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“Se não for pra causar nem quero”: a visibilidade das transformações corporais e a produção de feminilidades por meio das cirurgias plásticas*

Resumo

Este artigo analisa discursos públicos produzidos por mulheres acerca de intervenções cirúrgicas estéticas destinadas a aprimorar seus corpos. O material utilizado foram as postagens em um grupo de discussão bastante numeroso e ativo no Facebook, além de algumas entrevistas complementares. A distinção entre resultados mais ou menos “naturais” ou “marcados” foi um elemento importante. Como eixos de discussão, enfatizou-se: o aprimoramento e as transformações corporais via recursos biomédicos; o uso de próteses de silicone e redefinições de natural versus “marcado” e o impacto das normas gênero.

Cirurgia Plástica; Gênero; Natural/Marcado; Aprimoramento

Abstract

This paper analyses public discourses produced by women about aesthetic surgical interventions intended to improve their bodies. The paper uses posts on a very active and popular Facebook group, and a few complementary interviews. An important element in this framework is the distinction between more or less “natural” or “dramatic” results. The following themes are emphasized as being the main areas of discussion: enhancement and body transformations via biomedical resources; the use of silicone breast prostheses; redefinitions of natural versus “dramatic”; and, the impact of gender norms.

Plastic Surgery; Gender; Natural/Dramatic; Improvement

Introdução

A frase que dá título a este artigo ilustra uma série de depoimentos revelados em interações via redes sociais que retratam o modo pelo qual muitas mulheres definem sua preferência por cirurgias plásticas1 1 A cirurgia plástica é uma das especialidades médicas reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) brasileiro. Segundo a resolução nº 1.621/2001 deste conselho, “visa tratar doenças e deformidades anatômicas, congênitas, adquiridas, traumáticas, degenerativas e oncológicas, (...) objetivando beneficiar os pacientes, com vistas ao seu equilíbrio biopsicosocial e consequente melhoria sobre a sua qualidade de vida”. Há subdivisões correntes entre cirurgias plásticas estéticas e reparadoras (Schimitt, 2017), que passam por noções de saúde, tanto física quanto mental (Antonio, 2012). que evidenciem resultados marcantes e que, por sua vez, ressaltem todos os investimentos empregados neste tipo de transformação corporal e subjetiva. O presente artigo analisa a produção deste tipo de discurso público produzido por mulheres acerca de intervenções cirúrgicas destinadas a aprimorar seus corpos, tendo a distinção entre resultados mais ou menos “naturais” como diferenciador importante. O foco analítico recai sobre um grupo de discussão bastante numeroso e ativo no Facebook, além de algumas entrevistas complementares. A seguir são apresentadas as motivações que deram origem à pesquisa,2 2 Os dados aqui discutidos são resultados de pesquisas realizadas para um trabalho de conclusão de curso (Silva, 2018) e de Iniciação Científica no âmbito do projeto "Processos de Subjetivação, transformações corporais e produções de gênero através da promoção e do consumo de recursos biomédicos”, coordenado por Fabíola Rohden e apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil (CNPq). Gostaríamos de agradecer às participantes da pesquisa e também às/aos pareceristas que contribuíram com sugestões valiosas para a versão final do artigo. os procedimentos metodológicos adotados e os resultados mais significativos. Na sequência, por meio da incorporação de referências teóricas e etnográficas pertinentes, os dados são analisados através de três eixos centrais. O primeiro se refere à dimensão das escolhas e investimentos realizados por essas mulheres que poderiam ser relacionados à valorização do aprimoramento individual via transformações corporais. O segundo diz respeito às especificidades ou à direção na qual este aprimoramento é procurado e produzido, ou seja, quais os modelos de intervenção e, portanto, de corpos almejados, e sua relação com dinâmicas envolvendo gênero, classe e raça/etnia. Já o terceiro eixo, que expressa também as considerações finais deste trabalho, problematiza a distinção apontada no campo entre as preferências por resultados mais “naturais” ou “marcados” e suas implicações para que se discutam transformações corporais e normas de feminilidade.

Antes de mais nada, é preciso mencionar que o Brasil é o segundo país com maior número de procedimentos médicos estéticos realizados em 2017, segundo survey da International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS, 2018). Foram contabilizados 2.427.535 procedimentos no país naquele ano, de acordo com o survey elaborado com dados de cirurgiões plásticos registrados em agremiações vinculadas à entidade internacional, como a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP). Outro dado interessante do survey é a preponderância feminina: do número total de procedimentos executados, 86,4% foram realizados em mulheres. Além disso, as estatísticas reafirmam que a cirurgia plástica mais comum no Brasil e no mundo é o aumento dos seios com implantes de próteses de silicone. Os dados do ISAPS vêm sendo divulgados anualmente desde 2010, e o Brasil tem sempre figurado entre os países que mais realizam procedimentos estéticos, sendo que, em 2013, ocupou a primeira posição no ranking, superando até mesmo os Estados Unidos.

Uma das formas de divulgação e de trocas de informação a respeito dos recursos biomédicos e, em especial, das cirurgias plásticas tem sido via internet e diferentes redes socais. Inicialmente, esta pesquisa realizou um levantamento com sites de clínicas e de cirurgiões/ãs brasileiros/as dedicados à divulgação de serviços de cirurgias plásticas. Foi possível reconhecer a produção de um forte discurso relacionado ao aprimoramento individual e à produção de certos padrões de “normalidade” estética, profundamente marcados pelo gênero e também por diferenças étnico-raciais e relativas ao “combate” ao envelhecimento. Chamou-nos também a atenção o fato de que muitas dessas páginas traziam depoimentos de mulheres, quase sempre acompanhadas de fotos, testemunhando a grande transformação que a cirurgia havia proporcionado em suas vidas. São relatos pessoais, feitos em ambientes públicos, destinados à promoção de um determinado tipo de serviço médico, nos quais se misturavam a produção de uma narrativa acerca da transformação de si e a gratidão ao especialista e aos serviços que produziram a “realização de um sonho”, como muitas expressavam. Tais resultados deram origem à pretensão de investigar com mais cuidado a produção deste tipo de discurso por parte das mulheres que estão envolvidas com a possibilidade de fazer uma cirurgia plástica.

O campo e os procedimentos metodológicos

Consideramos que uma investigação em redes sociais seria potencialmente produtiva para este objetivo, na medida em que poderia revelar um conjunto mais consistente de relatos espontâneos acerca dessas experiências pessoais. Além disso, destaca-se a própria dimensão interativa e produtiva das dinâmicas das redes e grupos que constituem práticas, ideais e posicionamentos. Entendemos, assim como Beleli (2015BELELI, Iara. O imperativo das imagens: construção de afinidades nas mídias digitais. cadernos pagu, (44), Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero-Pagu/Unicamp, 2015 [https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8637321 - acesso em 20 fev 2019].
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
, 2016BELELI, Iara. Novos cenários: entre o “estupro coletivo” e a “farsa do estupro” na sociedade em rede. cadernos pagu, (47), Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero-Pagu/Unicamp, 2016 [https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8647266 - acesso em 20 fev 2019].
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), que a proliferação de conteúdos e de autores/as nas redes pode justapor distintas moralidades e amplificar os diferentes posicionamentos das pessoas a respeito dos temas em voga, mas também participar da constituição dessas relações e da produção de conteúdo. Os posicionamentos das pessoas, como lembra a autora, não são produzidos de forma separada da vivência cotidiana dos/as criadores/as de conteúdo. Como explicitaremos com mais detalhes adiante, essas distintas moralidades e posicionamentos emergem em processos de constituição dialógicos e relacionais, o que permite ver os depoimentos aqui analisados não como simples expressão de preferências pessoais, mas de complexas interações sociais marcadas pelo desejo de diferenciação do outro, nesse caso, via implante de silicone e a forma como ele é incorporado.

