Acessibilidade / Reportar erro

Índios mestiços e selvagens civilizados de Debret reflexões sobre relações interétnicas e mestiçagens

Debret's Mestizo Indians and civilized savages reflections of interethinic relationships and mestizajes

Resumos

Os índios retratados por Jean-Baptiste Debret são por ele classificados nas categorias de selvagens e civilizados e reconhecem-se neles, tanto nas imagens quanto nos textos a elas correspondentes, significativos sinais de mestiçagem. Algumas aparentes contradições do autor indicam considerável continuidade e fluidez entre os ditos estados de selvageria e civilização; e de mestiçagem e indianidade. Índios e mestiços, "selvagens" e "civilizados" interagiam e confundiam-se nas sociedades americanas e nas imagens e classificações do autor. O objetivo deste texto é refletir sobre essas interações complexificando as categorias de índios e mestiços, selvagens e civilizados, a partir de abordagens interdisciplinares que, ao historicizar os conceitos de cultura e etnicidade, permitem um novo olhar sobre relações interétnicas e processos de mestiçagem.

índios; mestiços; Debret


The Indians portrayed by Jean-Baptiste Debret are classified by him in the categories of civilized or savages. However, there is evidence of mestizajes both in the images and their corresponding texts. The author presented the Indians, in the images as in the texts related to them, with significant traces of mixture blood. Some apparent contradictions of the author indicate considerable continuity between the so called categories of savagery and civilization and of racial mixture and Indian blood mestizaje and indianity. Indians and mestizos, "savages" and "civilized" interact and and blended both in American societies and in the images and in the images of the author. The aim of this paper is to reflect on these categories of Indians and mestizos and of savages and civilized pleople, developing a more complex view of these categories. The article adopts an interdisciplinary approach which considers the concepts of culture and ethinicity as historical products allowing us to have a new look at the interethnic relations and the processes of mestizaje fusion.

Indians; mestizos; Debret


DOSSIÊ - IMAGENS: ESCRAVIDÃO, MESTIÇAGENS

Índios mestiços e selvagens civilizados de Debret reflexões sobre relações interétnicas e mestiçagens* * Autor convidado.

Debret's Mestizo Indians and civilized savages reflections of interethinic relationships and mestizajes

Maria Regina Celestino de Almeida

Departamento de História da UFF, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia (ICHF), Campus do Gragoatá, Bloco O, Sala 520 - Gragoatá, Niterói, RJ, CEP: 24210-350. reginacelestino@uol.com.br

RESUMO

Os índios retratados por Jean-Baptiste Debret são por ele classificados nas categorias de selvagens e civilizados e reconhecem-se neles, tanto nas imagens quanto nos textos a elas correspondentes, significativos sinais de mestiçagem. Algumas aparentes contradições do autor indicam considerável continuidade e fluidez entre os ditos estados de selvageria e civilização; e de mestiçagem e indianidade. Índios e mestiços, "selvagens" e "civilizados" interagiam e confundiam-se nas sociedades americanas e nas imagens e classificações do autor. O objetivo deste texto é refletir sobre essas interações complexificando as categorias de índios e mestiços, selvagens e civilizados, a partir de abordagens interdisciplinares que, ao historicizar os conceitos de cultura e etnicidade, permitem um novo olhar sobre relações interétnicas e processos de mestiçagem.

Palavras-chave: índios, mestiços, Debret

ABSTRACT

The Indians portrayed by Jean-Baptiste Debret are classified by him in the categories of civilized or savages. However, there is evidence of mestizajes both in the images and their corresponding texts. The author presented the Indians, in the images as in the texts related to them, with significant traces of mixture blood. Some apparent contradictions of the author indicate considerable continuity between the so called categories of savagery and civilization and of racial mixture and Indian blood mestizaje and indianity. Indians and mestizos, "savages" and "civilized" interact and and blended both in American societies and in the images and in the images of the author. The aim of this paper is to reflect on these categories of Indians and mestizos and of savages and civilized pleople, developing a more complex view of these categories. The article adopts an interdisciplinary approach which considers the concepts of culture and ethinicity as historical products allowing us to have a new look at the interethnic relations and the processes of mestizaje fusion.

Keywords: Indians, mestizos, Debret

As imagens dos índios "selvagens" e "civilizados" retratados por Jean-Baptiste Debret (1768-1848), no início do século XIX, evidenciam claramente os sinais de mestiçagem característicos das sociedades americanas coloniais e pós-coloniais. As intensas interações étnicas, sociais e culturais entre os ameríndios e os demais grupos com os quais eles interagiam configuraram, na América, sociedades multiétnicas e multiculturais nas quais grupos e indivíduos circulavam com considerável liberdade, pelas porosas fronteiras físicas, étnicas e culturais entre o mundo indígena e o mundo colonial e pós-colonial.1 1 Vários trabalhos nas últimas décadas têm apontado para a falácia da existência de fronteiras rígidas entre espaços e populações dentro e fora das administrações espanhola e portuguesa nas Américas. Sobre isso, para a América espanhola, ver, entre outros, POLONI-SIMARD, Jacques. Redes y Mestizaje Propuestas para el análisis de la sociedad colonial. In: BOCCARA, Guillaume e GALINDO, S. (org.) Lógica mestiza en América. Temuco: Ed. Universidad de La Frontera-Instituto de Estudios Indígenas, 2000, p.113-137; ORTELLI, Sara. Del discurso oficial a las fuentes judiciales. El enemigo y el proceso de mestizaje en el norte novohispano tardocolonial. Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.53-81, 2005; NACUZZI Lídia R. Las identidades étnicas y sus límites. In: . Identidades impuestas. Tehuelches, aucas y pampas en el norte de la Patagonia. Buenos Aires: Sociedad Argentina de Antropología, 2005, p.103-164; RATTO, Silvia. Rompecabezas para armar: el estudio de la vida cotidiana en un ámbito fronterizo. Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.180-207, 2005. Para a América portuguesa, ver: RESENDE, Maria Leônia Chaves de e LANGFUR, Hal. Minas Gerais indígena: a resistência dos índios nos sertões e nas vilas de El Rei. Revista Tempo, Rio de Janeiro, n°.23, p.15-32, 2007; GARCIA, Elisa F., As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo Sul da América Portuguesa. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, no prelo; MALHEIROS, Márcia. " Homens da Fronteira": índios e capuchinhos na ocupação dos sertões do Leste, do Paraíba ou Goytacazes. Niterói: UFF, 2008 (História, Tese de Doutorado); KOK, Gloria O sertão itinerante expedições da capitania de São Paulo no Século XVIII. São Paulo: Hucitec/FAPESP, 2004; LEMOS, Marcelo. "O Índio virou pó de café?" A resistência dos índios coroados de Valença frente à expansão cafeeira no Vale do Paraíba (1788-1836). Rio de Janeiro: UERJ, 2004 (História, Dissertação de Mestrado), entre outros.

