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Apocalipse pop: representações do fim do mundo em canções brasileiras da década de 1980

Pop apocalypse: representations of the end of the world in Brazilian songs from the 1980s

Resumo

Esta pesquisa, com o uso da metodologia sócio-histórica, aborda a relação entre a produção cultural e as visões sobre a ciência e a tecnologia na década de 1980. Analisa um repertório de canções lançadas nesse período que apresentam temática apocalítica por conta do contexto de Guerra Fria e das crises ambientais. A análise se fundamenta nas noções de horizonte de expectativas de Koselleck e nas expectativas decrescentes de Arantes. As canções estão agrupadas na temática nuclear e na temática ambiental. Observa que essas canções da década de 1980 representam uma mudança da expectativa nacional com relação ao futuro, apresentando um temor acerca de desastres nucleares ou ambientais.

Canção popular; Meio ambiente; Guerra Fria; Arte e ciência

Abstract

This study utilized socio-historical methodology to investigate the relationship between cultural production and views on science and technology in the 1980s by analyzing a repertoire of songs released during this period containing apocalyptic themes due to the context of the Cold War and environmental crises. This exploration is based on Koselleck’s notions of the horizon of expectations and on Arantes’ concept of decreasing expectations. The songs centered around nuclear power and the environment. We observed that these songs from the 1980s represent a shift in national expectations about the future, exhibiting fears related to nuclear and environmental disasters.

Popular songs; Environment; Cold War; Art and science

O presente artigo analisa um conjunto específico de canções populares brasileiras da década de 1980 que apresentam em suas letras uma temática apocalíptica diante do futuro do Brasil e da humanidade. Mais precisamente, canções que têm como assunto o temor diante de um possível conflito nuclear, em função da ainda presente Guerra Fria, ou do colapso ambiental, evidenciado pelos acidentes em Cubatão e Chernobyl, assim como pela instalação das Usinas de Angra dos Reis. Segundo o historiador David S. Russell, o gênero literário apocalíptico, desde suas origens durante o século II a.C., é caracterizado pelos “seus pronunciamentos relativos à consumação de todas as coisas em cumprimento das promessas de Deus” (Russell, 1978, p.3). Contemporaneamente, termos como “apocalipse” e “apocalíptico” encontram-se presentes em romances, filmes, canções e demais produtos da indústria cultural que têm como foco a “catástrofe absoluta” e o “colapso total” da sociedade, representando o que seria a destruição da humanidade ( Russell, 1997RUSSELL, David Syme. Desvelamento divino: uma introdução à apocalíptica judaica. São Paulo: Paulus, 1997. , p.16).

Partimos do pressuposto de que a música pode ser entendida como “uma forma de pensamento e ação no mundo” ( Blacking, 1995BLACKING, John. How musical is man? Seattle: University of Washington Press, 1995. , p.235) que “pode nos dizer coisas sobre a História que não estão acessíveis por meio de nenhum outro meio” ( McClary, 1991McCLARY, Susan. Feminine endings. Minnesota: University of Minnesota Press, 1991. , p.29). 1 1 Esta e as demais citações em inglês têm tradução livre. Destarte, o artigo optou por uma abordagem do seu objeto do tipo sócio-histórico que se caracterizaria por ser “em geral, … investigações sobre ‘as relações estabelecidas entre a obra musical e o espaço social, histórico ou contextual de sua criação ou execução’” ( Vasconcelos, 2019VASCONCELOS, Francisco de Assis Guedes de. Os significados da Sinfonia do café: uma releitura da canção de Humberto Teixeira. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.26, n.1, p.145-163, 2019. , p.147; destaque nosso). Deve-se, portanto, considerar que as canções aqui tratadas são constituídas pela apreensão e transformação de elementos advindos do contexto sócio-histórico em elementos da sua estrutura interna ( Candido, 1976CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade . São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976. ). Consequentemente, a oposição rígida entre análise externa e interna ( Napolitano, 2007NAPOLITANO, Marcos. História e música popular: um mapa de leituras e questões. Revista de História , n.157, p.153-171, 2007. , p.154) perde seu sentido, pois as canções aqui abordadas, assim como outros objetos estéticos, ocupariam um campo social de mediação situado entre a perspectiva individual dos compositores/intérpretes e as macroestruturas de seu tempo ( Bourdieu, 2011BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011. ). Em outros termos, nas palavras do historiador Marcos Napolitano (2007NAPOLITANO, Marcos. História e música popular: um mapa de leituras e questões. Revista de História , n.157, p.153-171, 2007. , p.162): “A obra, nesta perspectiva, era uma espécie de feixe de tensões de problemas e de séries culturais, muitas vezes contraditórias e, por isso mesmo, expressão dos projetos e lutas culturais de uma determinada época”.

O levantamento e a seleção das canções analisadas partiram da consulta a portais enciclopédicos de letras de canções. 2 2 Os portais consultados foram Letras.Mus ( www.letras.mus.br ), Vagalume ( www.vagalume.com.br ) e Letras.com ( www.letras.com.br ). Por meio das ferramentas de busca internas a cada um desses sites , elaborou-se uma lista de canções com registro fonográfico de 1980 até 1989, independentemente do gênero musical.

A primeira parte do texto, de caráter introdutório, apresenta breve contextualização dos anos iniciais da década de 1980, da conjuntura brasileira como da internacional. Depois, tem-se uma descrição do mercado musical do mesmo período, com foco na emergência do rock como protagonista mercadológico da época, sua contraposição ideológica e musical à música popular brasileira (MPB), assim como um exame da influência do movimento punk nesse cenário.

Parte-se então para a análise propriamente dita das canções selecionadas. Optou-se por agrupá-las em dois grandes blocos temáticos: “apocalipse nuclear” e “apocalipse ambiental”. No primeiro grupo estão incluídas as canções que versam sobre uma provável guerra com uso de armas nucleares pelas duas superpotências da época: EUA e URSS. No segundo, estão canções que abordam os problemas ambientais e suas consequências para a humanidade. Dois subtemas se destacam neste último grupo: canções que tratam das usinas nucleares de Angra dos Reis e do desastre de Cubatão. Por fim, deu-se um tratamento em separado ao tema relativo ao acidente em Chernobyl, na URSS, pois é uma temática híbrida com elementos tanto do apocalipse nuclear como do apocalipse ambiental.

Por fim, a parte da análise de canções é arrematada com um exame específico de algumas letras do cantor Roberto Carlos, como em uma espécie de breve estudo de caso. Tal destaque se justifica em função de dois fatores: em primeiro lugar, pelo fato de ele ser o maior vendedor de discos no Brasil nas décadas de 1970 e 1980, além de possuir um público consumidor nas mais diversas classes sociais da época ( Araújo, 2006ARAÚJO, Paulo. Roberto Carlos em detalhes . São Paulo: Editora Planeta, 2006. , 2021ARAÚJO, Paulo. Roberto Carlos outra vez: 1941-1970. Rio de Janeiro: Record, 2021. v.1. ). Ademais, sua obra apresenta uma série de canções nas quais a temática apocalíptica, tanto em sua vertente nuclear como ambiental, são tratadas diretamente.

A última parte do artigo elabora uma avaliação do contexto socioeconômico e cultural da década de 1980, de modo a fornecer uma intepretação coerente da emergência da temática apocalíptica nas letras das canções examinadas na parte precedente. Com esse fim, recorre-se às noções de espaço de experiência e horizonte de expectativas do historiador Reinhart Koselleck (2006)KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006. , expectativas decrescentes do filósofo Paulo Arantes (2014)ARANTES, Paulo. O novo tempo do mundo e outros estudos sobre a era da emergência. São Paulo: Boitempo, 2014. , assim como à abordagem que o economista Francisco Oliveira (2013)OLIVEIRA, Francisco. Crítica à razão dualista: o ornitorrinco. São Paulo: Boitempo, 2013. faz do colapso do desenvolvimentismo brasileiro após o fim da ditadura militar.

