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Roger Bastide - entre tempos, espaços, tradições

Roger Bastide - between times, spaces, traditions

Resumo

O artigo propõe uma análise do itinerário e escritos de Roger Bastide (1989-1974), procurando mostrar como os seus trânsitos entre França e Brasil, e entre diferentes domínios do conhecimento, contribuíram para a formação de seu ponto de vista plural, e como essa sua posição entre tempos, espaços e tradições lança questões importantes para o modo como pensamos e escrevemos a história da antropologia.

Palavras-chave:
Roger Bastide; antropologia francesa; modernismo paulista de 1922; história da antropologia no Brasil

Abstract

The article proposes an analysis of the itinerary and writings of Roger Bastide (1898-1974), trying to show how his displacements between France and Brazil, and also between different fields of knowledge, contribute to the formation of his plural point of view, and also how his position at the intersection of times, places and traditions raises important questions for the way we conceive and write the history of anthropology.

Keywords:
Roger Bastide; French anthropology; São Paulo’s modernism; history of anthropology in Brazil

A consideração detida do trajeto e produção de Roger Bastide (1898-1974) deixa ver um autor que resiste a classificações; aliás, ele perturba categorizações estritas e nisso reside, talvez, um de seus maiores interesses. De saída, o seu exemplo convida-nos a borrar fronteiras disciplinares; definido e definindo-se diversas vezes como sociólogo, Bastide é presença inconteste em mais de uma história da antropologia, tendo transitado ainda pela filosofia, história e psicologia. Militante do método científico e arquiteto de instituições acadêmicas, experimentou a crítica de arte, o jornalismo e o ensaio de corte literário, desconcertando oposições entre ciência e literatura, amadorismo e profissionalização. Francês de nascimento e formação, renasce (africano) no Brasil, conhecendo aí novas tradições intelectuais e revendo com elas repertórios e pontos de vista prévios. Com isso, desestabiliza as linhas de um mapa que discerne inequivocamente centros e periferias; afinal, ele ensina, as chamadas periferias produzem ideias originais, permitindo miradas outras sobre as denominadas tradições centrais.

Nesse sentido, é possível dizer que Bastide situa-se entre tempos, espaços e tradições: entre passado e presente; entre França, África e Brasil; entre saberes e práticas distintos. Tal localização em zonas limítrofes evidencia o seu perfil de “homem-ponte”, que faz comunicar ideias e experiências, e que se deixa tocar pelos trânsitos que se verificam em áreas de fronteiras.1 1 A expressão “homem-ponte” foi utilizada por Antonio Candido (1989) para definir o crítico, sociólogo e poeta Sérgio Milliet.

Esta leitura do autor ampara-se em um convívio de mais de 20 anos com os seus escritos, que conheceu uma primeira sistematização em Diálogos brasileiros (Peixoto, 2000PEIXOTO, F. A. Diálogos brasileiros: uma análise da obra de Roger Bastide. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2000.) e uma reavaliação em A viagem como vocação (Peixoto, 2016PEIXOTO, F. A. A viagem como vocação: itinerários, parcerias e formas de conhecimento. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2016.). Convencida de que nada mais teria a dizer sobre ele, vi-me instigada a revisitá-lo, motivada pela proposta deste dossiê, convencida que o seu exemplo coloca questões importantes para o modo como pensamos e narramos a história da antropologia. Mas, deixo anotado, a retomada do percurso e de parte da produção do autor neste texto carrega um sentido de “re-suscitar”, quer dizer, trata-se da recuperação criadora de problemas antes trabalhados que, sem esquecê-los, reformula-os em função de novas indagações.2 2 Esta reflexão teve origem no painel organizado por Patrícia Ferraz de Matos e Frederico Delgado Rosa, “Genealogias resgatadas: trilhos para uma historiografia das antropologias do mundo”, no Congresso da Associação Portuguesa de Antropologia, Lisboa, 2019. O sentido de “re-suscitar” foi retirado de Despret e Stengers (2011, p. 60, nota 1).

Entre tradições, nacionais e disciplinares

Em terras francesas

Os escritos de Roger Bastide dos anos 1920 e 1930 exibem traços salientes do perfil do jovem agregé de filosofia, que fizera seus estudos universitários em Bordeaux, e que assume seu primeiro posto docente em 1924, em um liceu de Cahors, no sul da França, mudando-se dois anos depois para Lorient e em seguida para Valence (de 1928 a 1937), sempre como professor do ensino médio.3 3 Para a biografia do autor, ver Ravelet (1993). Antes da publicação do livro de estreia, Les problèmes de la vie mystique (Bastide, 1996BASTIDE, R. Les problèmes de la vie mystique. Paris: PUF, 1996.), em 1931, publicou artigos e conferências que permitem flagrar a educação familiar protestante; os primeiros experimentos poéticos; as incursões pela crítica literária; a formação filosófica; o aprendizado paulatino da sociologia e os contatos sistemáticos com a psicologia. O livro sobre os escritores místicos reafirma o amplo espectro dos seus interesses e as tentativas de combiná-los. Os textos produzidos em seguida, entre 1931 e 1935, mostram a permanência de temas, ainda que a visada sociológica adquira proeminência no segundo livro, Éléments de sociologie religieuse (Bastide, 1997aBASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a.), de 1935. Esses trabalhos de juventude revelam uma forte imbricação entre arte, vida mística e religião, domínios nos quais ele afia seus instrumentos de interpretação e escrita, aproximando reflexão e experiência com o auxílio de uma atitude crítica eminentemente “introspectiva”, que quer afastar todo e qualquer positivismo científico.

No mesmo período, Bastide arrisca-se na literatura, indicam os versos de “La montée au désert” (Bastide, 1995cBASTIDE, R. La montée au désert. Bastidiana, Brionne, n. 10-11, p. 35-41, 1995c.) (inédito até 1995) e “Le cep taillé” (Bastide, 1995bBASTIDE, R. Le cep taillé. Bastidiana, Brionne, n. 10-11, p. 42-45, 1995b.), de 1920, e a prosa de “Dépaysements” (Bastide, 1995aBASTIDE, R. Dépaysements. Bastidiana, Brionne, n. 10-11, p. 45-46, 1995a.), de 1927. Essa breve produção literária permite entrever a temática religiosa, a presença da terra natal e uma reflexão sobre a experiência da viagem e do deslocamento (Ravelet, 1995RAVELET, C. Roger Bastide et la poésie. Bastidiana, Brionne, n. 10-11, p. 7-22, 1995.). Paralelamente, Bastide exercita-se na crítica da literatura e nos ensaios sobre estética, nos quais são também evidentes a importância da dimensão religiosa e mística; a reflexão sobre a criação poética; a especial predileção pelas literaturas de André Gide e Pierre Jean Jouve.

Mas talvez a grande trilha aberta por esses textos (e que será revisitada mais tarde, com outras inflexões), diz respeito às influências da religião no processo criador, ponto que será explorado, por exemplo, em “Marcel Proust et le pilpoul” (Bastide, 1994bBASTIDE, R. Marcel Proust et le pilpoul. Bastidiana, Brionne, n. 5, p. 15-20, 1994b.), de 1928, dedicado aos traços judaicos da literatura de Proust; em “André Gide et le temps retrouvé” (Bastide, 1928aBASTIDE, R. André Gide et le temps retrouvé. Signaux, Laon, n. 6, p. 16-18, 1928a.), voltado para o protestantismo em Gide; em “Les héros de Mauriac” (Bastide, 1935BASTIDE, R. Les héros de Mauriac. Grande revue, Paris, v. 39, n. 1, p. 482-492, 1935.), quando discute as marcas católicas do escritor. Nesses escritos primeiros insinua-se também a preocupação em exercitar um ponto de vista sociológico capaz de complementar as visadas filosófica e psicológica, predominantes nos ensaios sobre literatura e vida mística.4 4 Retomei com mais vagar esses escritos na introdução de Diálogos brasileiros (Peixoto, 2000). A relação da bibliografia completa de Bastide pode ser encontrada em Dauty (1978).

Esforço semelhante em mobilizar instrumentos da sociologia associados a outros aportes pode ser notado em Les problèmes de la vie mystique (Bastide, 1996BASTIDE, R. Les problèmes de la vie mystique. Paris: PUF, 1996.), quando ele tenta reaver, de outro ângulo, um tema de certo modo cativo de filósofos, teólogos, moralistas e psicólogos. Tomando como ponto de partida a classificação das personalidades místicas (o “entusiasta”, o “quietista”, o “construtor” e o “profeta”) e a rara coexistência desses tipos em uma mesma época e país, Bastide chama a atenção para a importância fundamental do “meio social e intelectual” para a conformação de cada uma delas (a despeito das questões individuais, fisiológicas e psicológicas, que também atuam). Defende assim a necessidade de situar o fenômeno sob o “fogo cruzado de todas as ciências: medicina, psicologia, etnografia, história e sociologia” (Bastide, 1996BASTIDE, R. Les problèmes de la vie mystique. Paris: PUF, 1996., p. 12).5 5 Salvo indicação contrária, as traduções são de minha autoria.

Não parece difícil localizar no livro de estreia ecos do modelo durkheimiano de análise da religião, quando, por exemplo, o autor toma as formas elementares da vida mística e o “misticismo primitivo” de modo a acompanhar o desenvolvimento e a transformação progressivos do fenômeno até as suas formas mais acabadas, nas quais concentra sua interpretação. O seu interesse recai precisamente sobre o que denomina “misticismo verdadeiro”, que permitiria deixar as trilhas explicativas que veem o fenômeno como patologia, expressão da confusão afetiva ou negação do pensamento, para tomá-lo como fonte de criação, intelectual, poética, estética.

Se na parte inicial do volume Bastide afirma o vigor da explicação sociológica para a compreensão da vida mística, nos segmentos finais sublinha a necessidade de associá-la à perspectiva psicológica, de modo que seja possível apreender o fenômeno em sua dupla dimensão, individual e social. Se isso é verdade, somente a psicologia poderia penetrar a essência do misticismo, diz ele, cabendo à sociologia a análise das “impurezas” que o cercam, isto é, dos elementos alheios à vida mística que interferem em sua manifestação.