As imagens e as explicações do autor sobre os índios retratados nos convidam a pensar sobre a fluidez entre essas fronteiras, sobre as interações étnicas nas sociedades americanas do início do século XIX e sobre as diferentes formas de classificar grupos e indivíduos que entre elas circulavam. O olhar do artista sobre essas populações e a própria terminologia por ele utilizada refletem as concepções políticas e ideológicas então predominantes na América portuguesa, ao mesmo tempo que nos dão elementos para questioná-las, sobretudo quanto à distinção rígida entre os chamados estados de selvageria e civilização e entre grupos e indivíduos classificados como índios e mestiços.

Os índios por ele descritos são classificados nas categorias de selvagens e civilizados, porém ambos apresentam, tanto nas imagens quanto nos textos a elas correspondentes, significativos sinais de mestiçagem, o que aponta para a percepção do artista sobre a fluidez entre os chamados mundo selvagem e mundo civilizado. Algumas aparentes contradições de Debret nas formas de representar e classificar grupos e indivíduos parecem indicar que sua experiência empírica o levava a vislumbrar uma considerável continuidade e fluidez entre os ditos estados de selvageria e civilização; e de mestiçagem e indianidade. Índios e mestiços, "selvagens" e "civilizados" interagiam e confundiam-se nas sociedades americanas e nas imagens e classificações do autor.

O objetivo deste texto é refletir sobre essas interações a partir das imagens e descrições de Debret, procurando complexificar as categorias de índios e mestiços, bem como as de selvagens e civilizados, à luz das novas concepções teóricas e conceituais da História e da Antropologia que, ao historicizarem os conceitos de cultura e etnicidade, permitem um novo olhar sobre as relações interétnicas e sobre os processos de mestiçagem.2 2 JONG, Ingrid de. Introducción. Dossier Mestizaje, Etnogénesis y Frontera. Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.9-19, 2005; BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del nuevo mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización. Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, ( www.ehess.fr/cerma.Revuedebates.htm); GRUZINSKI, Serge. O pensamento mestiço. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

Os "Índios Mestiços" e os "Selvagens Civilizados" de Debret

Contratado pela Corte Portuguesa para integrar a missão encarregada de criar uma Academia de Belas Artes no Rio de Janeiro, Debret iria, como muitos viajantes do século XIX, concentrar especial atenção nos costumes da terra, dedicando boa parte de sua obra aos nativos da América, cujo exotismo despertava especial interesse entre intelectuais europeus e americanos, bem como entre os governantes da América preocupados em conhecê-los e integrá-los às sociedades dos novos estados e nações que, então, se criavam. Distinguiu-se dos seus pares, no entanto, não só por ter vivido dezesseis anos no Brasil (1816-1831), como por ter se interessado em compreender e explicar a realidade que observava. Suas imagens eram acompanhadas por textos explicativos, configurando a obra considerada pelo próprio artista histórica, além de pitoresca.3 3 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Limitada; São Paulo: EDUSP, 1989, tomo 1. De acordo com Valéria Lima,

o Debret historiador comparece, então, no momento da elaboração dos textos e a organização do material para publicação. Nessa etapa, que é a da explicação de sua imagem a respeito do Brasil, Debret se esforça por adequar os registros que elaborara às idéias que pretendia defender. Assim para aquelas imagens que apresentavam características não mais presentes na organização do país, Debret atribuía a função de indicar a superação, de pontuar mudanças, sinais evidentes do caminho trilhado rumo à civilização.4 4 LIMA, Valéria. J. B. Debret historiador e pintor. Campinas: Editora da UNICAMP, 2007, p.35.

Sem intenção de aprofundar a discussão sobre a obra de Debret, convém ressaltar ainda com a autora, que as imagens e explicações do artista não devem ser tomadas como reflexos da realidade por ele observada e sim como "um plano de interpretação do Brasil que está completamente alicerçado nas idéias de seu tempo".5 5 LIMA, Valéria. J. B. Debret historiador e pintor, p.40.

