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A higiene mental ronda a infância: a Clínica de Eufrenia e o Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental, 1934-1939

Mental hygiene in early childhood: the Clínica de Eufrenia and Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental, 1934-1939

Resumo

Analisa-se como a higiene mental se tornou pauta central no debate acerca do desenvolvimento nacional (anos 1920 e 1930), detendo-se nos trabalhos desenvolvidos pela Clínica de Eufrenia (1931), criada pela Liga Brasileira de Higiene Mental, e pelo Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental (1934), edificado na reforma Anísio Teixeira, ambos situados na cidade do Rio de Janeiro. Ainda que com abordagens distintas, trabalharam a criança como lócus para a intervenção e construção do brasileiro do futuro: forte, saudável e produtivo. As análises foram alicerçadas em alguns casos clínicos realizados pelas instituições; nos escritos de seus diretores (os médicos Mirandolino Caldas e Arthur Ramos); e nos Arquivos Brasileiros de Higiene Mental.

Arthur Ramos (1903-1949); criança; família; história; Mirandolino Caldas

Abstract

This article analyzes how mental hygiene became a central theme in the debate on national development in the 1920s and 1930s, examining the work of the Clínica de Eufrenia (1931) created by the Liga Brasileira de Higiene Mental and the Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental (1934), both in Rio de Janeiro and established during the Anísio Teixeira reform. Despite following different approaches, they considered the child as a locus to intervene and construct the Brazilian of the future: strong, healthy, and productive. This analysis includes some clinical cases from these institutions, writings by their directors (the physicians Mirandolino Caldas and Arthur Ramos), and the Brazilian Mental Hygiene Archives.

Arthur Ramos (1903-1949); child; family; history; Mirandolino Caldas

Prevenir para não remediar: a infância é a fase em que todo trabalho começa

Na década de 1920, a preocupação com os problemas de ordem mental foi sendo projetada, de maneira cada vez mais enfática, com base na prevenção. Era mais lógico trabalhar com ela do que com a cura, o que demandava menos dispêndio de dinheiro e material humano. Assim, a higiene mental passou a figurar de maneira mais central nas discussões e nos projetos nacionais. A raça continuava a ter grande relevância nos debates sobre o futuro do país. Desde o século XIX, a discussão em torno dela e da prática da mestiçagem foi intensa em solo nacional, com as inquietações da classe intelectual acerca do que fazer com o país já composto por um enorme contingente de mestiços. O prognóstico era negativo, considerando as teorias e os teóricos que condenavam a mestiçagem. Desse modo, foi preciso trabalhar com tais teorias, com seu status científico, que, se aceitas sem mediações, significaria a concordância com a inferioridade do povo e a inviabilidade da nação ( Schwarcz, 2008SCHWARCZ, Lilia. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. ).

Negociar, traduzir, selecionar, reler e recortar foram meios utilizados pela intelectualidade para buscar possíveis caminhos, ajustamentos e/ou soluções com relação àquele marcador de diferença. Como apontou Ortiz (2006ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 2006. , p.15), o dilema daqueles homens de ciência era “compreender a defasagem entre teoria e realidade, o que se consubstancia na construção de uma identidade nacional”. Uma realidade local que fazia com que os postulados teóricos adquirissem novos contornos e peculiaridades.

No que diz respeito à raça, ela veio a ser “relida” pelo movimento sanitarista, nos anos 1910, como responsável por todas as mazelas nacionais. No entanto, o fator racial não deixou de ser considerado um entrave ao desenvolvimento do país, e nisso não há contradição, tendo em vista a centralidade da raça para os projetos nacionais. O contato estabelecido com o interior do Brasil foi realizado com as expedições dos médicos do/ou enviados pelo Instituto Oswaldo Cruz, que, desde 1905, já realizava incursões pelo país com a incumbência de executar inspeções sanitárias em portos e nas campanhas contra doenças, como a malária e a febre amarela. O desbravamento dos sertões atendia à necessidade de comunicação interna que viabilizasse a economia nacional, tal como a construção de linhas férreas e telegráficas. Nesse sentido, Lima (2009LIMA, Nísia. Uma brasiliana médica: o Brasil Central na expedição científica de Arthur Neiva e Belisário Penna e na viagem ao Tocantins de Julio Paternostro. História, Ciência, Saúde – Manguinhos, v.16, supl.1, p.229-248, 2009. , p.233) afirmou que as “primeiras expedições destinaram-se aos trabalhos profiláticos que acompanharam as ações relacionadas às atividades exportadoras, base da economia do país”.

O descaso público com relação às populações interioranas foi uma das abordagens mais destacadas por Belisário Penna e Arthur Neiva, médicos que compuseram a terceira e mais longa expedição. Em Cadernos de viagem , asseveraram que “seriam o governo e a doença e não mais a natureza, a raça ou o próprio indivíduo, os grandes culpados pelo abandono da população à sua própria sorte” (Lima, Hochman, 2004, p.501). Outrossim, exigia-se uma atuação enfática, responsável e eficaz por parte do governo na profilaxia das endemias rurais que assolavam a nação, além da criação de um ministério exclusivamente dedicado à saúde. As doenças foram sendo avistadas como um grande causador do flagelo do homem brasileiro. Essa nova chave explicativa (doença/saúde) proporcionava uma recuperação, permitia uma saída, ao menos para as doenças não hereditárias. Para muitas das doenças possibilitava a regeneração, por intermédio de medidas profiláticas, controles sanitários, campanhas e educação higiênica.

Nesse escopo, a eugenia, que ganhava cada vez mais espaço nos anos 1920, era entendida como mais uma via que se apresentava visando à regeneração racial do brasileiro. Para alguns intelectuais da época, ela seria possível por intermédio de um ambiente favorável, com acesso a saúde e educação de qualidade; para outros, a solução seria o impedimento da reprodução dos considerados degenerados. Mesmo os que pensavam nessa segunda chave não descartavam a interferência do meio ambiente sobre o indivíduo; porém, não acreditavam em sua função regeneradora, uma vez que as ações ambientais não influíam no plasma germinativo.

Pensar em ações higiênicas e educacionais como maneiras de regenerar a nação tinha uma aceitação maior. Entretanto, é preciso destacar que as medidas mais radicais, a exemplo das esterilizações compulsórias, também estiveram em circulação e discussão em solo nacional. Imbuída pelos ideais sanitários, considerável parte da intelectualidade brasileira leu a eugenia como uma proposta que se casava bem com seus princípios. Por essa razão, ela foi, muitas vezes, compreendida como sinônimo de higiene. É válido pôr em relevo que as discussões e trabalhos na esfera sanitária já estavam consolidadas no país. Como observou Stepan (2004STEPAN, Nancy. Eugenia no Brasil, 1917-1940. In: Hochman, Gilberto; Armus, Diego (org.). Cuidar, controlar, curar: ensaios históricos sobre saúde e doença na América Latina e Caribe. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2004. p.331-392. , p.20), nas duas primeiras décadas do século XX, o Brasil era líder em ciências biomédicas e saneamento na América Latina. Dessa forma, nas palavras de Carvalho (2014CARVALHO, Leonardo. A eugenia no humor da Revista Ilustrada Careta: raça e cor no Governo Provisório (1930-1934). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, São Paulo, 2014. , p.109), a eugenia “encontrou-se como mais uma vértebra para toda discussão que se desencadeava, de traçar um projeto nacional”. Ademais, como destacou o referido autor, “as leis eugênicas no país obedeciam a diversos pressupostos políticos, médicos, sanitaristas” (p.114).

A eugenia foi validada por um grande número de pessoas, em geral intelectuais da classe abastada, de variadas formações e atuantes em diferentes campos como faculdades, museus, imprensa e repartições públicas em uma abrangência global. A ideia de apressar a evolução consistia em uma corrida pela perfeição. Porém, como destacou Schwarcz (2008SCHWARCZ, Lilia. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. , p.61), ainda que a noção de perfectibilidade do século XVIII tenha permanecida no XIX, ela ganhou uma acepção diferente, “neste caso, implica(va) pensar não em uma qualidade intrínseca ao homem, mas em um atributo próprio das ‘raças civilizadas’ que tend(iam) à civilização”. Os pontos de vista, formações, ocupações e posturas com relação à eugenia variaram, com as devidas seleções de abordagens, mas, como afirmou Engel (2012ENGEL, Magali. Os intelectuais e a Liga de Defesa Nacional: entre a eugenia e o sanitarismo? (RJ, 1916-1933). Revista Intellèctus, v.11, p.1-30, 2012. , p.24), “tais apropriações, mesmo quando revelaram grande proximidade, apresentaram diferenças que não podem ser desprezadas”.