Em Éléments de sociologie religieuse, por sua vez, a visada sociológica assume o primeiro plano e, ao explicitá-la, Bastide (1997a)BASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a. define a sua posição no interior de um campo de debates de época. Duas concepções pautaram os estudos na área da sociologia da religião, diz ele. A primeira, exemplificada por Raoul de la Grasserie e por sua tentativa de circunscrever os móveis psicológicos do fenômeno religioso; a segunda, que tem em Durkheim sua maior expressão, coloca o seu foco nas coletividades, nas comunidades de crenças e práticas. Reivindicando o feitio sociológico de sua análise, Bastide busca afastar-se do que ele denomina a “ênfase coletivista” de Durkheim (tendência em fazer coincidir o religioso e o coletivo), assim como de seu esforço em transformar a sociologia religiosa em uma sociologia do conhecimento. A despeito de endossar a distinção entre sagrado e profano (que auxiliaria a apreender a essência do fenômeno, ele indica), defende a importância dos fatores individuais na compreensão da religião, recusando a oposição indivíduo e sociedade, cara à sociologia de Durkheim.

Desde os primeiros esboços de sua sociologia da vida mística, que se mostram no ensaio “Mysticisme e sociologie” (Bastide, 1928bBASTIDE, R. Mysticisme e sociologie. Revue internationale de sociologie, [s. l.], v. 36, n. 5-6, p. 297-306, 1928b.) antes de assumir forma mais acabada no livro de 1931, Bastide estabelece um diálogo crítico com as teses durkheimianas. Dentre os pontos centrais das discordâncias encontram-se o apagamento da dimensão individual das análises (resultante da definição do fato social como “coisa”, anterior e exterior ao indivíduo) e a condenação da “introspecção”, isto é, a recusa da possibilidade de partilhar a fé estudada e do estabelecimento de uma relação de “simpatia intuitiva” com o objeto. Assume expressamente outra via interpretativa, sustentando a importância decisiva da experiência pessoal e subjetiva para a análise sociológica. Um Renan, um Damester, um Gaston Richard, diz ele, advogam que

[…] se a primeira condição para falar de arte e poesia com discernimento é sentir a poesia e a arte, a primeira condição exigida daquele que deseja compreender os que creem e os grupos de fiéis é ter ele mesmo participado, em algum momento da vida, de uma fé, ao menos pela emoção ou pelo sentimento. (Bastide, 1997aBASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a., p. 8).

A referência a Gaston Richard na abertura do livro não é casual; o sociólogo fora professor de Bastide em Bordeaux e influência marcante em seus primeiros trabalhos.6 6 As cartas trocadas entre eles mostram que foi Richard quem introduziu Bastide nos estudos sociológicos e quem o auxiliou na preparação da agrégation; mostram ainda os laços de amizade que estabeleceram. Cf. Morin (1994) e também os artigos escritos por Bastide sobre Richard (Bastide, 1930, 1998). As relações próximas entre Bastide e Richard foram examinadas por Reuter (1997). Assim, as críticas que ele empreende à sociologia religiosa de Durkheim são, em larga medida, devedoras, de reparos feitos antes por Richard às teses do líder do Année sociologique.

Gaston Richard (1860-1945) esteve ligado ao Année desde a sua criação em 1896, revista para a qual realiza colaborações sistemáticas até 1907. Em 1905, ao que tudo indica por primeira vez, realiza uma série de críticas às ideias de Durkheim, que se explicitam, entre outros, nos reparos feitos ao Suicídio (Durkheim, 1897DURKHEIM, E. Le suicide: étude de sociologie. Paris: F. Alcan, 1897.), alguns deles publicados nas próprias páginas da revista, em 1898 (Besnard, 1979BESNARD, P. La formation de l’équipe de l’Année sociologique. Revue française de sociologie, [s. l.], n. 20, p. 7-31, 1979.; Pickering, 1979PICKERING, W. S. F. Gaston Richard: collaborateur et adversaire. Revue française de sociologie, [s. l.], n. 20, p. 163-182, 1979.). Parte de suas discordâncias recaem sobre o “sociologismo” de Durkheim, sobre a eliminação da dimensão individual da análise e sobre a recusa da introspecção como atitude metodológica (Richard, 1911RICHARD, G. Sociologie et métaphysique [quatro artigos]. Foi et Vie, [s. l.], n. 11, p. 331-332, 356-359, 395-399, 431-436, 1911., 1923RICHARD, G. L’athéisme dogmatique en sociologie religieuse. Revue d’histoire et de philosophie religieuses, [s. l.], 3ème année, n. 2, p. 125-137, 1923.), pontos salientados por Bastide em sua leitura de 1935, como vimos. As controvérsias entre os autores baseiam-se não apenas em visões distintas de sociologia, mas se estendem ao ensino da sociologia na França. E os argumentos de Richard sobre o assunto são retomados por Bastide (1936)BASTIDE, R. L’enseignement et la sociologie en France. Revue internationale de sociologie, [s. l.], v. 44, n. 7-8, p. 373-396, 1936. em “L’enseigment de la sociologie en France”, sobretudo os que dizem respeito à dominância da sociologia durkheimiana no ensino francês e à imposição de certa visão sociológica da religião, que deveria estar desligada da experiência religiosa.

Richard destoa do grupo do Année sociologique não apenas em função da fé religiosa explicitada (ele se converte ao protestantismo quando de seus estudos universitários, ligando-se aos círculos protestantes de Bordeaux, onde leciona7 7 Sobre os laços dos universitários, e sobretudo de Richard, com a Igreja reformada de Bordeaux, cf. artigo de Luze (2015), que integra um dossiê sobre o autor. ), mas também pela sua defesa dos nexos estreitos entre sociologia e psicologia, que o levam a prestar atenção nas questões de convicção pessoal, na base da religião, e a tentar discernir a essência do fato religioso que, segundo ele, não poderia ser confundido com todo e qualquer fenômeno coletivo.

Essas críticas fazem ecoar reparos anteriores de René Worms (1869-1926) e, antes dele, de Gabriel Tarde (1843-1904) a Durkheim, que remetem às aproximações e afastamentos entre a sociologia e a psicologia, dois regimes de pensamento científico em disputa pela representação e compreensão do homem e da vida social à época, e não apenas na França (Joly, 2017JOLY, M. La révolution sociologique: de la naissance d’une régime de pensée scientifique à la crise de la philosophie (XIXème et XXème siècles). Paris: La Découverte, 2017.). Os afastamentos entre Tarde e Durkheim referem-se a diferentes concepções do social e de seu estudo, como também a perfis intelectuais distintos: o exemplo de Tarde, que combina inclinações literárias com o trabalho científico, contraria o de Durkheim, que afirma a legitimidade da ciência por oposição a certo estilo letrado. O modelo representado por Tarde reverbera nas gerações seguintes (Worms, Richard, Bastide), que cultivam o gosto pela literatura e pelas artes, e concebem a sociologia em estreita relação com a psicologia. Nada mais distante do ponto de vista durkheimiano para o qual a sociologia é a ciência em torno da qual giram as demais.8 8 É Lepenies (1988) quem vê o conflito entre Tarde e Durkheim como amparado em temperamentos intelectuais diversos. Segundo ele, Tarde repudiaria o modelo do scholar representado por Durkheim; este, por sua vez, recusaria o homem de letras que Tarde personificava. Tal visão se afasta da leitura de Marc Joly (2017), que localiza a disputa entre os autores no modo como concebem as relações entre sociologia e psicologia. Tendo a achar que os dois argumentos são complementares. Lembro ainda, com o auxílio de Mucchielli (1994), que a sociologia de Durkheim não recusa de modo cabal a psicologia, mas a localiza no interior da sociologia, que de certo modo a englobaria. Isso sem esquecer que alguns dos chamados “durkheimianos” se valeram expressamente das contribuições da psicologia, Marcel Mauss e Maurice Halbwachs, por exemplo.

A despeito dos interesses heterogêneos e das aberturas da produção de Tarde para domínios diversos (a criminologia, a filosofia, a antropologia, a sociologia, a geografia, a arqueologia, a história, como também a literatura e a poesia), nota-se em sua obra um esforço sistemático de fundar uma psicologia social. Esta, em sua concepção, se define como a ciência da sociedade, cuja base é o estudo da “alma humana”. Nesse sentido, sociologia e psicologia deveriam atuar juntas para compreender indivíduos e sociedade, termos irremediavelmente imbricados (Lubek, 1981LUBEK, I. Histoires de psychologies sociales perdues. Le cas de Gabriel Tarde. Revue française de sociologie, [s. l.], n. 22-23, p. 361-395, 1981., p. 361-364). Tal empenho em associar sociologia e psicologia, e em recusar dicotomias entre dimensões individuais e coletivas, reverbera no grupo reunido em torno de René Worms no Institut Internationale de Sociologie e da Revue internationale de sociologie, criada em 1893, reduto de críticos de Durkheim (Clark, 1973CLARK, T. N. Prophets and patrons: the French university system and the emergence of social sciences. Cambridge: Harvard University Press, 1973.).

Será Richard, em 1926, o substituto de Worms na direção do instituto e da revista, com a qual Bastide colabora de modo relativamente assíduo, e não por acaso. Os primeiros escritos de Bastide (sobretudo os textos que escreveu sobre religião até meados dos anos 1930) indicam suas afinidades com essa vertente que se opõe ao determinismo sociológico de Durkheim, propondo a análise inseparável das coletividades e das manifestações individuais, além do foco específico nas especificidades do fenômeno religioso. Foi Richard quem provavelmente aproximou o jovem colega dessa corrente, no interior da qual se encontra um número expressivo de intelectuais protestantes.

Assim, no momento inicial de sua produção, Bastide define um instrumental de análise, faz escolhas temáticas e experimenta associar sociologia e psicologia, de acordo com ensinamentos retirados de Pierre Janet, Georges Dumas, Gabriel Tarde e Raoul Allier.9 9 As ideias do historiador, psicólogo e professor na Faculdade de Teologia de Paris, Raoul Allier, grande referência para Richard, é matéria de exame de Bastide em artigo de 1929, “L’œuvre de Raoul Allier et la sociologie religieuse” (Bastide, 1993).