Índios aldeados e índios considerados selvagens compunham a diversidade das populações indígenas presentes na América portuguesa, porém a barreira entre elas era muito menor do que se supunha e se apregoava, conforme a ideologia e a política indigenista, então vigentes. Ainda que informado por essa divisão e alicerçado nas idéias de seu tempo, como afirmou Lima, Debret nos apresenta sua própria interpretação e é instigante perceber que as imagens e textos por ele construídos, se analisados de forma conjunta, revelam a dinâmica e interação entre sertões e aldeias e entre os ditos estados de selvageria e de civilização. Índios e mestiços, selvagens e civilizados confundiam-se e relacionavam-se intensamente entre si e com outros segmentos da sociedade colonial, indo e voltando, com freqüência de uma condição à outra.

Minha intenção nesse texto é explorar o aspecto classificatório da obra de Debret, aspecto esse que permite refletir sobre a complexidade das relações interétnicas e do processo de mestiçagem.6 6 De acordo com Valéria Lima, esse aspecto classificatório da obra de Debret foi particularmente ressaltado por Wilson Coutinho. Cf. COUTINHO, Wilson. E os franceses chegaram. In: Catálogo Missão Artística Francesa e pintores viajantes. Rio de Janeiro: Instituto Cultural Brasil-França e Fundação Casa França-Brasil, 1990. Citado em LIMA, Valéria. J.B. Debret historiador e pintor, p.34. Convém destacar que as muitas imprecisões e contradições dos registros quanto às classificações étnicas de índios, negros e mestiços, incluindo a imensa variedade de nomes para designar esses últimos não são exclusivas dos relatos de viajantes. Tais contradições estão presentes nos mais variados tipos de fontes e têm sido objeto de reflexão dos pesquisadores nas últimas décadas. Instigantes questões têm sido levantadas sobre as razões dos aparentes equívocos, considerando os possíveis usos e apropriações dessas identificações que podem ser feitos por interesse tanto dos registradores quanto dos registrados. Na verdade, esses equívocos devem refletir a fluidez e pluralidade das próprias identidades que continuamente se reconstruíam nas sociedades coloniais e pós-coloniais. É o que se pode depreender também das pranchas e textos de Debret.

Sobre isso, é particularmente instigante contrastar a imagem do índio flecheiro retratado na prancha 5 com o título e texto que lhe correspondem.

Os Índios Mestiços de São Lourenço

Um índio nu deitado de costas exibe sua extrema habilidade no manejo do arco e flecha. Ocupa o centro da imagem, porém um pouco mais distante, destaca-se outro índio na mesma posição e, mais afastado, um terceiro atirador, de pé, também lança sua flecha em paisagem natural e agreste, na qual não se identifica nenhum sinal dos colonizadores. Selvagens ou civilizados? Mestiços ou índios?

Se a imagem (nudez, uso das armas indígenas, paisagem agreste) poderia sugerir estarmos diante de um "índio selvagem", o título da prancha Caboclos ou índios civilizados e o texto a ela correspondente, sobre populações indígenas da aldeia de São Lourenço, não deixam dúvidas sobre a classificação dada por Debret aos personagens: trata-se de índios civilizados, caboclos, nome genérico que, na província do Rio de Janeiro, era dado "a todo índio civilizado, isto é batizado".7 7 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.

São Lourenço foi a primeira aldeia missionária estabelecida no Rio de Janeiro (1568) e se manteria até 1866, quando foi declarada extinta pelo estado de civilização e mistura dos índios que a habitavam.8 8 Rio de Janeiro. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ). Fundo Presidência da Província (PP), col.115, dossiê 312, pasta 1, n°.3. De acordo com Debret, na segunda década do oitocentos, seus habitantes eram descendentes de "índios católicos", há séculos em contato com a colonização, que haviam se misturado com diversas tribos já civilizadas, às quais, poucos anos depois, os jesuítas juntaram os goitacases que acabavam de catequizar".9 9 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47. Viviam, segundo o autor,

de sua indústria, cerâmica de barro e diferentes espécies de esteiras feitas de caniços, que exportam para o Rio de Janeiro. Esses caboclos dedicam-se igualmente com êxito, à navegação; alguns mesmo habitam com suas famílias o arsenal da marinha, empregando-se especialmente no serviço das canoas particulares do Imperador do Brasil. Quem visite, sucessivamente, todas as cabanas de São Lourenço encontra, ainda hoje, a conservação interessante dos usos e costumes particulares, que distinguiam as diferentes tribos selvagens, fundadoras dessa aldeia, por ocasião de sua primitiva reunião.10 10 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.

O texto contribui, senão para desfazer, pelo menos para explicar a aparente contradição entre o título e a imagem. As informações do autor sobre a vivência, os costumes e as interações dos índios da aldeia revelam o intenso processo de mestiçagem e de relações interétnicas entre índios e não índios, ao mesmo tempo que enfatizam a manutenção de antigas práticas culturais. A referência às tribos selvagens fundadoras da aldeia aponta para a concepção evolucionista do autor que, bem de acordo com as idéias predominantes na época, acreditava serem os índios ancestrais da humanidade, de raça selvagem que podiam, no entanto, ser conduzidos à civilização através do contato com os brancos.11 11 Sobre isso ver SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil - 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. Convém ressaltar a firme convicção de Debret sobre a possibilidade de o Brasil caminhar para a civilização,12 12 Sobre isso ver LIMA, Valéria. J. B. Debret historiador e pintor, p .35. convicção essa que orientava, me parece, suas construções sobre a mobilidade dos índios da condição de selvageria para a de civilização.

Os índios de São Lourenço, portanto, tinham sido selvagens, como o eram, ainda, muitos outros com os quais o pintor se deparava, retratava e descrevia. Não obstante, os de São Lourenço misturaram-se e civilizaram-se, conservando, no entanto, alguns "usos e costumes particulares", tais como redes para dormir, fabricação de esteiras utilizadas "para todos os fins" e, principalmente a "extraordinária atitude do índio flechador da prancha 5".13 13 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47. Esta prática, não resta dúvida, mereceu especial atenção do artista.