As redes sociais dão suporte às mais variadas congregações e são ambientes que vêm integrando a realidade enquanto ferramenta de conexões e trocas. A partir das contribuições de Hine (2015)HINE, Christine. Ethnography for the internet: embedded, embodied and everyday. Huntingdon, Bloomsbury Publishing, 2015. e Miller (2012)MILLER, Daniel. Social Networking Sites. In: MILLER, Daniel. HORST, Heather. (eds.). Digital Anthropology. London, Berg, 2012, pp.146-161., pode-se definir essas redes enquanto instâncias da realidade cotidiana, produzidas em conjunto e não apartadas dessa realidade. Com uma abordagem da internet enquanto artefato cultural, Hine problematiza conceitos como netnografia (Kozinets, 2010KOZINETS, Robert. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. London, Sage, 2010.), reforçando a importância da manutenção dos pressupostos do método etnográfico nos estudos que têm como parte de seu campo ambientes virtuais (Hine, 2000HINE, Christine. Virtual Ethnography. London, SAGE Publications, 2000.; 2015).

Para além disso, Miller (2012)MILLER, Daniel. Social Networking Sites. In: MILLER, Daniel. HORST, Heather. (eds.). Digital Anthropology. London, Berg, 2012, pp.146-161. também enfatiza como redes sociais utilizadas mundialmente, apesar de serem ferramentas padronizadas, têm seus usos informados pela cultura local. Em função disso, Miller e Horst (2012) argumentam que na etnografia digital é necessária especial atenção às conexões entre aqueles elementos tidos como gerais ou globais e aqueles locais ou particulares. Para os autores, isso se traduz em uma espécie de holismo que enquadra o particular pelo viés etnográfico, mas agrega aspectos não locais que podem impactar ou transcender o quadro.

O Facebook é uma possibilidade de acesso potencialmente produtiva, na medida em que foi a rede social mais utilizada pelos Brasileiros em 20183 3 Segundo relatório (Kemp, 2018) para We Are Social, agência de comunicação e mercado na internet. e também por conter uma ferramenta de grupos que congrega usuários/as, direcionando o foco das interações para um assunto específico. Esse ambiente permite a convergência de discursos que apontam para as perspectivas das pessoas sobre um tema definido.

Para esta investigação, foram considerados, inicialmente, todos os grupos no Facebook cujo nome continha as palavras “cirurgia plástica”. Os mais de 100 grupos encontrados têm algumas variações, como a destinação a pessoas de determinadas localidades, a tipos específicos de cirurgia e a programações financeiras para o pagamento dos procedimentos. Chama a atenção também a associação de alguns deles a médicos/as, como por exemplo, um grupo intitulado “Cirurgia Plástica Dr. A. - Mulheres do A.” e a presença de dois grupos que se destinam à discussão sobre a realização de cirurgias plásticas “pelo SUS”. A maioria dos grupos congrega um número muito alto de participantes. Os cinco mais populares têm entre 100 mil e 320 mil integrantes.

No caso deste artigo, privilegiou-se um dos maiores grupos, diariamente ativo no Facebook, cujo foco é lipoaspiração e implantes de silicone e que chamaremos aqui de LS. A magnitude desse grupo pode ser ilustrada pela numerosa contagem de suas participantes: centenas de milhares. Isso traz alguns desafios ao considerar-se todas essas pessoas ou perfis na rede como grupo. Como denotam os próprios resultados etnográficos, há entre essas participantes posicionamentos bastante distintos. O que podemos traçar como ponto de encontro dessas pessoas é seu interesse na temática evidenciada no nome do grupo, que faz referência aos procedimentos de lipoaspiração e silicone, bem como a vontade de se informar ou de produzir conteúdo sobre determinadas formas de intervenções tecnológicas de constituição de si, com a informação e acesso a esses procedimentos como estratégia de distinção. Apesar desse ponto de encontro, as informações que se destinam a identificar as pessoas desse grupo por trás dos perfis nas redes sociais indicam uma série de diversidades: étnico-racial, de faixa etária, geográfica (de todas as regiões do Brasil e, em alguns casos, até de fora desse país), e de classe social, para citar algumas das mais evidentes. Dessa forma, não podemos pressupor similaridades entre as participantes para além do interesse nos procedimentos citados e alguma identificação com aspectos do gênero feminino que se relacionam aos procedimentos estéticos ali discutidos.

A atividade constante no grupo e o fato de os procedimentos privilegiados nele – lipoaspiração e aumento de seios com próteses de silicone – serem os mais performados no Brasil (ISAPS, 2018) foram decisivos para essa escolha. Outras possibilidades de cirurgia plástica, apesar de menos frequentemente do que a lipoaspiração e os implantes de silicone, também são ali discutidas.

Nesse grupo existe a associação a um médico, que é inclusive administrador do ambiente virtual. A função de administrador de um grupo no Facebook permite que um dos usuários, geralmente o criador do grupo ou um membro indicado por ele, faça a moderação das atividades, defina as configurações de privacidade do grupo4 4 As configurações de privacidade definem aqueles/as que terão acesso ao conteúdo postado no grupo. Em um grupo público, não há restrições de acesso às postagens, que acabam se tornando também públicas. e possa excluir membros, postagens e comentários. Contudo, é importante frisar que, no caso deste grupo, a presença do administrador ficou por vezes despercebida diante da magnitude dos debates e do volume intenso de interações. A foto de capa, que fica na parte de cima, como um cabeçalho de página quando se acessa o grupo, tem o nome do médico, seus contatos via telefone e redes sociais. Além disso, compõem esta capa uma foto do rosto do médico com touca e roupa cirúrgica e uma série de outras imagens de partes de corpos femininos, geralmente do tronco, cujos rostos não aparecem.

A descrição do grupo frisa que o objetivo é a troca de informações e experiências sobre cirurgias plásticas. Após isso, há uma série de proibições cuja infração seria punida com expulsão, entre elas: divulgar outros grupos sobre o mesmo assunto, acessá-lo com perfis fake5 5 São assim chamadas as contas nas redes sociais cujas informações de identificação não correspondem à pessoa por trás do perfil. , expor fotos de terceiros ou que mostrem partes íntimas sem tarjas para cobri-las, discussões sobre a mudança de privacidade do grupo, fazer anúncios e expor resultados negativos dos procedimentos. A descrição termina enfatizando a importância da formação do médico e recomenda profissionais associados/as à SBCP.

