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Da impossibilidade de conter: intervenções urbanas e produção de subjetividade em Porto Alegre

The impossibility of containing: urban interventions and subjectivity production in Porto Alegre

Resumo

Através da errância do pesquisador pela cidade de Porto Alegre, o artigo explora diferentes intervenções urbanas e seus efeitos nos processos de subjetivação. Passando pela implementação de containers de lixo a diferentes formas de arte que se fazem presentes na cidade, o pesquisador constrói uma narrativa acerca das forças que compõem a cidade a partir dos efeitos de tais intervenções no tecido urbano. Nessa cartografia, lixo e arte são chamados a responder a necessidades de assepsia, corresponder a padrões de beleza, ordenar corpos, gentrificar e revitalizar espaços ditos precários e interferir diretamente nos modos de se viver na cidade. Por outro lado, as intervenções também captam murmúrios e denúncias da cidade, criam desvios nos fluxos urbanos, oportunizando experiências coletivas. Propõem, assim, novas estilísticas de vida atravessadas pelos encontros da rua, pelos detalhes efêmeros, pela arte subversiva e por outros tempos e movimentos possíveis no caos que dá forma ao urbano.

Palavras-chave:
cidade; arte; intervenções urbanas; subjetividade

Abstract

By wandering through the city of Porto Alegre, the researcher explores different urban interventions and their effects on the processes of subjectivation. From exploring the implementation of garbage containers to different art forms that are present in the city, the researcher builds a narrative about the forces that compose the city based on the effects of such interventions in the urban space. In this cartography, garbage and art are invited to respond to the need of asepsis, to correspond to beauty standards, to order bodies, to gentrify and revitalize precarious spaces and to interfere directly with the ways of living in the city. At the same time, the interventions also capture murmurs and denunciations of the city, create deviations in the urban flows, offering collective experiences. Besides that, they proposes new life styles that crossed by street encounters, ephemeral details, subversive art and other possible times and movements in the chaos that gives shape to the urban space.

Keywords:
city; art; urban intervention; subjectivity

Introdução: a contenção do lixo na cidade1 1 O presente artigo é consequência da reelaboração de parte de uma dissertação de mestrado intitulada Sobre containers e medianeras: intervenções urbanas e subjetivações limiares (Flach, 2016), vinculada ao Programa de Pós Graduação em Psicologia Social e Institucional da UFRGS, que contou com o apoio da Capes para sua realização.

Ao ler o jornal do dia 12 de julho de 2011, o cidadão de Porto Alegre soube que a cidade recebeu em suas ruas a instalação de 1100 containers de lixo, como parte da ação “Porto Alegre: eu curto, eu cuido”, promovida pela prefeitura da cidade (Prefeitura de Porto Alegre, 2011PREFEITURA DE PORTO ALEGRE. Eu curto, eu cuido. 7 jul. 2011. Disponível em Disponível em http://www2.portoalegre.rs.gov.br/portal_pmpa_novo/default.php?p_noticia=143073&ARTIGO:+EU+CURTO+EU+CUIDO . Acesso em: 10 jun. 2015.
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). O projeto-piloto, inicialmente pensado para 13 bairros da cidade, proporcionaria à sua população o conforto de não mais precisar “guardar o lixo dentro de sua casa, podendo descartar seu lixo orgânico a qualquer hora do dia ou da noite” (Prefeitura de Porto Alegre, 2012PREFEITURA DE PORTO ALEGRE. DMLU. Automatização da coleta de lixo modernizou limpeza urbana. 21 jan. 2012. Disponível em Disponível em http://www2.portoalegre.rs.gov.br/dmlu/default.php?p_noticia=149079&AUTOMATIZACAO . Acesso em: 10 jan. 2015.
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). A estética da cidade também melhoraria: “principalmente nos finais de tarde, os sacos de lixo nas calçadas irão sumir. Três mil metros cúbicos de lixo, que equivalem a um edifício de dez andares, deixariam de ficar expostos à chuva e ao vento, ficariam fora do alcance dos animais, não seriam mais espalhados pelas ruas e deixariam de entupir bueiros e gerar alagamentos”, afirmava um dos responsáveis pela mudança. Também haveria progressos educativos: “A chegada dos contêineres para coleta de lixo orgânico à área central de Porto Alegre também reforçou o conceito de separação do lixo (orgânico e seco) e fez crescer a coleta seletiva, gerando emprego e renda média de um salário mínimo para cerca de 800 pessoas que trabalham nas 18 Unidades de Triagem” (Porto…, 2011PORTO Alegre implementa coleta de lixo automatizada. Correio do Povo, 12 jul. 2011. Disponível em Disponível em https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/geral/porto-alegre-implementa-coleta-de-lixo-automatizada-1.66898 . Acesso em: 10 set. 2018.
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).

“Que bom que não veria mais aquelas montanhas de sacos de lixo pela rua!”, pensou o cidadão porto-alegrense, quase ao mesmo tempo que sentia medo. Medo da mudança e medo das consequências que aquilo poderia trazer. “Seria o fim do caos do lixo? Fim dos ratos? O que se encontraria dentro dos containers além do lixo? O que poderia acontecer lá dentro?” Medo característico da modernidade que se espalha por todas as esquinas da cidade, todos os corpos que experimentam o frio na espinha a cada nova curva.

A novidade na cidade jamais poderia ter passado despercebida, por mais que a rotina atribulada do cidadão porto-alegrense o impedisse de prestar atenção em alguns detalhes que o cercavam. Ele observou os vizinhos levando seu lixo até o novo container da sua rua, o qual parecia ter sido muito bem planejado, já que todos eram abertos através de um pedal, evitando que se utilizassem as mãos em seu manuseio, prevenindo possíveis contaminações. Aparentemente, o simples mobiliário urbano não era um mero detalhe na cidade. Eles eram motivo de discussão, eram capa de todos os jornais, assunto do cafezinho do intervalo do trabalho à pauta de destaque do noticiário televisivo. Todos tinham que ter uma opinião e o dever de compartilhá-la: “Investimento em lixo? Cadê o investimento na saúde e na educação?” “Ótima iniciativa para nossa saúde, pois assim os ratos e as bactérias estarão longe!” “Esses containers são horríveis! Só tiram espaço de estacionamento para os carros ou da calçada para os pedestres!” “Eu achei superprático e higiênico.” “Aquele da esquina atrapalha a visibilidade e o trânsito!” “Bem melhor assim do que ver todos aqueles sacos amontoados nas calçadas.” “E o cheiro que vai ficar com esse monte de lixo junto? Quem vai limpar isso?” “Como assim só pro lixo orgânico? E o que eu faço com o lixo seco?” Eram diferentes opiniões e comentários que compunham o cenário nada calmo da capital.

Para além de containers de lixo: a contenção da cidade

A respeito da temática do mobiliário urbano, Fantini (2014)FANTINI, D. Desconstruções do invisível. Revista URBE: Cultura Visual Urbana e Contemporaneidade, Porto Alegre, n. 5, p. 28-34, 2014. atenta ao que chama de “design desagradável” ou “arquitetura hostil”, cada vez mais difundida na cidade. Ao invés de pinos pontiagudos instalados em degraus (herança da estética das fortalezas) que explicitamente declaram que ali não é um lugar para se estar, a autora diz que as cidades vêm buscando maneiras mais sutis de falar dessa não permissão de momentos de pausa ou descanso em meio a seu constante movimento. Pedras são colocadas em determinados locais como um recurso de paisagismo, mas que têm como função principal impedir o abrigo de moradores de rua. Divisórias são instaladas em bancos como apoio para os braços (mesmo que não haja encosto!), de forma a não permitir que se deite no assento.

Trata-se de maneiras quase invisíveis de manipular nosso comportamento e que impedem aberturas a possíveis negociações, pois encontramos um mobiliário urbano com uma armadura imóvel e instransponível. Há a invocação de certa arte que embeleza determinadas áreas, uma beleza estética que compõe ordens de assepsia e harmonia que visam expulsar aqueles com quem não se quer encontrar na cidade. Os muros de vidro também expressam esse desejo estético por uma apresentação mais leve e bonita dos imóveis calcados na ilusão da transparência. Passamos de prisões a aquários, afirma Mizoguchi (2009)MIZOGUCHI, D. H. Segmentaricidades: passagens do Leme ao Pontal. São Paulo: Plêiade, 2009..