Se isso é verdade, parece difícil não reconhecer nesses primeiros escritos a adesão a certas teses de Durkheim, sobretudo por intermédio de alguns de seus próximos. No livro de 1935, por exemplo, a crítica formulada ao mestre francês na introdução ganha novos matizes quando da definição do fenômeno religioso. Objetando a “teoria intelectualista” de Frazer, ele recupera Lévy-Bruhl, Mauss e Hubert para defender as proximidades entre magia e afetividade. A magia, segundo ele, traduz a “eficácia do desejo” (nos termos de Allier) e tem sua raiz no sentimento e não no exercício da inteligência. Os sentimentos envolvidos na magia se oferecem ao escrutínio da psicologia, é certo, mas o caráter convencional e tradicional do fenômeno deve ser estudado pela sociologia, o que, mais uma vez, reafirma a necessidade de complementaridade entre os saberes (Bastide, 1997aBASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a., p. 21).

Bastide endossa a linha divisória que Durkheim estabelece entre magia e religião, mas discorda do percurso traçado pelo autor que coloca a magia como termo de origem fadada ao desaparecimento em um mundo em vias de secularização, no qual ganha terreno a lógica e a explicação científicas. Seguindo as trilhas abertas por Allier e Richard, afirma: “Para compreendermos a magia, em lugar de nos dirigirmos à ciência, devemos nos voltar para a música e para a poesia” (Bastide, 1997aBASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a., p. 13). Outro ponto de discordância anunciado no livro, e que faz coro às críticas anteriores de Richard, diz respeito à redução explicativa do fenômeno, considerado expressão da sociedade. Não percorreria a religião outros caminhos que escapam aos ditames sociais?

Em seus termos:

Mas se a religião traduz, ao lado das tendências coletivas e das necessidades sociais, os solilóquios solitários das almas, os movimentos secretos do coração, as nostalgias dos espíritos em busca do absoluto, imiscuem-se então no seio desse determinismo [sociológico] começos imprevisíveis, germens misteriosos, promessas de flores desconhecidas, dos quais a sociologia religiosa pode constatar a presença, mas que não consegue explicar. (Bastide, 1997aBASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a., p. 199).

Seu esforço é mostrar como as relações entre religião e sociedade desenham um movimento de dupla mão, contrariando o sentido único das determinações e a visão da religião como epifenômeno. Além disso, em algumas ocasiões é possível observar como as expressões religiosas se descolam dos substratos sociais, interferindo em seus contornos.

Vemos, com efeito, as religiões sobreviverem às revoluções, se adaptarem às estruturas as mais diversas mantendo os seus próprios sistemas de valores […]. Se a religião tende a se destacar de todo substrato social para viver uma vida autônoma, é porque a religião é mais do que um sistema de instituições, é um sistema de crenças e sentimentos. (Bastide, 1997aBASTIDE, R. Éléments de sociologie religieuse. Paris: Stock, 1997a., p. 133).10 10 Vale notar, em primeiro lugar, que Bastide recorre às análises de Max Weber sobre a ética protestante e o espírito do capitalismo para fundamentar o seu ponto de vista sobre as relações de dupla mão existentes entre religião e sociedade. Em segundo, as considerações sobre o relativo descolamento da “superestrutura” religiosa de seu substrato material aqui anunciado serão retomadas e exemplificadas na análise das religiões africanas no Brasil, quando ele mostra como o esfacelamento dos grupos e das coletividades pela escravidão não impediu a reconstrução de expressões religiosas, que se mantêm vivas e transformadas no Brasil. Cf. Bastide (1971), sobretudo o primeiro volume.

As claras discordâncias em relação a Durkheim não impediram aproximações com figuras de seu círculo, como Maurice Halbwachs por exemplo, que ele conhece nos anos 1930. Os dois se encontram em Estrasburgo, momento em que Halbwachs sugere que entre em contato com Mauss. As trocas de Bastide com o autor do Ensaio sobre o dom (Mauss, 1925MAUSS, M. Essai sur le don: forme et raison de l’échange dans les societés archaïques. L’Année sociologique, Paris, t. 1 (1923-1924), p. 30-186, 1925.) podem ser aferidas na breve correspondência entre eles; em carta datada de 3 de novembro de 1936, por exemplo, Mauss pondera certos exageros nos questionamentos de Bastide em relação a Durkheim, chamando a atenção para o caráter excessivamente filosófico da introdução do seu livro de 1935. Diz ainda não corroborar sua predileção por Weber: “Um dos autores que você mais aprecia, Max Weber, é um daqueles com quem Durkheim, Hubert e eu dialogamos menos” (cf. Morin, 1994MORIN, F. Les inédits et la correspondance de Roger Bastide. In: LABUTHE-TOLRA, P. (dir.). Roger Bastide ou le réjouissement de l’abîme. Paris: L’Harmattan, 1994. p. 21-42., p. 37).

A importância atribuída às expressões individuais e à subjetividade se faz presente também nos artigos que Bastide escreve sobre os sonhos, tema desses escritos primeiros que reaparecerá em trabalhos de maturidade. As fabulações oníricas são objeto de dois ensaios: “La plongée tenebreuse” (Bastide, 1932BASTIDE, R. La plongée tenebreuse. Grande revue, Paris, n. 9, p. 459-470, 1932.), espécie de peça literário-filosófica sobre o sonho, e “Matériaux pour une sociologie du rêve” (Bastide, 1933BASTIDE, R. Matériaux pour une sociologie du rêve. Revue internationale de sociologie, [s. l.], v. 4, n. 11-12, p. 623-627, 1933.) que, como o título indica, debruça-se sobre as possibilidades de uma abordagem sociológica da matéria.

Em suma, a obra de juventude do autor deixa ver um amplo leque temático que ele não mais abandona - a vida mística, o sagrado, a religião, a literatura, o sonho, o imaginário, a memória - bem como uma atitude intelectual que continuará a ser exercitada, ritmada pelo trânsito entre saberes e formas de conhecimento, entre disciplinas e métodos retirados de diversos domínios: da sociologia, da antropologia, da história, da psicologia e das artes. Claro está que certas marcas - a de Richard, por exemplo - tendem a se esmaecer e a dar lugar a outras, em função de novas leituras e contatos, que o levam a rever referências primeiras.11 11 Astrid Reuter (1997) chama a atenção para o silêncio progressivo de Bastide em relação a Richard e sugere ter sido o Brasil um campo profícuo para o estreitamento de laços com a sociologia durkheimiana, diante da forte influência de Durkheim no meio intelectual paulista da época e entre os professores franceses que integraram a missão francesa na Universidade de São Paulo na década de 1930. Difícil aferir tal influência durkheimiana, seja nos intelectuais brasileiros, seja no grupo francês de professores, bastante heterogêneo. O que talvez possa ser dito é que longe do solo francês e das polarizações de um debate acirrado, Bastide pode adquirir certa distância para reler Durkheim à luz de outros autores e das pesquisas empíricas que realizaria no Brasil. De todo o modo, Richard continua presente nos programas de seus cursos na Universidade de São Paulo.

Além disso, é importante observar ainda que se a sociologia exercitada nas décadas de 1920 e 1930 e aquela que ele ensinará na Universidade de São Paulo, entre 1938 a 1954, diferem em função do aprendizado de novas teorias e das pesquisas realizadas em solo brasileiro - que convertem o contato de civilizações em um eixo central da sua produção - é possível notar a permanência dos trânsitos entre disciplinas, aos quais se soma uma perspectiva, ela mesma deslocada, forjada por sua condição de estrangeiro, posição da qual soube tirar farto partido teórico-metodológico.

Em terras brasileiras

No Brasil, onde permaneceu por 16 anos, Bastide não se contentou com as atividades docentes e com o convívio nos círculos acadêmicos, ainda que tenha se engajado na confecção de cursos (sobre folclore, arte, psicanálise, religião, etc.) e na orientação de teses (algumas delas heterodoxas para o período12 12 Lembremos a tese de Gilda de Mello e Souza, A moda no século XIX, defendida em 1950 e publicada no ano seguinte na revista do Museu Paulista. Não por acaso, apenas em 1987 o ensaio é publicado na forma de livro, adquirindo reconhecimento e visibilidade inéditos, com o título O espírito das roupas (Souza, 1987). ), defendendo a importância e vitalidade do prisma sociológico de análise, que ensinava os alunos a manejar em sala de aula e trabalhos de campo.

Ao lado dos cursos e pesquisas, ele exercitará a crítica de arte, colaborando semanalmente com importantes jornais e revistas brasileiros: com os jornais O Estado de S. Paulo, Diário de S. Paulo, Folha da Manhã, Folha de S. Paulo; com as revistas Anhembi, Revista do Arquivo Municipal, Revista do Brasil, etc. Escreveria, entre 1939 e 1945, um ou dois artigos por semana sobre temas diversos: cultura e literatura francesas; literatura e artes brasileiras; estética e estética afro-brasileira; sociologia brasileira; cidades e arquitetura. O registro dessa ampla produção jornalística mostra como, desde sua chegada ao país, ele mergulhou na produção nacional, na sociologia e antropologia brasileiras (Bastide, 1939BASTIDE, R. État actuel des études afro-brésiliennes: le problème du contact des races. Revue internationale de sociologie, [s. l.], v. 47, n. 1-2, p. 77-89, 1939.), mas também na literatura e nas artes visuais. No campo literário, lançou comentários sobre escritores consagrados, do porte de Machado de Assis e José de Alencar; sobre outros pouco tratados (como Sousândrade) e também sobre seus contemporâneos, Mário e Oswald de Andrade. Paralelamente às contribuições a órgãos brasileiros, manteve-se ligado à impressa de matriz francesa no Brasil (ao Boletim da Aliança Francesa, por exemplo) e a veículos franceses, como a revista Mercure de France, com a qual colaborou regularmente entre 1948 e 1965, com textos sobre as lettres brésiliennes (Amaral, 1998AMARAL, G. C. do. Navette France-Brésil, via littéraire. Bastidiana, Brionne, n. 21-22, p. 25-40, 1998., 2010AMARAL, G. C. do. Navette literária França Brasil: a crítica de Roger Bastide. São Paulo: Edusp, 2010. 2 v.).13 13 Essa produção jornalística encontra-se no Arquivo Roger Bastide, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. A crítica literária, especificamente, foi reunida por Amaral (2010).