A interação com o grupo se deu a partir do momento em que uma das pesquisadoras se apresentou, revelando que estava realizando um estudo sobre o tema das cirurgias plásticas e questionando se poderia usar os depoimentos produzidos naquele contexto. Mesmo considerando que as informações estão disponibilizadas em um grupo público, de acesso aberto, optamos por ocultar qualquer identificação das participantes e mesmo do grupo. Nesse sentido, todas as informações que poderiam comprometer a privacidade e o anonimato foram removidas ou alteradas.

O grupo foi acompanhado de janeiro a novembro de 2018. Os assuntos mais frequentes nesse período no LS foram as cirurgias, o período pós-operatório, os preços das intervenções, recomendações de clínicas, de hospitais e de médicos/as e discussões sobre o tipo de procedimento que deve ser feito para atingir cada resultado desejado. Também foram frequentes fotos de “antes e depois” do procedimento. Essas fotos mostram, geralmente, uma mudança evidente conquistada por meio da cirurgia plástica. A nudez nessas imagens é frequente, com mamilos e genitálias cobertos por emojis.6 6 Os emojis são ferramentas de comunicação, típicos das redes sociais, onde emoções que usualmente precisariam de algumas palavras para serem expressas são traduzidas em símbolos e desenhos, geralmente representação de uma face expressiva. Aplicativos de celulares permitem que os emojis sejam adicionados facilmente a fotos. Foi bastante comum que as postagens contendo fotos de “antes e depois” usassem emojis tristes para cobrir mamilos e genitálias nas fotos do “antes” e emojis felizes para o mesmo fim nas fotos do “depois”.

Em geral, as postagens com dúvidas e pedidos de recomendação são respondidas no grupo, mas são aquelas que apresentam fotos de resultados de cirurgias as que mais mobilizam a interação e as discussões. Nessas ocasiões, as mulheres que expõem sua experiência são muito questionadas, e o que interessa à maioria das participantes são as especificidades do procedimento, o/a médico/a que o realiza, os preços e o período de recuperação.

Dentre toda a vasta gama de interações e assuntos tratados no grupo, um tópico em especial chamou a atenção. Trata-se de uma constante discussão em torno da preferência por resultados das cirurgias “naturais” ou “marcados” após o implante de próteses de silicone nos seios. Este tema nos pareceu central para abordar mais diretamente os processos relativos a transformações corporais e à produção de subjetividades associadas a este tipo de recurso médico. Em particular, tomaremos aqui como objeto de análise as interações provocadas por uma enquete, feita por uma integrante do grupo, sobre a preferência do “silicone marcado” em oposição ao “natural”, que gerou uma discussão com 195 respostas.7 7 O administrador do grupo, um cirurgião plástico, também se manifestou sobre o assunto em outra postagem em que aborda os tipos de próteses indicadas para cada tipo de desejo de aparência final, reiterando a popularidade de tal tópico.

Além da análise dessas repostas, de modo complementar, também foram realizadas duas entrevistas semiestruturadas com mulheres escolhidas por meio de suas postagens sobre esse assunto. Foram abordadas as participantes que fizeram comentários com mais informações ou que mais interagiram com outras nas postagens do grupo. Uma delas, aqui chamada de Renata, escolhida dentre as que preferiam a opção mais “natural” e cuja entrevista, via mensagens de texto em uma ferramenta de chat, estendeu-se por cerca de duas horas. A outra, Flávia, partidária daquelas que declararam não preferir resultados naturais. Flávia também foi muito receptiva e estabeleceu um diálogo que foi além dos tópicos abordados na entrevista, enviando não só mensagens de texto, mas também de áudio, através do mesmo chat. Os resultados das entrevistas mostraram-se em consonância com as postagens públicas no grupo.

“Natural ou Marcado”: diferentes possibilidades de transformação

A discussão em torno das preferências por resultados mais ou menos “naturais” é comum no grupo e reaparece sempre que alguma integrante chama a atenção para isto. É interessante que, em contraste com os sites de clínicas médicas e de cirurgiões/ãs que, muitas vezes, valorizam os resultados “naturais” das intervenções,8 8 Em entrevista, uma médica dermatologista que realiza uma série de procedimentos estéticos afirmou que, inclusive, “perde” pacientes que a procuram para realizar intervenções mais “exageradas”, pois esta profissional não deseja que tais procedimentos estejam associados à sua imagem e aos resultados de seu trabalho. no caso das participantes do grupo LS, o “natural” pode ser indesejado.

Certamente há a presença de mulheres que atestam suas preferências por resultados mais “naturais”, como é o caso de Renata, pós-graduanda em Direito e moradora de um bairro de classe média em uma capital do sudeste brasileiro. Em uma das discussões do LS acerca de resultados “naturais” ou mais “marcados”, em cirurgia plástica nos seios, Renata responde: “Eu prefiro um resultado mais natural e fico mega feliz quando dizem que não parece que meu peito é silicone”. Durante a entrevista concedida, Renata afirmou que “sempre quis ter peitão”, que não achava o tamanho dos seus seios proporcional ao restante do corpo e que, por isso, fez a cirurgia. Para ela, os resultados foram satisfatórios e sua vida “melhorou demais”. Ela segue afirmando: “Minha autoestima ficou 100%, e eu finalmente achei que eu era eu mesma, sabe? Não achava que aquele corpo com peito pequeno era eu”. Sobre o resultado da cirurgia plástica feita, ela diz que “Meu peito é súper natural. Não parece silicone nem ao toque. Nesses nove anos, nem os namorados que eu tive perceberam. Eu que contei”.

Houve também a situação em que o aspecto “natural” foi valorizado em resposta às postagens de uma mulher trans, demonstrando o “antes e depois” da cirurgia nos seios. Elen revelou logo de início que é trans e “99% mulher”. Implantou próteses de silicone e estava feliz com o resultado que, segundo sua avaliação, “ficou bem natural”. Essa postagem recebeu a atenção de muitas participantes do grupo, com mais de mil reações. Os comentários foram elogiosos, e o teor dos elogios passava por adjetivações como linda, perfeita, natural e bem feminina. Também foram comuns comentários no sentido de Elen não parecer trans ou homem, em conjunto com os elogios. Uma das participantes, por exemplo, comentou: “Essas mulheres [trans] são lindas demais e, quando fazem as cirurgias estéticas, ficam perfeitas, sem explicação. Mana, tu já era linda, agora tá perfeita”. A perfeição de que fala a participante parece referir-se a uma feminilidade específica, acessível e produzida por meio de tecnologias como as cirurgias plásticas.

Contudo, de um ponto de vista mais geral, o que chama a atenção são os discursos enfáticos em torno de um certo desprezo pelo “natural” e a valorização dos resultados que seriam imediatamente percebidos. Foi isso o que notamos nas quase duas centenas de respostas motivadas pela pergunta de Marcela: “Meninas querem silicone: natural ou bem marcado estilo cheguei? Eu não gosto de Natural, não”.