De acordo com Moura e Boarini (2012MOURA, Renata; BOARINI, Maria. A saúde da família sob as lentes da higiene mental. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.19, n.1, p.217-235, 2012. , p.221), a preocupação com a higiene se tornou uma questão de saúde pública em meio à sociedade capitalista, quando as taxas de morbidade e mortalidade populacional passaram a ameaçar o desenvolvimento das forças produtivas. A estrutura sanitária do país então disponível não acompanhava a urbanização crescente. Moradias e espaços laborais não possuíam condições sanitárias adequadas, e as preocupações em torno da proliferação de doenças era pauta na agenda política. Nesse contexto, eram as classes populares que mais sofriam com abusos e intromissões em sua privacidade ( Chalhoub, 1996CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na corte imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. ).

A medicina social passava a entender como de sua alçada responsabilidades de geografia, economia, arquitetura, engenharia ou geologia, por exemplo. Ela as incorporou em nome da saúde, e com esse brado se organizou como poder e projeto político. Para atuar com eficácia, ela precisava do apoio do Estado, exigindo, assim, o exercício da chamada polícia médica ( Benchimol, 1992BENCHIMOL, Jaime. Pereira Passos: um Haussmann tropical. A renovação urbana da cidade do Rio de Janeiro no início do século XX. Rio de Janeiro: Biblioteca Carioca, 1992. , p.115). Tendo em vista a edificação de uma nação moderna, a população e os espaços físicos precisariam e deveriam ser saudáveis. Anseios esses que não eram acompanhados por ações efetivas e práticas por parte do Estado com relação às populações mais pobres. A higiene foi adentrando os lares, e, em seu nome, a medicina social passou a intervir nas relações familiares, na maneira de educar as crianças, nos hábitos sociais, no lazer.

As preocupações com as patologias mentais estavam presentes na agenda médica e política desde o Império: reivindicações dos médicos psiquiatras quanto à construção de hospícios; entendimento de que a loucura e os loucos necessitavam de um espaço, terapêutica e pessoal adequados em seus cuidados; autonomia no comando dos hospícios; exclusividade de sua especialidade no trato das enfermidades de ordem mentais ( Engel, 2001ENGEL, Magali. Delírios da razão: médicos, loucos e hospícios. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2001. ). Da mesma forma que com relação ao corpo, a prevenção era avistada como a maneira mais viável e lógica para atuar neste campo de intervenção – a mente. Por conseguinte, a psiquiatria foi ampliando seu raio de ação. Como asseverou o médico alagoano Arthur Ramos (1955RAMOS, Arthur. Saúde do espírito. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde/Serviço Nacional de Educação Sanitária, 1955. , p.7), a higiene mental seria uma parte da medicina do futuro, que “previne a doença, forma funcionários da saúde, em vez de médicos-funcionários da doença”. E, se a ideia primeira era prevenir, o ideal era que tal ação fosse realizada o quanto antes. Por esse entendimento, a criança e a infância passaram a ser escrutinadas.

Foi sobre a criança, essa categoria historicamente construída ( Ariès, 1986ARIÈS, Philippe. História social da criança e da infância. Tradução de Dora Flaksman. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. ), que estiveram voltados os trabalhos dos médicos higienistas, eugenistas, criminalistas e educadores brasileiros. Ainda que cada qual apresentasse abordagens ou ênfases distintas, todos concordavam que era com ela e na fase da infância que as ações em prol da higiene e do bom desenvolvimento do brasileiro adulto, ajustado à ordem e às normas sociais, deveriam começar. A criança se tornou também um membro destacado no seio familiar. A ela foram destinados atenção e cuidados específicos. A gestação, o nascimento, a saúde, a alimentação, o vestuário, o lazer, o comportamento, enfim, foram se tornando objetos de observação e intervenção: do médico, da educadora, da igreja, do Estado.

As famílias foram incluídas no mesmo raio de intervenção. As mães ganharam atenção especial, e uma cobrança maior foi depositada sobre elas, como ficou patente nos discursos da Clínica de Eufrenia e do Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental (SOHM). Com a ciência a assessorá-las, elas deveriam empregar seus ensinamentos na educação dos filhos. Ainda que o chamado fosse feito a todas as mães e famílias, havia um descompasso muito grande entre o acesso aos preceitos médicos-científicos e a ação, em decorrência das condições socioeconômicas dos indivíduos envolvidos.

Como afiançou Rizzini (2011RIZZINI, Irene. Salvar a criança. In: Rizzini, Irene. O século perdido: raízes históricas das políticas públicas para a infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 2011. p.83-119. , p.83), “nas primeiras décadas do século XX, a preocupação com a infância, como problema social, refletia a preocupação com o futuro do país”, e foi sob essa óptica que as atenções se voltaram para ela, priorizando os cuidados; sobretudo a proteção. Vale destacar que essa proteção, como ainda abonou a autora, não estava mais circunscrita ao viés caritativo/religioso, mas ao sentido laico. Mesmo que a intervenção e o esquadrinhamento sobre a infância, a criança e a família tenham sido mais bem delimitados no governo Vargas, não foram por ele instaurados. Fonseca ressaltou que já na Primeira República haviam surgido “as primeiras experiências visando à elaboração de uma legislação de proteção ao trabalho, bem como discussões sobre a atuação do Estado com relação às questões sociais” (Fonseca, 1993, p.98). O que ocorreu, ainda de acordo com essa autora, foi “uma mudança no caráter dado à política social, que vai sendo incorporada enquanto uma função de Estado, fortalecendo-se a ideia do Estado como principal agente implementador de políticas sociais” (p.98).

A política varguista estava interessada na compleição do novo brasileiro. Modelado dentro dos princípios do bom trabalhador, a educação foi sendo vista como o meio mais eficaz para alcançar aqueles objetivos. Ela continuava a ser pensada e projetada como instrumento por meio do qual se pudesse perpetrar uma transformação dos hábitos e comportamentos da população. Nesse contexto, a educação e a infância foram unificadas dentro de um projeto maior, no qual instituições paralelas foram sendo criadas.

Foi em meio a este contexto – de urbanização em expansão; de entrada do capital estrangeiro no Brasil; de ânsia pela inserção do país na modernidade; de emergência da eugenia, frente aos processos migratórios; da crise oligárquica nos anos 1920 que desencadeou a revolução de 1930 – que tanto a Clínica de Eufrenia quanto o SOHM foram fundados. Seus propósitos, a começar com suas criações, estavam atrelados aos anseios que gravitavam em torno da construção dessa nação forte, hígida, psiquicamente sã e trabalhadora.

As ações empreendidas tanto pela Clínica de Eufrenia quanto pelo SOHM elegeram a criança como a personagem central de suas atividades, a educação como um dos meios pelos quais se alcançariam tais metas, a psicanálise como uma das ferramentas teóricas para subsidiar os objetivos aventados, e a família como categoria coadjuvante indispensável. Dessa forma justificava-se todo um projeto que tinha “permissão” científica e social para intervir na vida das crianças, incluindo sua família e todos os seus hábitos e vivências extraescolares.

A Clínica de Eufrenia: a criança na agenda da Liga Brasileira de Higiene Mental

A Liga Brasileira de Higiene Mental (LBHM) foi uma instituição criada em 1923, pelo médico carioca Gustavo Riedel, que tinha como objetivo prevenir futuros desajustes de ordem mental. Suas metas eram de amplo alcance, deixando poucas esferas de fora: prevenção das doenças nervosas e mentais; proteção e amparo no meio social aos egressos dos manicômios e aos deficientes mentais passíveis de internação; melhoria progressiva nos meios de assistir e tratar os doentes nervosos e mentais em asilos públicos, particulares ou fora deles; e realização de um programa de higiene mental e de eugenética nos domínios das atividades individual, escolar, profissional e social (Arquivos..., 1925a, p.223-234).