Essa profícua e importante produção faz com que Bastide seja reconhecido no Brasil também como crítico literário, responsável por textos importantes para a reavaliação da literatura brasileira, como o ensaio “Machado de Assis, paisagista” (Bastide, 1940aBASTIDE, R. Machado de Assis, paisagista. Revista do Brasil, [s. l.], ano 3, n. 29, p. 3-14, 1940a.), que Antonio Candido (1993)CANDIDO, A. Roger Bastide e a literatura brasileira. In: CANDIDO, A. Recortes. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. p. 99-104. diz ter sido o texto-guia para a sua formação como crítico literário.14 14 Antonio Candido afirma, em mais de uma ocasião, as marcas deixadas por Bastide em sua formação como crítico, cf. “Roger Bastide e a literatura brasileira” e “Machado de Assis de outro modo”, reunidos em Candido (1993). A importância das aulas, dos textos e da convivência com Bastide é lembrada pelos jovens membros do grupo Clima, que se tornariam importantes ensaístas e críticos de arte em São Paulo; além de Antonio Candido, Gilda de Mello e Souza, Décio de Almeida Prado, Lourival Gomes Machado, Paulo Emílio Salles Gomes, Ruy Coelho, entre outros. Sobre essa geração que desenhou “destinos mistos”, cf. Pontes (1998). Menos comentados, mas também expressivos, são seus escritos sobre artes visuais, nos quais examina obras de Tarsila do Amaral, Lasar Segall, Vicente do Rego Monteiro, Di Cavalcanti, entre vários outros artistas.

O exercício rotineiro da crítica dirigida à literatura, artes visuais, e também às cidades e à arquitetura, foi realizado de modo concomitante às aulas e às pesquisas que ele empreende no país sobre o folclore, o barroco e o candomblé.15 15 Nos capítulos 1 e 2 de A viagem como vocação (Peixoto, 2016), “Roger Bastide e as cidades” e “O candomblé barroco de Roger Bastide”, proponho uma leitura integrada dos textos que Bastide produziu sobre cidades, barroco e candomblé, mostrando as repercussões que essas reflexões e pesquisas tiveram, umas sobre as outras. Menos do que reflexões e atividades apartadas ou conflitantes, elas se encontram associadas em prol da composição de uma perspectiva sociológica híbrida e dissonante para os padrões da época.

Tais escritos críticos, realizados ao ritmo das descobertas e aprendizados das tradições artísticas e intelectuais brasileiras, chamam a atenção por seu caráter sociológico, sempre reivindicado. Ainda que sensível aos desafios formais das expressões artísticas, a arte mostra-se para Bastide um acesso à compreensão da sociedade e da cultura brasileiras mais amplas, sem que isso signifique recair em determinismos. O alerta é explicitado nos debates com o crítico Sérgio Milliet, nos quais pondera sobre os perigos dos excessos sociológicos nas análises das artes; nesse sentido, convida o amigo a pensar a poesia como forma de conhecimento e como “método” ou “mergulho na experiência social.16 16 Cf. Milliet (1981) e Bastide (1980). Sobre os diálogos entre os dois críticos, ver R. Campos (1996). Os nexos entre arte e sociedade são também enfrentados em sala de aula, nos cursos sobre estética sociológica que ministrou, parte deles reunidos em Arte e sociedade (Bastide, 1945aBASTIDE, R. Arte e sociedade. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1945a.).

Nas análises das expressões literárias e artísticas nacionais, Bastide inicia o enfrentamento de questões que serão revisitadas a partir das pesquisas que realizará sobre o barroco, o folclore e as religiões africanas, que se abrem na direção de problemas ampliados, entre os quais: os contatos entre culturas e a “mestiçagem estética”; a formação da cultura; as marcas dos negros nas artes; a questão do “autenticamente nacional”. Tais questões, às quais conferiu tratamento próprio, correspondem a pontos centrais da pauta modernista, sobretudo de Mário de Andrade, um dos grandes nomes do modernismo de 1922, com o qual ele conviveu em seu período brasileiro e cujos escritos (literários e ensaísticos) foram decisivos para seu aprendizado das coisas brasileiras.17 17 Acompanho no detalhe os diálogos entre Bastide e Mário de Andrade no capítulo 1 de Diálogos brasileiros (Peixoto, 2000).

Quando chega à cidade de São Paulo em 1938, Bastide se aproxima imediatamente dos críticos atuantes na imprensa da época: Sérgio Milliet, Luís Martins e Lourival Gomes Machado, este último integrante do grupo Clima, composto por alunos do professor francês e ligados aos poetas modernistas. Esse é o ano em que Mário de Andrade muda-se para o Rio de Janeiro, após fechamento do Departamento de Cultura que dirigia em São Paulo. Mas, mesmo assim, ele continua a dar o tom da crítica na capital paulista, e Bastide segue-o de perto, sobretudo na defesa de uma arte capaz de figurar a nação. Os diversos textos que publicou sobre as artes nacionais são eloquentes em relação às suas afinidades com problemas caros ao modernismo paulista e a Mário de Andrade em particular, entre os quais a reflexão sobre a importância do estabelecimento de uma tradição estética nacional, que se revela na paisagem, na cor local e no inventário de tipos nacionais; tradição forjada pelas marcas indígena e africana, vivas no Brasil, sobretudo na “cultura popular”.18 18 Nunca é demais lembrar que o folclore, tema de Bastide em artigos e cursos, parte deles reunidos em livro (Bastide, 1959), é elemento central do repertório modernista.

O barroco arquitetônico, transformado pela presença africana no país - outro tópico caro ao modernismo de 1922 - converte-se imediatamente em interesse do sociólogo francês; as expressões nordestinas do barroco brasileiro serão conhecidas de perto na viagem de 1944 ao nordeste do país, momento em que visita também terreiros de candomblé (Bastide, 1945bBASTIDE, R. Imagens do Nordeste místico em branco e preto. Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1945b.). Ao mesmo tempo, Bastide percorre a cidade de São Paulo, que seus olhos veem crescer e transformar-se, escrevendo sobre a estética da cidade em expansão, horizontal e verticalmente, em textos nos quais dialoga com arquitetos e urbanistas. Lidos lado a lado, os registros das pesquisas simultâneas sobre o barroco e o candomblé, assim como os escritos concomitantes sobre cidades e arquitetura, mostram cruzamentos surpreendentes, deixando ver como um campo termina por iluminar e expandir a compreensão do outro.

Interessado nas projeções barrocas que encontra em diversas expressões da cultura, esses escritos permitem flagrar o seu “ponto de vista barroco”, a informar suas análises das artes, cidades e também do candomblé.19 19 Desenvolvi o ponto com vagar nos capítulos 1 e 2 de A viagem como vocação, já referidos, analisando cada um desses textos (Peixoto, 2016). Assim, o barroco não apenas fornece matéria de estudo, mas oferece elementos decisivos para que ele ajuste sua mirada analítica.

A obstinada busca modernista por uma expressão autenticamente nacional, que a obra e as pesquisas de Mário traduzem de modo exemplar, encontra eco nas formulações do sociólogo sobre a arte e a cultura brasileira, como disse antes. Mas, é importante frisar, a preocupação com a autenticidade cultural corresponde não apenas à busca de objetos genuinamente nacionais, mas à definição de uma perspectiva que permita alcançá-los. No contexto brasileiro, a questão da autenticidade liga-se ao cruzamento de legados culturais distintos, às mesclas e sínteses, que não devem ser confundidos com “pureza” ou “cópia”, nem com exotismos ou com o pitoresco.20 20 A questão encontra-se claramente explicitada na correspondência de Mário e Carlos Drummond de Andrade, quando o primeiro afirma que o seu projeto de “devoção ao Brasil” não se confunde com o cultivo de exotismos nem de regionalismos (Andrade, C., 1982, p. 5, 23).

O problema, anunciado por Mário no ensaio sobre Machado de Assis em 1939 (Andrade, M., 1943ANDRADE, M. de. Machado de Assis. In: ANDRADE, M. de. Aspectos da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Americ-Edit, 1943.) é enfrentado por Bastide em seu artigo sobre o escritor, publicado no ano seguinte. A contrapelo das leituras realizadas sobre Machado e do que ele próprio afirma (no Memorial de Aires, Machado diz não saber descrever nem pintar), Bastide vai rastrear a presença da paisagem em sua obra, que, embora pareça ausente, “está terrivelmente presente […] dissimulada atrás dos homens”, sutilmente expressa em pormenores, transposta em coloridos tênues e sensações delicadas. “Não conheço nada mais tropical”, declara. Machado “soube, com razão, ver um perigo no gosto de seus predecessores pelas paisagens exóticas” (Bastide 1940aBASTIDE, R. Machado de Assis, paisagista. Revista do Brasil, [s. l.], ano 3, n. 29, p. 3-14, 1940a., p. 4).21 21 As citações originalmente em português tiveram sua grafia atualizada.

Se o exotismo pode ser entendido como “ver o próprio país com olhos de estrangeiro” (Bastide 1940aBASTIDE, R. Machado de Assis, paisagista. Revista do Brasil, [s. l.], ano 3, n. 29, p. 3-14, 1940a., p. 5), Machado escapou do risco, do qual o sociólogo, ele também, quer escapar, em seu esforço de alcançar uma compreensão profunda da “alma brasileira”. Como se aproximar do autenticamente nacional sem deixar-se levar pelos arremedos? A questão, fundamental para Mário de Andrade, é enfrentada por Bastide, seja na crítica ligeira ou em ensaios mais longos, como “A poesia afro-brasileira”, de 1943, no qual se debruça sobre a poesia escrita por negros e mulatos no Brasil, tentando desvelar a presença da “raça na trama da obra escrita”, esforçando-se para sair das aparências e impressões primeiras de modo a capturar “ressonâncias em profundidade” (Bastide, 1983eBASTIDE, R. A poesia afro-brasileira. In: BASTIDE, R. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1983e. p. 3-110., p. 4, 41-42).22 22 Exercício semelhante, tomando como material de análise a literatura produzida por brancos, pode ser verificado no ensaio de 1945, “A incorporação da poesia africana à poesia brasileira”, reunido um ano depois em Poetas do Brasil (Bastide, 1997b).

