras regras sociais relacionadas ao dever ser do médico.

Os citados relatórios de Manuel Soriano, Juan María Rodríguez e José Pablo Martinez del Río recomendavam determinadas práticas médicas e expressavam implicitamente como o médico deveria ser. Podem ser extraídas deles ideias de: companheirismo, ajuda mútua entre os médicos e respeito às crenças dos pacientes, no caso do relatório de Soriano; compromisso com a verdade, honestidade e perseverança científica, nos casos de Rodríguez e seu discípulo; e reivindicação do respeito e confiabilidade, por meio da antiguidade e do pioneirismo, no exemplo de Martinez del Río.

Além desses casos, existem outros publicados na Gaceta Médica que abordaram outras temáticas do ser e dever ser médico. Talvez o exemplo mais emblemático das primeiras décadas de existência do periódico sobre como os médicos deveriam ser seja o relatório de Domingo Arámburu, publicado em 1866. Anedótico, seu texto reforça a característica de “manual não sistematizado” do periódico, mas também exemplifica como alguns escritos assumiram posicionamentos mais enfáticos com relação à normatização de certos valores e posturas “científicos”.

Segundo a história relatada, Arámburu (maio 1866, p.156) fora solicitado com urgência para atender a um chamado de uma criança que havia se engasgado com uma casca de pinhão. Após averiguar seu quadro clínico, assim como refletir sobre quais procedimentos deveriam ser realizados, Arámburu realizou uma traqueostomia implantando uma cânula flexível por meio de uma perfuração da traqueia da criança. O objetivo era fazer com que o paciente respirasse pela cânula enquanto pudesse realizar a extração da casca. Feito isso, então o médico retirou com sucesso o objeto da garganta que bloqueava sua respiração.

A parte mais interessante do relato, no entanto, narra quando o médico se encontrou com o pequeno paciente em estado de convalescença. Arámburu confessou aos companheiros de ofício que, dias após a realização da cirurgia, quando retornou à casa do paciente, quase lhe caíram algumas lágrimas ao escutar a criança gritando depois que o médico bloqueou a cânula implantada em sua traqueia. Isso, segundo ele, era sinal de que o menino já podia respirar de maneira autônoma, sem a necessidade do objeto.

Apesar da emoção, o médico conta que precisou conter suas lágrimas, pois estava diante dos progenitores da criança. Em suas palavras: “Essa comoção teve que ser afogada, pois seus pais estavam presentes, e compreendi que eles sentiam o mesmo que eu; e ‘um médico precisa suprimir certos sentimentos de sensibilidade para não parecer ridículo’. Com essa sensação, considerei-me recompensado” (Arámburu, maio 1866, p.156; destaques meus).

Esse fragmento, portanto, elucida duas interessantes questões relacionadas ao dever ser da profissão, em processo de constituição naquela época. Em primeiro lugar, ao discorrer sobre qual deveria ser a postura do médico diante dos familiares do enfermo, ou seja, a de precisar “suprimir certos sentimentos de sensibilidade para não parecer ridículo”, Arámburu não só elucidou como reforçou determinado aspecto normativo que possivelmente estava na ordem do “não dito” na prática médica, mas que regulava o comportamento exigido durante a teatralização médica nos atendimentos clínicos.

Depois, o excerto também confirma a existência de uma crescente demarcação de posições sociais entre os sujeitos ali em interação. Em tal atendimento, portanto, caberia ao médico atender ao chamado da família e cumprir com o papel sociologicamente esperado de seu ofício, isto é: realizar os procedimentos científicos para restaurar a saúde do enfermo. À família, por sua vez, competia ser atendida pelo médico e aguardar que ele agisse, como médico, como um “homem da ciência”, que demonstrasse perícia e certo controle emocional. Na interpretação de Arámburu, chorar diante dos familiares quebraria o protocolo do ritual, gerando assim uma situação constrangedora; nas palavras do autor, “ridícula”.

Novamente, os estudos de Goffman ajudam a compreender melhor essa interação simbólica compartilhada no relatório. Neste, pode-se entender que, caso o choro fosse notado pelos responsáveis da criança, o ritual de representação do “médico cientista” se romperia de imediato; para evitar isso, cabia-lhe o dever de se comportar friamente perante os pacientes e seus responsáveis. Nos termos de Goffman (1985, p.157), chorar durante a encenação médica constituiria uma “exclamação não pertencente à peça”, cujo desdobramento faria desmoronar o autor por trás do personagem encenado por Domingo Arámburu.