Nas respostas daquelas que não querem um resultado natural, as justificativas passam pela abordagem das cirurgias plásticas enquanto investimentos e da percepção visual de tal investimento: “Penso assim: paguei foi caro, então tem que ser algo que dá pra ver que tenho silicone.” Outra participante, que se diz insatisfeita com os resultados de sua cirurgia plástica, relata ter ouvido comentários sobre seu corpo ter uma aparência natural e reclama: “É triste você gastar um dinheiro que não tem (empréstimo) e ouvir as pessoas dizendo: ‘tá natural’”. Além de evidenciar as diferentes normas em tensão a respeito de “natural” e “marcado”, a postagem é enfática no enquadramento da cirurgia como um investimento que deve ser percebido. Um resultado natural converte-se em tristeza, pois é como um investimento que não traz os resultados esperados: a aparência da cirurgia plástica e o reconhecimento dela por parte de terceiros/as.

As justificativas das partidárias do “marcado” passam também pelo desejo da aparência ou do reconhecimento de um corpo com próteses de silicone: “Silicone é para ter cara de silicone, uai”; pela diferenciação da aparência natural que já existe: “Pra deixar natural, melhor nem colocar silicone”; e, mais notavelmente, pela expressão do desejo de “causar”, de impactar: “Natural todo peito é. Quero silicone é pra causar mesmo.”; “Se não for pra causar, nem quero.” Outras postagens evidenciam o desejo de que o resultado do implante seja marcado no corpo: “Marcado, tão marcado que pra mim poderia ter a marca da prótese em alto relevo.”; “Quero tipo cara de falso mesmo”; “Bem marcado, natural eu já tive a vida toda.” Frases como estas certamente revelam algo muito particular no que se refere à incorporação das próteses na percepção de si e realização pessoal por meio de recursos biomédicos e tornam bastante complexas as diferentes agências envolvidas nesses processos.9 9 Para uma discussão acerca do reconhecimento das possíveis agências de dispositivos biomédicos envolvendo processos de materialização e subjetivação, consultar Rohden (2018), sobre o uso de implantes hormonais por mulheres.

Um comentário que vai no mesmo sentido, mas que apresenta um certo deslocamento ou acréscimo na justificativa em relação aos anteriores é o de Flávia:

Quero que meus seios sejam compatíveis comigo, de acordo com as outras coisas, por exemplo: cabelos alisados, unhas postiças, cílios alongados; a barriga vou tirar; os peitos não podem ser naturais, vão ficar se sentindo excluídos.

O depoimento de Flávia demonstra um reconhecimento do papel dos artifícios na construção do corpo feminino. Mais do que isso, e consoante às postagens de várias outras participantes; demonstra a possibilidade de que esses recursos sejam desejáveis em relação à alternativa natural. Embora em tom jocoso, há a sugestão de uma necessária adequação de algumas características ao restante das outras já estabelecidas como artificiais. Perspectivas como as de Flávia e das outras partidárias sobre a valorização desses recursos e a explicitação de seu uso são contrastantes às reveladas por narrativas mais próximas àquelas dos/as médicos/as, que dão ênfase à possibilidade de resultados naturais ao descreverem seu trabalho em suas páginas na internet.

Flávia, dona de casa e mãe mato-grossense, foi também uma das entrevistadas. Durante a conversa, revelou que ela ainda não havia feito as cirurgias desejadas. Contou que seus planos iniciais de fazer as cirurgias foram interrompidos por uma contraindicação relacionada ao ganho de peso associado à gravidez. No momento, estava dedicada a uma dieta alimentar, preparando-se para plásticas no abdome e nas mamas, que optou por fazer neste período da vida, após ter dado à luz sua filha. Bem humorada, ela afirmou: “Só tá faltando tirar a barriga e colocar os peitos. O resto é tudo falso”. Seu plano é “fazer tudo: lipo, abdome e seios”. Sobre os resultados, disse que quer sempre o melhor e “o peito bem marcado”. Seu desejo é fazer:

praticamente o procedimento de quem tem câncer (…) pra diminuir e deixar duro, duas bolotas enormes (…) pra quem ver dizer que é silicone mesmo; não tenho por que esconder nada, muito menos cirurgia plástica.

Esta última referência de Flávia a “não esconder” a cirurgia plástica remete também à importância de revelar um tipo de intervenção que, em outras situações, poderia ser alvo de ocultamento ou vergonha. Ao que parece, faz parte do processo de realização do projeto individual dessas mulheres a exposição de sua capacidade e de sua busca por promover as alterações corporais que sentem como necessárias à sua satisfação pessoal, através dos recursos biomédicos disponíveis.

Em consonância com este processo, percebe-se ainda a conformação dessas mulheres como consumidoras em um mercado cada vez mais pungente. No que se refere a este ponto, Heyes e Jones (2009)HEYES, Cressida; JONES, Meredith. (eds.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009. mencionam a nova relação de paciente-consumidora que se estabelece entre clientes e médicos/as. Se antes eram pacientes, hoje são consumidoras. Se antes seus desejos eram patologizados, frequentemente secretos e vergonhosos, hoje se constroem narrativas públicas em contextos midiáticos e globais que demonstram as transformações envolvendo esses procedimentos.

No caso do grupo aqui estudado, a busca por aprimoramento e sua tradução na imagem da paciente-consumidora, que pretende determinar suas escolhas, muitas vezes de forma incisiva frente aos/às médicos/as, são características presentes. Adriana, por exemplo, ao responder à pergunta sobre se preferia silicone “natural ou marcado”, disse de forma enfática: “Marcado! Levei logo uma foto de como queria e falei que, se não ficasse marcado, comia o fígado do médico!”. Apesar do tom exagerado da metáfora, a frase ilustra o tipo de intencionalidade e a exigência das mulheres que buscam as intervenções cirúrgicas frente aos/às médicos/as.

Cirurgias plásticas e (re)produção de diferenças

As posições produzidas no contexto de interação do grupo LS constituem um importante foco de análise, porque evidenciam certas transformações presentes no cenário contemporâneo de recurso às intervenções estéticas e também nos levam a refletir acerca do uso desses artefatos face a diferenciações sociais como classe, raça, geração e, neste caso, especialmente, gênero. Para avançar na análise do material, recorreremos, nos limites deste artigo, a três eixos principais. O primeiro eixo se refere à dimensão das escolhas e investimentos feitos por essas mulheres que, sugerimos, podem ser relacionadas à valorização do aprimoramento individual que se realiza, entre muitas outras possibilidades, por meio do consumo de informações e produtos destinados a transformações corporais.10 10 Para uma análise que ressalta a dimensão da escolha na cirurgia estética, considerando uma perspectiva que acentua como o sujeito faz opções circunscritas pelos modelos, repertórios e diferentes expertises disponíveis, ver a análise de Fraser (2009) sobre revistas femininas e programas de televisão que propõem transformações na aparência dos seus participantes. Para a autora, os sujeitos são produzidos por várias formas de agência, disponíveis em dado momento ou contexto cultural específico.