Roteiros da pauta literária modernista são assim seguidos na definição do percurso de sua interpretação e do seu ponto de vista sociológico. Estrangeiro, engajado na superação de uma visão postiça do país, ele se vê diante de certa radicalização da busca dos poetas e escritores que vão buscar nos temas indígenas e afro-brasileiros “o exotismo no interior da terra exótica”. Se os poetas no modernismo viam-se diante de um “exotismo de segundo grau” (afinal, buscavam a diferença no próprio país), o intérprete francês teve que lidar com outro, em grau superior. Nesse sentido, sua posição aprofunda o desafio dos artistas: a procura da África no Brasil, no seu caso, converte-se na procura do “outro do outro” (Bastide, 1997bBASTIDE, R. Poetas do Brasil. São Paulo: Duas Cidades: Edusp, 1997b., p. 40-50).

A definição de uma perspectiva de análise é construída com auxílio de um jogo especular que desloca permanentemente o observador: o francês olha a África no (e desde o) Brasil e, inversamente, o Brasil na (e da) África.23 23 A busca das marcas brasileiras na África, empreendida com a ajuda dos materiais que lhe são apresentados regularmente pelo amigo Pierre Verger, se aprofunda quando da viagem que realizam juntos ao Benim e à Nigéria, em 1958. Analisei essa viagem no capítulo 4 de A viagem como vocação, “Bastide e Verger entre áfricas e brasis” (Peixoto, 2016). Desse modo, o triângulo composto pelos vértices África, Europa, Brasil define um espaço de observação movimentado por trocas e barganhas, que se revelam, mais ou menos explicitamente, em função do patamar de observação escolhido. Em outras palavras: se o folclore, o barroco e a literatura permitem ao intérprete olhar para a trama sincrética em função da preponderância branca e ocidental, as religiões, reduto privilegiado da resistência africana, dão acesso às expressões negras, abrindo caminho para que o analista localize as marcas africanas na cultura.

A apreensão dos processos de hibridação e a sondagem de suas camadas profundas dependem da definição de uma perspectiva que permita apanhá-los, como disse antes, e da conversão do intérprete à realidade estudada. O problema é expressamente discutido na introdução aos Estudos afro-brasileiros, de 1973, quando Bastide descreve a primeira etapa de seu “itinerário de pesquisador europeu nos trópicos” como uma crise de consciência, que implica uma “modificação total das [suas] categorias lógicas”; foi preciso, diz ele, “que me deixasse penetrar por uma civilização diferente da minha”, de modo que a compreensão pudesse emergir de dentro, e não do exterior (Bastide, 1983cBASTIDE, R. Introdução. In: BASTIDE, R. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1983c. p. IX-XXI., p. X-XI). A segunda etapa do itinerário corresponde ao encantamento da descoberta, fruto do desvendamento de sistemas simbólicos originais; etapa que coincide com a sua segunda viagem ao Nordeste, em 1959, quando se inicia no candomblé. Assim, a conversão que em seus diálogos com os poetas e críticos literários é definida como “poética”, mergulho na realidade estudada, efetiva-se nesse segundo momento como conversão religiosa.

Ao tornar-se africano no Brasil (africanus sum, ele diz na mesma introdução), Bastide parece incorporar a multiplicidade mesclada do eu, em uma espécie de paráfrase de Mário de Andrade, quando este afirma em mais de uma ocasião, “sou trezentos, trezentos e cinquenta”. Em outras palavras, a conversão, longe de resolver um problema identitário, revela um self plural: ao protestante; ao poeta e crítico de arte; ao professor e sociólogo cioso do método, agrega-se agora o Bastide africano, adepto do candomblé.

A convivência dessas diversas faces vem acompanhada de um conjunto de leituras e referências que concorrem para a confecção de uma perspectiva plural de análise, que se beneficia de contatos e leituras variadas. Ao lado do estudo dos escritores nacionais e das discussões com os críticos de arte, Bastide realiza uma revisão dos grandes nomes do pensamento social brasileiro (Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre, por exemplo), examinando também a tradição africanista nacional (Nina Rodrigues, Manuel Querino, Arthur Ramos, Edison Carneiro, entre outros).24 24 Cf. o ensaio de 1939, já citado, e também o balanço realizado em 1974 (Bastide, 1939, 1974b). Essas referências oferecem-lhe meios de combinar uma perspectiva sociológica de análise das religiões (verificável em As religiões africanas no Brasil [Bastide, 1971BASTIDE, R. As religiões africanas no Brasil. São Paulo: Pioneira, 1971. 2 v.], obra na qual é central a noção de “formação”, tal como sugerida por Gilberto Freyre nos anos 1930) a outra de cunho etnográfico (em O candomblé da Bahia [Bastide, 1978BASTIDE, R. O candomblé da Bahia: rito nagô. 3. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1978.], onde o esforço é decantar os nichos africanos no interior do amálgama sincrético, descrevendo-os e interpretando-os).

Para a consolidação do problema da interpenetração de civilizações, central a partir da estada brasileira, Bastide retoma e redefine também a formação francesa primeira. O enfrentamento do sincretismo leva-o a reler Lévy-Bruhl e a noção de “participação”, teia de relações que enlaça coisas, seres humanos e demais espécies que habitam o universo. Mas ao recuperar o conceito, retira-o do plano da ideação e da mentalidade mística, para considerá-la como “categoria pragmática”, operador que orienta a ação e que, portanto, “só existe quando manipulada” (Bastide, 1978BASTIDE, R. O candomblé da Bahia: rito nagô. 3. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1978., p. 274). Além disso, a participação, segundo ele, atuaria em um campo definido pelas classificações primitivas, nos termos de Durkheim e Mauss. Os primitivos, assim como nós, indica, dividem o universo em compartimentos, que estabelecem correspondências entre si; mas no interior de cada um deles, verificam-se participações.25 25 Em artigo especificamente dedicado à noção de participação, ele anuncia em termos semelhantes: “Talvez fosse melhor substituir a noção de categoria afetiva, que visa explicar o processo de formação dessas participações pelas leis da psicologia humana, pela expressão ‘categoria pragmática’, que indica que a categoria só existe manipulada […], o que levaria a substituir a explicação psicológica por uma explicação sociológica ou cultural da participação”. Aí também chama a atenção para a confusão frequente entre “participações” e “correspondências”, também entre “participação” e “identidade”. É preciso atentar, ele diz, para níveis de participação, o que pode conduzir à identificação, mas também permanecer em um nível de “simples ligação de forças” (Bastide, 1953, p. 35-37).

Tais sugestões serão aproveitas nas análises que realiza do sincretismo religioso (ou “católico-fetichista”) e das equivalências entre divindades africanas e santos católicos observadas no Brasil, que colocam, ele sugere, um problema de tradução: vemos uma mesma “realidade sobrenatural mas numa língua diferente”. As operações tradutórias que definem os processos sincréticos não significam misturas ou identificações completas, mas são sempre parciais, os textos originais mantidos em suas complexidades lexicais. “Cada nação conserva os seus deuses mas todos estão reunidos por uma série de equivalências” (Bastide, 1983a, p. 183BASTIDE, R. Contribuição ao estudo do sincretismo católico-fetichista. In: BASTIDE, R. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1983a. p. 159-191.).

A interpenetração religiosa faz conviver, em planos diferentes, participações, equivalências ou correspondências, nos termos de Marcel Griaule, também lido por Bastide quando das pesquisas sobre as “áfricas brasileiras”. A série de entrevistas realizadas pelo africanista com Ogotemmêli, o caçador dogon, e reunidas em Dieu d’eau (Griaule, 1966GRIAULE, M. Dieu d’eau. Paris: Librarie Arthème Fayard, 1966.), de 1948, e o modo como percorre os enredos de um pensamento habilidoso na realização de operações lógicas e de correspondências cosmobiológicas, inspira Bastide a pensar o candomblé como uma “filosofia sutil” e não apenas como uma religião, o que ele faz em O candomblé da Bahia (Bastide, 1978BASTIDE, R. O candomblé da Bahia: rito nagô. 3. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1978.), de 1958. Aí, ele se vale também dos escritos de Michel Leiris sobre os aspectos teatrais da possessão entre os dogon, que encontram forma acabada na tese de 1958 (Leiris, 1958LEIRIS, M. La possession et ses aspects théâtraux chez les Éthiopiens de Gondar. Paris: Plon, 1958.). As referências a Griaule e Leiris indicam como a etnografia dos nichos africanos encontrados no Brasil leva Bastide a estabelecer um diálogo estreito com certa produção africanista francesa, que ele lê no calor da hora ao ritmo das pesquisas realizadas.

A noção de “memória coletiva” de Maurice Halbwachs, de seu lado, é fundamental para que ele reflita sobre como a sobrevivência das marcas africanas no Brasil e nas Américas deve ser compreendida como processo mnemônico. Afinal, a cultura africana é recriada em nova geografia em função de viagens e recomposições, em que se observam criações de tipo bricolagem, realizadas com fragmentos de memória (Bastide, 1994aBASTIDE, R. Mémoire collective et sociologie du bricolage. Bastidiana, Brionne, n. 7-8, p. 209-242, 1994a.). Em Gurvitch, por sua vez, ele localiza as potencialidades de uma sociologia ao mesmo tempo “pluralista e empirista”, que combina os interesses durkheimianos pelas normas jurídicas e pela consciência coletiva com a perspectiva weberiana que enfatiza as condutas e a ação. Além disso, endossa o seu modelo antideterminista, apoiado na visão da realidade social composta por estratos, que logra relançar a noção maussiana de fato social total, permitindo ainda a articulação dos níveis micro e macrossociológicos de análise (Bastide, 1940bBASTIDE, R. A sociologia de Georges Gurvitch. Revista do Arquivo Municipal, [s. l.], v. 6, n. 68, p. 5-39, 1940b.).26 26 Marcas da “sociologia em profundidade” de Gurvitch podem se fazer sentir em diversos de seus trabalhos do período brasileiro e em publicações posteriores; em As Américas negras, por exemplo, Gurvitch auxilia-o projetar um “sincretismo em camadas” (Bastide, 1974a, p. 143).