Ficar assim de costas e lançar com todo o vigor uma flecha, de maneira quase incrível para nós, não passa para o caboclo de um simples exercício de destreza, oferecido à contemplação dos viajantes estrangeiros que o visitam. (...) Esses exercícios, sempre perfeitos, são bem conhecidos de quem percorre a província de Canta Galo.14 14 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47-48.

O flecheiro era, pois, segundo o olhar de Debret, um caboclo de São Lourenço, que vivia em intenso contato com a sociedade colonial, porém mantivera a habilidade com o arco e flecha e posicionava-se daquela forma para atrair a admiração dos viajantes estrangeiros. De acordo com a descrição, devia ser corriqueiro encontrar entre os civilizados das aldeias, índios flecheiros, talvez nus, interessados em exibir sua destreza aos forasteiros que por ali passavam. Se o objetivo era esse, parece ter sido atingido, ao menos com Debret. O trecho citado evidencia a admiração do artista pela habilidade do índio, evidência essa reforçada pela opção de retratá-lo, associando-o ao texto sobre a aldeia de São Lourenço.

É, no mínimo, instigante que um índio flecheiro nu ilustre um texto sobre a aldeia mais antiga do Rio de Janeiro, onde, no início do século XIX, viviam índios civilizados, caboclos ou mestiços, em contatos intensos com a sociedade colonial desde muitas gerações, como é apontado no próprio texto do autor. Parece claro que o interesse maior do artista estava no flecheiro. Além disso, lembrando que Debret é um pintor e a prioridade de sua obra é a imagem, convém considerar que elas não se constroem para ilustrar textos, mas estes últimos são escritos para explicá-las. Isso parece evidente no caso aqui abordado, no qual o texto enfatiza a manutenção dos costumes indígenas na aldeia, apesar das interações e misturas que descreve.

Seja como for, imagem e texto juntos nos informam sobre a mestiçagem e relações interétnicas no interior das aldeias. Informam também sobre as possibilidades de considerar seus habitantes como índios e/ou caboclos, bem como expressam a idéia de evolução do estágio de selvageria para o de civilização. Parece, então, plenamente possível classificar um índio da aldeia no início do século XIX na dupla categoria de índio mestiço, índio caboclo ou índio civilizado.

Cabem aqui algumas considerações sobre a política indigenista da Coroa Portuguesa e sobre o processo de mestiçagem nas aldeias coloniais. A política indigenista da Coroa, desde o século XVI, visava inserir os índios no mundo colonial na condição de aliados e estabelecia para eles uma condição jurídica especifica que além das obrigações, lhes conferia alguns direitos, dentre os quais terra coletiva e proteção, condições bastante atraentes, deve-se convir, diante do caos e da violência do processo de colonização. Ao ingressar nas aldeias, como aliados dos portugueses, os índios tornavam-se súditos cristãos do Rei e tinham obrigações e direitos específicos, próprios de sua categoria de aldeados.15 15 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003.

Em trabalho anterior, afirmei que as aldeias constituíram para esses índios espaço possível de sobrevivência, no qual várias etnias tornaram-se índios aldeados e passaram a compartilhar uma experiência nova com outros grupos sociais e nesse processo recriaram suas culturas, tradições e identidades.16 16 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Inúmeros estudos etno-históricos da atualidade têm demonstrado que as tradições e culturas indígenas não são estáticas, mas constroem-se e reconstroem-se continuamente em situações históricas definidas.17 17 SCHWARTZ, Stuart e SALOMON, Frank. News people and new kind of people: adaptation, readjustment, and ethnogenesis in South American Indigenous societies (Colonial Era). In: SCHWARTZ, Stuart e SALOMON, Frank. (orgs.) The Cambridge History of Native Peoples of the Américas. New York: Cambridge University Press, 1999; HILL, Jonathan. (org.) History, power and identity: ethnogenesis in the Americas, 1492-1992. Iowa City: University of Iowa Press, 1996; BOCCARA, Guillaume. Poder colonial e etnicidade no Chile: territorialização e reestruturação entre os Mapuche da época colonial. Revista Tempo, Rio de Janeiro, n°.23, p.67-83, 2007, entre outros. Essa perspectiva teórica aliada a documentos sobre as aldeias nos permitem percebê-las como espaço múltiplo, onde grupos étnicos e sociais diversos compartilhavam experiência nova e construíam novas formas de vivência,novas culturas e novas identidades.

Em São Lourenço, diversas gerações de índios misturaram-se e civilizaram-se, tendo chegado ao oitocentos, ainda afirmando a identidade indígena e reivindicando direitos e demarcação de terras com base na cultura política do Antigo Regime, também aprendida e incorporada por eles no processo de mestiçagem vivenciado na aldeia. Na ânsia de transformar e homogeneizar, os jesuítas lhes ensinaram novas práticas culturais e políticas habilmente utilizadas por eles na busca dos possíveis ganhos que a condição de aldeados lhes proporcionava. Aprenderam a valorizar acordos e negociações com autoridades e com o próprio rei, reivindicando mercês em troca de serviços prestados, o que aponta para a apropriação dos códigos portugueses e da própria cultura política do Antigo Regime. Suas demandas fundamentavam-se basicamente em direitos assegurados pela legislação da Coroa Portuguesa por sua condição distinta da dos demais vassalos do Rei.18 18 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuações político-culturais no Rio de Janeiro Oitocentista. In: SOIHET, Rachel; BICALHO, M. Fernanda; GOUVÊA, M de Fátima S. (coord.) Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Rio de Janeiro: Mauad, 2005, p.235-255.