O campo dos estudos sobre a biomedicalização da sociedade, no panorama internacional e brasileiro, tem sido muito profícuo em chamar a atenção para o deslocamento do uso dos recursos biomédicos, farmacêuticos ou cirúrgicos, do tratamento das doenças para o quadro mais amplo da melhoria do desempenho e satisfação pessoal. Isso ocorre, sobretudo, com o advento e a disponibilização em maior escala de biotecnologias muito variadas, desenvolvidas no arcabouço de uma medicina cada vez mais tecno-científica. Além disso, esta oferta de recursos coaduna-se com a promoção da ideia de que as/os pacientes devem se tornar mais responsáveis pela administração de sua saúde e condições de vida. Configura-se o modelo do/a paciente que é também consumidor/a, sempre atento/a às novas informações e descobertas recém anunciadas (Clarke et al, 2010; Rose, 2007ROSE, Nicolas. The politics of life itself: biomedicine, power, subjectivity in the twenty-first century. Princeton, Princeton University Press, 2007.; Martin, 2007MARTIN, Emily. Bipolar Expeditions: mania and depression in American culture. Princeton, Princeton University Press, 2007.; Dumit, 2012DUMIT, Joseph. Drugs for life: How Pharmaceutical Companies Define Our Health. Duke University Press/Durham and London, 2012.).

Descrevendo este cenário de consumo das inovações biomédicas, Clarke e colegas (2010), enfatizam como o corpo deixa de ser visto de modo relativamente estático ou imutável e enquanto foco de controle para converter-se em algo flexível e suscetível de ser transformado e reconfigurado. O processo de controle e normalização abre espaço para um processo de customização ou personalização associado à instituição das práticas tecno-científicas, como nichos de mercado que sustentam uma “medicina de boutique” (Clarke et al, 2010). A mesma linha de argumentação é defendida por Rose (2007)ROSE, Nicolas. The politics of life itself: biomedicine, power, subjectivity in the twenty-first century. Princeton, Princeton University Press, 2007., que destaca como as tecnologias médicas contemporâneas são usadas não apenas para curar patologias, mas para controlar os processos vitais do corpo e da mente. Para o autor, as tecnologias da otimização estão associadas à ideia do aprimoramento como algo direcionado ao futuro e ao aparecimento de indivíduos consumidores desses novos desejos e possibilidades de controle da vida. A novidade não é a existência da vontade ou da prática do aperfeiçoamento, e sim o fato de passarem a moldar a vida dos sujeitos. Rose (2007)ROSE, Nicolas. The politics of life itself: biomedicine, power, subjectivity in the twenty-first century. Princeton, Princeton University Press, 2007. também enfatiza a ocorrência de uma passagem da normalização para a customização não apenas do corpo, mas também de sensações, desejos, habilidades emocionais e cognitivas.

No campo da cirurgia plástica, podemos sugerir um paralelo com esses argumentos, na medida em que também se passa cada vez mais do emprego dessas técnicas de intervenção com base na justificativa da “reparação”, motivada por alguma deformidade ou doença, para um cenário no qual o desejo ou expectativa de melhoria se torna a motivação central. Como demonstram os trabalhos de Heyes e Jones (2009)HEYES, Cressida; JONES, Meredith. (eds.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009., e também o clássico livro de Gilman (1999)GILMAN, Sander. Making the Body Beautiful: A Cultural History of Aesthetic Surgery. Princeton, Princeton University Press, 1999., a distinção entre as cirurgias plásticas reparadoras e aquelas com fins cosméticos marcou esta especialidade médica de forma contundente. De um lado estariam as intervenções cujo objetivo seria restaurar a configuração normal dos tecidos corporais em termos de aparência e funcionalidade, em virtude de ferimentos ou dos então chamados defeitos congênitos. De outro, o objetivo seria aprimorar o corpo em declínio em relação a padrões considerados “normais”. Um aspecto importante na história da aceitação desses procedimentos diz respeito à importância do “complexo de inferioridade”, categoria cunhada pelo psicólogo austríaco Alfred Adler em 1910 (Adler e Jelliffe, 1917ADLER, Alfred; JELLIFFE, Smith Ely (trad.). Study of organ inferiority and its psychical compensation: a contribution to clinical medicine. New York, The Nervous and Mental Disease Publishing Company, 1917.). A recorrência a esta noção era comum para justificar as práticas de auto-aperfeiçoamento. De acordo com Heyes e Jones (2009HEYES, Cressida; JONES, Meredith. (eds.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009.:5, Tradução nossa.): “Porque o conceito era vago e relativo à percepção do paciente de sua própria psicologia, os cirurgiões mais facilmente poderiam justificar as intervenções com base em necessidades psíquicas”. Mais contemporaneamente, o termo usado para justificar as intervenções, do ponto de vista médico, é “baixa autoestima”, categoria que também abarca uma grande fluidez nas intepretações. E, de forma significativa, a distinção entre reparação e estética torna-se cada vez mais problemática, como mostra o trabalho de Schimitt (2017)SCHIMITT, Marcelle. Da superfície à carne: as fronteiras entre estético e reparador na formação e atuação no campo da cirurgia plástica. Dissertação de mestrado, Antropologia Social, UFRGS, 2017..

Contudo, se o discurso médico, analisado na bibliografia citada, tem de alguma forma lidado sempre com a necessidade de justificar uma intervenção em decorrência de um problema (defeitos congênitos, imperfeições, complexo de inferioridade, baixa autoestima), cuja definição e fronteiras sempre foram ambíguas, os depoimentos das mulheres que apresentamos apontam para outra direção. Certamente que nossa análise é limitada pelos recortes deste trabalho de campo, mas o discurso negativo, da ênfase nos problemas, parece suplantado pela expressão do desejo de aprimoramento, de alcançar um algo a mais, que produziria satisfação pessoal e exigiria certo tipo de investimento. Isso só se mostra possível no contexto em que o consumo desses recursos biomédicos se torna cada vez mais acessível e no qual é moralmente justificável o uso deste tipo de intervenção no quadro da valorização de novas práticas de otimização e de aprimoramento de si, via biomedicina.

Se o quadro geral pode ser compreendido desta forma, as especificidades ou a direção na qual este aprimoramento é procurado e produzido exigem o desenvolvimento de um esforço analítico a mais. Trata-se exatamente do segundo eixo de análise que gostaríamos de trazer à tona e que diz respeito a como poderíamos qualificar os modelos de intervenção e, portanto, de corpos, almejados por boa parte das participantes do LS. Nessa direção, a distinção apresentada entre “natural” e “marcado” pode ser discutida melhor por meio da incorporação de alguns trabalhos que têm enfatizado o enraizamento das cirurgias e das intervenções estéticas no contexto das dinâmicas envolvendo gênero, classe e raça/etnia.