A pesquisadora Sarah Kendzior (2014)KENDZIOR, S. Gentrificação: os perigos da economia urbana hipster. Arch Daily Brasil, 30 nov. 2014. Disponível em Disponível em http://www.archdaily.com.br/br/758003/gentrificacao-os-perigos-da-economia-urbana-hipster . Acesso em: 11 dez. 2014.
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também fez uma critica às gentrificações de alguns bairros considerados deteriorados ou empobrecidos, mas que, carregados de uma estética2 2 O conceito de estética aqui se refere a determinado “culto ao belo” que embasa tais projetos de remodelação de algumas áreas da cidade, oferecendo uma arquitetura padronizada e funcional de acordo com as premissas capitalistas. atrativa e nostálgica, estão sendo remodelados, estimulando a chegada de novos residentes com um diferente padrão social. Bairros historicamente associados às populações marginais tornam-se procurados e valorizados, alterando uma memória já construída desses locais e forçando a mudança de famílias para zonas mais pobres e distanciadas. A arte também tem papel nesse processo, pois às vezes é utilizada como instrumento dessa gentrificação em nome de “experiência[s] que convida[m] as pessoas a pensar sobre o espaço que elas enfrentam todos os dias” ou a “lutar com arte contra a deteriorização urbana” (Kendzior, 2014KENDZIOR, S. Gentrificação: os perigos da economia urbana hipster. Arch Daily Brasil, 30 nov. 2014. Disponível em Disponível em http://www.archdaily.com.br/br/758003/gentrificacao-os-perigos-da-economia-urbana-hipster . Acesso em: 11 dez. 2014.
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). Ela relata alguns projetos onde a arte é usada para esconder algumas realidades ou torná-la mais bonitas esteticamente e aceitáveis, criticando o fato de não haver uma real luta contra a deterioração urbana, apenas contra a capacidade daqueles que passam por esses lugares de observá-la. “Os gentrificadores focam na estética, não nas pessoas. Porque as pessoas, para eles, são a estética” (Kendzior, 2014KENDZIOR, S. Gentrificação: os perigos da economia urbana hipster. Arch Daily Brasil, 30 nov. 2014. Disponível em Disponível em http://www.archdaily.com.br/br/758003/gentrificacao-os-perigos-da-economia-urbana-hipster . Acesso em: 11 dez. 2014.
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). Em nome do belo, os espaços-pessoas ditam as regras daqueles que podem conviver em um mesmo espaço e com um mesmo tipo de pessoa.

Se há uma preocupação com a “beleza” de um bairro pautado na “estética da arte”, criando uma sensação de segurança e bem-estar nesses locais, é porque existe nas ruas uma invasão daqueles que não são desejados, aqueles que tornam explícito o mal-estar da sociedade, fazem lembrar a fome, o mau cheiro, a hipocrisia, o lixo. Algo que os shopping centers estão tendo que lidar frente ao fenômeno dos rolezinhos3 3 Rolezinho é o nome dado a pequenos encontros ou passeios em parque ou shopping centers, geralmente organizados por adolescentes e jovens, através de redes sociais ou celulares. Ganharam destaque na mídia brasileira devido a supostos delitos, tumultos e agressões cometidos por alguns participantes. que inundaram suas seguras e controladas galerias de ostentação ao consumo, tanto com o descontrole de passeios descomprometidos, como com a delinquência de uma certa juventude não desejada. Fecham-se as portas aos jovens da periferia e homens de terno ficam na guarda dessa fortaleza moderna.

Imbuído dessa ideia, Baptista (1999)BAPTISTA, L. A. A cidade dos sábios: reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999. traz a figura dos arquitetos e urbanistas, como outros autores de processos de produção de subjetividades. Tanto eles quanto os clássicos profissionais do espaço interno/privado - técnicos “psi” - escrevem formas de vida e forjam vidas micropoliticamente, moldam sonhos e desejos. Seja em kitnets-caixa-de-sapato ou em grandes shopping centers, os condomínios da classe média demonstram essas forças onde “a segurança e a privacidade caminham juntas com o apartheid” (Baptista, 1999, p. 38BAPTISTA, L. A. A cidade dos sábios: reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999.), produzindo segregações através de seus muros e barreiras que impedem que as diferentes subjetividades e classes sociais circulem. Solidificam-se identidades paranoicas, ascéticas, que desejam o luxo e a segurança do ambiente privado, onde o forasteiro não tem vez nem voz. Já a voz da televisão tem seu espaço, um altar, facilmente controlado por um só botão ao alcance da mão.

Fundamentado na livre escolha, o controle remoto instrumentaliza o desejo de uma individualidade sacralizada e infinita […] Essa moderna proposta de arquitetura e de subjetividade, sem ruas e esquinas, não se direciona para a praça pública ou para vizinhos, ela se assenta em inertes e solitárias formas de convivência, de frente para o mar e para a montanha. Próximo à natureza, esse projeto de morar investe, em suas linhas divisórias, na proteção e no cuidado. Fragilizado pelos riscos da violência urbana e pelas exigências de consumo, que solicita avidez a todo momento, o morador encontra, além de seus iguais, privacidade e tutela. Nos blocos de cimento armado encontramos um consumidor ansioso por segurança e conhecimento de si. (Baptista, 1999BAPTISTA, L. A. A cidade dos sábios: reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999., p. 38-39).

Arquitetos, designers, atores, padres, curandeiros, farmacêuticos, psicólogos, psiquiatras: todos oferecem seu conhecimento para esse homem medroso, com sede de consumo e fome de conhecimento de si. São diferentes discursos e receitas que prometem vidas alegres e tranquilas de maneira rápida, mas nem sempre barata, acessível e democrática. Drogas lícitas e ilícitas, condomínios, divãs, novelas e simpatias milagrosas se traduzem em novas narrativas homogeneizadoras de se viver. Aos modos de certos “amoladores de facas” da violência banalizada do contemporâneo, como refere Baptista (1999)BAPTISTA, L. A. A cidade dos sábios: reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999., especialistas da subjetividade e do bem-estar carregam a presença camuflada do ato genocida em suas práticas, pois retiram da vida suas cores, dores e amores, as possibilidades de experimentação e de criação coletiva. Fazem a vida perder seu caráter estético, de criação de modos singulares do existir, abrindo espaço ao controle, ao medo e ao ressentimento: especialistas na produção e garantia de uma “sobrevida”.

São discursos nem sempre explícitos que prometem vidas perfeitas, pessoas perfeitas para cidades perfeitas. Vidas anestesiadas que encontram eco em promessas de cidades completas e organizadas. Anseios por cidades-modelo que demonstram o quanto elas vêm ficando cada vez mais complexas e aquém do desejado. Mesmo quando silenciosa, vemos que a cidade nos diz das formas como devemos agir e ser dentro dos limites de suas fronteiras. Fronteiras que, às vezes, extrapolam aquelas traçadas nos mapas e ganham um caráter mais fluido, expresso em fluxos de forças que se intercambiam e se relacionam. Para além do plano das formas - as ruas, as calçadas, os prédios, a multidão -, a cidade também abarca planos de forças que se dão em modos de produzir saúde, de habitar, de transitar, de subjetivar-se… modos de vida. Modos de vida padronizados, homogeneizantes, planificados, compostos por forças que prometem conter as subjetividades e suas singularidades rebeldes, suas diferentes cores. As subjetividades tornam-se containers, como aqueles do lixo, pois devem abafar os gritos, dar conta da sujeira de toda uma sociedade, esconder o inevitável. O indesejável, a sujeira, o sofrimento, encontram seu espaço nos containers de lixo, acinzentando ainda mais a sobrevida dos bons cidadãos da cidade.

A cidade que escapa

Mas seriam essas as únicas narrativas possíveis de uma cidade? Extermínio aos ratos, ao lixo, à pobreza, aos “rolezinhos”, às subjetividades desviantes, ao caos? Ao olhar novamente para a rua através de sua janela, o cidadão-surpreso olha para os três containers da rua com estranhamento. Suas tampas estão abertas, deixando à vista tudo aquilo que se queria esconder. A cidade parece sempre escapar…

Entendendo a cidade como um território vivo, complexo e sempre em movimento, Massey (2008)MASSEY, D. Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008. traz uma “nova imaginação” sobre o espaço e o território, diferindo da concepção ocidental hegemônica que o entende como morto, estático, fixo, e/ou atemporal. Para ela, o espaço é produto de inter-relações e tem uma contemporaneidade dinâmica, uma abertura radical e heterogênica. Está sempre em construção e, portanto, aberto, inacabado, fruto de uma multiplicidade de possibilidades.