O contexto socioeconômico da década de 1980: o mundo e o Brasil

Para o sociólogo Wolfgang Streeck (2018)STREECK, Wolfgang. Tempo comprado: a crise adiada do capitalismo democrático. São Paulo: Boitempo, 2018. , desde fins da década de 1970, o Estado de bem-estar social (w elfare State ) na Europa e nos EUA começou a se deteriorar. Políticas de emprego e direitos sociais universais foram atacados sob o manto da “flexibilização”, tendo como consequência a aceitação de altas taxas de desemprego e a privatização dos serviços públicos (p.76). O espírito dessa época pode ser sintetizado pelo acrônimo Tina, “ there is no alternative ”, que, segundo Mark Fisher (2020)FISHER, Mark. Realismo capitalista: é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. São Paulo: Autonomia Literária, 2020. , descreveria o que ele chama de realismo capitalista: “O sentimento disseminado de que o capitalismo é o único sistema político e econômico viável, sendo impossível imaginar uma alternativa a ele” (p.10).

Já no Brasil, a década se inicia com o último governo da ditadura militar, o do general João Figueiredo (1979-1985), que deu continuidade à abertura institucional desencadeada pelo seu antecessor, general Ernesto Geisel. Dá-se fim ao bipartidarismo e, consequentemente, surgem novas agremiações como o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), entre outros. Havia, além disso, toda uma efervescência social e política em função do movimento das Diretas Já (1983-1984) e da Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988), que visava a uma reconstrução institucional do país pós-ditadura. Em contrapartida, no plano econômico, o Brasil chegou a ter anos com crescimento negativo durante a década, como, por exemplo, -0,1% em 1988. Ademais, a inflação corroía diariamente a capacidade de compra dos brasileiros, indo de 242,24%, em 1985, até atingir 1.972,91%, em 1989 ( Baltar, 1996BALTAR, Paulo. Estagnação da economia, abertura e crise do emprego urbano no Brasil. Economia e Sociedade, n.6, p.75-111, 1996. , p.89).

O mercado musical brasileiro na década de 1980 e o protagonismo do rock

O início da década de 1980 trouxe a consolidação das rádios de frequência modulada (FM), caracterizadas pela qualidade de som superior (Farias, Zuculoto, 2017), e de uma mudança no estilo de locução e de programação, privilegiando um público jovem e artistas como Rita Lee e Guilherme Arantes ( Barcinski, 2014BARCINSKI, André. Pavões misteriosos: 1974-1983 – a explosão da música pop no Brasil. São Paulo: Três Estrelas, 2014. , p.156-157). Esses artistas inseriam-se no cenário do pop rock brasileiro que, nesse período, passou a adotar em suas composições o formato da música pop estrangeira, caracterizado por canções “de duração curta” e estrutura de “estrofe-refrão-estrofe” que visava à rápida assimilação do ouvinte (p.10). É diante desse contexto que a indústria da música passa por uma série de mudanças.

Simultaneamente a essa mudança, a indústria fonográfica enfrentava uma crise. A recessão mundial redundou em queda de 10% nas vendagens de disco nos EUA entre 1977 e 1980. No Brasil a crise também se instalou: a indústria fonográfica brasileira foi de 63,8 milhões de discos vendidos em 1979 para 43 milhões em 1981 (Garson, Souza, 2018, p.229).

Uma das soluções para a crise foi a reformulação do elenco das gravadoras. Buscou-se priorizar estilos com baixo custo de produção, em que se enquadrava o novo rock brasileiro, formado por bandas como Titãs, Legião Urbana, Kid Abelha, entre outras. Esses artistas tinham poucos integrantes, repertório próprio e “dispensavam arranjadores, orquestras e músicos convidados” ( Alexandre, 2013ALEXANDRE, Ricardo. Dias de luta: o rock e o Brasil dos anos 80. Porto Alegre: Arquipélago Editorial, 2013. , p.144). Em 1984, tais medidas já surtiam efeito no mercado: o rock respondia por mais de 50% das vendas de gravadoras como Odeon e WEA, enquanto nas rádios “as duas maiores emissoras FM do Brasil, a Rádio 98 e a Jovem Pan, já reservavam entre 20% e 30% de sua programação para o gênero” (Garson, Souza, 2018, p.230).

Apesar do importante papel que o rock cumpriu na recuperação do mercado de discos do período, seu protagonismo na indústria não chegou até o fim da década. Conforme Vicente e Marchi (2014VICENTE, Eduardo; MARCHI, Leonardo de. Por uma história da indústria fonográfica no Brasil 1900-2010: uma contribuição desde a comunicação social. Música Popular em Revista, v.3, n.1, p.7-36, 2014. , p.22), durante os anos 1980, “além do eixo Rio-São Paulo [surgiu] um mercado consumidor no interior do país e nas periferias [das capitais]”, o que gerou “uma demanda por expressões culturais próprias” (p.23). Com essa mudança, o espaço mercadológico do rock acabou sendo ocupado por estilos diversificados do interior do Brasil: o sertanejo, que modernizava a música rural brasileira, especialmente do Sudeste, do Sul e do Centro-Oeste brasileiros (Ferreira Filho, 2015), e o axé, que fundia ritmos caribenhos, africanos e elétricos na Bahia ( Pereira, 2010PEREIRA, Iana Souza. Axé-axé: o megafenômeno baiano. Revista África e Africanidades, v.2, n.8, p.1-6, 2010. ). Isso representou uma descentralização econômica e geográfica do público-alvo das gravadoras.

A influência do movimento punk no rock brasileiro da década de 1980

Uma das marcas distintivas do rock brasileiro da década de 1980 foi a incorporação da estética e da ideologia do movimento punk . Para o sociólogo francês Michel Maffesoli (2002)MAFFESOLI, Michel. O tempo das tribos: o declínio do individualismo na sociedade de massas. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. , o punk origina-se da acentuação da desigualdade social advinda do fim do welfare State , da repressão política estatal e da degradação do espaço público. John Lydon, vocalista do Sex Pistols, reforça tal interpretação ao descrever nos seguintes termos a Inglaterra em 1977, ano do surgimento do estilo: “Foi um período muito miserável. Desemprego elevado. Absolutamente sem esperança. Guerra de classes muito furiosa. Literalmente, nenhum futuro” (Guerra, Straw, 2017, p.6). Tal postura, não só lírica e estética, mas existencial, colocou o punk em rota de colisão ao otimismo ideológico dos hippies da década de 1960: “Não se sonha mais com a sociedade alternativa – o sonho hippie foi absorvido pelo sistema, e slogans pela paz e pelo amor soam ingênuos” ( Cohen, 2014COHEN, Renato. Performance como linguagem . São Paulo: Perspectiva, 2014. , p.144).

Enquanto o punk , nos EUA e na Europa, antagonizava o rock produzido no meio da década de 1970 – caracterizado por superproduções, num “ambiente estritamente controlado, economicamente orientado e financeiramente conservador” ( Friedlander, 2010FRIEDLANDER, Paul. Rock and roll: uma história social. Rio de Janeiro: Record, 2010. , p.347) –, ao chegar ao Brasil, o punk acabou por antagonizar não o rock produzido aqui, mas sim a MPB e sua “linguagem complexa e intrincada, forjada pelos anos de combate cultural à ditadura militar e à censura” (Garson, Souza, 2018, p.230). Vale ressaltar que “MPB é sigla que desde meados dos anos [19]60 congregava a música de matriz nacional-popular (ampliada a partir de 1968, na direção de outras matrizes culturais, como o pop ), declaradamente crítica ao regime militar” ( Napolitano, 2004NAPOLITANO, Marcos. A MPB sob suspeita: a censura musical vista pela ótica dos serviços de vigilância política (1968-1981). Revista Brasileira de História, v.24, n.47, p.103-126, 2004. , p.105). Clemente Nascimento, líder da banda Inocentes, escreveu, em 1982, um manifesto do intitulado “Fora com o mofo da MPB! Fim da ideia de falsa liberdade!”, no qual afirmava que “… estamos aqui para revolucionar a música popular brasileira para dizer a verdade sem disfarces (e não tornar bela a imunda realidade): Para pintar de negro a Asa Branca, atrasar o trem das onze, pisar sobre as flores de Geraldo Vandré e fazer da Amélia uma mulher qualquer” ( Alexandre, 2013ALEXANDRE, Ricardo. Dias de luta: o rock e o Brasil dos anos 80. Porto Alegre: Arquipélago Editorial, 2013. , p.71).