Em 1870, Manuel Dominguez publicou uma interessante reflexão sobre como deveriam ser elaboradas as receitas no México. Nela, também apresentou alguns elementos sobre como o médico mexicano deveria ser. Estratégico, Dominguez (jun. 1870a, p.126-127) iniciou seu texto com um cuidadoso elogio a alguém que pretende criticar. Indicou que, “de forma geral, os filhos da Escola Nacional de Medicina deixam-na adornados com os requisitos indispensáveis aos professores e aos que buscam aperfeiçoar suas práticas privadas” (p.127). Ao longo de suas formações, além de adquirir conhecimentos teóricos de fisiologia, os futuros médicos aperfeiçoavam suas práticas nos hospitais da instituição e aprendiam “pelos estudos farmacológicos, as armas que serviriam para combater os males”. No entanto, havia uma mancha nessa “magnífica tela de conhecimentos biológicos e patológicos”. “Uma mancha pequena”, porém suficientemente incômoda para que se procurasse apagá-la. No caso, Dominguez se referia à baixa qualidade da escrita dos médicos (p.127).

Em tempos pretéritos, afirmou Dominguez, procurava-se receitar em latim, porque era um idioma inacessível aos enfermos e seus familiares. Com isso, os médicos se distinguiam e se protegiam de qualquer problema judicial, caso o conteúdo da receita fosse modificado. Porém, Dominguez afirmou que, naqueles anos, havia dois sérios problemas em receitar daquela forma: (1) o latim já não era uma língua tão estranha à clientela; e (2) com o surgimento de novos medicamentos e tratamentos, muitos médicos acabavam “latinizando” seus nomes ou inventando novos símbolos para incorporar essas inovações, a fim de tornar suas receitas incompreensíveis aos leigos.

Sobre o primeiro ponto, o médico (Dominguez, jun. 1870a, p.128) comentou que muitos enfermos já conheciam alguns termos em latim e frequentemente se horrorizavam com a leitura de algumas palavras soltas que designavam, de maneira equivocada, outras substâncias. Por exemplo, “não faltava quem já não houvesse sido politicamente despedido das casas por receitar mercúrio para combater a flegmasia”. E isso ocorria por conta de más interpretações a respeito dessa substância, que também era prescrita às pessoas com sífilis (doença muito estigmatizada na época, sobretudo entre as famílias das classes acomodadas, pois estava relacionada com a sexualidade impura, ilegal ou ilegítima).

No segundo ponto, foi ainda mais cuidadoso. Dominguez não negou que entre os médicos mexicanos existissem aqueles que dominassem o difícil idioma de Cícero e Virgílio. Havia, porém, muitos outros que, ao tentar mudar seus estilos para tornar suas receitas menos compreensíveis, elaboravam perífrases, inventavam palavras e criavam símbolos que não faziam sentido. Assim, acabavam construindo “orações Quijotitas”6 6 Referência à personagem Pomposita, do livro La Quijotita y su prima: historia muy cierta con apariencias de novela, de José Joaquín Fernández de Lizardi, publicado no final do século XVIII. De inspiração cervantina, Pomposita é uma personagem feminina que, sem instrução erudita, vive em função da pompa e da frivolidade. Porém, possui como principal arma sua formosura para conseguir seus objetivos, seja com seus pais, criados ou pretendentes ( Arrom, 1988 ). e “expondo os médicos à justa crítica dos discípulos de Iriarte e Nebrija [escritores espanhóis], que poderiam avaliar seus conhecimentos pelo que revelassem com o domínio do latim” (Dominguez, jun. 1870a, p.127).

Para que isso não ocorresse, a recomendação de Dominguez era que os médicos mexicanos evitassem o latim. Em seu lugar, recomendou também que não fosse utilizado o francês, idioma lentamente propagado entre os médicos à época. Para Dominguez, era compreensível que alguns nativos optassem por escrever na língua de Racine por sua beleza, bem como por ser a mesma dos grandes nomes da medicina científica daquele período. Contudo, “‘o francês não é o idioma nacional’” (Dominguez, jun. 1870b, p.132; destaque no original). Defendia que deveria ser utilizado somente o espanhol. Se as alegações dos médicos eram de que procuravam apenas se defender dos abusos e das falsificações utilizando outros símbolos e línguas, elas não se sustentavam, pois, como afirmou, caso os clientes quisessem fraudar o receituário, fraudariam em qualquer idioma.