Baptista (1999BAPTISTA, L. A. A cidade dos sábios: reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999., p. 122) também aponta algumas questões a respeito do espaço/cidade:

A funcionalidade e o caráter expressivo são constantes em nossos discursos [área psi] sobre o espaço [… mas] uma outra dimensão nos é apresentada, isto é, a política, porém cabe aqui um certo cuidado quando o redimensionamos nesta direção. O sentido político do espaço não se justifica em localizá-lo como reflexo de infra-estruturas econômicas, ou efeito ideológico determinado historicamente. Proponho, por meio dessa advertência, sublinhar o caráter não-inerte, de reflexo ou efeito, em sua constituição, e sim caracterizá-lo como detonador de sentidos, subjetividades, modos de categorização do humano, entre outras ações. Em resumo, entendendo-o como dispositivo político, ressaltamos o caráter de movimento, de acionar práticas, de interferir promovendo ou dissipando conflitos.

“Por que aqueles containers estavam abertos?” - ainda indagava o curioso cidadão porto-alegrense, num misto de curiosidade e coragem que o levaram até a rua. Ele saiu da segurança de seu apartamento levando um saco do seu lixo orgânico, pronto para ser depositado no devido lugar. Ao se aproximar de um dos containers, percebeu que a tampa se mantinha aberta com a ajuda de um pedaço de madeira que servia de apoio. No chão estavam alguns montes de lixo agrupados, seguindo talvez, alguma lógica de organização que não fez sentido ao bom-cidadão num primeiro olhar. Apenas continuou sua caminhada desviando deles e sentindo seu mau cheiro característico. Ao erguer a sacola em direção ao container, foi tomado pelo medo: havia um homem lá dentro, dois olhos ameaçadores fitando-o. “Cuidado, moço! Não joga o lixo, não! É plástico, papel ou comida?”, perguntou o catador de lixo. O medo pareceu se transformar lentamente em culpa, enquanto os movimentos ficavam retardados e uma resposta demorava a aparecer.

Os containers haviam concentrado o lixo das pessoas, das casas, dos prédios, de forma que poucos respeitavam a separação entre o lixo seco e o lixo orgânico. Já que o lixo era pra ser escondido, tudo era depositado no mesmo lugar. Os catadores, atentos à nova lógica e querendo aproveitar a oportunidade de ganhar algum dinheiro com aquilo que ninguém mais queria, passaram a vasculhar o conteúdo daquelas grandes caixas nos mais diferentes horários. Porém, precisavam entrar dentro deles para que pudessem separar o que era de seu interesse.

Enquanto isso, as autoridades continuavam atentando a população a respeitar a separação de lixo, que insistia em ser misturada nos containers. Segundo elas, essa era a maneira de evitar que aparecessem mais catadores de lixo, dos quais a população teimava em reclamar, culpabilizando os containers pelo aumento de seu número. Era, aliás, uma reclamação que atualizava uma discussão antiga, contra as carroças que dificultavam o trânsito da cidade. Geralmente de tração animal e carregadas de lixo selecionado pelos mesmos catadores, as carroças dirigiam-se à região das ilhas do Guaíba, local onde se concentram muitos dos centros de coleta e separação de lixo destinados a reciclagem. O que antes atrapalhava o trânsito, agora atrapalhava a visão, pregava sustos na frente de casa, gerava culpa e lembrava das desigualdades de uma cidade, que agora parecia pouco padronizada. Os containers denunciavam aquilo que ninguém queria ver, evidenciavam um trabalho que ninguém queria fazer.

Porém, eles também reservaram surpresas aos próprios catadores. Durante uma noite, como tantos outros que entram nos containers para realizar a separação do lixo, uma catadora percebeu estar suja de sangue. Assustada e achando que pudesse ter se machucado com algum objeto afiado em meio aos sacos plásticos, levou um susto ainda maior quando encontrou partes de um corpo ensanguentado envolto nas sacolas. Um jovem havia sido esquartejado aquela noite e as partes do seu corpo despejadas no container, como qualquer outro objeto indesejável (Quintana, 2014QUINTANA, P. Corpo é encontrado esquartejado dentro de contêiner em Porto Alegre. GaúchaZH, 31 mar. 2014. Disponível em: Disponível em: http://gaucha.clicrbs.com.br/rs/noticia-aberta/corpo-e-encontrado-esquartejado-dentro-de-conteiner-em-porto-alegre-91682.html . Acesso em: 11 jan. 2015.
http://gaucha.clicrbs.com.br/rs/noticia-...
).

Junto aos containers, também vieram modernos caminhões especialmente para a coleta automatizada. Foi no momento em que o caminhão suspendia um dos containers para despejar seu conteúdo na boleia que um dos motoristas percebeu, através das seis câmeras com que os caminhões são equipados, a movimentação de um homem que tentava desesperadamente sair do seu interior, antes que caísse junto aos sacos de lixo e fosse esmagado em meio às engrenagens de compactação do lixo. O morador de rua havia visto no container um espaço seguro e aquecido para seu sono frente ao frio do inverno, até ser abruptamente acordado pela movimentação de seu leito (Badowsky, 2013BADOWSKY, S. Morador de rua que dormia dentro de contêiner escapa de cair dentro do caminhão de coleta. GaúchaZH, 16 maio 2013. Disponível em: Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/noticia/2013/05/morador-de-rua-que-dormia-dentro-de-conteiner-escapa-de-cair-dentro-do-caminhao-de-coleta-cj5v88q0 m00uxxbj0s7oogyxn.html . Acesso em: 10 set. 2018.
https://gauchazh.clicrbs.com.br/noticia/...
).

De cenário ou coadjuvantes nos novos sustos do cotidiano da cidade, os containers também se fizeram presentes nas traquinagens dos jovens da cidade. Em uma rua não tão movimentada e afastada do centro, alguns jovens prenderam um container com uma corrente junto ao carro estacionado ao seu lado. Não se sabe se pretendiam ver o container ser arrastado pela rua por um motorista desatento ou impedir que o motorista saísse de sua vaga, já que ficaria preso ao novo “atracadouro”. Antes de qualquer situação acontecer, alguns vizinhos perceberam a brincadeira e puderam avisar às autoridades do ocorrido, libertando o carro e o seu pretenso reboque.

Os containers não poderiam também deixar de ser alvo das pichações que compõem a paisagem de qualquer cidade. Porém, as letras, palavras e rabiscos em preto, características dos pichos, contrastando com o fundo cinza dos containers, foram diretamente atacadas por um grupo de artistas que coloriram alguns dos containers do centro da cidade. Convidados pela prefeitura para decorá-los com temas que abordassem o meio ambiente, o projeto fez parte de uma ação educativa para conscientizar a população contra a depredação do mobiliário urbano. Os primeiros 20 containers decorados foram espalhados pelos bairros da cidade considerados mais afetados por esse problema, substituindo aqueles mais depredados e desgastados (Becker, 2014BECKER, M. Porto Alegre usa grafite para evitar vandalismo em contêineres. Terra, 10 jun. 2014. Disponível em: Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/cidades/porto-alegre-usa-grafite-para-evitar-vandalismo-em-conteineres,2ea4bf137a786410VgnVCM5000009ccceb0aRCRD.html . Acesso em: 17 jun. 2015.
http://noticias.terra.com.br/brasil/cida...
).

Maior profanação dos containers talvez tenha ocorrido durante as manifestações de julho de 2013, onde cerca de 50 deles espalhados no centro da cidade foram queimados (Manifestantes…, 2013MANIFESTANTES queimam mais de 50 contêineres em Porto Alegre. G1 RS, 17 jun. 2013. Disponível em: Disponível em: http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2013/06/manifestantes-queimam-mais-de-50-conteineres-em-porto-alegre.html . Acesso em: 17 jun. 2015.
http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul...
). Alvo da ira dos manifestantes ou ferramentas de reivindicação, os objetos presenciaram os embates ocorridos nas ruas de Porto Alegre, enquanto milhões de “cidadãos de bem” assustados assistiam pela televisão à revolta que tomava conta das ruas da cidade e do país. Outros containers serviam de barreira de segurança para cidadãos-manifestantes que fugiam da violência, das balas de borracha e do gás lacrimogêneo que a polícia utilizava na intenção de dispersar a multidão.

Para além de concentrar e organizar o lixo da cidade, portanto, os containers transformaram a paisagem e trouxeram à tona dilemas urbanos, denunciaram tantos outros lixos que na grande maioria das vezes não querem ser olhados. De mero mobiliário urbano, puderam corporificar muitas das forças invisíveis da urbe que denunciam esse território vivo e carregado de conflitos. Como lembra Baptista (1999BAPTISTA, L. A. A cidade dos sábios: reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999., p. 23):

As cidades de nossos dias, assim como as do passado, são territórios de fecundos conflitos, experimentações, lugar onde se produz a face do diverso, do estranho, do familiar, do estrangeiro. Local ao mesmo tempo de fabricação de práticas para acolhê-los, dar corpo às suas faces ou dissipá-los.