Vemos então que na longa estada brasileira, Bastide não apenas define um problema que se tornará central em sua obra - o da interpenetração de civilizações - como forja uma perspectiva essencialmente compósita, para a qual concorrem diferentes repertórios: a sociologia e antropologia francesas, readquiridas e reavaliadas no Brasil; as tradições intelectuais brasileiras (literárias, sociológicas e antropológicas) e a sociologia e antropologia norte-americanas, com as quais ele entra em contato no país.

Os problemas de “difusão”, “aculturação”, “assimilação”, “miscigenação” e “acomodação”, tais como formulados no “Memorandum” de Robert Redfield, Ralph Linton e Melville Herskovits (1936)REDFIELD, R.; LINTON, R.; HERSKOVITS, M. J. Memorandum for the study of acculturation. American Anthropologist, New Series, [s. l.], v. 38, n. 1, p. 149-152, Jan./Mar. 1936., são passados em revista pelo autor, que, reconhecendo seus méritos, tenta deles se afastar (Bastide, 1948BASTIDE, R. Initiation aux recherches sur l’interpénétration des civilisations. Paris: CDU, 1948.). As formulações da Escola de Chicago, por sua vez, inspiram-lhe a pensar as cidades, as relações raciais, as migrações e as relações interétnicas, temas para os quais dirige parte importante de sua obra.27 27 As críticas que empreendeu a vertentes do culturalismo norte-americano não impediram o estabelecimento de diálogos profícuos com vários de seus expoentes, sobretudo com Herskovits, com o qual ele partilha uma série de preocupações. A noção de “reinterpretação”, nuclear para o antropólogo norte-americano, é utilizada por Bastide em mais de uma ocasião, que reconhece os seus rendimentos para a análise das questões de mudança cultural (o sincretismo seria uma forma de reinterpretação). As limitações maiores que localiza nas formulações do colega dizem respeito à falta de uma ancoragem teórica mais ampla, necessária para retirar a discussão do registro exclusivo das sobrevivências africanas (Bastide, 1974a, p. 362, 375). As afinidades de Bastide com os sociólogos e antropólogos de Chicago insinuam-se também em convergências teórico-epistemológicas: as fontes alemãs (a sociologia de Weber, Tönnies e Simmel) e o tratamento conferido aos fatos individuais, compreendidos em suas relações com a sociedade e a cultura, e que obrigam à reunião da sociologia, da antropologia e da psicologia (Cuche, 2008CUCHE, D. Roger Bastide, le “fait individuel” et l’école de Chicago. Cahiers Internationaux de Sociologie, [s. l.], n. 124, p. 41-59, 2008.).28 28 Denis Cuche observa como dentre os franceses de sua geração Bastide é dos únicos - ao lado de Halbwachs - a ler e utilizar os autores de Chicago, praticamente desconhecidos na França do entreguerras (Cuche 2008, p. 43-45). Pierre-Jean Simon (1994, p. 62), por sua vez, lembra como nos cursos de Bastide nos anos 1950 em Paris, ele tem contato com os autores da Escola de Chicago; “era praticamente o único a falar nisso”.

Tudo indica que Bastide conhece os autores de Chicago por meio dos professores norte-americanos atuantes na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, sobretudo por intermédio de Donald Pierson, aluno de Robert Park, que em seus anos brasileiros (1939-1956) faz chegar ao país um feitio de trabalho caro à Chicago, os estudos de comunidade, como também um modelo institucional, com primazia dos estudos pós-graduados e da formação de laboratórios e grupos, aos quais Bastide se mantém atento. Ecos dos autores de Chicago, e sobretudo de Park, se fazem sentir de modo mais decidido em suas reflexões sobre as expressões urbanas das religiões (em “A macumba paulista” [Bastide, 1983dBASTIDE, R. A macumba paulista. In: BASTIDE, R. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1983d. p. 193-248.], de 1946, por exemplo) ou quando se volta para o exame do crescimento da cidade e para o feitio de urbanização de São Paulo (Bastide, 1952BASTIDE, R. São Paulo, la cité tentaculaire. Le Courier de l’Unesco, Paris, v. 5, p. 8-9, 1952.).29 29 Examinei mais de perto o ponto no capítulo 1 de A viagem como vocação, mostrando como, a despeito das afinidades, Bastide se afasta de certas dicotomias caras ao vocabulário da sociologia de Chicago - comunidade/sociedade, cultura de folk/cultura civilizada - como também da associação que Park realiza entre urbanização, secularização e individualização (Peixoto, 2016).

É possível localizar ainda outros movimentos empíricos e teóricos ensaiados por Bastide quando de sua estada em terras brasileiras, por exemplo, sua proximidade de lideranças dos movimentos negros brasileiros e sobretudo paulistas, com os quais conviveu e sobre os quais escreveu.30 30 Conferir, entre outros, “A imprensa negra no estado de São Paulo” (Bastide, 1983b). Os aprendizados retirados desse convívio próximo repercutirão no formato das pesquisas sobre relações raciais que coordenou com Florestan Fernandes em São Paulo, no bojo do projeto Unesco em 1951 e 1952; aí verifica-se de forma inédita a colaboração entre acadêmicos e militantes, o que incidiu sobre os métodos e sobre os resultados das pesquisas (Campos, A., 2014CAMPOS, A. J. M. Interfaces entre sociologia e processo social: a Integração do negro na sociedade de classes e a pesquisa em São Paulo. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.).

As relações entre sociologia e psicologia, cultivadas desde o período de juventude, serão retomadas em cursos oferecidos na Universidade de São Paulo, podendo ser aferidas em textos que escreveu para o projeto Unesco - sobre os sonhos de pessoas negras -, textos nos quais é possível observar forte inclinação para as dimensões psicossociais da experiência (Bastide; Fernandes, 1955BASTIDE, R.; FERNANDES, F. (org.). Relações raciais entre negros e brancos em São Paulo. São Paulo: Anhembi, 1955.). Os elos com a psicologia encontrarão novas feições em preocupações posteriores com a sociologia das doenças mentais e com a psiquiatria social, que ainda estão por conhecer avaliação mais detida.31 31 As relações com a psicologia nessa fase madura conhecem expressão no livro Sociologie des maladies mentales (Bastide, 1965) e no Centre de psychiatrie social, que ele dirigiu nos anos 1960 e 1970.

Observações finais

O percurso e a produção de Roger Bastide aqui analisados mostram movimentações permanentes, que auxiliam à compreensão de um perfil plural, marcado pela convivência de orientações díspares. O Bastide renascido africano no Brasil não substitui o protestante e místico que o período de formação francesa revela; nem suplanta o jovem aprendiz de poeta ou o crítico de arte; muito menos o pesquisador cioso do método e investigações detidas. Um dos interesses de sua experiência e obra variadas reside em não ter resolvido de modo externo as tensões que as fricções entre zonas díspares às vezes produzem, mas em tê-las incorporado na forma de seu próprio pensamento, que se beneficiou de trânsitos e deslocamentos perspectivos.

Além de contribuir para a compreensão do autor, o exame de seus escritos e experiências coloca questões importantes para refletirmos sobre o modo como pensamos e escrevemos a história da antropologia, de acordo com os objetivos deste dossiê. Desde logo, ele nos convoca a ampliar os limites estritamente disciplinares, pela incorporação de exemplos que escapam a definições mais estritas em termos de domínios do conhecimento. Aos trânsitos indisciplinados do autor, somam-se as circulações entre França e Brasil, que o situam ao mesmo tempo na história da antropologia e da sociologia, em ambos os países. No Brasil, especificamente, além de notório especialista nas religiões afro-brasileiras, seu nome figura ao lado de importantes críticos de literatura dos anos 1930 e 1940, sendo reconhecido também como formador de uma importante geração de estudiosos e comentadores das artes.

Os movimentos disciplinares, temáticos e epistemológicos experimentados pelo autor, que o texto procurou evidenciar, deixam sugestões importantes aos interessados nos balanços históricos de saberes e práticas. De saída, convida-nos a atravessarmos fronteiras e a considerarmos, lado a lado, produções que à primeira vista não se comunicam. A leitura integrada de seus escritos ilumina, de outros ângulos, questões e problemas sobre os quais ele se debruçou com a ajuda de materiais diversos, evitando que apartemos o estudioso das religiões e o analista das artes, das cidades e do folclore.32 32 Esse tem sido o esforço de minhas leituras do autor, sistematizadas nos dois livros, já mencionados, e em diversos artigos.

A consideração detida de suas experiências leva-nos ainda a desconfiar da oposição entre centro e periferia e de um sentido preferencial da circulação dos saberes, como se houvesse zonas de produção de ideias e outras onde elas aportam, mais ou menos alteradas. Bastide não apenas descobre concepções originais nas tradições intelectuais brasileiras, fundamentais na definição de sua perspectiva analítica, como encontra outras (a antropologia e sociologia norte-americanas), desconhecidas nos círculos nos quais se formara. E essas descobertas, realizadas ao sabor dos achados empíricos, permitiram-lhe a revisão de aprendizados primeiros.

O Brasil foi não apenas um rico laboratório de pesquisas para o autor, mas descortinou um campo de possibilidades, teóricas e metodológicas. Permitiu-lhe também aceder ao ensino universitário e aos meios acadêmicos - lugares de formação de novas gerações de especialistas, para a qual muito contribuiu33 33 Não esqueçamos que ele foi também responsável pela formação de uma geração de antropólogos e sociólogos, como Florestan Fernandes, Maria Isaura Pereira de Queiróz, Fernando Henrique Cardoso, Ruth Cardoso, entre outros. - sem que deixasse de circular por espaços extramuros, frequentando círculos e figuras atuantes na cena cultural e política da cidade. Ao mesmo tempo dentro e fora da universidade, pôde testar o estilo monográfico da escrita acadêmica e a forma do ensaio, fazendo-as conviver expressamente em algumas obras (em Psicanálise do cafuné, [Bastide, 1941BASTIDE, R. A psicanálise do cafuné. Curitiba: Guaíra, 1941.] e Imagens do Nordeste místico em branco e preto, [Bastide, 1945bBASTIDE, R. Imagens do Nordeste místico em branco e preto. Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1945b.], por exemplo). Com isso, auxilia-nos a desconfiar da incompatibilidade entre institucionalização científica e experimentalismos, como se algumas formas expressivas fossem completamente descartadas diante da “disciplinarização” do conhecimento. Finalmente, o seu exemplo leva-nos a interconectar passado e presente, mostrando como ideias à primeira vista ultrapassadas ou autores démodés (Lévy-Bruhl, por exemplo) estão vivos no presente, permanentemente relidos e reavaliados.