A fundação da LBHM representou um esforço dos médicos, com destaque para os psiquiatras, em congregar em um espaço específico as discussões eugênicas e firmar um “programa de eugenia e higiene mental, que significaria então o ápice da penetração, no domínio da ação psiquiátrica, dos ideais de eugenia e do saneamento preventivo da população”, como destacou Reis (1994REIS, José Roberto. Higiene mental e eugenia: o projeto de “regeneração nacional” da Liga Brasileira de Higiene Mental (1920-1930). Dissertação (Mestrado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 1994. , p.43). Essa agremiação teve um papel bastante importante no estudo e divulgação das teses eugênicas no Brasil. Sua atuação foi bem significativa, tanto no plano concreto, com seus ambulatórios e serviços sociais, quanto no âmbito das ideias, com os debates, palestras, reuniões e publicações que realizou.

Umas das criações da LBHM foi a Clínica de Eufrenia, em 1931. Esta ficou sob a responsabilidade do médico Mirandolino Caldas, que foi seu diretor durante toda sua existência. A vida de Caldas é uma incógnita, uma vez que não encontramos registros biográficos ou mesmo outros materiais textuais do autor afora os publicados na revista oficial da LBHM, os Arquivos Brasileiros de Higiene Mental ; tampouco foram encontradas mais informações nos trabalhos já publicados relativos à Clínica. Analisar tanto a Clínica quanto o SOHM significa trabalhar com lacunas e visões unilaterais, considerando que as principais fontes documentais proveem de seus diretores. Outrossim, conhecê-los se torna parte da reflexão, no intuito de compreender suas linhas de pensamento, seus lugares de fala, seus engajamentos sociais e políticos para conseguir entender as motivações e os interesses com os trabalhos realizados. Tal conhecimento só foi possível com relação a Arthur Ramos, como será esclarecido mais à frente.

O intuito da LBHM era criar uma clínica psicológica para crianças, nos moldes das então existentes nos EUA e em alguns países da Europa. Com um plano adaptado ao meio brasileiro, propunha finalidades não apenas “corretivas ou de reajustamento psíquico, mas, também com objetivos construtivos, isto é, de aperfeiçoamento do psiquismo, através de uma atuação médico-pedagógica direta no período inicial do desenvolvimento mental infantil” (Caldas, 1932b, p.65). Para os médicos, as crianças eram a “cera mole e plástica” ( Porto-Carrero, 1929PORTO-CARRERO, Júlio. Educação sexual. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, n.3, p.120-133, 1929. , p.123) que possibilitava a intervenção de maneira mais eficaz na construção de seu psiquismo.

Os pré-escolares eram os alvos prioritários que no Brasil se apresentavam inacessíveis, tendo em vista a ausência e/ou dificuldade em encontrar espaços específicos destinados a eles. Destarte, alguns médicos, a exemplo de Henrique Roxo (1925)ROXO, Henrique. Higiene mental. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, n.2, p.1-9, 1925. , e educadores, caso de Anísio Teixeira (1933)TEIXEIRA, Anísio. O problema da assistência à infância e à criança pré-escolar. Boletim de Educação Pública, ano 3, n.7-8, p.5-20, 1933. , elegeram a escola e os escolares os meios pelos quais seria possível realizar a profilaxia mental. Nesse âmbito, ganharam destaque os intermediários de que falou Caldas – os médicos e educadores. A criança pré-escolar era uma preocupação da Clínica. Julgando que nem sempre as condições domésticas eram favoráveis à educação eufrênica que ansiavam, um serviço de hospitalização para essas crianças seria inaugurado por ela e a posteriori ampliado, quando as finanças da LBHM permitissem. O que, afinal, não veio a ser cumprido.

Tanto os médicos quanto os educadores entendiam a importância e centralidade da família, em especial dos pais, na educação das crianças conforme suas orientações. Entretanto, para eles havia a certeza de que era preciso instruí-los. As cartilhas confeccionadas por muitos médicos ( Martins, 2008MARTINS, Ana. “Vamos criar seu filho”: os médicos puericultores e a pedagogia materna no século XX. História, Ciência, Saúde – Manguinhos, v.15, n.1, p.135-154, 2008. ), as palestras ofertadas nas rádios ( Ramos, 1945RAMOS, Arthur. Curriculum Vitae: 1903-1945. Acervo Arthur Ramos (Universidade Federal de Alagoas). 1945. ) e os círculos de pais ( Ramos, 1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. ; Teixeira, 2007TEIXEIRA, Anísio. Educação para a democracia: introdução à administração educacional. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007. ), reuniões realizadas nas escolas, foram algumas das maneiras para preparar os pais na tarefa de educar, mais do que isso, de educar de maneira correta. Os médicos ensinavam os pais, e estes últimos ensinavam suas crianças, configurando um “governo em dois níveis”, como classificou Lima (2013LIMA, Ana. Recomendações médicas para a educação da criança-problema: um estudo de manuais de higiene mental, 1939-1947. História, Ciência, Saúde – Manguinhos, v.20, n.1, p.317-325, 2013. , p.321). O que fica evidente é que ao mesmo tempo que os médicos, as escolas, os educadores, a Clínica e o SOHM qualificavam a família como despreparada para educar, precisavam e, em alguns casos, dependiam dela para realizar seus trabalhos.

A Clínica de Eufrenia recebeu tal denominação porque, segundo Ernani Lopes, médico e também membro da LBHM, a expressão eufrenia era mais compreensiva e ampla, tendo em vista “não só os casos em que existem anomalias que devem ser corrigidas ou atenuadas, como todas e quaisquer crianças normais ou supernormais às quais a eufrenia se propõe a proporcionar o mais alto grau de eficiência e de validez mental” (Lopes, 1932, p.80). Dessa forma, buscava-se diferenciá-la das clínicas de hábitos, então, já disseminadas nos EUA. Henrique Roxo (1932ROXO, Henrique. Entrevista do professor Henrique Roxo ao O Globo em 01/11/1932. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, ano 5, n.2, p.88-89, 1932. , p.88) acrescentou que a expressão clínica de hábito não satisfazia de forma plena, uma vez que “os neuro-higienistas não procuram apenas remover os maus e incutir os bons hábitos, mas procuram, sobretudo, estudar a personalidade da criança, de modo a poderem traçar de maneira mais racional os preceitos de higiene mental que devem assegurar o bom funcionamento e o equilíbrio das funções neuropsíquicas”.

No princípio, a Clínica esteve sediada no bairro de São Cristóvão. A planta apresentava as seguintes instalações: varanda, cozinha, banheiro, refeitório, parque, dormitórios, laboratório de psicologia, serviço social, consultório e diretoria e biblioteca. Seu corpo de funcionários era formado por uma psicologista chefe (senhorita Maria Brasilia Leme Lopes), um psicobiologista (doutor Paulo Schirch), dois auxiliares acadêmicos (Herconides Martins e Braz Mazzillo) e duas visitadoras sociais (senhoritas Margarida Buhler e Zilda Lima). Havia ainda os consultores especializados em neurologia (doutor R.Mac-Dowel), helioterapia (doutor Massillon Saboia) e em dietoterapia (doutor Martinho da Rocha) e mais 14 patronos (Caldas, 1932b, p.67).

O intuito era atender crianças desde os primeiros meses até os 12 anos de idade. Intervir o quanto antes significava “auxiliar a própria formação do psiquismo” (Caldas, 1932b, p.66). Passada a idade ideal, de 0 a 6 anos, e estando a criança com seu psiquismo já formado, restava apenas orientá-la, mantendo-a em harmonia com o meio social, uma atribuição da higiene mental, e não mais da eufrenia. Por essa razão, o trabalho se estendia até os 12 anos. Caldas afirmava que, ao chegar à idade de 6 anos com uma boa e correta formação de caráter, a criança “venceria galhardamente o choque da puberdade e as crises da adolescência, e teria todas as possibilidades de se tornar um homem útil e equilibrado”. Utilidade e equilíbrio necessários para a construção e o desenvolvimento da pátria, mote que impulsionava os trabalhos e justificava a criação não só da clínica, como do SOHM.

O acompanhamento deveria, então, ser realizado o mais cedo possível, sendo essa a máxima do serviço prestado pela clínica. Nesse escopo, as lactantes seriam acompanhadas em seu desenvolvimento mental e neurológico, para que nenhum retardamento passasse desapercebido. Para Ramos (13 jul. 1939), antes mesmo do nascimento, quando, de fato, um trabalho de higiene mental era iniciado, a prevenção mental podia e devia ser realizada, o que incluía o período pré-natal e mesmo pré-concepcional.