Além do idioma, a caligrafia dos médicos também foi duramente criticada. Sobre ela, Dominguez (jun. 1870b, p.131-132) afirmou que não passaria em silêncio sobre esse outro grande problema que acometia os médicos mexicanos. Como se não fosse o bastante fazer ininteligível o idioma utilizado pelos médicos, bem como os signos criados e adotados por eles, quem o escrevia usava uma letra tão detestável que não havia paleógrafo que pudesse decifrá-la, conforme afirmou. A péssima caligrafia também tinha suas desvantagens, pois poderia levar ao equívoco do farmacêutico durante o processo de manipulação dos remédios e dificultar o acesso ao prontuário do paciente por outro médico que fosse consultado posteriormente. Escrever mal também foi apontado como um defeito que revelava um descuido com a educação primária do médico, o que colocava em risco sua credibilidade perante a população. Nas palavras de Dominguez (jun. 1870b, p.132), escrever mal “deveria ser algo mortificante”, pois “muitos médicos fazem gala de sua péssima escrita como os soberanos da Idade Média que tinham a glória de escrever ... com gordos, trêmulos e ininteligíveis caracteres”.

Ao concluir, o médico elaborou um modelo de receita a ser utilizado por seus pares e estudantes. Nele, apontou que o documento deveria ser escrito em espanhol, sem abreviaturas ou quaisquer símbolos, com a melhor caligrafia possível e que fosse utilizado o sistema decimal para a designação da quantidade dos produtos utilizados na elaboração dos medicamentos prescritos. Por fim, alegou que a ciência daqueles anos não necessitava de obscurantismos cabalísticos para que fosse solicitada. Portanto, ao escreverem de maneira clara, garantiriam não só a credibilidade de homens doutos, mas dariam liberdade aos pacientes, caso quisessem “apelar aos conhecimentos de outro facultativo” (Dominguez, jun. 1870b, p.133).

Além dos exemplos citados, destaca-se também um relatório de Demetrio Mejía no qual foram discutidos o aspecto sacerdotal da medicina e a cobrança de honorários. Nele Mejía (dez. 1892, p.418) procurou contestar uma opinião externa à Academia de que, com a cobrança de honorários pelos serviços, os médicos haviam transformado a medicina daqueles tempos numa profissão lucrativa como qualquer outra, deixando de lado sua dimensão sagrada, a do sacerdócio.

A medicina como sacerdócio era uma concepção antiga tanto no imaginário leigo como no dos médicos, reforçada diariamente no curso de medicina e na própria prática médica cotidiana. Como elemento de distinção, o sacerdócio valorizava simbolicamente o ofício médico em detrimento dos demais como a do advogado, cujos preços dos serviços eram tabelados. No entanto, acabava também gerando algumas intepretações que se tornaram problemáticas aos médicos conforme a medicina se profissionalizava. Por um lado, ao se tratar de um sacerdócio, algo sagrado, a dimensão pecuniária, que vinha crescendo, passou a ser vista por alguns críticos como algo depreciativo, herético, já que se tratava de um retorno financeiro quase relacionado à avareza. Por outro, o pagamento de honorários era defendido por Mejía como um reconhecimento justo aos esforços científicos dos médicos por devolver a saúde a seus pacientes. Reconhecimento, aliás, considerado por ele insuficiente em muitos casos, pois, enquanto na Europa se valorizavam os saberes dos médicos, remunerando-os relativamente bem, no México, onde o custo de vida era mais alto, costumava-se pagar muito pouco ou nada. Na avaliação de Mejía (dez. 1892, p.417), isso ocorria também porque a população, inculta, não valorizava os saberes da medicina científica.