Inúmeras reivindicações de lideranças da aldeia de São Lourenço ilustram essas práticas e revelam terem os índios se identificado perante as autoridades, colonos e missionários a partir da posição que ocupavam no mundo colonial. Se no interior das aldeias as referências aos nomes dados pelos portugueses aos grupos étnicos antes dos aldeamentos (Tamoio, Tupiniquim, Temininó, etc.) realmente se perderam ou foram colocadas em segundo plano, cabe reconhecer, com base nas questões teóricas da atualidade e nas várias evidências empíricas, que uma outra referência de identificação, com certeza, mais interessante para os índios em situação colonial era por eles priorizada: a de índio aldeado, identidade genérica e inicialmente dada pelos colonizadores, mas apropriada pelos índios que souberam utilizá-la para obter vantagens e benefícios que essa condição lhes proporcionava. De acordo com a documentação, a identidade de aldeado com o nome de batismo português e a referência à aldeia em que habitavam se sobrepunha à do grupo étnico. Foram feitos súditos do Rei e era esta posição que lhes possibilitava solicitar mercês, sendo consequentemente a mais valorizada por eles no mundo colonial, o que demonstra reconhecimento e apropriação dos valores do novo mundo em que atuavam.19 19 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro.

Cabe reafirmar, portanto, o papel das aldeias como espaço de reconstrução identitária e de mestiçagem intensa, no qual diferentes grupos étnicos misturavam-se entre si e com vários outros grupos étnicos e sociais, que viviam e frequentavam as aldeias, apesar dos esforços dos jesuítas em mantê-los afastados. Dentro das aldeias coloniais e fora delas, os índios aldeados conviviam e se misturavam com negros, brancos pobres e mestiços. Além disso, as interações entre sertões, aldeias e cidades eram intensas como têm revelado trabalhos recentes.20 20 Vários trabalhos que apontam essas interações, tanto na América portuguesa como na espanhola, estão citados na nota 1. Assim, os aldeados tornaram-se, muito provavelmente, mestiços, sem, no entanto, deixarem de ser índios. Unificava-os a idéia de pertencer à aldeia e o compartilhamento de um passado comum que remontava à fundação da aldeia e à aliança com os portugueses, bem como a ação política coletiva em busca dos direitos que lhes tinham sido dados.21 21 WEBER, Max. Relações comunitárias étnicas. In: WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: Editora da Universidade de Brasilia, 1994, p.267-277; BARTH, Frederick Os grupos étnicos e suas fronteiras. In: TOMKE, Lask. (org.) O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Rio de Janeiro: ContraCapa, 2000, p.25-67. Apesar das misturas, mantinham, como informam os documentos, a identidade indígena que naquele mundo conturbado, lhes garantia a vida comunitária e a terra coletiva.

Cabe, pois, considerar que, muito provavelmente, no tempo de Debret, e provavelmente muito antes, podia ser, talvez, impossível distingui-los por sinais diacríticos, laços consangüíneos e/ou caracteres físicos distintos dos demais grupos com os quais se relacionavam. Podiam, portanto, ser vistos como índios ou como mestiços. Culturas e etnicidades vistas como produtos históricos, dinâmicos e flexíveis, que continuamente se transformam através da experiência dos agentes sociais em contato, conduzem à idéia de identidades plurais e à percepção de que as categorias étnicas são historicamente construídas.22 22 GRUZINSKI, Serge. O pensamento mestiço, 2003; BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización; JONG, Ingrid de. Introducción. Dossier Mestizaje, Etnogénesis y Frontera, p.9-19; MATTOS, Hebe. Escravidão e cidadania no Brasil monárquico. Rio de Janeiro: Zahar, 2000; LIMA, Ivana Stolze. Cores, marcas e fala: sentidos da mestiçagem no Império do Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003. Grupos e/ou indivíduos podem ter sido identificados ou assumido a dupla identidade de índios mestiços, da mesma forma que podem também ter priorizado uma ou outra, conforme a especificidade das situações e dos agentes com os quais atuavam. As idéias de identidades plurais e de historicização das categorias étnicas e dos próprios processos de mestiçagem nos permitem perceber diferentes significados que as categorias de índios e mestiços podem adquirir conforme os tempos, os espaços e os agentes sociais em contato, questões essas que serão retomadas mais adiante.23 23 Sobre isso ver CADENA, Marisol de la. Are mestizos hybrids? The conceptual politics of Andean identities. Journal of Latin American Studies, n°.37, p.259-284, 2005; WADE, Peter. Rethinking mestizaje: ideology and lived experience. Journal of Latin American Studies, n°.37, p.239-257, 2005.

A imagem e o texto de Debret analisados de forma conjunta nos apresentam esses índios mestiços que há séculos misturados na aldeia de São Lourenço tinham passado, segundo o autor, do estado de selvageria para o de civilização e, no início do XIX, mantinham contatos intensos com a sociedade envolvente, mas ainda conservavam costumes próprios e eram vistos e classificados por ele como caboclos ou índios civilizados.

Além disso, o autor nos revela também a costumeira interação entre índios e não índios, em especial com os viajantes, tão freqüente no oitocentos, e bastante enfocada em suas imagens e descrições. Se, na prancha 5, o viajante não aparece na litogravura, o texto nos informa sobre sua presença e interação com o índio que, afinal, posa para ele. Dando seqüência às explicações sobre o flecheiro, Debret nos informa que

esses hábeis caçadores são muito procurados pelos naturalistas estrangeiros, que os utilizam como companheiros indispensáveis de suas excursões através das florestas virgens (...). Alguns comprometem-se a formar escolta durante um tempo ilimitado.24 24 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.48.