A interferência da higiene na vida das pessoas foi ficando cada vez mais evidente e invasiva. Ela não mais se limitava à limpeza, tampouco era em termos de miasmas e drenagens que estavam circunscritas as preocupações dos higienistas, como afirmou Porter (2011PORTER, Roy. História do corpo. In: Burke, Peter (org.). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Unesp, 2011. p.297-334. , p.320). Ela se tornou um ideário, e as atenções destes últimos “não eram menores com respeito à sujeira moral e à regulamentação do contágio e da contaminação sexual” (p.320-321). Sua prática penetrou vários âmbitos da vida humana: a gestação – higiene da espécie; a infância – higiene infantil; a escola – higiene escolar; a profissão – higiene do trabalho; o indivíduo – higiene corporal; na moradia – higiene urbana e sanitária; as doenças – higiene profilática (Wanderbroock Jr., 2007, p.20).

As preocupações da LBHM em torno da criança e da infância surgiram antes da criação da Clínica de Eufrenia. Elas estiveram presentes em sua agenda desde a sua fundação, como ressaltou Reis (2000)REIS, José Roberto. De pequenino é que se torce o pepino: a infância nos programas eugênicos da liga Brasileira de Higiene Mental. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.7, n.1, p.135-157, 2000. . Em 1925, a instituição havia esboçado em seu serviço ambulatorial uma organização com o mesmo objetivo das clínicas de hábitos (Arquivos..., 1932, p.2) que realizou: a aplicação de testes psicológicos nas escolas públicas; a inclusão da criança, infância e família no plano traçado pelo doutor Faustino Esposel, em 1925, para um serviço ambulatorial de psiquiatria preventiva (Arquivos..., 1925b, p.149); a oferta, em 1929, do curso de higiene mental para enfermeiras, ministrado pelo doutor Ernani Lopes, com pontos destinados às temáticas acima elencadas (Arquivos..., 1932, p.116); além das conferências relacionadas ao tema proferidas por seus membros (Arquivos..., 1932, p.121). Portanto, desde o início de suas atividades, a agremiação destinou atenção à temática que seria continuada com a fundação da clínica.

Os interesses da higiene mental também insidiam sobre a extinção das eivas hereditárias (Caldas, 1932a, p.29). O objetivo era permitir que a mentalidade das novas gerações pudesse se aproximar do padrão psicológico ideal. Padrão esse que não chega a ser explicado nem o que consistiria o equilíbrio que Caldas e tantos outros estudiosos, a exemplo de Ramos, falavam e esperavam das mães e de suas crias. A eugenia era indispensável ao trabalho da eufrenia, uma vez que era a responsável pela extinção das imperfeições hereditárias. Mas a eufrenia não se bastava aí, uma vez que incluía os fatores mesológicos. Por essa razão, Caldas dividiu a eufrenia em (1) genealógica, que focalizava os problemas genéticos do psiquismo (neuroses e psicoses de fundo hereditário) e (2) médico-pedagógica, que julgava o ambiente circundante da criança fator de considerável influência. Aqui residiria a necessidade de um trabalho educativo, com a educação sendo apresentada como a via capaz para a “eufrenização das crianças, não somente estimulando as boas qualidades inatas, como atenuando as predisposições mórbidas hereditárias” (Caldas, 1932a, p.36). Um trabalho que passava a exigir das escolas e das professoras uma atuação mais enfática e meticulosa nos detalhes.

Não se pode perder de vista que essa divisão pensada e posta em prática por Caldas na Clínica tinha um interesse bem delimitado, que era a ampliação do campo de intervenção dos psiquiatras ( Reis, 2000REIS, José Roberto. De pequenino é que se torce o pepino: a infância nos programas eugênicos da liga Brasileira de Higiene Mental. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.7, n.1, p.135-157, 2000. ). Enquanto as clínicas de hábitos tinham como ponto focal a terapêutica dos transtornos mentais, a Clínica de Eufrenia ampliava o trabalho, englobando tanto a terapêutica quanto a prevenção, o que lhe distinguia das outras existentes e fundamentava a sua nomenclatura. O raio de ação da psiquiatria envolvia, desse modo, o lar e a escola, uma vez que tinha como princípio a eufrenia médico-pedagógica e também a criança mentalmente sã.

O trabalho prático na Clínica de Eufrenia: divisões e estudo de casos

O trabalho na Clínica de Eufrenia era dividido em três etapas que seguiam exatos três serviços técnicos: Serviço Social, Serviço Psicológico e Serviço Clínico. Essa era a ordem de execução. Havia duas fases de trabalho: uma de inquéritos e estudos, e outra de aplicações práticas. Quando a criança era matriculada no ambulatório, iniciava-se o processo com o neuro-higienista. Esse, por sua vez, encarregava o Serviço Social de realizar um inquérito “domiciliar ou escolar, objetivando colher os dados mais importantes não apenas da vida pregressa da criança como do ambiente doméstico em que esta vida (iria) desabrochar e evoluir” (Caldas, 1932b, p.69).

Com os dados provenientes do Serviço Social, sua ficha psicossocial era construída. Esse trabalho era realizado pelas enfermeiras que haviam realizado o curso de visitadora social da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto. Após a confecção da ficha, a criança era encaminhada para o Serviço de Psicologia, em cujo laboratório fazia alguns testes, como o de execução, o de atuação, o psicográfico da inteligência e o de pesquisa do desenvolvimento motor. Os testes ficavam sob a responsabilidade da psicologista chefe. O laboratório estava equipado com outros tipos de testes elencados por Caldas (1932b, p.69): exame da atenção concentrada, exame de atenção difusa, exame da atenção associada à aptidão motora, exame pelo raciocínio, exame da sugestibilidade e exame da afetividade.

Ao término desse processo, a criança era enviada ao consultório médico onde seria submetida a um exame médico minucioso. Nessa etapa, era realizada a pesquisa de seus antecedentes heredofamiliares, seu desenvolvimento somático e suas características psíquicas. Tudo isso configurava a primeira fase do trabalho do neuro-higienista que, munido de tais dados, estudaria a criança e o seu meio para saber quais problemas sociais pediam solução e como os solucionar. A segunda fase seria a mais “difícil e de maior responsabilidade: a de eufrenização ou de reajustamento psíquico” (Caldas, 1932b, p.69). Ficam perceptíveis o alcance do trabalho executado, seu planejamento, a gama de profissionais envolvidos, as etapas e a estrutura disponibilizada pela clínica. Um trabalho pormenorizado, para nada lhe escapar, o que permitia o atendimento de cerca de dez crianças, no intervalo de duas a três horas diárias ( Caldas, 1933CALDAS, Mirandolino. Clínica de Eufrenia. Os trabalhos do primeiro trimestre. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, ano 6, n.1, p.36-42, 1933. , p.37).

Como afirmado, a Clínica confeccionava uma ficha individual. Nela estavam incluídos os dados pessoais da criança, bem como dados referentes a seus exames somático e psíquico, acerca de sua habitação, meio doméstico, situação econômica da família, escolaridade, diversão, trabalho, hábitos, educação doméstica, disposições e tendências, e os relativos aos problemas sociais. Havia ainda os dados da família, com ênfase sobre os pais e em menor escala, porém não menos importante, dos irmãos ou de outros parentes (Caldas, 1932b, p.70-76). O perfil da ficha elaborada pela Clínica era bem correlato ao modelo utilizado pelo SOHM. Com relação a este último, houve uma influência bastante significativa do questionário apresentado pelo psicólogo austríaco Alfred Adler em seu livro A psicologia individual e a escola , que Ramos replicou em sua obra Educação e psicanálise ( Tamano, 2018TAMANO, Luana. “Manter normal a criança normal e normalizar a desajustada”: Arthur Ramos e o Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental, 1934-1939. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. , p.252-254).

Assim como na ficha utilizada pelo SOHM, na da Clínica de Eufrenia havia perguntas específicas aos pais. No entanto, pelas informações que acabaram sendo fornecidas pelos diretores nas análises das fichas, percebe-se que várias outras informações eram colhidas pelas visitadoras para além das questões pontuais. Em ambas as instituições havia um espaço reservado para observações complementares, que podiam ser detalhes apreendidos pelas visitadoras ou depoimentos suplementares dos pais.