Apesar de a contestação às músicas da época, no Brasil, ser diferente do punk europeu, a temática dos punks brasileiros tinha conexão com o punk britânico quanto ao horizonte de expectativas no país para os jovens. Sendo assim, a expressão no future , originária da canção God save the Queen , da banda inglesa Sex Pistols, que sintetizava “o abandono de uma geração que se via excluída das beneficies sociais na Inglaterra do final da década de 1970” ( Vieira, 2017VIEIRA, Tiago de Jesus. O futuro do sem futuro: uma análise da escrita punk no Brasil e suas construções identitárias. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal do Mato Grosso, Cuiabá, 2017. , p.14), também se estabeleceria nas canções de diversas bandas brasileiras que analisamos neste artigo.

O apocalipse nuclear: os últimos anos da Guerra Fria

Para além da crise econômica e institucional brasileira e internacional, a década de 1980 teve em sua primeira metade um recrudescimento da Guerra Fria. Desde 1979, as relações entre URSS e EUA entraram em uma nova fase de tensão. O presidente Jimmy Carter acusava a invasão do Afeganistão pelos soviéticos de maior perigo à paz mundial desde a Segunda Guerra Mundial e, em retaliação, anunciou uma série de embargos comerciais à URSS, assim como o boicote aos Jogos Olímpicos de Moscou em 1980.

No primeiro mandato de Ronald Reagan (1981-1984), a política americana, diante da outra superpotência, radicalizou-se ainda mais. A princípio com a instalação em 1983 de mísseis nucleares de médio alcance em território europeu e, em seguida, com o anúncio feito por Reagan de “pesquisas visando à constituição de uma defesa estratégica antimísseis, a Strategic Defense Iniciative … conhecida popularmente como Projeto ‘Guerra nas Estrelas’” (Silveira, Alves, 2018, p.62; destaque no original). Caso fosse concluído, tal sistema de defesa tornaria todo arsenal soviético completamente inútil diante do poderio militar norte-americano.

Tal clima não foi ignorado pela cultura pop . Em novembro de 1983, milhões de americanos assistiram a um telefilme produzido pela cadeia televisiva ABC que mostrava as consequências de um ataque nuclear ao território dos EUA. O dia seguinte (The ) também foi assistido pelo presidente Reagan, que registrou em seu diário que estava deprimido com o que viu no filme (Silveira, Alves, 2018, p.63).

Ainda durante 1983, um grupo de pesquisadores liderados por Carl Sagan começou a avaliar as consequências efetivas de um conflito nuclear entre as superpotências. O resultado foi que, em qualquer cenário possível, para além dos efeitos imediatos, o planeta seria coberto por uma nuvem de poeira durante dois anos, o que acarretaria uma queda da temperatura para até -47ºC, o que decretaria o fim de toda a vida na Terra. O impacto desse resultado foi tão grande que no ano seguinte o Vaticano promoveu um seminário para que cientistas de todo o mundo debatessem as consequências do chamado inverno nuclear ( Colacios, 2011COLACIOS, Roger. O inverno nuclear: ciência, medo e Guerra Fria nos anos 1980. In: Congresso Internacional de História, 5., 2011, Maringá. Anais… Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2011. p.1806-1815. Disponível em: http://www.cih.uem.br/anais/2011/trabalhos/96.pdf. Acesso em: 26 out. 2021.
http://www.cih.uem.br/anais/2011/trabalh...
).

O ano de 1984 viu, então, um arrefecimento na retórica belicista de Reagan. Impactado pelos citados acontecimentos do ano anterior, o presidente americano fez um discurso conciliador afirmando que “o fato de nenhum de nós gostarmos do outro sistema não é motivo para que nos recusemos conversar”, ressaltando que “1984 é um ano de oportunidades para a paz” (Silveira, Alves, 2018, p.63). Juntamente com a ascensão de Gorbachev na URSS, em 1985, estava pavimentado o caminho diplomático que nos anos seguintes redundaria na distensão das relações entre os dois blocos e no colapso da URSS em 1991.

As canções do apocalipse nuclear

Tal contexto de retomada das tensões da Guerra Fria se refletiu em várias canções brasileiras da época. Em 1981, duas tematizaram um ataque nuclear: “Bomba H sobre São Paulo”, de Arnaldo Baptista, e “Nostradamus”, de Eduardo Dusek. Na primeira, a descrição do momento da explosão de uma bomba atômica serve para redimir o narrador –“E eu que até aí me achava muito ruim/ Chorei, chorei de amor pela humanidade” (Baptista, 1981) –, enquanto na última, o tom é de indiferença diante do fim do mundo:

Vou até a cozinha

Encontro Carlota, a cozinheira, morta

Diante do meu pé, Zé

Eu falei, eu gritei, eu implorei:

‘Levanta e serve um café

Que o mundo acabou!’ ( Dusek, 1981DUSEK, Eduardo (intérprete). Nostradamus. In: Dusek, Eduardo. Olhar brasileiro. Rio de Janeiro: Polygram, 1981. LP, faixa 3. ).

Em ambas, não existe uma postura crítica ou um contexto sociopolítico, sendo o fim do mundo um momento exclusivo para o narrador e seus problemas pessoais. A politização da bomba chega em 1982 com o primeiro registro fonográfico do punk rock brasileiro, o Grito suburbano , com músicas das bandas Cólera, Olho Seco e Inocentes. “Morte nuclear” ( Nascimento, 1982NASCIMENTO, Clemente Tadeu (compositor). Morte nuclear. In: Vários artistas. Grito suburbano. São Paulo: Punk Rock Discos, 1982. LP, faixa 10. ), dos Inocentes, afirma que “O mundo está por um pavio”, pois “Há armas nucleares apontadas/ Para todos os lugares” e agora “Você tem que se preparar/ Para a morte nuclear”. Não existe drama existencial ou cinismo pequeno-burguês, apenas a certeza do fim.

No ano seguinte, o apocalipse nuclear é retratado de duas maneiras diferentes. Enquanto o Ratos de Porão (1983)RATOS DE PORÃO (intérprete). Poluição atômica. In: Vários Artistas. SUB. São Paulo: Estúdios Vermelho, 1983. LP, faixa 3. em “Poluição atômica” dá continuidade ao tom niilista da canção dos Inocentes (“O ser humano quer se autodestruir … não há solução”), um dos maiores sucessos radiofônicos do ano, “Eva” (Bicazzi, Tozzi, 1984), da banda Rádio Táxi, descreve um hipotético cenário pós-apocalipse. Após decretar o “fim da aventura humana na Terra”, no qual o planeta foi reduzido “a nada, a nada mais”, um casal foge em uma nave em busca de um novo habitat para a humanidade. Se as canções citadas até aqui se passavam antes ou no momento do fim do mundo, “Eva” inova partindo de uma circunstância posterior ao apocalipse. No lugar da urgência punk , a letra opta por narrar um romance destinado a recriar, em uma nova arca de Noé, a própria humanidade aniquilada e em busca de outro planeta para viver. Têm-se uma rara fusão de imagens religiosas com ficção científica e sem tom de exortação niilista do punk ou do lirismo autocentrado das canções de Dusek e Baptista. Lirismo esse retomado por Tom Zé em 1984ZÉ, Tom (intérprete). Acalanto nuclear. In: Zé, Tom. Nave Maria. São Paulo: RGE, 1984. LP, faixa 7. com “Acalanto nuclear”, na qual, novamente, a bomba atômica é despida de qualquer politização, sendo um momento para se resignar, pois

só posso agora te ninar

no colo

quente

da bomba nuclear

deita o desespero

no meu travesseiro ( Zé, 1984ZÉ, Tom (intérprete). Acalanto nuclear. In: Zé, Tom. Nave Maria. São Paulo: RGE, 1984. LP, faixa 7. ).

Em 1985, o tema se popularizou a ponto de ser tratado na canção infantil “Guerra nas estrelas”, do Fofão: “Enquanto o mundo fala em guerra nas estrelas/ Vamos explodir amor/ Não podem acabar com o nosso planeta” (Bernardes, Pessini, Winter, 1985). Já a banda de heavy metal paraense Stress gravou duas canções em seu segundo disco, “Inferno nuclear” e “Flor atômica”, com versos no mesmo tom pessimista e crítico dos punks paulistas: “Mísseis nucleares/ Cruzam os ares … Nascida desse caos de manhã/ Flor atômica” (Stress, 1985a, 1985b).