Um trabalho exemplar neste sentido é a análise feita por Heyes (2009) acerca da blefaroplastia asiática, procedimento realizado com a finalidade de tornar os olhos das mulheres asiáticas maiores e mais redondos, ou “ocidentalizados”. Problematizando abordagens que veem nessa cirurgia apenas um “racismo internalizado”, a autora propõe pensar como todas as cirurgias cosméticas, na verdade, seriam sempre, também, étnicas. Ao contrário do apagamento da questão, o que Heyes propõe é que passemos a questionar o quanto as intervenções feitas por mulheres brancas e tantas outras correspondem a modificações corporais que trazem em si marcações étnicas. Para a autora, todos os corpos são etnicamente marcados, e as cirurgias realizadas em pessoas brancas, e não apenas aquelas que moldam narizes negros ou pálpebras asiáticas, também estão envolvidas em projetos raciais de conformidade corporal.

No caso do Brasil, Edmonds (2010)EDMONDS, Alexander. Pretty Modern: Beauty, Sex and Plastic Surgery in Brazil. Durham, Duke University Press, 2010. chama a atenção para o fato de a cirurgia estética ser concebida em termos de embelezamento. Por trás disto, revela-se uma noção de beleza relacionada à raça e à classe social, de forma que os/as belos/as seriam os/as socialmente dominantes. Essa beleza é vista pelo autor como um capital usado para mobilidade social no Brasil, como no caso das siliconadas, personagens populares que representariam uma “fantasia do corpo enquanto veículo de ascensão social” (Edmonds, 2010EDMONDS, Alexander. Pretty Modern: Beauty, Sex and Plastic Surgery in Brazil. Durham, Duke University Press, 2010.:72. Tradução nossa.). O trabalho mais recente de Jarrín (2017)JARRÍN, Alvaro. The biopolitics of beauty: cosmetic citizenship and affective capital in Brazil. Oackland, Univ. California Press, 2017., embasado em um estudo histórico e etnográfico de grande fôlego e em uma proposta teórica original que articula o plano da biopolítica com a capacidade de “afetar”, associada à estética, aprofunda esta discussão. O autor salienta a questão da mobilidade social e as conexões entre as hierarquias de raça, classe e gênero associadas à promoção da beleza por meio das cirurgias plásticas no Brasil.

Podemos sugerir que algumas das participantes do grupo LS expressam estas conexões e ecoam mesmo o desejo de mobilidade social associado ao corpo. Uma delas, por exemplo, ao justificar por que desejava a aparência de siliconada, afirmou: “Eu quero cheegueeeei mesmo, porque, se depender dos meus [peitos] pra chegar em algum lugar, eu tô ferrada”. Mesmo em tom jocoso, a cirurgia plástica aparece, assim, significada como meio para se chegar a um lugar idealizado.

No que se refere mais especificamente à discussão acerca do “natural”, podemos recorrer às contribuições de Naidin (2016)NAIDIN, Silvia. (Bio)tecnologias do corpo e do gênero: Uma análise da construção de corporalidades femininas. Tese de doutorado, Ciências Sociais, UERJ, 2016., por meio de pesquisa realizada no Rio de Janeiro. A autora afirma que a valorização do que parece ou é descrito como natural seria hegemônica em meios elitizados. Neles, as mulheres prezariam por discrição e privacidade em torno das suas cirurgias, diferentemente de grupos mais populares, que apreciariam uma feminilidade “supergostosa”, como descreve Naidin (2016)NAIDIN, Silvia. (Bio)tecnologias do corpo e do gênero: Uma análise da construção de corporalidades femininas. Tese de doutorado, Ciências Sociais, UERJ, 2016.. Seus/suas interlocutores/as de classes médias e altas descrevem essa feminilidade, muitas vezes, como um exagero ou excesso de volume, em forma de músculos, próteses e preenchimentos em partes do corpo como seios e glúteos. Para a autora, em ambos os circuitos operaria uma divisão entre bizarro e aceitável, com deslocamentos, a depender do grupo social.

No grupo LS, embora não tenha sido possível traçar um perfil das centenas de milhares de mulheres que constituem este coletivo, pode-se sugerir que essas preferências e divisões ressoam de alguma forma. De um lado, temos a preferência pelo “natural” e pela distinção de padrões associados a celebridades mais populares: “Se for pra ficar marcado, eu coloco duas bolas que é mais barato. Deus me livre ficar com peitos iguais aos da Gracyane Barbosa; quero bem natural, claro”. De outro, impõe-se a preferência por uma cirurgia plástica que resulte em uma aparência impactante: “(…) tipo [para] quando alguém me encontrar falar ‘Oi, silicone, e depois Oi, Pri’”. E que também revela os investimentos realizados: “penso assim: paguei foi caro, então tem que ser algo que dê pra ver que tenho silicone”.

As moralidades que circulam nas redes parecem estar associadas à diferenciação social, tanto no caso das preferências por um resultado natural, quanto no caso das preferências pela marca do silicone no corpo. No primeiro caso, a moralidade que se aproxima daquilo que os cirurgiões/ãs geralmente preferem e tentam praticar: resultados “naturais”. Estes parecem relacionados a um pensamento mais conservador sobre as modificações corporais e sobre a forma de circunscrição no corpo das normas de gênero. A diferenciação social aqui operaria no sentido de separar uma cirurgia plástica que emula a natureza daquela que marca no corpo e deixa visível a intervenção e o formato da prótese, o que é visto por muitas das integrantes do grupo como algo indesejável, associado ao bizarro. Já no segundo caso, a forma de diferenciação social é feita de forma diretamente associada ao uso e à visibilidade dos implantes de silicone. Sugerimos que as próprias interações dessas mulheres via grupo LS participam dos processos pelos quais elas constroem sua subjetividade e sua remodelação corporal. O que parece ser decisivo nessas relações é a forma como dar-se-ia a visibilidade da transformação. Em um diálogo que ultrapassa as experiências individuais, essas mulheres processam sua autoconstituição a partir da diferenciação de si em relação às outras, suas interlocutoras no próprio grupo LS.

De qualquer forma, o que se observa até o momento, reforçando as indicações da bibliografia, é que as preferências por determinados tipos de redefinição corporal têm profundas conexões com padrões historicamente constituídos em termos de classe social, geração, raça/etnia e gênero. E, para além disso, a dimensão do consumo e da demonstração pública de que se tem condições de ter acesso a determinados recursos de transformação ou aprimoramento torna-se central.

As preferências demonstradas nas interações no grupo e ilustradas nas entrevistas, além de revelarem os contornos que o consumo desses recursos biomédicos para o aprimoramento adquirem e apontarem para possíveis diferenciações sociais, remetem ainda à necessidade de problematizarmos um pouco mais o contraste entre “natural” e “marcado”. Chegamos, assim, ao terceiro eixo analítico, que se traduz também em nossas considerações finais para este artigo. Esta escolha retórica se dá exatamente pelo fato de que este tópico remonta a uma série de discussões fundamentais nas ciências sociais e especialmente no âmbito dos estudos de gênero e ciência (Fausto-Sterling, 1992FAUSTO-STERLING, Anne. Myths of the gender: biological theories about women and men. New York, Basic Books, 1992 [1985].; Haraway, 2000HARAWAY, Donna. Manifesto Ciborgue: ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século XX. In: HARAWAY, Donna; KUNZRU, Hari; TADEU, Tomaz. (orgs.) Antropologia do Ciborgue: as vertigens do pós-humano. Belo Horizonte, Autêntica, 2000.). Longe de pretender recuperar este amplo debate, optamos aqui por trazer uma discussão mais específica ao campo das cirurgias estéticas e transformações corporais.