Dos trabalhos efetivados pela Clínica, Caldas levou a público cinco casos em três artigos distintos: o primeiro foi o de um menino de 13 anos levado por sua mãe em decorrência de sua mudez; o segundo se referia a uma menina de 10 anos, conduzida pela mãe para tratar seus espasmos faciais e a onicofagia; o terceiro foi F., um menino de 7 anos, encaminhado aos cuidados da Clínica por ser irritável e desobediente; e, por fim, o quarto e o quinto diziam respeito a um casal de irmãos levados pela mãe com fim preventivo. Os casos não apresentam as fichas de cada criança, o que impede um conhecimento maior sobre elas: dados pessoais, condição social e econômica, ambiente em que viviam. Um problema recorrente ao analisar os casos apresentados por Caldas é que eles são pouco trabalhados pelo autor. São apresentados, destacando-se as etapas do trabalho realizado, mas o autor pouco desenvolve os quadros clínicos, os diagnósticos e as terapêuticas.

A Clínica destinava-se primeiramente à prevenção, o que tornava a criança na fase da primeira infância sua cliente preferencial, pois ainda seria possível eufrenizá-la. Diferente dos casos anteriores, os dois últimos estavam voltados para a prevenção. Tratava-se da primeira consulta com esse fim. Pré-escolares, A., menino de 3 anos, e E., menina de 2 anos, foram levados à clínica por sua mãe. Em todos os casos apresentados por Caldas, ele citou as mães como as responsáveis pelo encaminhamento das crianças à clínica. Mais do que mera informação, referenciá-las significava registrar seu comprometimento com os filhos e o futuro da nação. Ademais, assim procedendo elas estariam valorizando o trabalho realizado, a instauração da Clínica recém-fundada, a higiene mental e a eufrenia.

A mãe das crianças A. e E. era um exemplo positivo da julgada correta maternidade, pois, ciente de sua condição genética – ela epiléptica, com casos de alienação mental na família –, antecipou a manifestação de qualquer enfermidade, haja vista seus filhos não serem doentes. Essa senhora demonstrava, na visão de Caldas, compreender o valor da medicina preventiva. Aparentemente, as crianças eram, de fato, sadias. Condição comprovada pelos exames realizados. Contudo, a Clínica não se destinava ao que era aparente ou imediato. Destarte, entendia como necessário o prosseguimento de suas investigações, visando a uma maior e melhor compreensão da personalidade das crianças.

Com as investigações realizadas, foi possível pensar as orientações que deveriam ser ofertadas aos pais. Elas estariam voltadas para a profilaxia em dois eixos: heredológico e problema médico-educacional. O primeiro passo seria a aplicação de um questionário aos genitores com o fim de estudar a herança genética. Já o aspecto médico-educacional dependeria mais dos pais, ao conhecer e observar os preceitos de higiene mental que a Clínica indicaria. Para a Clínica, ainda que as crianças se apresentassem bem nutridas e com evolução neurológica regular, elas expunham algumas reações nervosas anômalas e alguns maus hábitos. Era preciso, então, extirpá-los. Assumindo o compromisso de seguir as prescrições para o tratamento da agressão do menino e para a incontinência urinária da menina, bem como o de levá-las quinzenalmente à Clínica, os pais conseguiram incutir em seus filhos novos hábitos. A Clínica se dava por satisfeita, ou por ora satisfeita.

Com a mudança de sua localização física, o trabalho desenvolvido pela Clínica sofreu alguns desgastes. Além de pleitear a sede da Clínica, a prefeitura cortou a subvenção financeira já aprovada. Caldas acusou a prefeitura de exigir resultados instantâneos, criticando-a pela falta de apoio. A falta de compreensão por parte da prefeitura era, consoante Reis (1994REIS, José Roberto. Higiene mental e eugenia: o projeto de “regeneração nacional” da Liga Brasileira de Higiene Mental (1920-1930). Dissertação (Mestrado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 1994. , p.249), “apenas o ponto mais visível de um distanciamento que se anunciava entre a atual orientação médico-social da prefeitura e a Liga”. Esse autor chamou a atenção para o fato de esse distanciamento não representar uma ruptura da primeira com a higiene mental. Refletia, antes, a “oficialização de certos serviços afetos a esta área” ( Reis, 1994REIS, José Roberto. Higiene mental e eugenia: o projeto de “regeneração nacional” da Liga Brasileira de Higiene Mental (1920-1930). Dissertação (Mestrado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 1994. , p.249), caso do SOHM, que estava, tal como a Clínica de Eufrenia, voltado para a prevenção de desajustes mentais nas crianças.

Não é irrelevante o fato de Pedro Ernesto ser o prefeito do Rio de Janeiro na época e estar, no âmbito educacional, alinhado ao pensamento e às propostas educativas pensadas por Anísio Teixeira, por ele convidado para a diretoria da Instrução Pública da cidade. Pedro Ernesto realizou obras em prol da saúde pública, como a construção de hospital, prestou assistência à mulher gestante e à infância, além de ter criado, em 1935, a Secretaria Geral de Saúde e Assistência. Sua linha de trabalho e a verba restrita podem sinalizar a falta de interesse da prefeitura em auxiliar a LBHM. Com a reforma anisiana, uma seção destinada a higiene mental e ortofrenia das crianças foi criada – o SOHM –, que acabou sendo um projeto mais interessante para se financiar e apoiar do que o serviço prestado pela Clínica.

O SOHM possuía perfil de análise ambientalista, ainda que tenha mantido o orgânico como relevante em seu trabalho com as crianças. Arthur Ramos, à semelhança de Teixeira, não enfatizava o caráter hereditário tal como a LBHM, criticando o uso abusivo do conceito por parte de médicos e educadores. Na crítica ao fator hereditário, não deixou de abordar a higiene racial. Com interesse pelos estudos culturalistas, Ramos entendia que a análise do comportamento humano deveria estar pautada em termos de cultura, e não de raça.

O Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental: crianças normalizadas, adultos ajustados

No planejamento de sua gestão, iniciada em 1931, Anísio Teixeira criou alguns órgãos regulares para uma melhor administração do setor educacional, que, segundo ele, não estava aparelhado de maneira devida. Faltavam-lhe divisões de matrículas e frequências escolares, programas escolares, promoção e classificação de alunos, prédios e aparelhamentos escolares, além de inspeções especializadas de ensino (Teixeira, 2007, p.129-130). Cada uma das novas seções criadas possuía subdivisões, com direções e funções específicas. O SOHM estava incluído no Instituto de Pesquisas Educacionais e sob a direção de Arthur Ramos.

Médico, formado pela Faculdade de Medicina da Bahia, Ramos já tinha alguns trabalhos publicados acerca da psicanálise e estudos voltados para a antropologia quando recebeu o convite de Teixeira para chefiar o SOHM. Polígrafo, incursionou por diversas áreas do conhecimento, vindo a publicar livros e artigos sobre folclore, psicanálise, cultura negra, antropologia, educação, higiene mental. Apresentando-se e sendo apresentado como antropólogo, acabou tendo “um grande papel histórico na construção das Ciências Sociais no Brasil” ( Campos, 2002CAMPOS, Maria José. Arthur Ramos: luz e sombra na antropologia brasileira. Uma versão da democracia racial no Brasil nas décadas de 1930 e 1940. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002. , p.23), vindo a se empenhar na consolidação da antropologia como ciência e no incentivo e desenvolvimento da pesquisa científica. A psicologia educacional foi outra seara na qual o diretor do SOHM atuou, exercendo papel importante na área, colaborando para divulgar a psicanálise no campo educacional ( Lima, 2006LIMA, Ana. A “criança-problema” e o governo da família. Revista Estilos da Clínica, v.11, n.21, p.126-149, 2006. ).

No âmbito da psicanálise de crianças no Brasil, foi um de seus precursores, ao lado dos médicos Hossanah de Oliveira, Porto-Carrero, Deodato de Moraes e Gastão Pereira da Silva, que utilizavam os textos, os conceitos e as análises de Freud mais no plano teórico do que prático, considerando a clínica ( Abrão, 2008ABRÃO, Jorge. A introdução das ideias relativas à psicanálise de crianças no Brasil através da obra de Arthur Ramos. Memorandum, n.14, p.37-51, 2008. , p.38). A realização de análises psicanalíticas de crianças requeria profissionais com habilidades de condução, que, no caso, eram muito poucos no país, quase inexistentes. Esse fato pode evidenciar o motivo pelo qual as ações voltadas para a educação da criança no lar e na escola, por meio de aconselhamentos psicanaliticamente direcionados, eram mais utilizadas e conduzidas a exemplo de Ramos junto ao SOHM.