O autor resgata um olhar diverso à imagem da cidade massificadora e totalizadora, apontando outras forças capazes de quebrar alguns fluxos mais duros, carregadas de potencial heterogenético e que evidenciam uma cidade em movimento, em permanente construção e capaz de se reinventar, gerando com isso, também, novos modos de subjetivação.

É nesse sentido que Guattari (1992)GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992. afirma que, na contemporaneidade, a subjetividade deve ser enfatizada pelos seus modos de produção que seguem uma lógica capitalista, na qual as cidades estão mergulhadas, que, por sua vez, tende a produzir formas dominantes e universalizantes de ver o mundo. O autor entende que essa produção se dá de forma maquínica, ou seja, por agenciamentos coletivos de enunciação, que podem trabalhar tanto para um lado de criação e invenção de novos mundos quanto para um lado de homogeneização, ou o que chamou de “mass-midialização embrutecedora” (Guattari, 1992GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992., p. 15-16). Entende a subjetividade, então, como “o conjunto das condições que torna possível que instâncias individuais e/ou coletivas estejam em posição de emergir como território existencial auto-referencial, em adjacência ou em relação de delimitação com uma alteridade ela mesma subjetiva” (Guattari, 1992GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992., p. 19).

O alcance dos espaços construídos vai então bem além de suas estruturas visíveis e funcionais. São essencialmente máquinas, máquinas de sentido, de sensação, máquinas abstratas […], máquinas portadoras de universos incorporais que não são, todavia, Universais, mas que podem trabalhar tanto no sentido de um esmagamento uniformizador, quanto no de uma re-singularização liberadora da subjetividade individual e coletiva. (Guattari, 1992GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992., p. 158).

Guattari (1992)GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992. tomará as cidades então como megamáquinas, dotadas de engrenagens urbanísticas e arquiteturais de grande porte, mas também de subconjuntos menores (a rua, o prédio, a janela, o corredor…), os quais devem todos ser tratados como componentes maquínicos, isto é, produtores de subjetividades. A cidade é uma megamáquina complexa, que beira o caos frente aos campos virtuais que se desdobram a partir das interações entre os corpos e os espaços. Afastando-se de um paradigma científico e partindo de um paradigma estético, o autor postula que, através dos implícitos agenciamentos de enunciação que se dão no caos urbano, abrem-se brechas para se pensar a complexidade da urbe. Arquitetos e urbanistas, como proponentes de formas, assim como qualquer outro profissional dos mais diferentes campos disciplinares - numa perspectiva transdisciplinar - devem buscar captar esses agenciamentos ocultos e “apreender e cartografar essas produções de subjetividade” (Guattari, 1992GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992., p. 161) por uma maneira sensível, fazendo relações com os territórios existenciais, com o tempo, com os devires, com o corpo.

A estratégia de padronização da coleta de lixo serve como um exemplo de como esse “componente maquínico” interviu nos fluxos da cidade, na velocidade do trânsito, na organização e disputa dos espaços, nas cores da rua, escapando das lógicas até então “acinzentantes” e massificantes da vida urbana. Containers que foram implantados como instrumentos de uma política higienista, atualizada na forma de discurso ecologicamente correto, subvertem suas missões e tornam-se instrumento de contestação. Apontam, com isso, para a existência de uma cidade viva, de um território sempre em construção, que consegue fugir às regras, escapar aos padrões, produzir brechas na homogeneização subjetiva que a cidade da biopolítica insiste em afirmar.

Mas não são só os containers que chamam a atenção do cidadão de Porto Alegre. Outras mudanças, que muitas vezes passavam despercebidas de seus olhos acostumados ao cinza, começam a surpreendê-lo em seu mais corriqueiro trajeto. Às vezes, ele é fisgado por pequenos detalhes, uma sensação de estranhamento ou pela multiplicidade do colorido que produz diferenças na paisagem. Questiona-se de onde surgem pequenas intervenções que o fazem virar o pescoço e parar, encontrar outras pessoas, visitar outros lugares em outros horários até então não pensados. Mudanças às vezes efêmeras, outras barulhentas, que parecem encontrar impulso nas aparentes durezas da urbe e intensificar a produção de diferença, de movimento, de criação. O cidadão de Porto Alegre se questiona: o que querem essas intervenções? Quais seus efeitos em meio aos modos de subjetivação contemporâneos? São algumas dessas questões que o levam a querer pesquisar. De cidadão curioso, ele passa a ser um pesquisador-errante, que através de suas andanças pela cidade tece narrativas acerca das intervenções urbanas e os efeitos destas que atravessam seu corpo.

Intervenções que profanam

Uma árvore envolta em uma rede colorida de tricô. Pinturas e frases conexas ou desconexas num muro esquecido, na fachada de uma loja, nas vigas de sustentação do viaduto ou numa parede qualquer da cidade. Cartazes, lambe-lambes, adesivos. Um novo chafariz patrocinado por uma multinacional. Um novo viaduto que requer mudanças nos fluxos e nas formas de habitar daquele espaço da cidade. Um acidente de trânsito. Uma nova lei. Uma mulher nua correndo em um parque público. Polainas, corações ou colete salva-vidas em uma antiga estátua no meio da praça. Uma janela clandestina na medianeira de um prédio. O cidadão-pesquisador se indaga mais uma vez: “o que define uma intervenção urbana?”.

Se formos levar ao pé da letra esse termo, cairemos no risco de afirmar que qualquer movimento, qualquer alteração, qualquer ressonância de forças na cidade é uma intervenção urbana. E talvez seja, já que a cidade, tomada em sua complexidade, compõe-se de “fixos e fluxos”,4 4 Tomamos aqui emprestada a definição proposta pela professora Dra. Liane B. Righi (2010) às Redes de Cuidado em Saúde. forças em constantes agenciamentos e virtualidades que se atualizam a cada encontro e desencontro, ora modificando, ora ordenando as rotas dos acontecimentos. Novamente, estamos falando do caos e sua multiplicidade de poder interventivo, no qual um exército macropolítico parece ser sempre posto em combate a fim de controlar a cidade desgovernada, que, por sua vez, teima em escapar.

Entretanto, o micropolítico interpela as formas estabelecidas de se fazer política na cidade e os especialismos perdem sua aura intocável para pequenas intervenções anônimas, efêmeras, não tradicionais ou não autorizadas. Intervenções urbanas que querem percorrer outros caminhos, propor outras afetações, construir outras narrativas. Os lugares sacralizados de saber/poder, conforme problematiza Agamben (2007)AGAMBEN, G. Profanações. São Paulo: Boitempo, 2007., são profanados, almejando trazer de volta aos homens comuns aquilo que foi divinizado e separado de um uso comum, sem querer abolir ou suprimir esses lugares, mas aprender a fazer um novo uso deles, brincar com eles e transformá-los, onde qualquer um pode propor mudanças e intervir.

A arte urbana e o artivismo podem ser exemplos dessas vozes que materializam alguns tensionamentos resistentes às lógicas hegemônicas da urbe. Em um primeiro momento, as intervenções buscam mexer com esses fixos das cidades que, por sua vez, alteram seus fluxos. Intervenções que agem num plano tridimensional, brincam, usam, profanam os signos, os pontos, as marcas da cidade. Além de fazerem críticas e denúncias, ou manifestar descontentamento, podem se propor a resgatar significados esquecidos de monumentos ou ocupar de diferentes formas espaços abandonados, trazer um estranhamento para aquilo que sempre esteve ali, dando uma nova roupagem, uma nova chance de ser percebido, ser contemplado, estranhado, usado, inventado.