Para seguir adiante, vale a referência ao trabalho de Weiss e Kukla (2009)WEISS, Daniel; KUKLA, Rebecca. The “Natural Look”: Extreme Makeovers and the Limits of Self-Fashioning. In HEYES, Cressida; JONES, Meredith (ed.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009, pp.117-132. que analisa a produção de um “visual natural” (natural look, no original), em um programa de televisão norte-americano, cuja atração é a transformação de pessoas por meio de cirurgias plásticas e outras tecnologias estéticas. Estariam evidentes no programa, segundo os autores, duas posições a respeito da intervenção humana em sua natureza: uma, libertária, que entende essas intervenções como algo constitutivo do humano, e outra, essencialista, que não reconhece como legítima essa intervenção. Haveria ainda uma variedade de discursos sobre as cirurgias plásticas, sem definições acuradas a respeito do que o “natural” significaria.

Weiss e Kukla (2009)WEISS, Daniel; KUKLA, Rebecca. The “Natural Look”: Extreme Makeovers and the Limits of Self-Fashioning. In HEYES, Cressida; JONES, Meredith (ed.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009, pp.117-132. enfatizam que são atribuídas correntemente às cirurgias plásticas uma função primordial de combate aos estigmas corporais. Por esse ponto de vista, cirurgias plásticas que criam estigmas, marcas evidentes ou cicatrizes, seriam consideradas fracassadas. Para as mulheres que buscam um resultado aparentemente natural, a cirurgia plástica não deve ser perceptível. A aparência desejada seria, portanto, informada por normatividades “conservadoras”. Nessa linha, um estigma pode existir antes da cirurgia, e não deveria permanecer depois. Se, em contraste, são buscados resultados visivelmente artificiais, esse estigma, ou seja, a marcação no corpo de que um processo de modificação tecnológico foi executado, outra norma parece surgir. Nesse caso, a regra seria a de que a marcação, ou o estigma, deveria estar presente depois da cirurgia. Se não estiver, o procedimento não foi satisfatório.11 11 Embora não haja espaço neste artigo, gostaríamos de apontar que esta discussão também poderia ser aprofundada por meio do contraste analítico entre a noção de “marcado” e o processo de incorporação da cicatriz nos casos de cirurgia de mastectomia, como aponta o trabalho de Slatman (2016).

As partidárias do silicone “marcado” que encontramos no grupo LS, de certo modo, desafiam uma normatividade “conservadora”, como a identificada por Weiss e Kukla (2009)WEISS, Daniel; KUKLA, Rebecca. The “Natural Look”: Extreme Makeovers and the Limits of Self-Fashioning. In HEYES, Cressida; JONES, Meredith (ed.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009, pp.117-132., que prescreveria um corpo sem híbridos ou intervenções. Suas narrativas parecem ilustrar muito mais a ideia de que é preciso, ou mesmo desejável, que se busquem as transformações corporais almejadas e que este investimento subjetivo, físico e financeiro seja evidente e visível. A relação de incorporação das próteses como parte do próprio corpo e de si, mostrando uma subjetividade combinada, que congrega elementos “internos” e “externos”, reforça este ponto. Isso pode ser ilustrado pela referência a uma participante do grupo que comemora o resultado de sua cirurgia plástica, postando fotos da parte do corpo operada, antes e depois do procedimento, e o seguinte texto:

Meninas, hoje completo mesversário dos meus gêmeos amados (…). Meu melhor presente, de mim para mim mesma!!! Súper feliz sem usar aquele sutiã com bojo que era um pesadelo. ESTAR PLENA É A MELHOR SENSAÇÃO QUE EXISTE (Destaque no original).

A expressão da possibilidade de alcance da “plenitude” por meio da conquista de um corpo com próteses aponta de forma significativa para este novo tipo de sujeito que se realiza através do acréscimo de algo mais, resultado de grandes investimentos. Nesta direção estaríamos mais próximas de uma posição “libertária”, nos termos de Weiss e Kukla (2009)WEISS, Daniel; KUKLA, Rebecca. The “Natural Look”: Extreme Makeovers and the Limits of Self-Fashioning. In HEYES, Cressida; JONES, Meredith (ed.). Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009, pp.117-132., ou de uma corporalidade mais plástica e flexível, como sugerem Clarke e colegas (2010). A frequência com a qual as mulheres do LS reportam a importância de mostrar os resultados de forma evidente também corrobora esta interpretação. Suas preferências são por ressaltar os investimentos pessoais feitos no processo e, principalmente, os resultados que se constituem, nesse sentido, como as próprias marcas ou estigmas, fruto das cirurgias. Nada mais distante, ao que parece, da vergonha ou ocultamento do processo, associados a uma justificativa de baixa autoestima. O que prepondera é a exposição de uma trajetória de capacidade de investimento em si própria, sendo eficaz na conquista dos recursos necessários e a consequente transformação corporal e, portanto, subjetiva, almejada.

Como tentamos argumentar, estas indicações se coadunam com um cenário mais geral, no qual uma aura de ambiguidade moral associada a certos problemas tratados por meio da medicina vem sendo confrontada por uma obrigação de buscar melhorias no desempenho e performance. Privacidade, segredo e vergonha, que tornavam indesejável a exposição de certos tratamentos médicos, estariam dando lugar à publicização de discursos sobre o uso destes recursos. E isso se torna possível no contexto vigente, de valorização do aprimoramento individual. O foco na capacidade pessoal de conhecimento e acesso a tratamentos biomédicos visando ao aprimoramento também indicaria a produção de formas de distinção social possível por meio do uso dessas tecnologias (Rohden, 2017ROHDEN, Fabíola. Vida saudável versus vida aprimorada: tecnologias biomédicas, processos de subjetivação e aprimoramento. Horizontes Antropológicos, (23), Porto Alegre, 2017, pp.29-60.). As postagens no LS relatam trajetórias em torno das cirurgias plásticas, contendo imagens e textos que enfatizam este tipo de narrativa, evidencia os investimentos pessoais e as “melhorias” ou “realizações” alcançados por meio desses procedimentos.

Contudo, se as referências às possibilidades de aprimoramento e a uma plasticidade ou capacidade de transformação corporal podem ser lidas pelo registro “libertário”, é necessário que se explicite muito bem os limites dessa referência. Libertário, nesse sentido, aponta para o esboroamento de uma concepção essencialista de corpo, no sentido de uma realidade material que está plenamente sujeita a modificações, conforme as necessidades apresentadas pelos sujeitos e as tecnologias disponíveis. Potencialmente, isto representaria uma condição fundamental para o questionamento de enquadramentos morais associados às normas de gênero que prescrevem uma justaposição entre corpos (a princípio binários, neste registro), identidades de gênero e mesmo sexualidades, indicando novas possibilidades performativas diante das normatividades de gênero (Butler, 1990BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e a Subversão da Identidade. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1990.).