O trecho revela a interação dos viajantes estrangeiros com os índios, dos quais dependiam para o bom êxito de suas excursões e para a obtenção de informações e conhecimentos.25 25 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.48. Tais relações, no entanto, não se limitavam aos chamados civilizados. É o próprio Debret que nos fala de inúmeras outras situações em que índios selvagens tornavam-se extremamente fiéis aos brancos quando a eles se associavam, comportando-se como verdadeiros civilizados. Não são poucos os trechos e imagens que nos permitem perceber suas idéias de continuidade e fluidez entre o que chama de selvageria e civilização. Em suas pinturas e descrições, os índios, com freqüência, vão e voltam de uma condição para outra. Além disso, alguns termos por ele utilizados são particularmente interessantes para exemplificar não apenas essa idéia de continuidade como também as ambigüidades classificatórias. Ao tratar dos índios na região sul do Brasil, por exemplo, diz que ali se encontram "algumas nações selvagens cujo caráter dominante é a doçura; dia a dia mais próximas dos brancos, elas vivem num verdadeiro estado de civilização".26 26 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1978, tomo I, p.41-42 Em outro trecho refere-se aos selvagens civilizados que falam um pouco de português.27 27 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.43-44. Grupos Coroados são chamados "tribos selvagens mestiçadas".28 28 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.52-54.

Em sua concepção evolucionista, Debret observa os índios em diferentes graus de civilização e estabelece comparações entre eles, considerando que podem ser mais ou menos civilizados, situações que vão se alterando em suas relações de contato, podendo, no entanto, também regredir.29 29 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.36-37. Essas classificações do autor refletem, sem dúvida, sua expectativa de que o Brasil se torne civilizado e talvez por isso acentue essa mobilidade entre os estados de selvageria e civilização. Sobre isso é instigante observarmos a prancha 10 e o texto que a acompanha.

Os "Selvagens Civilizados" do Sertão do Leste

Intitulada "Botocudos, puris, pataxós e maxacalis ou gamelas", a prancha 10 apresenta um ambiente de floresta escura e esfumaçada com fogueiras, em torno das quais índios nus, com expressões rancorosas ou apáticas, alguns com botoques nos lábios, assam pedaços de carne. Apenas um índio come, ou melhor, devora a carne, provavelmente de aves e tatus, espécies que jazem no solo próximas aos índios e ao fogo. Valéria Lima, considerando o tamanho do osso consumido pelo índio, levanta a possibilidade da imagem sugerir a prática do canibalismo, embora ressalte que o texto explicativo não faça menção a isso e até afirme tratar-se de índios civilizados. Segundo a autora, o complemento à explicação da imagem estaria no texto referente à prancha 28, no qual o canibalismo é abordado.30 30 LIMA, Valéria. J. B. Debret, historiador e pintor, p.260.

Seja como for, para o tema em questão, importa ressaltar mais uma vez a interação apontada por Debret entre o que chama de estado de selvageria e de civilização, que se pode perceber na análise conjunta entre imagem e texto. Além disso, cabe observar, na própria imagem, alguns sinais de ternura transmitidos pelas crianças presentes no grupo e representadas em cenas que indicam tranqüilidade e laços de afeto com os adultos: uma dorme no ombro de um deles, outra é amamentada, enquanto outras duas são levadas às costas por mulheres que trabalham.

No texto explicativo sobre a imagem, Debret nos informa que:

Entre as inúmeras tribos de índios civilizados que apareceram sucessivamente no Rio de Janeiro a fim de serem apresentadas a Sua Majestade Imperial, são as dos botocudos, puris, maxacalis e pataxós, sem contestação possível, as de índios de aspecto mais repugnante pelas mutilações a que se sujeitam.31 31 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, p.56. (grifo meu).

Refere-se, com certeza aos botoques, ornamento característico dos botocudos, grupo contra os quais o Príncipe Regente declarara guerra justa em 1808, e que eram, então, identificados como símbolo da selvageria dos índios do Brasil.32 32 Carta Régia ao Governador e Capitão General da capitania de Minas Gerais sobre a guerra aos Índios Botocudos. 13/05/1808. In: CUNHA, Carneiro da. Legislação indigenista no século XIX: uma compilação (1808-1809). São Paulo: Edusp, 1992, p.57-61. Sobre os Botocudos, ver MISSAGIA, Isabel de Mattos. Civilização e revolta: os botocudos e a catequese na Província de Minas. São Paulo: EDUSC, 2004. Na verdade, o comentário do autor refere-se a um grupo que foi trazido em 1823 da província de Minas Gerais para o Rio de Janeiro e, segundo ele, estavam ali tranqüilos, num barracão da marinha na ilha das Cobras e não se importavam com a "importuna visita de todos os curiosos da cidade, ansiosos por contemplarem a horrorosa novidade".33 33 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, tomo I, p.56. Muitos dos índios compreendiam, segundo Debret, algumas palavras do português, mas foram por ele chamados de selvagens que erram nos sertões de Minas Gerais e norte do Rio de Janeiro, "não usam nenhuma vestimenta, nem mesmo em estado de civilização. Alimentam-se de caça e comem carne assada extremamente tostada".34 34 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, tomo I, p.56-57.