Algumas dessas intervenções têm grandes proporções, são impossíveis de não serem notadas, têm longa duração; outras são menores, poéticas, efêmeras; outras ainda têm permissão das “autoridades competentes” para que aconteçam, enquanto algumas encontram sua potência na subversão e não esperam uma autorização. Grupos organizados em redes sociais organizam pedaladas mensais pelas ruas da cidade, deixam bicicletas presas a postes com o slogan “Mais amor, menos motor”.5 5 O movimento Massa Critica difunde o uso da bicicleta como o meio de transporte mais democrático, ágil, saudável e sustentável. Está em mais de 300 cidades espalhadas pelo mundo. Em fevereiro de 2011, o grupo ficou em maior evidencia em Porto Alegre devido a um atropelamento de ciclistas ocorrido durante um de seus eventos. Mais informações sobre o grupo estão disponíveis no site https://massacriticapoa.wordpress.com/. ONGs pintam no asfalto borboletas para lembrar as mortes e os perigos do trânsito.6 6 O projeto Vida Urgente está vinculado à Fundação Thiago de Moraes Gonzaga e tem como objetivo o desenvolvimento de programas educativos, culturais e informativos direcionados a crianças, adolescentes, jovens e adultos com o intuito de desenvolver a humanização no trânsito e a valorização da vida. Mais informações estão disponíveis no site http://www.vidaurgente.org.br/site/index.php. Outros grupos organizam serenatas7 7 O evento Serenata Iluminada já teve algumas edições realizadas no parque Farroupilha e no parque Moinhos de Vento, em Porto Alegre. Integra o projeto PortoAlegre.cc que é uma plataforma digital, baseada no conceito de wikicidade, que tem por objetivo permitir a discussão da história, a realidade e o futuro de territórios específicos. Lançado em 24 de março de 2011, o projeto nasceu de uma parceria entre a Universidade do Vale do Rio dos Sinos, a Prefeitura de Porto Alegre e a Parceiros Voluntários. Mais informações estão disponíveis na página do Facebook: https://www.facebook.com/SerenataIluminada. e sessões de cinema ao ar livre8 8 O coletivo RUA (Rastro Urbano de Amor) promoveu no ano de 2012 um evento de ocupação do Largo dos Açorianos, uma aérea considerada abandonada. O largo abriga dois monumentos: a Ponte de Pedra e o Monumento aos Açorianos. Mais informações a respeito desse coletivo podem ser encontradas na página do Facebook: https://www.facebook.com/RUApoa. em parques e praças esquecidas ou de “reputação perigosa”. Ou ainda intervêm nas placas de trânsito, convidando corpos-motoristas, corpos-pedestres e corpos-pesquisadores a PARAR e pensar, cantar, amar…

São inúmeros movimentos e grupos que têm surgido com o intuito de repensar a cidade e pôr em prática ações que possam melhorar a qualidade de vida urbana, utilizando-se muitas vezes da internet para organização e gestão participativa desses projetos. Parecem seguir um mesmo curso de movimentos macropolíticos de resistência relacionados ao tema dos espaços urbanos, sendo o Occupy9 9 Os movimentos Occupy tiveram sua origem no Occupy Wall Street, em 2011, movimento de protesto contra a desigualdade econômica e social, a corrupção e a influência indevida de empresas do setor financeiro no governo dos Estados Unidos da América. Teve força juntamente com a onda de movimentos árabes que lutavam pela democracia (a Primavera Árabe). um dos mais conhecidos mundialmente por ter ganhado mais forca e visibilidade por suas ações no ano de 2011.

As ideias de “colaboração em rede” e “inteligência colaborativa” também parecem ser um ponto em comum entre diversos atores que promovem intervenções urbanas. Sejam propostas e movimentos ciberativistas ou empresas guiadas por tecnologias de inovação social, criatividade e corresponsabilização, a rede mundial de computadores torna-se palco para fóruns, encontros e planejamento de intervenções urbanas que ganham corpo no ambiente off-line. As ferramentas digitais tornam-se essenciais nesse processo de construção das intervenções, como também para a divulgação das ações e compartilhamento de seus efeitos (Martins, 2013MARTINS, F. G. Colaboração, (ciber)ativismo e subjetividade. 2013. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Centro de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2013.).

Algumas dessas intervenções urbanas parecem também encontrar ressonância em movimentos de contracultura como o culture jamming, que através do ativismo e da arte urbana querem promover uma resistência à lógica do consumo, atacando principalmente as estratégias do marketing e da propaganda que inundam os espaços públicos sem um “consentimento” da população. Seriam como uma resposta do público frente às imagens persuasivas que nunca pediram para ver. Produzem, assim, alterações em slogans, inserções de mensagens, ataques de tinta ou pichações em outdoors e outras peças publicitárias, elaboração e distribuição de material publicitário parodiado, usando-se da própria mídia para subvertê-la (Diniz, 2008DINIZ, J. R. Culture Jamming: ativismo e contra-hegemonia. Caligrama: Linguagem e Mídia, São Paulo, v. 4, n. 1, 2008. Disponível em: Disponível em: http://www.revistas.usp.br/caligrama/article/view/68127/70685 . Acesso em: 30 nov. 2014.
http://www.revistas.usp.br/caligrama/art...
).

Mazetti (2006)MAZETTI, H. M. Entre o afetivo e o ideológico: as intervenções urbanas como políticas pós-modernas. Revista ECO-PÓS, v. 9, n. 2, p. 123-138, ago./dez. 2006. aponta que tais atividades não buscam destruir ou interromper os canais de comunicação dominantes, mas provocar ruídos nas mensagens levadas por eles. O humor torna-se um grande aliado nessa tarefa, pois ressalta um elemento lúdico como potência criadora, além de servir como um eficaz chamariz ao público. Para o autor, essas intervenções urbanas colocam-se de maneira crítica na sociedade, e, inspiradas por movimentos artísticos, buscam unir arte e cotidiano, transformando signos familiares em pontos de interrogação. Tais atos de desobediência civil, através das intervenções ilícitas, forçam uma politização do cotidiano, em que cartazes, placas, outdoors e muros se renovam como um campo de trocas simbólicas.

A intervenção efêmera

O trabalho do grupo/coletivo Poro - Intervenções urbanas e ações efêmeras10 10 Mais informações sobre o Poro - Intervenções urbanas e ações efêmeras podem ser encontradas no site http://poro.redezero.org/; um compilado de algumas de suas ações está disponível em vídeo (Poro…, 2010). pode ser um exemplo de trabalho artístico, de intervenção, ou de ainda de artivismo, que se preocupa com a ressensibilização dos espaços urbanos invisíveis a partir de ações que apontem sutilezas da cidade, refletindo sobre possibilidades de relação entre espaços públicos e espaços institucionais, promovendo uma ocupação poética dos espaços. Em seu site trazem o seguinte texto, em que transparecem um pouco mais suas pretensões:

Intervenções são quase sempre efêmeras. Duram o tempo de uma panfletagem no centro da cidade ou o tempo de uma folha de ouro cair de uma árvore. Duram o tempo do deslocamento do ritmo cotidiano para um ritmo poético, questionador. É possível re-sensibilizar o espaço urbano? Uma intervenção pode durar o tempo em que a imagem-provocada ficar na memória de quem a viu. Ou o tempo enquanto as histórias de seus desdobramentos forem contadas. Quantas imagens uma intervenção pode gerar? (Poro, 2002PORO. Apresentação. 22 fev. 2002. Disponível em: Disponível em: http://poro.redezero.org/apresentacao/ . Acesso em: 30 nov. 2014.
http://poro.redezero.org/apresentacao/...
).

Ao comentar sobre as intervenções urbanas efêmeras, Fantini (2012FANTINI, D. Tchau, tchau, Belo horizonte. Revista URBE: Cultura Visual Urbana e Contemporaneidade, Porto Alegre, n. 4, p. 12-19, 2012., p. 12) diz que elas “podem não durar na paisagem, mas têm potência para se impregnar na memória de forma poética”. Dessa forma, o efêmero é transposto a um campo de intensidades em que ele se faz “força invisível que torna possível o devir” (Mesquita, V., 2012MESQUITA, V. O tempo nunca vem para permanecer. Revista URBE: Cultura Visual Urbana e Contemporaneidade, Porto Alegre, n. 4, p. 34-37, 2012., p. 38), possibilitando um outro jeito de viver a cidade, de praticá-la em um outro tempo que permita transparecer novas narrativas, ganhar relevância e ocupar espaços. Difere-se, assim, da noção de um efêmero preso ao momentâneo, facilmente igualado ao do consumo descartável e do achatamento do tempo característicos da contemporaneidade. Portanto, tais intervenções poéticas conseguem colocar outro peso no cotidiano, encher o tempo de inquietações, pôr o senso em crítica (Mesquita, V., 2012MESQUITA, V. O tempo nunca vem para permanecer. Revista URBE: Cultura Visual Urbana e Contemporaneidade, Porto Alegre, n. 4, p. 34-37, 2012.).

A questão da autoria nessas intervenções também tem suas peculiaridades, ou melhor, seu esquecimento. Seus proponentes dizem que o lugar da autoria se perde nas ruas da cidade, convidando o público a ser coautor dos trabalhos. Não há uma preocupação com a originalidade ou proteção das obras, mas o contrário. Estão na rua para serem sujadas pelo urbano, redesenhadas, contaminadas, copiadas, apagadas.11 11 Informação verbal retirada de uma série sobre arte urbana produzida pelo canal Arte1. Autoria diluída que também objetiva garantir a eficácia das intervenções no âmbito do mercado cultural, em que o trabalho anônimo ou a criação de pseudônimos coletivos busca criticar o “culto modernista do artista individual e de sua separação social, suprimindo a contemplação passiva e estritamente espetacular de uma obra” (Mesquita, A., 2002MESQUITA, A. Arte-ativismo: interferência, coletivismo e transversalidade. Rizoma.net: Artefato, p. 96-104, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
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, p. 98). Como principal expoente desse tipo de arte, as cidades viram as pichações e os grafites tomarem suas ruas como se fossem um organismo vivo e independente. De ação transgressora, com caráter de protesto, passaram de pequenas intervenções efêmeras ao valorizado e reconhecido patamar da arte de rua, mesmo que, para alguns, ainda sejam vistas como um incômodo e vandalismo.