Mejía defendeu a profissão médica. Para ele, a cobrança de honorários não anulava seu caráter sagrado, pois esse estava relacionado a outros aspectos do dever ser médico: o da caridade e o do sacrifício. Ambos, segundo Mejía (dez. 1892, p.418-419), se realizavam por exemplo, quando os médicos assistiam os enfermos contagiosos ou quando abriam mão de estar com suas famílias para atender aos necessitados, mesmo depois de um dia cansativo e cheio de serviço. A caridade e o sacrifício se evidenciavam também quando os médicos frequentemente deixavam até mesmo de comer para cuidar de seus pacientes. Faziam tudo isso ganhando pouco, expondo-se e correndo risco de se contaminar. Por isso, ainda que fossem retribuídos financeiramente de maneira justa, não deixariam de exercer o sacerdócio da profissão.

O caráter depreciativo da dimensão sacerdotal da profissão, entretanto, não foi negado no texto. Mejía (dez. 1892, p.420) afirmou que de fato ele se manifestava em situações específicas, como quando alguns médicos ofereciam consultas gratuitas em boticas cujos interesses eram unicamente financeiros. “Com raras exceções”, escreveu, “esse serviço dava ao médico pouco proveito e nenhuma honra”, pois muitos desses lugares se revestiam com roupagens de caridade para “cobrir a desnudez de uma simples exploração”, já que frequentemente ofereciam consultas gratuitas e emitiam receitas codificadas, forçando assim os pacientes a comprar os medicamentos no próprio estabelecimento (p.420).

Demetrio Mejía (dez. 1892, p.417) elogiou a diligência dos médicos mais jovens ao se dispor a oferecer serviços gratuitos, sobretudo para adquirir clientela e experiências clínicas, o “tesouro do ensinamento alcançável unicamente com os anos”. No entanto, recomendou que isso não deveria ser realizado de qualquer forma. Nem todos os caminhos eram nobres, havia outros mais honrados a ser trilhados. Para demonstrar qual vereda levaria à mina de ouro, Mejía utilizou sua própria trajetória como modelo. Argumentou que abriu um consultório particular nos anos iniciais de sua carreira. Nele, oferecia serviços gratuitos e permitia que outros jovens médicos que também se tornaram renomados no México o utilizassem para fazer o mesmo que ele. Com isso, acumulou clientela e experiência e então abriu outro consultório, onde passou a cobrar honorários pelos serviços. Ainda assim, assegurou que não havia deixado de atender gratuitamente aqueles que porventura não tivessem condições de pagar pela consulta (Mejía, dez. 1892, p.421).

Com isso, o médico rebatia a crítica externa acerca da profissão médica, garantindo sua distinção em relação às demais profissões, e também alertava seus pares mais jovens sobre os comportamentos socialmente esperados. Esse exemplo, junto aos demais já apresentados, faz parte de um conjunto de relatórios que ilumina o aspecto normatizador da Gaceta Médica entre 1860 e 1890, sobretudo acerca de como o médico e sua profissão deveriam ser. O relatório de Arámburu destaca o comportamento do médico, como cientista, perante seus clientes; o de Dominguez ressalta a forma como deveria ser a escrita durante a prescrição de medicamentos, adotando uma dimensão um pouco nacionalista ao ressaltar o idioma falado no México; por fim, o de Mejía, publicado anos depois de a Academia ter sido definitivamente institucionalizada pelo governo de Porfírio Díaz ( Rodríguez Pérez, 2013RODRÍGUEZ PÉREZ, Martha Eugenia. La Academia Nacional de Medicina de México (1836-1912). Gaceta Médica de México, v.149, n.5, p.569-575, 2013. ), defende a cobrança de honorários e um chamado à ordem, indicativos de como os médicos daqueles anos entendiam que deveria ser sua própria profissão.

Somados a esses, obviamente, estão os aspectos normativos do dever ser médico contidos nos outros exemplos apresentados na seção anterior. Todos demonstram que a Gaceta Médica foi constituída como uma importante instância normativa de saberes médicos no México, um “manual não sistematizado”.

Considerações finais

Os relatórios aqui discutidos fazem parte de um amplo universo de textos médicos publicados não apenas nas páginas da Gaceta Médica durante a segunda metade dos Oitocentos. Na elaboração deste artigo, optou-se por não abordar os conflitos ocorridos ao longo desses anos entre os membros da Academia Nacional de Medicina, por se entender que esse é um assunto a ser tratado com maior cuidado em outra ocasião. O que se analisou foi uma seleção arbitrária de alguns relatórios publicados na Gaceta Médica entre 1860 e 1890. O principal critério de escolha foi o fato de esses textos terem aspectos típicos que representassem a dinâmica do universo médico-científico mexicano em um contexto de institucionalização e profissionalização da medicina.