Em “Abrigo nuclear”, do Premeditando o Breque, ainda em 1985, apresenta-se um corretor de imóveis tentando vender abrigos para possíveis sobreviventes do apocalipse atômico:

Pense no futuro

O mundo pode acabar

Não viva inseguro

Com medo da hora H

Pois afinal chegou

O primeiro condomínio

Com abrigo nuclear

Da América Latina

Venha morar com comodidade

Total segurança

A prova de roubo, fogo e radiação

Seu dinheiro aplicado

Mesmo depois do fim do mundo ( Luiz, 1985LUIZ, Osvaldo (compositor). Abrigo nuclear. In: Premeditando o Breque. O melhor dos iguais. São Paulo: EMI, 1985. LP, faixa 5. ).

Se “Eva” admitia que a guerra atômica destruiria tudo, restando apenas a opção de escapar do planeta devastado em busca de outro mundo, “Abrigo nuclear” acaba por antecipar em chave irônica o já citado realismo capitalista de Mark Fisher (2020FISHER, Mark. Realismo capitalista: é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. São Paulo: Autonomia Literária, 2020. , p.10), no qual se crê que “é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo”.

Em 1986, o Ratos de Porão (1986)RATOS DE PORÃO (intérprete). Cérebros atômicos. In: Ratos de Porão. Descanse em paz. São Paulo: Baratos Afins, 1986. LP, faixa 1. retoma o tema do apocalipse atômico com “Paranoia nuclear” (É o medo de morrer/ É o medo de matar/ É a paranoia nuclear), assim como a banda gaúcha de heavy metal Virgem Atômica em “Ameaça nuclear”: “Ameaça nuclear/ O começo da destruição/ O sorriso das crianças/ Está para acabar” ( Victor, 1986VICTOR, Maurício (compositor). Ameaça nuclear. In: Virgem Atômica. Tempos vencidos. Porto Alegre: Eger, 1986. LP, faixa 6. ). Em contraposição ao no future dessas canções, Os Replicantes em “A verdadeira corrida espacial” conseguem matizar ainda mais o fim do mundo, pois ele pode ser diferente em função de a qual parte do capitalismo global você pertence:

Enquanto o terceiro mundo

Espera o juízo final

Eu quero uma vaga no ônibus

Da corrida espacial (Gerbase, Heinz, 1986).

Em 1987, os mesmos Replicantes aprofundam sua análise na canção “Tom e Jerry” (Gerbase, Heinz, Heinz, 1987). Em uma defesa do anarquismo (“Anarquia é utopia faça uma todo dia”), o capitalismo e o socialismo são atacados como “disfarces do fascismo”, assim como “Nacionalismo e direitismo são as armas dos burgueses”. Pela primeira vez no conjunto de letras aqui analisadas a bomba é vista como uma ferramenta ideológica de controle social, e não apenas um artefato de destruição em massa. “Bomba atômica e corrente servem para a mesma coisa/ Bomba atômica e porrete servem para a mesma coisa”.

Se Fausto Fawcett no mesmo ano faz de uma exposição sobre a Guerra Fria e o arsenal atômico americano uma situação para um encontro amoroso com uma “Loura cicerone do Pentágono/ Loura cicerone da Otan” (Fawcett, Alexandre, 1987), outras canções insistem na mera descrição de um fim do mundo por meio de armas nucleares. O hardcore Oi! da Vírus 27 reforçava a tradição crua das letras punks com “Morte nuclear” ( Oliveira, 1987OLIVEIRA, Reginaldo Barbosa de (compositor). Morte nuclear. In: Vírus 27. Parasitas obrigatórios. São Paulo: Devil Discos, 1987. LP, faixa 5. ): “É bom você se preparar/ Que seu corpo irá pro ar/ São efeitos da desgraça”. O Frequência Modulada, já sob o impacto do acidente em Chernobyl do ano anterior, fala de “Mísseis voando”, “físicos inconsequentes” e “usinas que explodem” (Quaresma, Cardoso, 1987). O thrash metal dos paulistas do Korzus gravou uma execração amaldiçoando os governantes responsáveis pelo apocalipse em “Guerra nuclear” ( Pompeu, 1987POMPEU, Marcello (compositor). Guerra nuclear. In: Korzus. Sonho maníaco. São Paulo: Devil Discos, 1987. LP, faixa 6. ): “E as ogivas vão destruir seus castelos retornando ao pó/ Vivendo sob a escuridão, definhando/ Definhando seu corpo na radiação mortal”. A mesma crítica contra os governantes aparece, mas sem as imagens fantásticas típicas do heavy metal , em “Uma bomba nuclear pode estragar todo seu dia” da banda punk Pupilas Dilatadas:

Ninguém vai sobreviver, a little boy é osso duro de doer

E a história se repete, como uma farsa absurda,

Uma minoria grita não, mas, a maioria fica muda.

Reagan tem seus abrigos, os Russos devem ter também ( Magno, 1987MAGNO, Cesar (compositor). Uma bomba nuclear pode estragar todo seu dia. In: Pupilas Dilatadas. Experience?? Porto Alegre: Sulcos Suicidas, 1987. LP, faixa 3. ).

Assim como em “A verdadeira corrida espacial” dos Replicantes do ano anterior, a canção do Pupilas Dilatadas faz uma distinção entre os impactos da guerra atômica para o núcleo do capitalismo e do socialismo real da época e para a maioria da periferia que apenas “fica muda”.

Talvez em função da distensão entre EUA e URSS por causa da consolidação do governo Gorbachev e da citada mudança nas relações entre as superpotências, 1988 tem apenas duas canções sobre o tema. Em uma delas, o cantor popular Amado Batista (1988)BATISTA, Amado (intérprete). Dinamite de amor. In: Batista, Amado. Dinamite de amor. Rio de Janeiro: RCA Victor, 1988. LP, faixa 7. mistura pacifismo e romantismo em versos como: “Os chefes das grandes potências/ Apertando os botões/ E os mísseis no ar explodindo/ Em flores e canções. A outra canção do ano é “Fome nuclear”, dos punks da Olho Seco. “Fome nuclear”, continua a tradição punk no future em versos como: “Por que aguentar/ A fome nuclear/ Desespero no ar/ A vida é uma só” ( Zvonar, 1988ZVONAR, Fabio (intérprete). Fome nuclear. In: Olho seco. Fome nuclear. São Paulo: Independente, 1988. EP, faixa 1. ). É notável como um tema que envolve ciência e geopolítica conseguiu, na década de 1980, ser abordado por artistas de estilos tão diversos, como Korzus e Amado Batista.

A última canção da década sobre o tema foi, assim como “Eva” em 1984, um enorme sucesso popular. “Astronauta de mármore”, de 1989, é uma versão feita pelo Nenhum de Nós para “Starman”, de David Bowie, e que em parte remete ao já citado inverno nuclear. O astronauta que volta à Terra pós-apocalipse atômico vê que “a lua inteira é um manto negro” e o “escuro deserto do céu” faz com que ele tenha saudades do “tempo de onde via o mundo azul” (Stein, Hornich, Corrêa, 1989).

Apesar de a guerra nuclear ter predominado na imagética sobre fim do mundo nas canções populares aqui abordadas, não se concebeu apenas esse tipo de fim do mundo na música pop brasileira dos anos 1980. Muitas das canções analisadas acima já percebiam que a questão ambiental poderia ser tão definitiva nos destinos da humanidade como o arsenal atômico das grandes potências.

O apocalipse ambiental: o Brasil entre a preservação e o desenvolvimento

A ideologia do desenvolvimentismo tornou-se uma espécie de consenso entre as classes dirigentes brasileiras desde a Revolução de 1930. Em linhas gerais, a que predominou na América Latina entre as décadas de 1930 e 1990 preconiza que os países subdesenvolvidos devem buscar, via um Estado nacional dirigente, completar sua revolução capitalista objetivando a criação de uma moderna classe empresarial, de uma classe média profissional e de uma classe assalariada de massa até chegar aos níveis de crescimento dos países ricos ( Bresser-Pereira, 2010BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Globalização e competição . Rio de Janeiro: Elsevier Campus, 2010. ). Durante a ditadura, mesmo a oposição ao regime defendia a necessidade de crescimento econômico a qualquer preço – até se tal preço fosse ambiental. Sob a presidência de Emílio G. Médici (1969-1974), o governo brasileiro chegou a convidar publicamente “indústrias poluidoras a transferirem-se para o Brasil, onde não teriam nenhum gasto em equipamento antipoluente” ( Viola, 1987VIOLA, Eduardo. O movimento ecológico no Brasil (1974-1986): do ambientalismo a ecopolitica. Notre Dame: Kellogg Institute, 1987. , p.8). As raras críticas a tal modelo de crescimento centravam-se apenas “no seu caráter concentrador da renda … sem fazer quase referência a seu brutal custo ecológico” ( Viola, 1987VIOLA, Eduardo. O movimento ecológico no Brasil (1974-1986): do ambientalismo a ecopolitica. Notre Dame: Kellogg Institute, 1987. , p.9). Com a abertura política e a queda nos índices de crescimento econômico na década de 1980, o país se viu às voltas com a herança econômica, simbólica e material dessa opção macroeconômica dos regimes anteriores. Obras como as usinas nucleares de Angra ou a situação crítica da cidade de Cubatão se tornaram ícones no imaginário do país do desenvolvimentismo interrompido e suas consequências ambientais nocivas.