Mas não se trata de fazer de Bastide um caso excepcional. O exercício proposto a partir do seu exemplo tem como uma de suas motivações pensar o modo como empreendemos o resgate de teorias e autores do passado, perguntando se não seria possível dirigir à história da antropologia as orientações teóricas primeiras de nossa disciplina. Dirigir ao passado a atitude reflexiva que baliza todo e qualquer estudo antropológico não nos auxiliaria a compreender as práticas e saberes em seus próprios termos e, ao mesmo tempo, buscar extrair suas potencialidades para a reflexão contemporânea? Com o auxílio de instrumentos adequados parece possível liberar o passado de seu confinamento em um tempo distante, inscrevendo-o no presente, convertendo a estranheza que ele porventura carregue em diferença produtiva, e deixando que ela afete e transforme as nossas próprias formas de reflexão. Formas “velhas” ou “antiquadas” de fazer antropologia não poderiam nos provocar e provocar novas questões?

Uma atitude antropológica dirigida a momentos pretéritos permite uma recuperação das ideias que não se confunde com o mero registro que visaria, no limite, preencher as lacunas de um amplo mapa de saberes, trazendo à tona figuras “menores”, “esquecidas” ou curiosas, que terminariam por compor uma espécie de museu da disciplina repleto de ídolos e totens, mais ou menos estranhos. Ao contrário, o desafio inscrito na operação (antropológica) de reaver saberes e práticas outros é converter a diferença que eles exibem em instrumento de indagação, de questionamento e de autorreflexão.34 34 Esforços bem-sucedidos nessa direção podem ser encontrados em Geiger (1999), Valentini (2013) e Goyatá (2019).

Uma história da antropologia orientada pela bússola antropológica nos convida, assim, a colocar em suspeição dicotomias como “científico” x “pré-científico”, “amadorismo” x “profissionalismo”, “central” x “periférico”, “vencedores” x “vencidos”. Claro está que tais categorias podem ser pensadas como classificações forjadas em situações precisas, que produzem efeitos sobre o mundo (e que as análises sócio-históricas dos contextos intelectuais permitem elucidar), mas não parecem ser as ferramentas mais adequadas à compreensão do caráter de procedimentos e concepções específicos, considerados do ponto de vista de seus formuladores. Nesse sentido, o célebre lema lévi-straussiano - a antropologia é a “ciência social do observado” - parece sugestivo para o exame das práticas e ideias antropológicas, do passado e do presente, que demandam o tratamento detido de saberes e fazeres de modo a compreendermos linguagens, modelos e condutas, e que pensemos com eles.

É dessa maneira que tenho me voltado para a história da antropologia, procurando realizar investigações minuciosas de produções e experiências, como as de Roger Bastide, que põem a nu movimentos de contágio e imbricações entre ideias à primeira vista “envelhecidas” ou “superadas” (seja do ponto das formulações ou do vocabulário), mas que se revelam repletas de sugestões para os caminhos da reflexão que fazemos hoje.