Texto e imagem juntos indicam fluidez entre as fronteiras do estado de selvageria e de civilização, bem como a concepção evolucionista do autor que não apenas considera a possibilidade dos índios passarem de um estado para outro, como os apresenta de forma ambivalente considerando-os, pode-se dizer "selvagens civilizados". Evidencia-se também uma situação bastante freqüente naquele período: a atração dos chamados selvagens à corte com a intenção de despertar neles o interesse pela civilização. Parece evidente, também, a visão preconceituosa do artista em relação a esses índios que os apresenta de forma bastante distinta da abordagem idílica sobre o flecheiro de São Lourenço.

Cabem algumas observações sobre esses índios puris, coroados, botocudos e alguns outros que, no final do século XVIII e início do XIX, erravam pelos chamados sertões do leste, desafiando a expansão colonial e eram chamados índios bravos ou selvagens. No Rio de Janeiro, autoridades políticas, missionários capuchinhos e mesmo moradores procuravam atraí-los e aldeá-los, em condições, porém, muito diversas daquelas que haviam sido praticadas em séculos anteriores com o concurso dos jesuítas. A principal diferença, me parece, passa por uma interação muito mais intensa e estreita entre eles e os demais grupos étnicos e sociais com os quais se relacionavam. Sem a severa vigilância dos inacianos que, como visto, haviam tentado, sem muito sucesso, manter os índios isolados, os novos aldeados do final do XVIII e do início do XIX circulavam com intensa liberdade entre os sertões, as aldeias, as fazendas dos moradores e as cidades. Passavam do estado de selvageria para o de civilização e voltavam a ele quando bem queriam, como informam alguns estudos recentes e as pranchas e textos de Debret.

Entre o final do século XVIII e o início do XIX, as margens setentrionais e meridionais do rio Paraíba foram sendo ocupadas, através de um longo processo de negociação, conflitos e aldeamento dos índios Coroados, Puris e Coropós. Os Coroados "errantes pelas imediações da serra da Mantiqueira, cujo domínio disputavam com os Botocudos, fugindo dos seus inimigos ou batalhando contra os atrevidos Puris, assolavam (...) a região, trazendo os moradores em constante sobressalto".35 35 SILVA, Joaquim Norberto de Souza e . Memória histórica e documentada das aldeias de índios do Rio de Janeiro. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, Rio de Janeiro, n°.62, p.250, abril/junho de 1854. É instigante observar que as informações sobre a selvageria desses índios contrastam com outras que afirmam sua docilidade e predisposição para aldearem-se. Em 1768, um documento da Câmara da Vila de Santo Antônio dizia haver ali, na margem oriental do Rio Paraíba, "várias aldeias de gentio da terra tão domáveis e capazes de abraçar a fé católica", 36 36 Lisboa. Arquivo Histórico Ultramarino, (AHU) Câmara da Vila de Santo Antonio de Sá, 19 de novembro de 1768, Caixas Rio de Janeiro, Cx.93, doc.43. de forma que cinco capitães de aldeia estavam dispostos a dar obediência ao Exmo. Vice Rei. O documento afirmava, ainda, a necessidade de reduzi-los e doutriná-los o que seria

útil à Real Fazenda, o serviço como as demais aldeias e também aos povos quem por estipêndio trabalhassem e muito mais por certo haverem nas suas vizinhanças copiosas e ricas terras de ouro, que se não podem das minas gerais mandar povoar por estar em meio o gentio chamado Coroado, que é indomável e guerreiro além de outros tais.37 37 AHU. Câmara da Vila de Santo Antonio de Sá, 19 de novembro de 1768, Caixas Rio de Janeiro, Cx.93, doc.43.

Essas variadas informações sobre as atuações dos Puris e Coroados apontam para a fluidez das alianças e para as mudanças de opções dos índios em suas relações de contato, na medida em que a colonização avançava. Revela também a fluidez e porosidade das fronteiras, por onde circulavam e interagiam diferentes grupos étnicos e sociais. Nos sertões fluminenses tornou-se comum a colaboração de fazendeiros para o estabelecimento das aldeias, colaboração essa incentivada por autoridades e pelos padres capuchinhos que sabiam recompensar os beneficiadores, concedendo-lhes terras dentro das aldeias e afilhados indígenas. Essa estreita colaboração entre os capuchinhos e os fazendeiros no norte fluminense foi evidenciada por Márcia Malheiros. A autora desconstrói a idéia de que esses índios teriam vivido em isolamento até serem aldeados entre o último quartel do XVIII e o início do XIX, demonstrando uma intensa interação entre eles e os demais agentes nos sertões.38 38 MALHEIROS, Márcia. "Homens da fronteira" índios e capuchinhos na ocupação dos sertões do leste, do Paraíba ou Goytacazes.

As imagens e textos de Debret aqui selecionados e analisados de forma conjunta indicam as ambivalências classificatórias do autor. Se os índios de São Lourenço podiam ser índios/mestiços; os do sertão do leste podiam ser selvagens/civilizados. Quanto às imagens, cabe também compará-las para perceber que refletem as concepções ideológicas, então predominantes no oitocentos, que influenciavam as descrições dos viajantes sobre essas populações, ao mesmo tempo que eram por elas reforçadas. Se com a prancha 10, o autor parece querer transmitir repugnância, com a 5, não resta dúvida, que quer causar admiração. O flecheiro se apresenta de forma quase idílica, exibindo além de sua destreza, um corpo robusto e musculoso, que como dizem alguns críticos de Debret, talvez pouco tenha a ver com a realidade corpórea dos ameríndios.39 39 Sobre isso ver LIMA, Valéria J.B. Debret historiador e pintor, p.48. Seja como for, as duas litogravuras apresentam índios idealizados e índios selvagens, imagens que, junto com a dos índios misturados, caracterizaram os discursos e as representações sobre os índios ao longo do século XIX. Cabe refletir sobre essas classificações e representações, relacionando-as à ideologia do oitocentos e à política indigenista que, sem dúvida, influenciavam os olhares dos viajantes sobre os povos indígenas por eles descritos e retratados. Além disso, as contradições sobre as classificações dos índios nas categorias de índios e mestiços podem ser pensadas, conforme ressaltou Guillaume Boccara como disputas políticas e sociais, como se verá a seguir.40 40 BOCCARA, Guillaume. mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización. Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, ( www.ehess.fr/cerma.Revuedebates.htm).