As canções do apocalipse ambiental: as usinas de Angra dos Reis

Algumas canções já citadas, como “Poluição atômica”, do Ratos de Porão (1983)RATOS DE PORÃO (intérprete). Poluição atômica. In: Vários Artistas. SUB. São Paulo: Estúdios Vermelho, 1983. LP, faixa 3. , já estabeleciam a ligação entre energia atômica e problemas ambientais, mas de maneira genérica (“Não há solução/ Pra essa poluição atômica”). Em 1986, com “Cérebros atômicos”, o Ratos volta a relacionar a questão ambiental e a energia atômica nos versos “cérebros atômicos/ programados para destruir … em nome do progresso” ( Ratos de Porão, 1986RATOS DE PORÃO (intérprete). Cérebros atômicos. In: Ratos de Porão. Descanse em paz. São Paulo: Baratos Afins, 1986. LP, faixa 1. ). Mas, do conjunto de canções levantadas, o tema ambiental concentrou-se em um cenário favorito: a região litorânea de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, onde se instalaram duas usinas nucleares na segunda metade da década de 1970, em um projeto típico do desenvolvimentismo da ditadura militar. Em diversas letras, a contraposição entre o cenário paradisíaco de Angra e o perigo mortal representado pelas usinas é um recurso lírico comum.

A marcha carnavalesca “Praia de Angra”, do grupo Coisas Nossas, de 1980, já compara as usinas com uma bomba atômica antes mesmo de elas começarem a funcionar: “Melhor andar pela sombra/ Que a praia, meu bem, tá uma bomba/ Angra dos Reis 1, 2, 3 fez ‘Bum!’/ E pra contar, não sobrou nenhum” ( Caola, 1980CAOLA (compositor). Praia de Angra. In: Coisas nossas. Coisas nossas. LP, faixa 12. Rio de Janeiro: Polygram, 1980. LP, faixa 12. ). Além disso, uma “pequena falha” poderia levar para o “beleléu” uma área que iria do “Pão de Açúcar” até o Edifício Itália em São Paulo. Contudo, a crítica era apenas contra a energia atômica em si, afinal, o Brasil ainda poderia “cortar cana”, pois “tem muito chão” e “mais os rios, sol e carvão”. Mesmo uma simples marcha de carnaval ainda reproduzia, em inícios da década, o ideário do desenvolvimentismo da ditadura em sua negligência diante da questão ambiental.

Em 1982, quatro canções retomam o tema. “Angra”, de Luiz Guedes e Thomas Roth (1982), apesar de reconhecer que “Teu poder resplende/ novas luzes”, rejeita as usinas. “Não queremos/ Essa herança, não/ Que o bom senso/ Nos obriga a recusar”, pois não seria desejável ter “contas para acertar” com o futuro. Se a canção do Coisas Nossas ainda acreditava em alternativas energéticas, “Angra” apenas abre mão da energia nuclear por uma motivação puramente ética diante das próximas gerações.

“Romance em Angra”, do Língua de Trapo, descreve a deterioração do corpo da mulher amada como efeito da degradação ambiental após a instalação da usina.

Recordo com saudades

De quando tinhas

Cabelo, meu amor …

Tua pele,

Coberta de escamas,

Realmente não é

Um convite pra cama

O nosso amor foi arrasado

Depois que o reator foi instalado

… E nesse pesadelo nuclear

Na mais torpe aflição

Passo o tempo a suplicar:

Não explode coração! (Sarrumor, Mastrodomênico, 1982).

“Angra” e “Romance em Angra” se referem às usinas não como símbolos do progresso, e sim como uma interdição ao futuro diante da possibilidade do desastre. Sintomático de uma sociedade que começava a abandonar a ditadura e sua ideologia do “Brasil, país do futuro”. “Angra”, ainda de 1982, da banda de synth pop Agentss, reforça tal impressão, ao colocar “Se aquela coisa explodir/ Eu não vou ter pra onde ir!” ( Mike, 1982MIKE, Orion (compositor). Angra. In: Agentss. Agentss. São Paulo: Scorpius, 1982. EP, faixa 1. ). Além de expressar a ansiedade com um possível acidente atômico, ainda repreende a negociação envolvendo a compra da usina nos versos “O gringo que vendeu?/ Mas, mas, mas ele prometeu!/ E se o prazo atrasou?/ O seu imposto aumentou!” ( Mike, 1982MIKE, Orion (compositor). Angra. In: Agentss. Agentss. São Paulo: Scorpius, 1982. EP, faixa 1. ). Isso se deve ao fato de que as usinas de Angra são produto do Acordo Nuclear Brasil-Alemanha Ocidental, firmado em 1975, que previa a construção de usinas nucleares até o início da década de 1990 ( Nunes, 2021NUNES, Helen Miranda. O triângulo do átomo: o acordo nuclear Brasil-Alemanha Ocidental e o papel dos Estados Unidos. Tese (Doutorado em História, Política e Bens Culturais) – Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro, 2021. ).

Nos anos subsequentes, Angra aparece em mais três canções. João Bosco grava em 1986 “Angra”, que relata uma “Angra desolada” com “barcos submersos” e redes de pescadores “que agonizam pelo chão da praia” em um cenário emoldurado por “nuvens de ameaça, lua prisioneira/ águas assassinas, chuva carpideira” (Bosco, Blanc, 1986). Em 1987, a banda punk Detrito Federal, em “Angra (A dança das ogivas)”, descreve um acidente que já aconteceu, pois “não adianta fugir/ pra lugar nenhum/ a mancha rosa-esverdeada/ a morte fumaça amarelada/ Já cobriu o céu” (Anatoly, Cascão, 1987). Em ambas, o tom profético quanto a um provável risco envolvendo as usinas é abandonado por descrições do acidente já consumado.

Ainda em 1987, a Legião Urbana lança “Angra dos Reis”, que se utiliza do mesmo artificio lírico já visto em “Bomba H sobre São Paulo” e “Nostradamus”: o desastre como momento de reconexão ou redenção individual. Mesmo nesse caso, porém, não existe o tom de aviso quanto ao futuro, pois “o fim” já chegou, e as “estrelas começaram a cair” (Bonfá, Rocha, Russo, 1987).

As canções do apocalipse ambiental: o desastre em Cubatão

Enquanto Angra situa-se liricamente como uma possibilidade de desastre, Cubatão, município de São Paulo, impõe-se como o desastre de fato consumado. A cidade, que durante a década de 1970 chegou a contribuir com 4% do PIB (Ferreira Filho, 2015, p.11), transitou de “‘marco do desenvolvimento’ e ‘cidade técnica’ nos anos 1970” para nos anos 1980 ser descrita “como um território tóxico e espaço de desenvolvimento e progresso perdidos” (Klanovicz, Ferreira Filho, 2018, p.10). Em 1981, perante o nascimento de crianças natimortas e anencéfalas na Vila Parisi em Cubatão, o jornalista Randau Marques cunhou a expressão “Vale da Morte” para a cidade. Em 1984 as chuvas ácidas da região decorrentes da poluição destruíram a vegetação da serra do Mar, provocando deslizamentos. Dois anos depois, vazamentos de resíduos tóxicos ocasionaram a contaminação do solo e a intoxicação de animais (Klanovicz, Ferreira Filho, 2018, p.11).