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  • 1
    A expressão “homem-ponte” foi utilizada por Antonio Candido (1989)CANDIDO, A. O ato crítico. In: CANDIDO, A. A educação pela noite e outros ensaios. São Paulo: Ática, 1989. p. 122-127. para definir o crítico, sociólogo e poeta Sérgio Milliet.
  • 2
    Esta reflexão teve origem no painel organizado por Patrícia Ferraz de Matos e Frederico Delgado Rosa, “Genealogias resgatadas: trilhos para uma historiografia das antropologias do mundo”, no Congresso da Associação Portuguesa de Antropologia, Lisboa, 2019. O sentido de “re-suscitar” foi retirado de Despret e Stengers (2011DESPRET, V.; STENGERS, I. Les faiseuses d’histoires: que font les femmes à la pensée?. Paris: La Découverte, 2011., p. 60, nota 1).
  • 3
    Para a biografia do autor, ver Ravelet (1993)RAVELET, C. Bio-bibliographie de Roger Bastide. Bastidiana, Brionne, n. 1, p. 39-48, 1993..
  • 4
    Retomei com mais vagar esses escritos na introdução de Diálogos brasileiros (Peixoto, 2000PEIXOTO, F. A. Diálogos brasileiros: uma análise da obra de Roger Bastide. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2000.). A relação da bibliografia completa de Bastide pode ser encontrada em Dauty (1978)DAUTY, D. Roger Bastide: bibliographie, 1921-1974. Paris: CREDA, 1978. (Cahiers d’Anthropologie, n. esp.)..
  • 5
    Salvo indicação contrária, as traduções são de minha autoria.
  • 6
    As cartas trocadas entre eles mostram que foi Richard quem introduziu Bastide nos estudos sociológicos e quem o auxiliou na preparação da agrégation; mostram ainda os laços de amizade que estabeleceram. Cf. Morin (1994)MORIN, F. Les inédits et la correspondance de Roger Bastide. In: LABUTHE-TOLRA, P. (dir.). Roger Bastide ou le réjouissement de l’abîme. Paris: L’Harmattan, 1994. p. 21-42. e também os artigos escritos por Bastide sobre Richard (Bastide, 1930BASTIDE, R. Un gran sociologue français. Gaston Richard. Revue du christianisme social, [s. l.], v. 2, p. 428-437, 1930., 1998BASTIDE, R. Un grand sociologue français: Gaston Richard. Bastidiana, Brionne, n. 2, p. 9-18, 1998.). As relações próximas entre Bastide e Richard foram examinadas por Reuter (1997)REUTER, A. Entre les civilisations: Roger Bastide (1898-1974) et les religions africaines au Brésil. 1997. Diplôme (Études approfondies) - École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, 1997..
  • 7
    Sobre os laços dos universitários, e sobretudo de Richard, com a Igreja reformada de Bordeaux, cf. artigo de Luze (2015)LUZE, S. P. de. Gaston Richard (1890-1945): un sociologue protestant peu connu de ses coreligionnaires bordelais et de ses concitoyens. Lendemains: études comparées sur la France, [s. l.], n. 158-159, p. 63-78, 2015., que integra um dossiê sobre o autor.
  • 8
    É Lepenies (1988)LEPENIES, W. Between literature and science: the rise of sociology. Cambridge: Cambridge University Press, 1988. quem vê o conflito entre Tarde e Durkheim como amparado em temperamentos intelectuais diversos. Segundo ele, Tarde repudiaria o modelo do scholar representado por Durkheim; este, por sua vez, recusaria o homem de letras que Tarde personificava. Tal visão se afasta da leitura de Marc Joly (2017)JOLY, M. La révolution sociologique: de la naissance d’une régime de pensée scientifique à la crise de la philosophie (XIXème et XXème siècles). Paris: La Découverte, 2017., que localiza a disputa entre os autores no modo como concebem as relações entre sociologia e psicologia. Tendo a achar que os dois argumentos são complementares. Lembro ainda, com o auxílio de Mucchielli (1994)MUCCHIELLI, L. Sociologie et psychologie en France, l’appel à un territoire commun: vers une psychologie collective (1890-1940). Revue de Synthèse, [s. l.], n. 3-4, p. 445-483, 1994., que a sociologia de Durkheim não recusa de modo cabal a psicologia, mas a localiza no interior da sociologia, que de certo modo a englobaria. Isso sem esquecer que alguns dos chamados “durkheimianos” se valeram expressamente das contribuições da psicologia, Marcel Mauss e Maurice Halbwachs, por exemplo.
  • 9
    As ideias do historiador, psicólogo e professor na Faculdade de Teologia de Paris, Raoul Allier, grande referência para Richard, é matéria de exame de Bastide em artigo de 1929, “L’œuvre de Raoul Allier et la sociologie religieuse” (Bastide, 1993BASTIDE, R. L’œuvre de Raoul Allier et la sociologie religieuse. Bastidiana, Brionne, n. 2, p. 19-30, 1993.).
  • 10
    Vale notar, em primeiro lugar, que Bastide recorre às análises de Max Weber sobre a ética protestante e o espírito do capitalismo para fundamentar o seu ponto de vista sobre as relações de dupla mão existentes entre religião e sociedade. Em segundo, as considerações sobre o relativo descolamento da “superestrutura” religiosa de seu substrato material aqui anunciado serão retomadas e exemplificadas na análise das religiões africanas no Brasil, quando ele mostra como o esfacelamento dos grupos e das coletividades pela escravidão não impediu a reconstrução de expressões religiosas, que se mantêm vivas e transformadas no Brasil. Cf. Bastide (1971)BASTIDE, R. As religiões africanas no Brasil. São Paulo: Pioneira, 1971. 2 v., sobretudo o primeiro volume.
  • 11
    Astrid Reuter (1997)REUTER, A. Entre les civilisations: Roger Bastide (1898-1974) et les religions africaines au Brésil. 1997. Diplôme (Études approfondies) - École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, 1997. chama a atenção para o silêncio progressivo de Bastide em relação a Richard e sugere ter sido o Brasil um campo profícuo para o estreitamento de laços com a sociologia durkheimiana, diante da forte influência de Durkheim no meio intelectual paulista da época e entre os professores franceses que integraram a missão francesa na Universidade de São Paulo na década de 1930. Difícil aferir tal influência durkheimiana, seja nos intelectuais brasileiros, seja no grupo francês de professores, bastante heterogêneo. O que talvez possa ser dito é que longe do solo francês e das polarizações de um debate acirrado, Bastide pode adquirir certa distância para reler Durkheim à luz de outros autores e das pesquisas empíricas que realizaria no Brasil. De todo o modo, Richard continua presente nos programas de seus cursos na Universidade de São Paulo.
  • 12
    Lembremos a tese de Gilda de Mello e Souza, A moda no século XIX, defendida em 1950 e publicada no ano seguinte na revista do Museu Paulista. Não por acaso, apenas em 1987 o ensaio é publicado na forma de livro, adquirindo reconhecimento e visibilidade inéditos, com o título O espírito das roupas (Souza, 1987SOUZA, G. de M. e. O espírito das roupas. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.).
  • 13
    Essa produção jornalística encontra-se no Arquivo Roger Bastide, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. A crítica literária, especificamente, foi reunida por Amaral (2010)AMARAL, G. C. do. Navette literária França Brasil: a crítica de Roger Bastide. São Paulo: Edusp, 2010. 2 v..
  • 14
    Antonio Candido afirma, em mais de uma ocasião, as marcas deixadas por Bastide em sua formação como crítico, cf. “Roger Bastide e a literatura brasileira” e “Machado de Assis de outro modo”, reunidos em Candido (1993)CANDIDO, A. Roger Bastide e a literatura brasileira. In: CANDIDO, A. Recortes. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. p. 99-104.. A importância das aulas, dos textos e da convivência com Bastide é lembrada pelos jovens membros do grupo Clima, que se tornariam importantes ensaístas e críticos de arte em São Paulo; além de Antonio Candido, Gilda de Mello e Souza, Décio de Almeida Prado, Lourival Gomes Machado, Paulo Emílio Salles Gomes, Ruy Coelho, entre outros. Sobre essa geração que desenhou “destinos mistos”, cf. Pontes (1998)PONTES, H. Destinos mistos: os críticos do grupo Clima em São Paulo, 1940-1968. São Paulo: Companhia das Letras, 1998..
  • 15
    Nos capítulos 1 e 2 de A viagem como vocação (Peixoto, 2016PEIXOTO, F. A. A viagem como vocação: itinerários, parcerias e formas de conhecimento. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2016.), “Roger Bastide e as cidades” e “O candomblé barroco de Roger Bastide”, proponho uma leitura integrada dos textos que Bastide produziu sobre cidades, barroco e candomblé, mostrando as repercussões que essas reflexões e pesquisas tiveram, umas sobre as outras.
  • 16
    Cf. Milliet (1981)MILLIET, S. Diário crítico. São Paulo: Martins Fontes: Edusp, 1981. e Bastide (1980)BASTIDE, R. A propósito da poesia como método sociológico. In: QUEIROZ, M. I. P. de (org.). Roger Bastide. São Paulo: Ática, 1980. p. 81-87.. Sobre os diálogos entre os dois críticos, ver R. Campos (1996)CAMPOS, R. S. Ceticismo e responsabilidade: Gide e Montaigne na obra crítica de Sérgio Milliet. São Paulo: Anablume, 1996..
  • 17
    Acompanho no detalhe os diálogos entre Bastide e Mário de Andrade no capítulo 1 de Diálogos brasileiros (Peixoto, 2000PEIXOTO, F. A. Diálogos brasileiros: uma análise da obra de Roger Bastide. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2000.).
  • 18
    Nunca é demais lembrar que o folclore, tema de Bastide em artigos e cursos, parte deles reunidos em livro (Bastide, 1959BASTIDE, R. Sociologia do folclore brasileiro. São Paulo: Anhembi, 1959.), é elemento central do repertório modernista.
  • 19
    Desenvolvi o ponto com vagar nos capítulos 1 e 2 de A viagem como vocação, já referidos, analisando cada um desses textos (Peixoto, 2016PEIXOTO, F. A. A viagem como vocação: itinerários, parcerias e formas de conhecimento. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2016.).
  • 20
    A questão encontra-se claramente explicitada na correspondência de Mário e Carlos Drummond de Andrade, quando o primeiro afirma que o seu projeto de “devoção ao Brasil” não se confunde com o cultivo de exotismos nem de regionalismos (Andrade, C., 1982ANDRADE, C. D. de (org.). A lição do amigo: cartas de Mário de Andrade a Carlos D. de Andrade. Rio de Janeiro: José Olympio, 1982., p. 5, 23).
  • 21
    As citações originalmente em português tiveram sua grafia atualizada.
  • 22
    Exercício semelhante, tomando como material de análise a literatura produzida por brancos, pode ser verificado no ensaio de 1945, “A incorporação da poesia africana à poesia brasileira”, reunido um ano depois em Poetas do Brasil (Bastide, 1997bBASTIDE, R. Poetas do Brasil. São Paulo: Duas Cidades: Edusp, 1997b.).
  • 23
    A busca das marcas brasileiras na África, empreendida com a ajuda dos materiais que lhe são apresentados regularmente pelo amigo Pierre Verger, se aprofunda quando da viagem que realizam juntos ao Benim e à Nigéria, em 1958. Analisei essa viagem no capítulo 4 de A viagem como vocação, “Bastide e Verger entre áfricas e brasis” (Peixoto, 2016PEIXOTO, F. A. A viagem como vocação: itinerários, parcerias e formas de conhecimento. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2016.).
  • 24
    Cf. o ensaio de 1939, já citado, e também o balanço realizado em 1974 (Bastide, 1939BASTIDE, R. État actuel des études afro-brésiliennes: le problème du contact des races. Revue internationale de sociologie, [s. l.], v. 47, n. 1-2, p. 77-89, 1939., 1974bBASTIDE, R. The presente status of afro-american research in Latin America. Daedalus, [s. l.], v. 103, n. 2, p. 111-123, 1974b.).
  • 25
    Em artigo especificamente dedicado à noção de participação, ele anuncia em termos semelhantes: “Talvez fosse melhor substituir a noção de categoria afetiva, que visa explicar o processo de formação dessas participações pelas leis da psicologia humana, pela expressão ‘categoria pragmática’, que indica que a categoria só existe manipulada […], o que levaria a substituir a explicação psicológica por uma explicação sociológica ou cultural da participação”. Aí também chama a atenção para a confusão frequente entre “participações” e “correspondências”, também entre “participação” e “identidade”. É preciso atentar, ele diz, para níveis de participação, o que pode conduzir à identificação, mas também permanecer em um nível de “simples ligação de forças” (Bastide, 1953BASTIDE, R. Contribution à l’etude de la participation. Cahiers Internationaux de Sociologie, [s. l.], v. 14, n. 8, p. 30-40, 1953., p. 35-37).
  • 26
    Marcas da “sociologia em profundidade” de Gurvitch podem se fazer sentir em diversos de seus trabalhos do período brasileiro e em publicações posteriores; em As Américas negras, por exemplo, Gurvitch auxilia-o projetar um “sincretismo em camadas” (Bastide, 1974aBASTIDE, R. As Américas negras. São Paulo: Difel, 1974a., p. 143).
  • 27
    As críticas que empreendeu a vertentes do culturalismo norte-americano não impediram o estabelecimento de diálogos profícuos com vários de seus expoentes, sobretudo com Herskovits, com o qual ele partilha uma série de preocupações. A noção de “reinterpretação”, nuclear para o antropólogo norte-americano, é utilizada por Bastide em mais de uma ocasião, que reconhece os seus rendimentos para a análise das questões de mudança cultural (o sincretismo seria uma forma de reinterpretação). As limitações maiores que localiza nas formulações do colega dizem respeito à falta de uma ancoragem teórica mais ampla, necessária para retirar a discussão do registro exclusivo das sobrevivências africanas (Bastide, 1974aBASTIDE, R. As Américas negras. São Paulo: Difel, 1974a., p. 362, 375).
  • 28
    Denis Cuche observa como dentre os franceses de sua geração Bastide é dos únicos - ao lado de Halbwachs - a ler e utilizar os autores de Chicago, praticamente desconhecidos na França do entreguerras (Cuche 2008CUCHE, D. Roger Bastide, le “fait individuel” et l’école de Chicago. Cahiers Internationaux de Sociologie, [s. l.], n. 124, p. 41-59, 2008., p. 43-45). Pierre-Jean Simon (1994SIMON, P.-J. Roger Bastide et l’histoire de la sociologie. In: LABUTHE-TOLRA, P. (dir.). Roger Bastide ou le réjouissement de l’abîme. Paris: L’Harmattan, 1994. p. 55-68., p. 62), por sua vez, lembra como nos cursos de Bastide nos anos 1950 em Paris, ele tem contato com os autores da Escola de Chicago; “era praticamente o único a falar nisso”.
  • 29
    Examinei mais de perto o ponto no capítulo 1 de A viagem como vocação, mostrando como, a despeito das afinidades, Bastide se afasta de certas dicotomias caras ao vocabulário da sociologia de Chicago - comunidade/sociedade, cultura de folk/cultura civilizada - como também da associação que Park realiza entre urbanização, secularização e individualização (Peixoto, 2016PEIXOTO, F. A. A viagem como vocação: itinerários, parcerias e formas de conhecimento. São Paulo: Edusp : Fapesp, 2016.).
  • 30
    Conferir, entre outros, “A imprensa negra no estado de São Paulo” (Bastide, 1983bBASTIDE, R. A imprensa negra do estado de São Paulo. In: BASTIDE, R. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1983b. p. 129-158.).
  • 31
    As relações com a psicologia nessa fase madura conhecem expressão no livro Sociologie des maladies mentales (Bastide, 1965BASTIDE, R. Sociologie des maladies mentales. Paris: Flammarion, 1965.) e no Centre de psychiatrie social, que ele dirigiu nos anos 1960 e 1970.
  • 32
    Esse tem sido o esforço de minhas leituras do autor, sistematizadas nos dois livros, já mencionados, e em diversos artigos.
  • 33
    Não esqueçamos que ele foi também responsável pela formação de uma geração de antropólogos e sociólogos, como Florestan Fernandes, Maria Isaura Pereira de Queiróz, Fernando Henrique Cardoso, Ruth Cardoso, entre outros.
  • 34
    Esforços bem-sucedidos nessa direção podem ser encontrados em Geiger (1999)GEIGER, A. Uma antropologia sem métier: primitivismo e crítica cultural no modernismo. 1999. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1999., Valentini (2013)VALENTINI, L. Um laboratório de antropologia: o encontro de Mário de Andrade, Dina Dreyfus e Claude Lévi-Strauss (1936-1938). São Paulo: Alameda Editorial, 2013. e Goyatá (2019)GOYATÁ, J. V. Haiti popular: saberes antropológicos e artístico em circulação (1940-1950). 2019. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    01 Fev 2021
  • Aceito
    15 Out 2021
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