O médico alagoano aportava no Rio de Janeiro com a possibilidade de colocar em prática suas concepções acerca da psicanálise, que fundamentavam suas posições a respeito da educação, além da antropologia e da sociologia. Sua presença foi notada em toda a extensão do SOHM: na metodologia, nas abordagens e nos fundamentos teóricos. Todavia, cremos que sua idealização tenha partido de Teixeira, o que não anula a participação de Ramos na elaboração de suas diretrizes e planejamento.

O SOHM atuou nas escolas experimentais que, em um total de cinco (Argentina, Bárbara Otoni, Estados Unidos, Manuel Bomfim e México) serviram de campo de ação para as demais seções do Departamento de Educação, com o acréscimo de uma escola pré-escolar, no caso do serviço, a General Trompowski. Outras tarefas executadas pelo SOHM foram os cursos ofertados às professoras; a instalação das clínicas de hábito e as ortofrênicas nas escolas; a realização dos círculos de pais, dos exames médicos e das conferências públicas, incluindo as executadas em parceria com a rádio PRD-5, uma das seções da reforma. Da mesma maneira se fez presente no lar com as visitas domiciliares.

O que justificava a fundação de um serviço como o SOHM era a prevenção. Porém, havia os casos em que a criança já chegava à escola apresentando problemas, fossem de cunho orgânico, disciplinar ou comportamental. Sua função também consistia em atuar junto a elas, por esse motivo a ortofrenia: torná-las “normais”, o que evidencia seu propósito normalizador.

Para que as atividades pensadas e propostas pudessem ser efetivadas era essencial uma equipe formada por médicos, uma vez que os exames clínicos eram indispensáveis, e pelas visitadoras sociais, possivelmente educadoras, e não enfermeiras. Pelo fato de os trabalhos serem realizados nas escolas experimentais, os funcionários de maneira geral, com maior enfoque sobre as professoras e diretoras, também compuseram a equipe técnica do SOHM. É muito provável que Ramos tenha contado com algum apoio de secretariado, e, a menos que as visitadoras também datilografassem as fichas, uma datilógrafa ou mais.

As professoras e visitadoras passavam por cursos e treinamentos. Os cursos de caracterologia e de higiene mental, ministrados por Ramos, eram obrigatórios, e suas chamadas eram anunciadas no jornal (O Jornal, 5 jul. 1934, p.20). Se os detalhes eram importantes com relação à família do alunado, a mesma atenção era dada às professoras. Ramos defendia a necessidade de as docentes terem noções de psicanálise, seus fundamentos elementares, para que não se tornassem professoras-problema. Dessa forma, existiam as crianças, as professoras e os pais-problema. Os dois últimos assim se tornavam ao deflagrar sobre aquelas suas frustrações de vida. Por isso, o conhecimento psicanalítico era necessário, julgando que, com ele, pais e mestres resolveriam suas problemáticas psíquicas e não derramariam seus problemas sobre seus filhos e alunos. Ainda alicerçado em uma leitura psicanalítica, Ramos depositou sobre a docente a função do modelo a imitar e chamou a atenção para a transferência afetiva que deveria ser buscada pela educadora na escola.

As visitadoras eram a extensão do SOHM e da escola no lar. Era um olhar atento às diretrizes propostas por Ramos, sobretudo, um olhar treinado. Suas atribuições também foram exercidas pelas enfermeiras visitadoras da Clínica de Eufrenia: “inquérito domiciliar ou escolar, de modo a colher os dados mais importantes da vida pregressa da criança, por vezes ainda em tenra idade, mas, sobretudo do ambiente doméstico em que esta vida vai desabrochar e evoluir” (Caldas, 1932b, p.69). Os pontos de observações eram os mesmos, mas a ênfase e o modo de operar guardavam suas distinções.

O trabalho era realizado em duas etapas: por meio do exame clínico, primeira fase em que tudo começava; e pela análise e intervenção do meio ambiente em que vivia a criança. Ramos questionou o uso da classificação “anormal” então utilizada para alocar as crianças que apresentavam problemas de aprendizagem, disciplina e comportamento na escola. Para ele, a denominação “anormal” deveria ser usada apenas para os casos em que houvesse “defeitos constitucionais hereditários, ou de causas várias que lhes produzissem um desequilíbrio das funções neuropsíquicas” (Ramos, 1959, p.13). Por essa razão, os exames médicos eram realizados nas clínicas de hábitos instaladas nas escolas experimentais. Isso explica a existência de um corpo médico próprio do SOHM, composto por dois médicos e uma médica – Cláudio Mesquita de Azevedo, José de Paula Chaves e Stefânia Soares ( Ramos, 1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. , p.26).

Após o exame médico-orgânico viriam o diagnóstico e o tratamento, tudo sendo realizado pelas clínicas ortofrênicas do SOHM. Se não houvesse problemas de natureza orgânica, seria o caso de uma criança-problema. Estas eram as indisciplinadas, as que apresentavam mau comportamento, as que tinham rendimento escolar baixo. Eram aquelas consideradas “difíceis, insubordinadas, desobedientes, instáveis, mentirosas” ( Ramos, 1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. , p.18). Problemas que tinham como causas o desajustamento dos ambientes social e familiar. Sua indisciplina, mal desempenho escolar, seu comportamento arredio seriam respostas a tais desajustamentos. Portanto, não seriam reações constitucionais.

Concordando com Anísio Teixeira, o diretor do SOHM considerava os conceitos de normal e anormal relativos em muitos fatores e situações complexas, acrescentando que os “higienistas mentais das escolas deveriam fugir às classificações rígidas, que visam dar rótulos às crianças desajustadas” ( Ramos, 1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. , p.19). Para Ramos, as crianças-problema deveriam estar imersas nas condições naturais de vida e experiência, logo, elas não deveriam ser segregadas em escolas específicas. Quando muito, e por tempo determinado, poderiam ser alocadas em classes especiais, desde que não fossem feitas mudanças em sua organização como as, então, realizadas para os anormais ou oligofrênicos (p.394). Elas deveriam ficar nessas classes até que fosse possível sua reintegração às classes normais. A transitoriedade respondia à necessidade de não incutir na criança um complexo de inferioridade com relação às outras. Juntar todas em uma mesma classe tinha como objetivo o ajustamento das crianças-problema às condições então vividas por todos os colegas (p.383).

Em se tratando de crianças-problema, o ambiente familiar passaria a ser examinado. A investigação sobre a família vinha da certeza de que não importava apenas observar as crianças, mas também desenvolver o que Foucault (1999FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. São Paulo: Vozes, 1999. , p.234) chamou de “margem de controle lateral”, ou seja, incluir aqueles que a cercavam. No trato com as crianças-problema, o SOHM atuaria onde a família havia falhado. O contato era estabelecido de duas maneiras: nas visitas domiciliares, realizadas pelas visitadoras sociais, e nas reuniões nas próprias escolas, quando os pais eram chamados.

Um dos principais instrumentos de trabalho do SOHM foi a ficha ortofrênica, caracterizada por ser individual, com perguntas precisas e composta por subdivisões. O Arquivo Arthur Ramos, pertencente à Biblioteca Nacional (BN), lotado na Divisão de Manuscritos, é o principal, se não o único, depositário de materiais relativos ao SOHM. Parte do arquivo pertencia ao próprio Ramos e foi vendido à BN por sua viúva, Luiza Ramos, em 1956. Outra parte do acervo do Arquivo Arthur Ramos foi vendida pela Universidade do Brasil no mesmo ano ( Faillace, 2004FAILLACE, Vera Lúcia Miranda (org.). Arquivo Arthur Ramos: inventário analítico. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2004. ).

As fichas não são os únicos materiais referentes ao SOHM presente no acervo que conta também com artigos publicados, atividades escritas pelas crianças, quadro dos cursos ofertados para as professoras, questionários respondidos pelas docentes e diretoras das escolas experimentais, notas de jornais, diário de uma das alunas, entre outros. Se não fosse a guarda de Ramos, menos se saberia acerca do SOHM.

Na execução das visitas, as visitadoras levavam consigo um questionário semiestruturado elaborado por Ramos. No entanto, suas impressões a respeito das relações familiares e do aspecto ambiental, incluindo a vizinhança, eram elementos componentes das futuras fichas. Dos dados pessoais, passando pela estrutura física da casa, pela alimentação, pelos momentos de lazer, pela dormida, enfim, havia um perscrutar detalhista da vida daqueles escolares. Com essa amplitude, fica perceptível como a presença do SOHM era intensa e extensa na vida de toda a família. Mas há que destacar que algumas de suas ações eram positivas, a exemplo das críticas aos castigos físicos aplicados pelos familiares nas crianças e as recomendações contrárias ao excesso de trabalho a que muitas delas eram submetidas, por exemplo.