Como exemplo de pichação que ganhou não só memória, mas tantos outros corpos nas ruas de Porto Alegre, “Toniolo” é a palavra que se destaca por sua efemeridade transformada em intensidade. Palavra que o pesquisador-errante de Porto Alegre encontrava constantemente nas paredes, nos viadutos, no chão da cidade, estampada em adesivos e “santinhos” de protesto ou cartazes de rua. Visto como lenda urbana devido à proporção que ganhou, já que sua marca se transformou em um fantasma que confunde o imaginário social da cidade, cidadãos e autoridades ainda se surpreendem quando descobrem que seu autor está vivo.

Ex-policial civil aposentado, Sergio José Toniolo, hoje em torno dos 70 anos, começou a pichar seu nome na cidade como forma de liberdade de expressão durante a ditadura militar. Pichava com hora marcada e anunciada, o que lhe rendeu algumas apreensões e uma internação no Hospital Psiquiátrico São Pedro sob o diagnóstico de esquizofrenia paranoide. Mesmo recluso, sua “assinatura” propagou-se pela cidade, escapando de suas mãos. Na década de 1990, enfrentou um processo da Prefeitura composto de um dossiê com fotos de suas pichações espalhadas pela cidade. O pichador compareceu à audiência, levando consigo também um dossiê contendo fotos que mostravam o nome do então prefeito, Tarso Genro, estampado nas propagandas eleitorais que invadiam os muros e ruas da capital.12 12 Informações retiradas do documentário Quem é Toniolo? (2005).

Mais uma história curiosa ao pesquisador-errante de Porto Alegre que se perguntava o quanto as intervenções urbanas, mesmo efêmeras, tinham potência sobre a cidade. Operando como um vírus, na contramão da assepsia, Cocchiarale (2002)COCCHIARALE, F. A (outra) arte contemporânea brasileira: intervenções urbanas micropolíticas. Rizoma.net: Artefato, p. 12-20, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
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diz que as intervenções urbanas introduzem no corpo da cidade estranhezas e pontos de descontrole que, mesmo por instantes, causam panes e curto-circuitos em sistemas já codificados da urbe. Será que as intervenções urbanas conseguem propor-nos novas formas de habitar a cidade?

Intervenção-arte e arte-intervenção

Eduardo Srur (2012SRUR, E. Manual de intervenção urbana. São Paulo: Bei Comunicação, 2012., p. 7), artista brasileiro conhecido por realizar intervenções urbanas principalmente na cidade de São Paulo, define suas obras como uma construção de ferramentas e ações que possibilitam um “engajamento diante da experiência de vida urbana no que ela oferece como expansão ou como limite, ao transformar a imaginação de seus habitantes… e a natureza”. Em uma entrevista, o artista diz fazer da cidade a tela para suas obras, no intuito de “criar símbolos que quebram a rotina a cidade, convidando e provocando o espectador a pensar junto com ele” (Eduardo…, 2014EDUARDO Srur é um artista visual conhecido por suas intervenções urbanas. Programa do Jô, 16 set. 2014. Disponível em: Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/3634475/ . Aceso em: 10 set. 2018.
https://globoplay.globo.com/v/3634475/...
).

Debruçando-se sobre as intervenções e sua relação com as artes, Giora (2014)GIORA, T. Em trânsito: o corpo e as intervenções no espaço da percepção estabelecendo um território comum entre Arte e Arquitetura. AusArt: Journal for Research in Art, v. 2, n. 1, p. 273-283, June 2014. diz que a arte, nesses casos, é convocada a desestabilizar os lugares cotidianos através de uma produção de imagens que excitam a percepção e provocam incertezas. Elas podem ainda ocupar vazios perceptivos que se dão entre corpos e ambientes, provocando alterações que dão maior visibilidade aos espaços e criam “um distúrbio no andar desatendo do cotidiano” (Giora, 2014GIORA, T. Em trânsito: o corpo e as intervenções no espaço da percepção estabelecendo um território comum entre Arte e Arquitetura. AusArt: Journal for Research in Art, v. 2, n. 1, p. 273-283, June 2014., p. 280), que reverbera intensidades renovadoras na percepção subjetiva dos indivíduos. Nesse contexto é que ficam explícitas as críticas à qualidade das interações entre homem e espaço, que são reflexos de uma “arquitetura funcionalista e padronizada, que ajuda a compor um ambiente rarefeito, pobre de referências à linguagem, às culturas locais ou à sensibilidade do indivíduo” (Giora, 2014GIORA, T. Em trânsito: o corpo e as intervenções no espaço da percepção estabelecendo um território comum entre Arte e Arquitetura. AusArt: Journal for Research in Art, v. 2, n. 1, p. 273-283, June 2014., p. 280). As intervenções urbanas se caracterizam então por serem

intervenções artísticas que buscam conduzir o público a uma apropriação do mundo pelos sentidos, tendo o corpo como receptor da tridimensionalidade, das texturas, peso, cheiro. São intervenções que jogam com posição do corpo do observador e sugerem uma tomada de consciência em relação aos pontos de vista e aos objetos instalados de forma a interagir com a arquitetura. Através de movimentos em meio e ao redor do espaço da intervenção, o corpo se apropria de um lugar habitado por coisas, desenhos, linhas e atmosfera, incluindo a si próprio neste campo emaranhado de relações. (Giora, 2014GIORA, T. Em trânsito: o corpo e as intervenções no espaço da percepção estabelecendo um território comum entre Arte e Arquitetura. AusArt: Journal for Research in Art, v. 2, n. 1, p. 273-283, June 2014., p. 275).

É nesse sentido que o autor ataca o que chama de “arte de retina”,13 13 O autor utiliza-se do termo do arquiteto finlandês Juhani Pallasma, conforme Giora (2014). ao considerar que é nisso que a arquitetura tem se transformado, pois está focada apenas em projetar imagens para um consumo imediato que achata a própria arquitetura e afasta a experiência de se estar no mundo. Ao invés de espectadores distanciados, julga que as intervenções urbanas conseguem retomar o significado dos espaços e sua relação com o corpo, até então pulverizado na experiência artística, focada apenas no sentido da visão (Giora, 2014GIORA, T. Em trânsito: o corpo e as intervenções no espaço da percepção estabelecendo um território comum entre Arte e Arquitetura. AusArt: Journal for Research in Art, v. 2, n. 1, p. 273-283, June 2014.).

Pelbart (2013)PELBART, P. P. O avesso do niilismo: cartografias do esgotamento. São Paulo: n-1 edições, 2013. busca em Rancière (2008)RANCIÈRE, J. Le spectateur emancipe. Paris: La fabrique, 2008. uma forma de descrever esses trabalhos artísticos que têm como objetivo uma “modificação das balizas do que é visível e enunciável, de fazer ver aquilo que não era visto, de fazer ver de outra maneira aquilo que era visto muito comodamente, de colocar em relação aquilo que não o era” (Pelbart, 2013PELBART, P. P. O avesso do niilismo: cartografias do esgotamento. São Paulo: n-1 edições, 2013., p. 240). Assim, eles podem produzir rupturas em um plano anteriormente mais estável, modificando percepções, afetos, a dinâmica dos ritmos, mesclando escalas, criando dissensos e alterado as coordenadas do representável e configurando uma nova paisagem do possível. Seria essa, inclusive, a função da ficção, que não vem opor-se ao real, mas almeja conseguir operar heterogeneidades.

O autor ressalta ainda, sustentado em Deleuze, que “nas artes, tanto em pintura como em música, não se trata de reproduzir ou inventar formas, mas de captar forças” (Pelbart, 1989PELBART, P. P. Da clausura do fora ao fora da clausura: loucura e desrazão. São Paulo: Brasiliense, 1989., p. 103), e se atém a esse campo de forças invisíveis na cidade e às formas como as artes podem torná-las explícitas e mais sensíveis ao corpo:

A tarefa da pintura é definida como a tentativa de tornar visíveis forças invisíveis - “não reproduzir o visível, mas tornar visível”, diria Klee - e a da música de tornar sonoras forças insonoras. Quais forças? Por exemplo, o Tempo, que é invisível e insonoro. Ou a pressão, a inércia, o peso, a atração, a gravitação, a germinação, ou o grito e o som para a pintura, e a cor para a música. Ou, no caso do pintor Francis Bacon que Deleuze analisa, a dilatação, a contração, o achatamento, o esticamento que se exercem sobre uma cabeça imóvel, deformada. Não se trata, aí, de mostrar a decomposição dos elementos, nem a transformação da forma, mas os efeitos das forças diversas sobre um mesmo corpo desfigurado. Desfigurado, aqui, significa: que deixa de ser figurativo, de figurar, de representar um objeto, de narrar uma história, de ilustrar uma situação, para liberar uma Figura (Figura é um conjunto simultâneo de formas) que seja um fato, a captação de uma força. (Pelbart, 1989PELBART, P. P. Da clausura do fora ao fora da clausura: loucura e desrazão. São Paulo: Brasiliense, 1989., p. 103-104).