Os desastres em Cubatão tomaram vulto nacional – e até mesmo internacional – por conta da tragédia da favela Vila Socó. Em 25 de fevereiro de 1984, “700 mil litros de gasolina do Oleoduto Santos-São Paulo causou a explosão da tubulação que passava por baixo das palafitas … ocasionando o incêndio de 470 moradias e provocando a morte de 93 pessoas, de acordo com dados oficiais da época” (Klanovicz, Ferreira Filho, 2018, p.11). O jornal A Tribuna de Santos comparou o desastre com o já citado filme O dia seguinte , pois o cenário da Vila Socó na manhã de 25 de fevereiro só era comparável ao ataque nuclear apresentado pelo telefilme da rede ABC (Ferreira Filho, 2015, p.87).

Em “Eu não!”, de Ângela Ro Ro (1985)RO RO, Ângela (intérprete). Eu, não! In: Ro Ro, Ângela. Eu desatino. Rio de Janeiro: Polygram, 1985. LP, faixa 7. , Cubatão é citada em tom crítico juntamente com outras “heranças” do período de crescimento da ditadura:

Se a Serra do Mar despencar

Vai ser triste confirmar

Erramos mais uma vez

A mão da destruição

Tucuruí, Itaipu

Angra dos Reis, Cubatão ( Ro Ro, 1985RO RO, Ângela (intérprete). Eu, não! In: Ro Ro, Ângela. Eu desatino. Rio de Janeiro: Polygram, 1985. LP, faixa 7. ).

E, quatro anos depois, Cubatão reaparece em duas canções. “Protesto do Olodum”, do Olodum, em tom de crítica ecológica, declara: “Brasil liderança/ Força e elite da poluição/ Em destaque o terror, Cubatão/ E lá vou eu” ( Tatau, 1988TATAU (compositor). Protesto do Olodum. In: Olodum: Núbia Axum Etiópia. Rio de Janeiro: Continental, 1988. LP, faixa 11. ). Apenas “Cubatão”, da banda Psychic Possessor (1989)PSYCHIC POSSESSOR (intérprete). Cubatão. In: Psychic Possessor: Nós somos a América do Sul. Belo Horizonte: Cogumelo, 1989. LP, faixa 10. , trata especificamente do desastre envolvendo a cidade paulista:

Você já ouviu falar em vale da morte?

… A poluição está matando Cubatão

Crianças nascem sem cérebro

A anencefalia não as deixa viver

O inferno é em Cubatão

E nada podemos fazer.

Faz-se necessária uma contraposição entre os temas Angra e Cubatão. As usinas de Angra dos Reis e a planta industrial de Cubatão são heranças do período do acelerado desenvolvimento macroeconômico nacional planejado e implementado pela ditadura militar. Todas são situadas nos mais ricos estados da federação. Contudo, apenas Cubatão redundou em desastres reais, desde os casos de anencefalia até a tragédia da favela Vila Socó. Angra sempre foi um temor quanto ao futuro, mas sem apresentar problemas de tamanha gravidade. O receio diante de um acidente em Angra, contudo, foi tratado explicitamente em sete canções durante toda a década enquanto os desastres efetivos em Cubatão são citados por apenas uma, “Cubatão”, da banda Psychic Possessor (1989)PSYCHIC POSSESSOR (intérprete). Cubatão. In: Psychic Possessor: Nós somos a América do Sul. Belo Horizonte: Cogumelo, 1989. LP, faixa 10. . Nas outras duas canções que se referem a cidade paulista, a de Angela Ro Ro e a do Olodum, cita-se Cubatão como um entre outros males brasileiros, sem mais especificação.

Chernobyl: onde o apocalipse nuclear encontra o apocalipse ambiental

Em 26 de abril de 1986, ocorreu um acidente em um dos reatores da usina nuclear de Chernobyl, atual Ucrânia, por conta de uma “incontrolável emissão de energia que superaqueceu o reator”, deteriorando a proteção e causando perda completa do sistema de arrefecimento da usina (Anspaugh, Catlin, Goldman, 1988, p.1513). Conforme Jean-Pierre Dupuy (2007DUPUY, Jean-Pierre. A catástrofe de Chernobyl vinte anos depois. Estudos Avançados, v.21, n.59, p.243-252, 2007. , p.244), os relatórios oficiais apresentam quatro mil vítimas fatais desse acidente. Já o número real se aproxima de 600 mil pessoas, entre as que trabalharam na contenção do acidente e habitantes da cidade de Pripiat e de regiões próximas à usina nuclear.

Esse acidente permanece até hoje no imaginário popular. Alguns episódios recentes, como o prêmio Nobel de Literatura em 2015 à escritora ucraniana Svetlana Aleksiévitch (2016)ALEKSIÉVITCH, Svetlana. Vozes de Tchernóbil: a história oral do desastre nuclear. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. , que, em sua obra Vozes de Tchernóbil , apresentou a história oral do ocorrido, a partir de depoimentos de pessoas que tiveram sua vida marcada pelo desastre, e a série televisiva Chernobyl , lançada pela HBO em 2019, trouxeram o tema à tona na contemporaneidade.

O pop brasileiro refletiu sobre o acidente no Leste Europeu em apenas duas canções. “Chernobil”, do Replicantes, em 1987, fez do acidente nuclear soviético um aviso diante dos riscos envolvendo Angra. Apesar de a letra afirmar de início que “Chernobil não foi suficiente/ será preciso um acidente em Angra”, ela vai além, pois aborda o assunto do programa militar nuclear brasileiro:

Alguns setores civis e militares

Já defendem a bomba atômica

Estão explorando a Serra do Cachimbo

E acabando com a Amazônia

Velhos fascistas só querem o poder (Heinz, Wildner, 1987).

Posteriormente, Chernobyl ressurge em “O lobo mau da Ucrânia”, de Cazuza, lançada em 1987: “Cheguei no Brasil/ Na terra azul de anil/ Back, back from Chernobyl/ O lobo mau de Chernobyl/ Minha sede de viver é uma ameaça atômica” (Cazuza, Neves, 1987). No caso dessa canção, Cazuza se vale de ironia para tecer críticas ao uso da energia nuclear e à antiga URSS. No último caso, utiliza até um certo deboche acerca do regime soviético e da linguagem russa, o que demonstra uma mescla das temáticas referentes ao apocalipse nuclear e ambiental, em um acontecimento que mistura um dos últimos capítulos da Guerra Fria com um grave acidente ecológico-industrial.

Mesmo a referência à serra do Cachimbo, citada em “Chernobil”, do Replicantes, mistura as duas temáticas. Situada entre o sul do estado do Pará e o norte do estado do Mato Grosso, até os dias de hoje observam-se na região problemas com exploração e desmatamento ilegal na região (Silva, Beltrão, Morales, 2021). Em 1986 veio a público a existência de um programa nuclear secreto, quando uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo divulgou a existência de uma estrutura na serra do Cachimbo para a realização de testes nucleares. Só em 1990, no governo Collor, o programa nuclear paralelo brasileiro foi extinto ( Patti, 2013PATTI, Carlo. O programa nuclear brasileiro entre passado e futuro. Meridiano 47, v.14, n.140, p.49-55, 2013. , p.53).

O caso Roberto Carlos: apocalipse, ecologia e religião

A partir de 1970, com a canção “Jesus Cristo”, que apresenta tema religioso, Roberto Carlos, já na posição de maior produto do mercado musical brasileiro ( Araújo, 2006ARAÚJO, Paulo. Roberto Carlos em detalhes . São Paulo: Editora Planeta, 2006. , 2021ARAÚJO, Paulo. Roberto Carlos outra vez: 1941-1970. Rio de Janeiro: Record, 2021. v.1. ), iniciou uma tradição de a cada novo álbum gravar uma canção-mensagem, “geralmente religiosa, mas também de protesto ecológico ou pacifista” ( Araújo, 2006ARAÚJO, Paulo. Roberto Carlos em detalhes . São Paulo: Editora Planeta, 2006. , p.326). Segundo Faraco (2012FARACO, Felipe Berger. À sombra do rei: elementos críticos para a análise da discografia de Roberto Carlos (1961-1982). Dissertação (Mestrado em Meios de Comunicação Social) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012. , p.102), nessas canções “há a constatação de um problema social em escala ampla e, usualmente, o caráter prescritivo na solução deste”. Chegando na década de 1980, Roberto Carlos deu continuidade a essa tradição em canções relevantes para a problemática aqui abordada.

“As baleias”, de 1981, é uma exortação otimista que preconiza a deliberação humana como elemento fundamental para se evitar a colapso ambiental (“Mudar seu rumo e procurar seus sentimentos/ Vai te fazer um verdadeiro vencedor/ Ainda é tempo de ouvir a voz dos ventos”) (Carlos, Carlos, 1981).