Analisando o ambiente doméstico, Ramos esperava encontrar os indícios que levassem aos problemas apresentados pelos alunos na escola. Nesse ponto, adentrava uma gama imensa de possíveis causas: herança e ambiente, afetividade, relações familiares, sexualidade, medos e angústias, mentiras e furtos. No que dizia respeito à afetividade, havia uma dosagem. Se em excesso, era um problema, pois geraria o que ele denominou crianças mimadas que perdiam a noção de comunidade e se tornavam indivíduos egoístas e agarrados aos pais. Se de menos, outro problema, haja vista a geração de crianças escorraçadas que respondiam com a violência e a criminalidade.

Ainda que hoje se possa ler o termo criança-problema como problemático, uma vez que ele acabou ampliando o espectro da irregularidade, como bem afirmou Lima (2006LIMA, Ana. A “criança-problema” e o governo da família. Revista Estilos da Clínica, v.11, n.21, p.126-149, 2006. , p.134), não se pode ignorar sua importância na época. Não se tratou de uma mudança terminológica, mas de expectativas de vida. A proposta e ação de Ramos foi investigar a vida das crianças numa acepção macrossociológica. Outros componentes, como os socioeconômicos e os fatores ambiental, doméstico, cultural e emocional passaram a ter relevância e centralidade no estudo e (re)ordenamento das crianças-problema para o SOHM em detrimento da herança e biologia.

O trabalho prático do Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental: o caso de J.D.

Ramos (1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. , p.14) asseverou que nos cinco anos de existência do SOHM, duas mil crianças foram observadas “em profundidade”. Em teoria, cada aluno das escolas experimentais possuía uma ficha individual. Todavia, não se sabe o fim destinado a esses documentos, com exceção daqueles que estão no Arquivo Arthur Ramos. Ele utilizou algumas das fichas para compor sua obra A criança problema , que sintetizou os trabalhos desenvolvidos no e pelo SOHM, vindo a ser publicada em 1939, mesmo ano da extinção do serviço. Esse livro é uma das principais fontes para o conhecimento não apenas do trabalho desenvolvido, mas também das teorias e perspectivas de Ramos que foram empregadas na Seção.

J.D. foi um dos meninos atendidos pelo SOHM e que teve seu caso explicitado em A criança problema . Tinha 10 anos e estava matriculado na Escola General Trompowski. Ao final de algumas fichas havia um campo intitulado Orientação Ortofrênica, que era da competência de Ramos, no qual o diretor apresentava o diagnóstico e a terapêutica. As fichas variam muito em extensão e conteúdo, com algumas bem completas e outras praticamente sem informação, de forma que nem todas elas possuíam o campo citado preenchido. No caso de J.D., Ramos o classificou como uma criança turbulenta, sobre a qual “se formou uma série de condições desfavoráveis, péssimas condições de ambiente familiar, pauperismo, doença orgânica, além de uma verdadeira ‘conspiração sádica’ dos adultos, desabada sobre ele” (Ramos, 1959, p.205-206).

A turbulência era o problema, e uma de suas causas era o escorraçamento da criança por parte da família, com a presença de brigas familiares, agressões físicas e verbais, ausência de afeto e cuidados com a criança. Na casa de J.D., segundo sua ficha, toda essa lista era uma realidade, com a hostilidade do pai e irmãos, que lhe batiam, com o alcoolismo paterno e, por vezes, o abandono de casa. A pobreza era outro agravante, porém, o que se destaca na ficha é a instabilidade familiar em suas relações pessoais. A agressividade da criança para com os outros era a mesma que sofria por parte do pai. O menino ingeria álcool, fugia da escola, era indisciplinado e tinha péssimo comportamento na escola. Uma criança-problema que, além dos ajustes necessários em seu ambiente doméstico e nas relações familiares, precisaria passar por um tratamento antiluético intensivo e de calcioterapia, além de uma assistência alimentar.

J.D. praticava pederastia, com ganho monetário, o que preocupava a família e o SOHM. A sexualidade compunha um dos campos a ser estudado, porém, não presente em todas as fichas. Nesse aspecto, Ramos se ressentia do tabu que girava em torno do tema, da negação da existência da sexualidade na infância, da incompreensão dos pais e suas atitudes de repressão desmedida, e da dificuldade em obter dados sobre a vida sexual da criança. Para o diretor, a primeira preocupação do SOHM e das escolas deveria estar voltada para as orientações aos pais: de como se comportar na observação e censura relativas à sexualidade de seus filhos. Psicanaliticamente considerou haver no menino uma fixação anal que era revelada não apenas pelas perversões sodômicas, mas também nos traços de caráter que estariam ligados ao fator anal-erótico, conforme Freud. Em torno da fixação anal do menino se formaram complexos decorrentes do seu ambiente familiar, desajustado e hostil.

Dentre as orientações ortofrênicas dedicadas ao menino havia uma que postulava uma “instrução sexual adequada”, ou seja, educá-lo para que seus atos de pederastia desaparecessem. Um reordenamento. Não era uma cura, pois não se tratava de uma doença, mas de um desvio, como destacava Ramos. Outro caminho que o conduziria a uma vida sexual normal, logo heterossexual, seria o fim das agressões que recebia em casa e uma reordenação das relações afetivas familiares. Da orientação que é destinada a ele, sublinham-se problemas de cunho orgânico que deveriam ser sanados, e psicológicos, voltados para a canalização de sua agressividade. Nesse ponto, deveria ser aproveitada a transferência afetiva com a professora de jogos, incluindo atividades que o ajudassem a transformar toda sua agressividade em algo positivo, sublimando-a.

Ramos punha em relevo que, caso as prescrições não fossem atendidas, seria aconselhável a retirada do menino para um internato. A ficha é datada em 1937 ( Ficha n.3, 1937FICHA N.3, J.D., Escola General Trompowski. (Arquivo Arthur Ramos, Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro). 1937. ) e finda nesse mesmo ano. A publicação do livro é de 1939. Neste, seu autor afirma que não foi possível modificar o ambiente, o que fez com que o SOHM “apelasse para uma última solução: a retirada da criança do ambiente familiar, e a sua observação e tratamento em um internato, dentro da orientação do Serviço” ( Ramos, 1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. , p.206). O SOHM encaminhou ao superintendente de Educação Secundária Geral e Técnica, em 1938, um pedido para a internação de J.D. no Instituto Ferreira Viana. Os motivos apresentados eram “de ordem médico-psicológica”, e, como a criança era “inadaptável” ao sistema de externato, “em virtude de péssimas condições de ambiente familiar”, solicitava o internamento, mediante a necessidade de observá-la por mais tempo, dentro das prescrições do SOHM. O pedido foi negado por falta de vaga. Por fim, em agosto de 1938, o despacho final foi dado pelo secretário geral: “não havendo vagas não pode ser atendido” ( Ramos, 1959RAMOS, Arthur. A criança problema: a higiene mental na escola primária. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1959. , p.206). Finda dessa maneira o capítulo de A criança problema e as considerações de Ramos sobre J.D.

O SOHM foi um serviço cujo perfil de trabalho estava alicerçado sobre a normatização, reajustando as crianças consideradas problemas. Era responsável por trabalhar com os chamados resíduos, na condição do aluno inassimilável ( Foucault, 2006FOUCAULT, Michel. O poder psiquiátrico: curso dado no Collège de France (1973-1974). Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2006. , p.67). A atuação dessa seção foi bastante intervencionista, buscando moldar a criança e, por extensão, sua família. Entretanto, é preciso chamar a atenção para dois pontos. Primeiro, nem todas as medidas praticadas pelo serviço foram negativas, pois algumas foram bastante importantes, como os aconselhamentos contrários ao abuso do álcool pelos genitores ou acerca do trabalho exercido pela criança. Afora o acesso a médicos e tratamentos, considerando principalmente as famílias de baixa renda, cujo acesso à saúde era precário.

Segundo, seu público-alvo não foi passivo às ordens recebidas. Isso significa dizer que muitas famílias aceitaram as visitações domiciliares, executaram as orientações prestadas, medicaram conforme a solicitação dos médicos, realizaram os exames prescritos, participaram dos Círculos de Pais, pediram o atendimento do SOHM. O aceite adveio de decisões tomadas por elas, e não, necessária e absolutamente, como uma resposta automática imposta. Ao reconhecerem as benesses que o SOHM ofertava e ao solicitá-las, as famílias estavam realizando uma escolha, aceitando-as. Assim, estavam atuando nessa relação entre escola, SOHM e lar, mesmo que essa relação se mostrasse de maneira assimétrica em vários momentos.