Para Pelbart, seguindo a questão que a estética herda da filosofia trágica, a arte teria a potência de marcar o corpo visível com forças invisíveis, de onde se poderia supor que a captação das forças em um campo sensível estaria diretamente relacionada à potência de uma intervenção artística. Como na sequência o filósofo nos explica:

Van Gogh teria inventado a “força do girassol”. […] Mesmo quando essa força é a morte, ao torná-la sensação pictórica, torna-se raio intenso, poder de riso da vida, dirá Deleuze. O horror vira vida, a abjeção, esplendor. O pessimismo cerebral torna-se otimismo nervoso. É que, embora a força não seja sensação, ela chega a nós como tal. A sensação é a tradução pictórica (através de todos seus elementos) da força. (Pelbart, 1989PELBART, P. P. Da clausura do fora ao fora da clausura: loucura e desrazão. São Paulo: Brasiliense, 1989., p. 103-104).

A intervenção, assim, ganha outro caráter: se faz presente, dispara e constitui processos, não é excluída como uma “variável-interveniente”, a qual a ciência tradicional sempre se ocupou em isolar. Pelo contrário, aqui ela se torna protagonista, voltada para a produção de acontecimentos. Intervenção que carrega em sua etimologia não só o sentido de uma intromissão violenta, como às vezes pode ser compreendida, mas que resgata um outro sentido contido no interventio que contempla a ideia de um “vir entre”, “interpor-se”, como uma espontaneidade rebelde (Ardoíno, 1987ARDOÍNO, J. La intervención: imaginario del cambio o cambio de lo imaginario. In: GUATTARI, F. et al. (org.). La intervención institucional. México: Plaza y Valdes, 1987. p. 13-42.; Paulon, 2005PAULON, S. M. A análise de implicação como ferramenta na pesquisa-intervenção. Psicologia e Sociedade, Porto Alegre, v. 17, n. 3, p. 17-23, set./dez. 2005.), uma abertura ao improviso.

Imbuídas de tal caráter interventivo, Mazetti (2006)MAZETTI, H. M. Entre o afetivo e o ideológico: as intervenções urbanas como políticas pós-modernas. Revista ECO-PÓS, v. 9, n. 2, p. 123-138, ago./dez. 2006. vê as intervenções urbanas como “políticas pós-modernas”. Apoiado nas ideias de Best e Kellner [s.d.]BEST, S.; KELLNER, D. Postmodern politics and the battle for the future. [s.d.]. Disponível em: Disponível em: http://www.uta.edu/huma/illuminations/kell28.htm . Acesso em: 10 fev. 2016.
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, diz que essa nova forma de ativismo surge a partir da fragmentação das grandes lutas políticas na década de 1960, fomentando, assim, a micropolítica em detrimento da macropolítica. Isso porque as intervenções urbanas possuem características de contestação sociocultural que intenta acontecer no “dia a dia, em uma politização do cotidiano e do espaço público”, afastando-se de uma política mais institucional, “para enfatizar a cultura e a reprodução social como terreno de combate… na busca por produzir novas maneiras de ver, sentir, perceber, ser e estar no mundo” (Mazetti, 2006MAZETTI, H. M. Entre o afetivo e o ideológico: as intervenções urbanas como políticas pós-modernas. Revista ECO-PÓS, v. 9, n. 2, p. 123-138, ago./dez. 2006., p. 123). O autor destaca ainda que, no Brasil, as intervenções urbanas se dão “nos interstícios das práticas tradicionais da cultura instituída, em ações com um viés mais low tech” (Rosas apud Mazetti, 2006MAZETTI, H. M. Entre o afetivo e o ideológico: as intervenções urbanas como políticas pós-modernas. Revista ECO-PÓS, v. 9, n. 2, p. 123-138, ago./dez. 2006., p. 128), diferentemente dos coletivos europeus e americanos que se utilizam da alta tecnologia em suas intervenções. Organizam-se assim performances, festas, ocupações e matérias artísticas in loco, durante protestos e manifestações, ocupações e trabalhos com movimentos sociais.

Com esse caráter micropolítico as ações e intervenções de artistas violam códigos da arte, e, para além de buscar outros suportes, fazem da desobediência civil sua plataforma. A inserção no cotidiano busca por um rompimento de barreiras edificadas no mercado das artes, de forma que o anonimato e a subversão se fazem armas contra a classificação da arte (Rosas, 2002ROSAS, R. (Ins)Urgência. Rizoma.net: Artefato, p. 8-12, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
http://www.intervencaourbana.org/rizoma/...
). Ferreira (2002)FERREIRA, L. H. G. Enredar: “a arte de organizar encontros”. Rizoma.net: Artefato, p. 20-30, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
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diz que essa aproximação da arte com o cotidiano vem em busca de uma produção do comum que, recuperando a lentidão, quer propiciar imagens e histórias despretensiosas em relação à espetacularização da vida. Não é uma proposta utópica ou de fuga da realidade, mas um resgate da possibilidade de confabular:

A arte no jogo dos afetos causa estranhamento, possibilita conhecer, vivenciar, experimentar de outro modo o encontro com o mundo e com o outro. Na perspectiva aqui esboçada trata-se da possibilidade de resgatar como força criadora, o instante, o insignificante, o detalhe, a sutileza que a rápida apreensão das coisas torna imperceptível. Enredar o fluxo da vida como na democracia espinosista: “arte de organizar encontros”, mas além de organizar, hoje, de conectar encontros num campo tecnologicamente ampliado de experimentações. (Ferreira, 2002FERREIRA, L. H. G. Enredar: “a arte de organizar encontros”. Rizoma.net: Artefato, p. 20-30, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
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, p. 29).

Amoreira (2002)AMOREIRA, P. A paz do grito. Rizoma.net: Artefato, p. 106-111, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
http://www.intervencaourbana.org/rizoma/...
afirma que a arte contemporânea também é uma arma da guerrilha cultural, quando se encontra mais preocupada com o processo artístico do que com o controle sobre o resultado da obra. Entendendo a arte como ato de resistência e de libertação de compreensões predeterminadas, encara-a como um elemento propício ao levante, que, se contrapondo à guerra, dilui a ação revolucionária no espaço-tempo. Inspirado por Hakim Bey (2001)BEY, H. TAZ: zona autônoma temporária. São Paulo: Conrad Livros, 2001., que chamou tais levantes de zonas autônomas temporárias, isto é, estratégias de ação mais distendidas e esparsas, de contaminação lenta e que não permitem uma contraofensiva do inimigo, o autor quer defender uma arte capaz de guerrilhar, ser “rebelde, apaixonada, avessa a protocolos domesticalizadores. Onde está a subversão do grafite quando o suporte que receberá essa manifestação é um espaço destinado para esse fim?” (Amoreira, 2002AMOREIRA, P. A paz do grito. Rizoma.net: Artefato, p. 106-111, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
http://www.intervencaourbana.org/rizoma/...
, p. 110).

Para o autor, então, “interferências urbanas são legítimas ações de guerrilha cultural artivista, que, quanto mais impactantes, intensas e nômades forem, mais próximas estarão da ideia de zona autônoma temporária” (Amoreira, 2002AMOREIRA, P. A paz do grito. Rizoma.net: Artefato, p. 106-111, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
http://www.intervencaourbana.org/rizoma/...
, p. 110). A desobediência civil também se torna armamento da guerrilha cultural, que se faz grito de rebeldia na conquista de espaços não autorizados ou na retomadas do espaço público. Armas, que, para o artista em questão, estão apontadas para a morte:

Armas todas empunhadas como anti-armas. Pois, ao contrário das bélicas possibilidades, as anti-armas matam a morte. As anti-armas estão mais interessadas na distensão do tempo. Na ampliação do espaço-tempo. Ao contrário da velocidade mortificadora dos meios tradicionais, onde tudo exala uma vida intensa e curta, onde tudo é descartável, os meios de resistência preferem a consistência da experiência. Arriscam resgatar valores e compreensões de mundo. Negam a morte. Vencer a morte é o mais radical ato de resistência. (Amoreira, 2002AMOREIRA, P. A paz do grito. Rizoma.net: Artefato, p. 106-111, 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.intervencaourbana.org/rizoma/rizoma_artefato.pdf . Acesso em: 6 fev. 2016.
http://www.intervencaourbana.org/rizoma/...
, p. 109).