Em contrapartida, “Apocalipse”, de 1986, adota um tom pessimista, reforçado pelo videoclipe da canção com imagens de guerras e cidades destruídas que remetem ao filme O dia seguinte . Adotando um tom de fatalismo religioso, Roberto Carlos declara que o fim do mundo é iminente (“perto do fim do mundo”), já que tudo estaria “escrito no Apocalipse”, assim como as profecias estariam confirmadas, pois é o “fim da estrada”. O no future não deixa espaço para a deliberação humana, restando apenas esperar pelo retorno do salvador: “Pra quem seguir Seus passos/ E o Seu amor profundo/ Ele virá trazendo/ A luz de um novo mundo” (Carlos, Carlos, 1986).

Apesar de a emergência da letra de “Apocalipse” encontrar-se em sintonia com os últimos anos da Guerra Fria, ela abre mão da busca pelas causas materiais, sociais e éticas do colapso civilizacional, como a que se fazia presente nas canções de teor ecológico de Roberto Carlos na década anterior. O progresso (1976) afirmava que “Não sou contra o progresso/ Mas apelo pro bom-senso/ Um erro não conserta o outro” (Carlos, Carlos, 1976), enquanto em “O ano passado” (1979) Roberto canta “Diante da economia/ Quem pensa em ecologia?/ Se o dólar é verde é mais forte que o verde que havia/ O que será o futuro que hoje se faz?” (Carlos, Carlos, 1979).

Se o no future punk , que perpassa tantas canções da época, abre mão do futuro em termos estritamente materialistas, sem a possibilidade de uma redenção transcendental, em “Apocalipse Roberto Carlos aceita o fim do futuro e prescreve uma solução soteriológica, via a salvação divina. Se há saída, ela não seria por meios humanos. O compositor das canções ecológicas e críticas acabou cedendo espaço – apesar de ter escutado o aviso de emergência ainda na década anterior – ao homem religioso de “Jesus Cristo”, “Todos estão surdos” e “Ele está para chegar”.

Em 1989, Roberto Carlos grava sua última canção ecológica da década. A despeito do pessimismo religioso de “Apocalipse” ter sido abandonado, em “Amazônia”, a exortação ambientalista não retorna à politização de canções dos anos 1970. O viés agora é moralista e fazendo recurso a imagens religiosas: “Quantos anjos queridos/ Guerreiros de fato/ De morte feridos/ Caídos no mato” (Carlos, Carlos, 1989).

As canções populares apocalípticas e o horizonte de expectativas decrescentes da década de 1980

Uma melhor compreensão das razões de a temática apocalíptica ter emergido de forma tão ampla como tema nas canções populares brasileiras da década de 1980 pode advir quando comparamos tal fenômeno a outros estilos e fases da música popular brasileira do século XX anteriores ao período abordado pelo presente artigo.

A levar-se em conta, por exemplo, a bossa nova, tem-se um estilo musical completamente antagônico à temática lírica do conjunto de canções aqui abordado, pois ela se insere perfeitamente no contexto de otimismo e progresso econômico do governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) ( Scheeren, 2005SCHEEREN, Andréia. Caleidoscópio estético: o nacional-popular e a antropofagia tropicalista. Nau Literária, v.1, n.1, p.1-10, 2005. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/NauLiteraria/article/view/4826. Acesso em: 27 set. 2022.
https://seer.ufrgs.br/index.php/NauLiter...
). Para Alvaro Padilha (2018; destaque no orginal), “a utopia social de João Gilberto, então, parece estar ligada ao que Celso Furtado chamou de ‘superação do subdesenvolvimento’”. A bossa nova ilustraria uma utopia da felicidade que “comunica uma sensação de temporalidade suspensa que não é ócio, mas uma atividade que se produz naturalmente, ‘sem sofrimento ou esforço’, como por emanação, [uma] ‘promessa de felicidade’” ( Mammì, 1992MAMMÌ, Lorenzo. João Gilberto e o projeto utópico da bossa nova. Novos Estudos Cebrap, n.34, p.63-70, 1992. , p.70; destaques nossos). A bossa nova projeta uma visão de mundo – e de país – em completa discordância com o que surge na década de 1980: no lugar da “superação do subdesenvolvimento” e de uma “promessa de felicidade” têm-se a ausência de um futuro viável e o colapso do desenvolvimento nacional.

Na década seguinte, já sob a ditadura militar, a jovem guarda, em especial seu maior representante, Roberto Carlos, era um estilo visto como mero produto de massa do imperialismo norte-americano, alienado das grandes questões nacionais. Seus críticos, a partir do nacionalismo de esquerda, demandariam “uma arte genuinamente brasileira, autêntica” compromissada com a transformação social ( Araújo, 2006ARAÚJO, Paulo. Roberto Carlos em detalhes . São Paulo: Editora Planeta, 2006. , p.319). Tal conflito ideológico encampado por um público mais “sofisticado” e “politizado” acabou por atingir até mesmo Caetano Veloso e Gilberto Gil. Este último chegou a ser tachado como “conformista, alienado, escapista, ditador e nazista” ( Barcinski, 2014BARCINSKI, André. Pavões misteriosos: 1974-1983 – a explosão da música pop no Brasil. São Paulo: Três Estrelas, 2014. , p.74).

As canções aqui analisadas, mesmo que em larga medida desvinculadas de raízes musicais estritamente brasileiras – na maioria são canções pop e rock de matriz anglo-saxã – são, ao contrário da jovem guarda, marcadamente políticas. Mas, em contraponto à “utopia da felicidade” da bossa nova, elas se colocam como antiutopias, como hinos, por assim dizer, da ausência do futuro. Esse apocalipse pop pode ser compreendido nos termos colocados pelo filósofo Paulo Arantes (2014ARANTES, Paulo. O novo tempo do mundo e outros estudos sobre a era da emergência. São Paulo: Boitempo, 2014. , p.39): “qualquer semelhança do apocalipse cristão com o apocalipse nuclear não é mera coincidência”, com a diferença que “a antiga esperança escatológica [cristã] anunciava o começo do Futuro, ao passo que a ‘mensagem’ de nosso tempo do fim simplesmente declara que ‘a ausência do futuro já começou’”. Ou seja, enquanto o apocalipse cristão anuncia a consumação do Evangelho e o início de um novo tempo, sem as mazelas do mundo conspurcado pelo pecado, o apocalipse pop , assim como o nuclear, anuncia o tempo do fim do futuro, nos termos exatos do no future expressados pelos punks que, por sua vez, tanto influenciaram os músicos do pop e rock da década de 1980.

Em termos conceituais, essa visão do futuro pode ser mais bem entendida se partirmos das noções de “espaço de experiência” e “horizonte de expectativas” do historiador Reinhart Koselleck (1923-2006). Espaço de experiência seria “o passado atual, aquele no qual acontecimentos foram incorporados e podem ser lembrados. Na experiência se fundem tanto à elaboração racional quanto às formas inconscientes de comportamento, que não estão mais, que não precisam estar mais presentes no conhecimento” ( Koselleck, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006. , p.309-310).

Já horizonte de expectativas seria “a expectativa que se realiza no hoje, é futuro presente, voltado para o ainda-não, para o não experimentado, para o que apenas pode ser previsto” ( Koselleck, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006. , p.309-310). Passado e futuro jamais chegam a coincidir, assim como uma expectativa jamais pode ser deduzida totalmente da experiência. Uma experiência, uma vez feita, está completa uma vez que suas causas são passadas, ao passo que a experiência futura, antecipada como expectativa, se decompõe em uma infinidade de momentos temporais (p.310).

Para o historiador alemão, a modernidade – em especial o iluminismo – modifica a relação entre o espaço de experiência e o horizonte de expectativas com a incorporação da noção de progresso. Se antes o espaço de experiência se liga diretamente ao horizonte de expectativas, após o Aufklärung inicia-se um descompasso entre as duas categorias históricas, no qual as expectativas superariam o espaço de experiência. Após duas guerras mundiais, fascismos e o fim dos anos dourados do capitalismo, entre 1945 e a primeira crise do petróleo em 1972, chegou-se, contudo, no ponto em que

a distância entre expectativa e experiência passou a encurtar cada vez mais e numa direção surpreendente, como se a brecha do tempo novo fosse reabsorvida, e se fechasse em nova chave, inaugurando uma nova era que se poderia denominar das ‘expectativas decrescentes’, algo ‘vivido’ em qualquer que seja o registro, alto ou baixo, e vivido em ‘regime de urgência’ ( Arantes, 2014ARANTES, Paulo. O novo tempo do mundo e outros estudos sobre a era da emergência. São Paulo: Boitempo, 2014. , p.67; destaques no original).