Considerações finais

Em meio a um contexto marcado por grande ebulição política, econômica, cultural e social, as instituições aqui estudadas atuaram visando como meta principal à construção de um brasileiro sadio, física e mentalmente, tendo como ponto de partida a criança. A crise no sistema oligárquico ficou em maior evidência nos anos 1920, conjuntamente com uma decepção mais acentuada com a República e suas promessas não realizadas. Aqueles anos foram de mudanças, como asseverou Lahuerta (1997LAHUERTA, Milton. Os intelectuais e os anos 20: moderno, modernista, modernização. In: Lorenzo, Helena; Costa, Wilma (org.). A década de 1920 e as origens do Brasil moderno. São Paulo: Unesp, 1997. p.93-114. , p.93), “na história política e cultural brasileira, por inaugurarem a gênese do Brasil Moderno, com a introdução de procedimentos, hábitos, ângulos de visão, diagnósticos que orientaram e mobilizaram várias gerações”. Com Vargas, o ideal de um Brasil moderno se tornava programa de governo, envolto por um nacionalismo e a valorização do trabalho e do trabalhador.

O trabalho da Clínica de Eufrenia envolvia um processo que incluía a observação, os exames clínicos, a realização de testes, a análise, o diagnóstico e a terapêutica. Trâmite bastante similar ao que ocorria no SOHM. Contudo, não se pode afirmar que tais etapas foram realizadas da mesma maneira, tendo em vista a falta de documentação relativa à Clínica de Eufrenia. Em ambas as seções, persistiu uma fala ancorada na busca pelo equilíbrio, pela dosagem certa, pela formação psíquica correta, sem apontar o que seriam essas premissas, de fato. As orientações ofertadas aos pais, com uma infinidade de preceitos a ser seguidos, lhes exigiam uma atenção exclusiva aos seus rebentos e um conhecimento amplo das diretrizes que as instituições julgavam necessárias na criação de uma criança. Uma ação impossível de ser praticada, principalmente para as famílias pobres. Mães solos que precisavam trabalhar fora de casa, em jornadas duplas, e pais que não podiam estar presentes integralmente em reuniões familiares, como nas refeições, foram aspectos de atenção do SOHM.

Nas fichas do SOHM, no campo referente aos pais, há perguntas relativas às atividades laborais exercidas por eles. Num escopo de 134 fichas analisadas, 96,75% das mães trabalhavam dentro e/ou fora de casa, desempenhando variadas funções, das quais as ligadas às atividades domésticas eram as mais frequentes. Havia, ainda, aquelas que precisaram começar a trabalhar fora de casa em decorrência da ausência do marido, por morte, doença ou abandono ( Tamano, 2018TAMANO, Luana. “Manter normal a criança normal e normalizar a desajustada”: Arthur Ramos e o Serviço de Ortofrenia e Higiene Mental, 1934-1939. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. , p.285-286). Do mesmo total de fichas estudadas, 92,62% dos pais trabalhavam. Com os pais ausentes pela necessidade de trabalhar para o sustento familiar, muitas crianças ficavam com parentes ou mesmo sozinhas em casa. Portanto, o perfil da família presente inteiramente na vida da criança, com seus cuidados e educação, não era a realidade de boa parte delas.

Alguns pontos de trabalho e anseios comuns são perceptíveis tanto na Clínica de Eufrenia quanto no SOHM, afora a atenção dada à criança. Ambas tinham um perfil intervencionista e detalhista; pensavam a criança como o adulto ajustado de amanhã; tinham como meta a produção, o trabalho e o progresso da nação; trabalhavam com visitadoras sociais; e creditavam à família papel importante na condução das crianças rumo à meta estabelecida. Partilhavam ideais comuns no seu tempo de fundação (uso da psicanálise, trabalho educativo, análise dos casos), com distinções na maneira de atuar (a Clínica em sua sede, o SOHM nas escolas) e na formação de suas equipes de trabalho (visitadoras enfermeiras na Clínica, educadoras no SOHM).

No perscrutar da vida, adentrando os aspectos mais íntimos e retendo as informações na escrita advindas do olhar treinado das visitadoras, as crianças, seus familiares, a vizinhança, e mesmo os inquilinos de suas casas, caso dos aluguéis de cômodos, eram investigados tendo como meta a máxima lei da higiene mental de manter a criança normal e ajustar a desajustada.

Com as reflexões aqui expostas, fica perceptível como a raça e a eugenia tinham relevância para pensar o brasileiro que se queria como peça central na engrenagem de um Brasil moderno. Pelas publicações dos Arquivos Brasileiros de Higiene Mental é possível entender a história, a linha de trabalho e as concepções da LBHM com relação às temáticas elencadas. Como já afirmado, há uma limitação referente à documentação e aos trabalhos relativos à Clínica de Eufrenia, e, por ela ter sido criação da LBHM, tomamos esta última como parâmetro para pensar a primeira. Entretanto, essa relação não é forçada, tendo em vista o fato de os escritos de Caldas reafirmarem os posicionamentos da LBHM. Assim sendo, a raça era pensada na Clínica de maneira determinista; e a eugenia era lida e tinha sua prática justificada na busca pelo o aperfeiçoamento moral, físico e mental da espécie humana, como destacava Gustavo Riedel (citado em Reis, 1994REIS, José Roberto. Higiene mental e eugenia: o projeto de “regeneração nacional” da Liga Brasileira de Higiene Mental (1920-1930). Dissertação (Mestrado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 1994. , p.54).

Com um ideal nacionalista e regeneracionista, como destacou Reis (1994REIS, José Roberto. Higiene mental e eugenia: o projeto de “regeneração nacional” da Liga Brasileira de Higiene Mental (1920-1930). Dissertação (Mestrado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 1994. , p.56), a LBHM mantinha um programa de atuação vasto e tentacular que envolvia temas centrais à raça, como o combate ao álcool, a seleção do imigrante, o controle dos matrimônios, a obrigatoriedade do exame pré-nupcial etc. Nesse escopo, a criança não poderia estar ausente de seu raio de ação. A Clínica de Eufrenia foi fundada com vistas a cuidar da infância em seus aspectos físico, moral e psíquico, a fim de contribuir com os ensejos de um adulto saudável, forte, mentalmente são e consciente de seus deveres com a pátria, o que envolvia a negativa ao uso dos tóxicos, a ciência de que deveria procurar um(a) parceiro(a) eugenicamente correto, os deveres da maternidade e paternidade, e mesmo a não procriação quando conscientes de sua imperfeição biológica/genética.

As mesmas categorias – raça e eugenia – eram vistas de maneira distinta pelo SOHM. A raça não detinha poder absoluto sobre o futuro do indivíduo, não sendo, pois, fatalista. A perspectiva de Ramos com relação àquela não a isolava do ambiente, das condições socioeconômicas, da cultura. Ele não foi um eugenista. Foi um higienista que leu a eugenia mais próxima da concepção higiênica/educacional/sanitária, não aceitando os postulados invasivos propostos pela vertente mais radical. Para ele, o país não precisava de cruzamentos eugênicos, apenas melhorar o que se tinha, eliminando “os deficits ambientais de toda natureza”. Ele compreendia que os males que se creditavam à raça provinham, na verdade, “de condições higiênicas deficitárias: subalimentação, pauperismo, doenças, alcoolismo” ( Ramos, 1955RAMOS, Arthur. Saúde do espírito. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde/Serviço Nacional de Educação Sanitária, 1955. , p.30). Era sobre esse viés que entendia a solução para os problemas nacionais.

As análises das duas instituições aqui trabalhadas evidenciam, com relação a raça e eugenia, e sua relação intrínseca com a infância e a criança, como as instituições foram pensadas e utilizadas de maneiras distintas no mesmo contexto. Isso, por seu lado, demonstra também que a ideia de uma apreensão homogênea com relação à eugenia não se fez presente em solo nacional. Contribui, ainda, para o estudo da eugenia no Brasil sustentando que ela não ocorreu (apenas) pelo viés “brando” e foi marcada por leituras e posicionamentos distintos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    6 Maio 2020
  • Aceito
    21 Ago 2020
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