Porém, essa rebeldia das intervenções também pode ser capturada no campo das artes, plataforma de muitas delas, quando é chamada a corresponder a certos padrões de beleza ou quando reproduz interesses individualizados. Faz-se arte de retina, um design, uma arquitetura que corresponde à especulação imobiliária de áreas até então desvalorizados, homogeneizando os ânimos e afetos que não encontram espaço na vida acelerada e ascética do urbano. A arte é, assim, também fetichizada, transformada em espetáculo-mercadoria, correspondendo ao biopoder abafador da alma. Os grafites transitam entre sua força de denúncia, a qual caracteriza suas origens, e um embelezamento-padrão das ruas chamado a frear as pichações que “sujam” a cidade. A “regra das ruas”, que não permite intervenções no trabalho de um grupo sobre o outro, funciona como escudo, deixando paredões e containers a salvo! Sendo assim, a arte não deve ser tomada a priori como transgressora ou detentora de mecanismos de defesa da vida e da singularidade. Ela pode atualizar antigos discursos que querem ditar as regras da vida em nome de saberes concebidos como verdades absolutas, que postulam os ideais que dizem levar a humanidade ao progresso, à evolução e à ordem.

Conclusão: da impossibilidade de conter

A arte, então, perdeu sua potência criativa e subversiva em meio às forças padronizadoras da cidade? Na busca por uma resposta, o pesquisador-errante lembrou-se que, volta e meia, os containers podiam ser encontrados abertos, deixando escapar cheiros, transbordar seu conteúdo indesejado. Lembrou-se das intervenções que produziam desvios e que se infiltravam na cidade como a água. Águas que insistiam em manchar paredes, escapar em fissuras, criar bolores. Foram elas que também se infiltraram nas paredes de um túnel sedento por manutenção e deixaram que a “arte de rua organizada” ainda se fizesse subversiva.

Nos corredores do Túnel da Conceição, um dos acessos principais a zona urbana Porto Alegre, olhares curiosos e admirados acompanhavam os desenhos ganhando forma em suas paredes (Grafiteiros…, [2014]GRAFITEIROS levam arte ao Túnel da Conceição, em Porto Alegre. Terra, [2014]. Disponível em: Disponível em: https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/grafiteiros-levam-arte-ao-tunel-da-conceicao-em-porto-alegre,27c0b8d664dc4410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html . Acesso em: 10 fev. 2016.
https://www.terra.com.br/noticias/brasil...
). A arte de rua era convidada a decorar a cidade sob o amparo da beleza, da ordem, da limpeza, da hospitalidade aos turistas, do bem-estar visual, do espetáculo! Mas os grafites capturavam intensidades que pareciam não caber em si, que transbordavam e extrapolavam as imagens, as cores, a rua, resgatando rastros e narrativas de um túnel reformado para a Copa do Mundo de Futebol: “Contra-Copa” - estava escrito em uma das paredes, usando da grafia de uma marca de refrigerante facilmente evocada na memória. O cidadão-pesquisador-errante sorriu. A cidade, que se fazia água, sempre escapava. O urbanismo faz rachaduras, e a arte se infiltra.

Referências

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  • SRUR, E. Manual de intervenção urbana São Paulo: Bei Comunicação, 2012.
  • 1
    O presente artigo é consequência da reelaboração de parte de uma dissertação de mestrado intitulada Sobre containers e medianeras: intervenções urbanas e subjetivações limiares (Flach, 2016FLACH, G. A. Sobre containers e medianeras: intervenções urbanas subjetivações limiares. 2016. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social e Institucional) - Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2016.), vinculada ao Programa de Pós Graduação em Psicologia Social e Institucional da UFRGS, que contou com o apoio da Capes para sua realização.
  • 2
    O conceito de estética aqui se refere a determinado “culto ao belo” que embasa tais projetos de remodelação de algumas áreas da cidade, oferecendo uma arquitetura padronizada e funcional de acordo com as premissas capitalistas.
  • 3
    Rolezinho é o nome dado a pequenos encontros ou passeios em parque ou shopping centers, geralmente organizados por adolescentes e jovens, através de redes sociais ou celulares. Ganharam destaque na mídia brasileira devido a supostos delitos, tumultos e agressões cometidos por alguns participantes.
  • 4
    Tomamos aqui emprestada a definição proposta pela professora Dra. Liane B. Righi (2010)RIGHI, L. B. Redes de saúde: uma reflexão sobre formas de gestão e o fortalecimento da atenção básica. In: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde, Política Nacional de Humanização. Atenção básica. Brasília, 2010. p. 59-74. (Cadernos HumanizaSUS, v. 2). às Redes de Cuidado em Saúde.
  • 5
    O movimento Massa Critica difunde o uso da bicicleta como o meio de transporte mais democrático, ágil, saudável e sustentável. Está em mais de 300 cidades espalhadas pelo mundo. Em fevereiro de 2011, o grupo ficou em maior evidencia em Porto Alegre devido a um atropelamento de ciclistas ocorrido durante um de seus eventos. Mais informações sobre o grupo estão disponíveis no site https://massacriticapoa.wordpress.com/.
  • 6
    O projeto Vida Urgente está vinculado à Fundação Thiago de Moraes Gonzaga e tem como objetivo o desenvolvimento de programas educativos, culturais e informativos direcionados a crianças, adolescentes, jovens e adultos com o intuito de desenvolver a humanização no trânsito e a valorização da vida. Mais informações estão disponíveis no site http://www.vidaurgente.org.br/site/index.php.
  • 7
    O evento Serenata Iluminada já teve algumas edições realizadas no parque Farroupilha e no parque Moinhos de Vento, em Porto Alegre. Integra o projeto PortoAlegre.cc que é uma plataforma digital, baseada no conceito de wikicidade, que tem por objetivo permitir a discussão da história, a realidade e o futuro de territórios específicos. Lançado em 24 de março de 2011, o projeto nasceu de uma parceria entre a Universidade do Vale do Rio dos Sinos, a Prefeitura de Porto Alegre e a Parceiros Voluntários. Mais informações estão disponíveis na página do Facebook: https://www.facebook.com/SerenataIluminada.
  • 8
    O coletivo RUA (Rastro Urbano de Amor) promoveu no ano de 2012 um evento de ocupação do Largo dos Açorianos, uma aérea considerada abandonada. O largo abriga dois monumentos: a Ponte de Pedra e o Monumento aos Açorianos. Mais informações a respeito desse coletivo podem ser encontradas na página do Facebook: https://www.facebook.com/RUApoa.
  • 9
    Os movimentos Occupy tiveram sua origem no Occupy Wall Street, em 2011, movimento de protesto contra a desigualdade econômica e social, a corrupção e a influência indevida de empresas do setor financeiro no governo dos Estados Unidos da América. Teve força juntamente com a onda de movimentos árabes que lutavam pela democracia (a Primavera Árabe).
  • 10
    Mais informações sobre o Poro - Intervenções urbanas e ações efêmeras podem ser encontradas no site http://poro.redezero.org/; um compilado de algumas de suas ações está disponível em vídeo (Poro…, 2010PORO: intervenções urbanas e instalações efêmeras. Realização: Associação Imagem Comunitária. Belo Horizonte: Rede Jovem de Cidadania: Poro, 2010. 19min31s. Disponível em: Disponível em: https://vimeo.com/8725870 . Acesso em: 6 fev. 2016.
    https://vimeo.com/8725870...
    ).
  • 11
    Informação verbal retirada de uma série sobre arte urbana produzida pelo canal Arte1.
  • 12
    Informações retiradas do documentário Quem é Toniolo? (2005)QUEM é Toniolo?. Direção e roteiro: André Moraes; Caco Pacheco. Porto Alegre: PUCRS-Famecos, 2005. 14min35s. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vkUaoEnzTjc . Acesso em: 6 fev. 2016.
    https://www.youtube.com/watch?v=vkUaoEnz...
    .
  • 13
    O autor utiliza-se do termo do arquiteto finlandês Juhani Pallasma, conforme Giora (2014).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2018
  • Aceito
    15 Abr 2019
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social - IFCH-UFRGS UFRGS - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Av. Bento Gonçalves, 9500 - Prédio 43321, sala 205-B, 91509-900 - Porto Alegre - RS - Brasil, Telefone (51) 3308-7165, Fax: +55 51 3308-6638 - Porto Alegre - RS - Brazil
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