A partir disso, demonstrou-se como certas experiências foram compartilhadas por meio do periódico. E como, dessa forma, os médicos vinculados sobretudo à Academia Nacional de Medicina e à Escola Nacional de Medicina (principais instituições mexicanas de pesquisa e ensino de medicina à época) acabaram instituindo certo modelo de ser médico e praticar a medicina voltado para aqueles que quisessem integrar a profissão e nela ser reconhecidos. Isso ocorreu, ao menos na esfera discursiva, porque aqueles médicos que estavam no topo da hierarquia científica do país, ao compartilhar suas experiências, transformaram as páginas da Gaceta Médica em outra instância de normatização além das já existentes. Tornaram-na o que se nomeou “manual não sistematizado” de saberes médicos.

Pensar a Gaceta Médica como um instrumento heurístico intitulado aqui “manual não sistematizado” ajuda a compreender melhor certos aspectos da organização e produção de saberes médicos no México que não estavam propriamente sistematizados nos livros-texto das disciplinas oferecidas nos estatutos da Escola e da Academia. Permite também acompanhar a dinâmica da produção de regras e normas implícitas e explícitas do ofício médico, sem que se necessitasse de um manual ou um estatuto propriamente ditos.

A noção de “manual não sistematizado” também pode servir para analisar a dinâmica de outros agrupamentos e agentes institucionalizados ou em processos de institucionalização e profissionalização. Mesmo que possuam regras sistematizadas e formalmente explicitadas, a leitura de suas produções cotidianas, por meio de uma concepção semelhante à da proposta para pensar a Gaceta Médica , pode iluminar aspectos interessantes dessas interações que poderiam ser obscurecidos em outras leituras.

REFERÊNCIAS

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NOTAS

  • 1
    A Academia Nacional de Medicina mexicana sofreu algumas modificações em seu nome e em sua forma de organização. Criada em 1864, como a Sección de Medicina da Comisión Científica, Literaria y Artística de México, tornou-se Sociedad Médica de México, em 1865, Academia de Medicina, em 1873, e Academia Nacional de Medicina, em 1887 ( Rodríguez Pérez, 2013RODRÍGUEZ PÉREZ, Martha Eugenia. La Academia Nacional de Medicina de México (1836-1912). Gaceta Médica de México, v.149, n.5, p.569-575, 2013. ). Por questões práticas, optou-se por referenciá-la apenas como Academia Nacional de Medicina ou simplesmente Academia.
  • 2
    Os exemplares da Gaceta Médica de México estão disponíveis para consulta na Biblioteca Nicolás León.
  • 3
    O Porfiriato corresponde ao período no qual o México foi governado, por aproximadamente três décadas, pelo general Porfírio Díaz, que ascendeu ao poder em 1876 e deixou o cargo em 1910. Sobre tal período, ver Garcíadiego (2010)GARCÍADIEGO, Javier. El Porfiriato (1876-1911). In: Wobeser, Gisela von (org.). Historia de México. Ciudad de México: FCE, SEP, Academia Mexicana de Historia, 2010. p.209-225. .
  • 4
    Eduardo Porro foi um obstetra que adaptou e realizou pela primeira vez um tipo específico de cirurgia cesariana em Milão, em 1876.
  • 5
    Nessa e nas demais traduções do espanhol a tradução é do autor.
  • 6
    Referência à personagem Pomposita, do livro La Quijotita y su prima: historia muy cierta con apariencias de novela, de José Joaquín Fernández de Lizardi, publicado no final do século XVIII. De inspiração cervantina, Pomposita é uma personagem feminina que, sem instrução erudita, vive em função da pompa e da frivolidade. Porém, possui como principal arma sua formosura para conseguir seus objetivos, seja com seus pais, criados ou pretendentes ( Arrom, 1988ARROM, Silvia Marina. Las mujeres de la Ciudad de México, 1790-1857. Ciudad de México: FCE, 1988. ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    11 Abr 2020
  • Aceito
    19 Out 2020
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