Nessa direção, caberia nos perguntarmos se a performance de gênero que valoriza uma aparência “marcada” poderia ser enquadrada no que Haraway (2000)HARAWAY, Donna. Manifesto Ciborgue: ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século XX. In: HARAWAY, Donna; KUNZRU, Hari; TADEU, Tomaz. (orgs.) Antropologia do Ciborgue: as vertigens do pós-humano. Belo Horizonte, Autêntica, 2000. classifica como uma produção não centrada no binômio natureza/cultura, como o ciborgue, por exemplo, e o potencial revolucionário aí contido. A aparência desejada das próteses, com ênfase em mostrar essa qualidade artificial, sugere que sim. Porém, a centralidade dos seios como uma marca de gênero e feminilidade complexifica esta hipótese. Isso porque as definições normativas tradicionais do que seria o corpo feminino idealizado permanecem, como vimos nas postagens, completamente ativas nessas práticas.

Podemos sugerir que as normas de gênero discutidas por meio do grupo LS, apesar de se mostrarem flexíveis ou alternativas no que se refere à distinção entre “natural” e “marcado”, demonstrando, por exemplo, a produção de uma feminilidade que é realizada com o auxílio de recursos cirúrgicos, também reafirmam certas posições. A mais evidente é a importância concedida aos seios enquanto definidores da feminilidade. De qualquer forma, se no plano do que se almeja e como se apresenta a feminilidade corporal certos traços permanecem, no que diz respeito ao enraizamento disso na circunscrição de uma “natureza” imutável e pré-determinada, percebemos modificações interessantes neste contexto etnográfico específico. O que preferimos destacar, neste cenário, por meio da situação apresentada, é a emergência de novas formas de produção do gênero, inclusive nos contornos da anatomia corporal, que acentuam a sua percepção como algo que é feito, produzido, trabalhado e, por fim, “marcado”, em qualquer circunstância e dentro de qualquer modelo normativo.

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  • 1
    A cirurgia plástica é uma das especialidades médicas reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) brasileiro. Segundo a resolução nº 1.621/2001 deste conselho, “visa tratar doenças e deformidades anatômicas, congênitas, adquiridas, traumáticas, degenerativas e oncológicas, (...) objetivando beneficiar os pacientes, com vistas ao seu equilíbrio biopsicosocial e consequente melhoria sobre a sua qualidade de vida”. Há subdivisões correntes entre cirurgias plásticas estéticas e reparadoras (Schimitt, 2017SCHIMITT, Marcelle. Da superfície à carne: as fronteiras entre estético e reparador na formação e atuação no campo da cirurgia plástica. Dissertação de mestrado, Antropologia Social, UFRGS, 2017.), que passam por noções de saúde, tanto física quanto mental (Antonio, 2012ANTONIO, Andrea Tochio de. O Psicólogo com o Bisturi na Mão: um estudo antropológico da cirurgia plástica. São Paulo-SP, Annablume, 2012.).
  • 2
    Os dados aqui discutidos são resultados de pesquisas realizadas para um trabalho de conclusão de curso (Silva, 2018SILVA, Jéssica Brandt da. “Se não for pra causar nem quero”: feminilidades naturais e artificiais via cirurgias plásticas. Trabalho de conclusão de curso, Ciências Sociais, UFRGS, 2018.) e de Iniciação Científica no âmbito do projeto "Processos de Subjetivação, transformações corporais e produções de gênero através da promoção e do consumo de recursos biomédicos”, coordenado por Fabíola Rohden e apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil (CNPq). Gostaríamos de agradecer às participantes da pesquisa e também às/aos pareceristas que contribuíram com sugestões valiosas para a versão final do artigo.
  • 3
    Segundo relatório (Kemp, 2018)KEMP, Simon. Digital in 2018 in Southern America Part 1. We are social. Nova York, 2018 [https://www.slideshare.net/wearesocial/digital-in-2018-in-southern-america-part-1-north-86863727 - acesso em 16 nov 2018].
    https://www.slideshare.net/wearesocial/d...
    para We Are Social, agência de comunicação e mercado na internet.
  • 4
    As configurações de privacidade definem aqueles/as que terão acesso ao conteúdo postado no grupo. Em um grupo público, não há restrições de acesso às postagens, que acabam se tornando também públicas.
  • 5
    São assim chamadas as contas nas redes sociais cujas informações de identificação não correspondem à pessoa por trás do perfil.
  • 6
    Os emojis são ferramentas de comunicação, típicos das redes sociais, onde emoções que usualmente precisariam de algumas palavras para serem expressas são traduzidas em símbolos e desenhos, geralmente representação de uma face expressiva.
  • 7
    O administrador do grupo, um cirurgião plástico, também se manifestou sobre o assunto em outra postagem em que aborda os tipos de próteses indicadas para cada tipo de desejo de aparência final, reiterando a popularidade de tal tópico.
  • 8
    Em entrevista, uma médica dermatologista que realiza uma série de procedimentos estéticos afirmou que, inclusive, “perde” pacientes que a procuram para realizar intervenções mais “exageradas”, pois esta profissional não deseja que tais procedimentos estejam associados à sua imagem e aos resultados de seu trabalho.
  • 9
    Para uma discussão acerca do reconhecimento das possíveis agências de dispositivos biomédicos envolvendo processos de materialização e subjetivação, consultar Rohden (2018)ROHDEN, Fabíola. Os hormônios te salvam de tudo: produção de subjetividades e transformações corporais com o uso de recursos biomédicos. Mana, (23), Rio de Janeiro, 2018, pp.199-229., sobre o uso de implantes hormonais por mulheres.
  • 10
    Para uma análise que ressalta a dimensão da escolha na cirurgia estética, considerando uma perspectiva que acentua como o sujeito faz opções circunscritas pelos modelos, repertórios e diferentes expertises disponíveis, ver a análise de Fraser (2009)FRASER, Suzanne. Agency Made Over? Cosmetic Surgery and Femininity in Women’s Magazines and Makeover Television. In: HEYES, Cressida; JONES, Meredith. (eds.) Cosmetic Surgery: A Feminist Primer. London, Routledge, 2009, pp.49-78. sobre revistas femininas e programas de televisão que propõem transformações na aparência dos seus participantes. Para a autora, os sujeitos são produzidos por várias formas de agência, disponíveis em dado momento ou contexto cultural específico.
  • 11
    Embora não haja espaço neste artigo, gostaríamos de apontar que esta discussão também poderia ser aprofundada por meio do contraste analítico entre a noção de “marcado” e o processo de incorporação da cicatriz nos casos de cirurgia de mastectomia, como aponta o trabalho de Slatman (2016)SLATMAN, Jenny. Is It Possible to “Incorporate” a Scar? Revisiting a Basic Concept in Phenomenology. Human Studies (39), Switzerland, 2016 [https://doi.org/10.1007/s10746-015-9372-2-acesso em 28 ago 2020].
    https://doi.org/10.1007/s10746-015-9372-...
    .

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2019
  • Aceito
    28 Abr 2020
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