Ora, por qual razão o Brasil pop dos anos 1980 se encontra nesse processo de expectativas decrescentes e em regime de urgência? O relato do economista João Manoel Cardoso de Mello (1992MELLO, João Manuel. Consequências do neoliberalismo. Economia e sociedade, v.1, n.1, p.1-167,1992. , p.59) dá algumas pistas quando afirma que, “entre 1950 e 1979, a sensação dos brasileiros, ou de grande parte dos brasileiros, é de que faltava dar uns poucos passos para nos tornarmos uma nação moderna”. Durante a década de 1980, contudo, “assiste-se ao reverso da medalha … constatamos, a toda hora, com espanto e vergonha, a enorme distância que nos separa da civilização”.

Tal constatação seria derivada do fato de que, segundo o sociólogo Francisco de Oliveira (2013)OLIVEIRA, Francisco. Crítica à razão dualista: o ornitorrinco. São Paulo: Boitempo, 2013. , desde a década de 1980, não há como o Brasil “aproveitar as brechas que a Segunda Revolução Industrial propiciava”, assim como não havia a possibilidade de se avançar na Terceira Revolução Industrial baseada na informática, pois “as bases de acumulação são insuficientes, estão aquém das necessidades para uma ruptura desse porte” (p.150). Ou seja, o Brasil havia chegado tarde demais à Terceira Revolução Industrial sem nem ao menos ter consolidado internamente a estrutura do trabalho formal integrado a um Estado de bem-estar social, modelo que o Primeiro Mundo já estava abandonando com Thatcher e Reagan.

Mesmo as esperanças depositadas na política se viram frustradas. O rearranjo de forças redundou, apesar do fim da ditadura em 1985 e da promulgação da Constituição em 1988, em “uma cultura política [que] se caracteriza por travar mudanças profundas, mesmo que tenham se tornado urgentes, prementes em vista de problemas estruturais postos a descoberto” ( Nobre, 2013NOBRE, Marcos. Imobilismo em movimento: da abertura democrática ao governo Dilma. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. , p.49).

Como agravante, os militares não se retiraram por completo das esferas do poder político. Ao longo do governo Sarney, eles mantiveram sua proeminência, configurando uma espécie de “democracia tutelada” – o que pode ser comprovado pelo fato de que, apesar da nova Constituição em 1988, a Lei de Segurança Nacional, que garantia as Forças Armadas como garantidoras da “lei e ordem” no país, continuou em vigência ( Zaverucha, 1994ZAVERUCHA, J. Relações civil-militares no primeiro governo da transição brasileira: uma democracia tutelada. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v.9, n.26, p.162-178, 1994. ).

Diante dos citados impasses e frustrações advindos da política e da economia – e do consequente soçobrar do modelo de nação das décadas passadas –, o psicanalista Jurandir Freire Costa (1989)COSTA, Jurandir Freire. Narcisismo em tempos sombrios. In: Fernandes, Heloísa (org.). Tempo do desejo. São Paulo: Brasiliense, 1989. assim descreveu o cenário nacional:

O regime que se sucedeu ao autoritarismo não conseguiu capitalizar o desejo de mudança da nação, imprimindo novos rumos à sociedade. [Têm-se] a exclusão de representações ou imagens [que] ‘possam oferecer ao sujeito a ilusão estruturante de um futuro passível de ser libidinalmente investido’. Na cultura da violência, ‘o futuro é negado ou representado como ameaça de aniquilamento ou destruição’ (destaques nossos).

Na década da hiperinflação, de Cubatão, da ansiedade sempre presente em relação a Angra, da degradação de salários e empregos e das promessas não cumpridas pela nova casta política, o artista pop reagiu criando “uma imagem do futuro surgida da compreensão profunda do presente”, nos termos que Horkheimer (1983HORKHEIMER, Max. Teoria tradicional e teoria crítica. In: Benjamin, Walter et al. Textos escolhidos. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p.125-162. , p.139) usou para descrever o papel da teoria crítica. O fim do “país do futuro”, no qual “o futuro é negado ou representado como ameaça de aniquilamento ou destruição”, trouxe a emergência permanente de viver nos escombros do progresso na década de 1980, fazendo dessas canções não uma narrativa sobre um futuro provável, mas, de modo similar à interpretação que Michael Löwy (2005LÖWY, Michael. Walter Benjamin: aviso de incêndio: uma leitura das teses sobre o conceito de história. São Paulo: Boitempo, 2005. , p.32) faz da obra de Walter Benjamin, “um aviso de incêndio dirigido aos seus contemporâneos, um sino que repica e busca chamar atenção sobre os perigos eminentes que os ameaçam, sobre as novas catástrofes que perfilam no horizonte”.

O horizonte de expectativas de toda uma geração definhava. Mesmo que pressentisse que “Estamos meu bem por um triz/ Pro dia nascer feliz”, ela testemunhava os restos do “Brasil potência” de Geisel assassinando centenas de pessoas na tragédia da favela Vila Socó e os saques famélicos que se tornaram um problema nacional a partir de 1980.

Considerações finais

É sintomático que em 1985, ano do primeiro Rock in Rio e o primeiro ano de governo Sarney, se viu o surgimento do programa federal “Subsídios para a Ação Imediata contra a Fome e o Desemprego” e da Campanha da Fraternidade da CNBB com o lema “Pão para quem tem fome”. Foram os anos em que o “primeiro consenso liberal-keynesiano que comandara a trégua do imediato pós-guerra” chegava ao seu estertor, revelando “que o horizonte do mundo encolhera vertiginosamente e uma era triunfante de expectativas decrescentes principiara” ( Arantes, 2014ARANTES, Paulo. O novo tempo do mundo e outros estudos sobre a era da emergência. São Paulo: Boitempo, 2014. , p.94).

Tal constatação pode ser vista na comparação entre duas canções que demonstra perfeitamente o fim do futuro do país do futuro. Em 1959, durante o governo JK, Luiz Gonzaga (1912-1989) grava a “Marcha da Petrobrás”, em que, além de exaltar Cubatão como um dos “campos de nossa riqueza infinda”, vaticina que “No conselho mundial entre as nações/ nós brasileiros temos de ser campeões” ( Gonzaga, 2016GONZAGA, Luiz (intérprete). Marcha da Petrobrás. In: Gonzaga, Luiz. 60 grandes sucessos. São Paulo: Gonzaga Music Entertainment, 2016. CD, faixa 35. ).

Vinte e nove anos após, o filho de Luiz Gonzaga, Gonzaguinha (1945-1991), em plena ressaca após as Diretas Já!, o fim da ditadura, a Constituinte, a morte de Tancredo Neves, o Plano Cruzado e a hiperinflação, gravou “Meninos do Brasil”. Após cantar sobre o acidente radioativo de Goiânia, enchentes, surfistas de trem da periferia, aviõezinhos do tráfico, crianças cheirando cola, arrastões nas praias, estupro infantil, o cantor arremata com:

Todos estão felizes na televisão

Estão em todos os jornais vendendo só bom humor

São parte desde rolo, querem parte deste bolo

Os meninos do Brasil têm a cara do Brasil

O jeitinho do Brasil

Pedem para desfilar

E arrastar no carnaval ( Gonzaguinha, 1988GONZAGUINHA (intérprete). Meninos do Brasil. In: Gonzaguinha. Corações marginais. Rio de Janeiro: WEA/Moleque, 1988. LP, faixa 8. ).

As canções aqui analisadas são reflexo direto dessa mudança de expectativa nacional em relação ao futuro. Do otimismo das décadas de 1950 e 1960, no qual “nós brasileiros temos de ser campeões”, para um país convivendo com as ruínas de um desenvolvimento malfadado, representado por Cubatão, Angra dos Reis e o temor diante de um fim do mundo perpetuamente presente, seja em um apocalipse nuclear ou ambiental.

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NOTAS

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2022
  • Aceito
    03 Out 2022
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