Política Indigenista no Tempo de Debret: disputas e contradições em torno de classificações étnicas

Nas primeiras décadas do oitocentos, as populações indígenas da América portuguesa eram inúmeras e extremamente diversas, porém de acordo com a legislação portuguesa, dividiam-se, desde o século XVI, em dois grandes grupos: os aliados dos portugueses e os inimigos que, grosso modo, classificavam-se em dualismos simplistas como mansos/bravos, tupis/tapuias, índios aldeados/índios do sertão. Essas classificações bipolares teriam continuidade no oitocentos e até se acentuariam pela declaração de guerra justa aos botocudos e kaingangs e pelas teorias racistas e preconceituosas predominantes na Europa e largamente aceitas no continente americano.

Em maio de 1808, o Príncipe Regente de Portugal, D. João, assinou a Carta Régia que decretava guerra justa contra os botocudos. Essa medida que, em novembro seria estendida aos kaingangs, assinalou a retomada oficial da antiga prática de combater os índios que resistiam ao domínio português e à invasão de suas terras, reduzindo os vencidos à condição de escravos legítimos, contribuindo, sem dúvida, para reforçar a ideologia que dividia as populações indígenas entre selvagens e civilizados.

As imensas diferenças regionais, que incluíam diversidades quanto aos níveis de inserção dos índios no mundo colonial e suas reações aos colonizadores, constituíram sempre sério empecilho ao estabelecimento e aplicação de legislações gerais para o conjunto das populações indígenas na América portuguesa. Do século XVI ao XIX, essas leis, raras vezes, tiveram caráter geral e quando isso ocorreu, as adaptações foram inevitáveis para atender as condições e necessidades regionais.41 41 Sobre a política indigenista do período colonial ver PERRONE-MOISÉS, Beatriz. Índios livres e índios escravos; e BEOZZO, José Oscar. Leis e regimentos das missões, 1983. Para o século XIX, ver CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX. In: CUNHA, Manuela Carneiro da. História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p.133-154; CUNHA, Manuela Carneiro da. (coord.) Legislação indigenista no século XIX: uma compilação (1808-1809). A política indigenista do Príncipe Regente não seria exceção.

Em 1809, provavelmente justificando-se pela guerra justa declarada aos kaingangs habitantes de Guarapuava, uma declaração do próprio Príncipe evidencia a ambivalência de sua política para os índios:

Não é conforme aos meus princípios religiosos e políticos o querer estabelecer minha autoridade nos Campos de Guarapuava e território adjacente por meio de mortandades e crueldades contra os índios, extirpando as suas raças, que antes desejo adiantar, por meio da religião e civilização, até para não ficarem desertos tão dilatados e imensos sertões, e que só desejo usar da força com aqueles que ofendem os meus vassalos, e que resistem aos brandos meios de civilização que lhes mando oferecer (1/4/1809).42 42 Citado em CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.152.

Situações diferenciadas entre grupos indígenas geravam, portanto, procedimentos diversos e essas situações podiam se apresentar em regiões muito próximas e com intensos contatos entre elas, como ocorreu no interior da própria capitania e depois província do Rio de Janeiro. Ali, no início do oitocentos, índios aldeados e índios considerados "selvagens" compunham, como visto, a variedade das populações indígenas que foram retratadas e descritas por Debret. Aldeados e selvagens, índios e mestiços relacionavam-se intensamente entre si e com outros segmentos da sociedade colonial e pós-colonial, tendo sido alvo e agentes de políticas indigenistas e indígenas, cujas práticas e estratégias eram variadas.

Ao longo do oitocentos, a política indigenista da América Portuguesa ainda se pautava, em grande parte, pelas diretrizes do Diretório dos Índios,43 43 Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará e Maranhão, enquanto Sua Majestade não mandar o contrário. In: ALMEIDA, Rita Heloísa de. O Diretório dos Índios: um projeto de "civilização" no Brasil do século XVIII. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997, Apêndice. legislação estabelecida no âmbito das reformas pombalinas com o objetivo essencial de promover a assimilação dos índios ao Império Português, acabando com as distinções entre eles e os demais vassalos do rei. Apesar de oficialmente extinto pela Carta Régia de 1798, o Diretório continuaria servindo de parâmetro oficial em várias regiões, inclusive no Rio de Janeiro.44 44 Sobre isso ver: CUNHA, Manuela Carneiro da. (coord.) Legislação indigenista no século XIX: uma Compilação (1808-1809). O Diretório visava a transformar as aldeias em vilas e freguesias e incentivava a presença de não índios em seu interior para apressar o processo de mestiçagem, porém assegurava a manutenção das terras coletivas para os índios e creio que foi, principalmente, em torno desse direito que muitos deles se mantiveram como índios por mais um século após essas reformas. Autoridades e moradores afirmavam as condições de mestiçagem dos índios que habitavam as aldeias, enquanto os últimos mantinham as reivindicações pela manutenção das terras e dos direitos coletivos, com base nas garantias que lhes tinham sido dadas pela condição de índios aldeados.45 45 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuações político-culturais no Rio de Janeiro Oitocentista, p.235-255.

No século XIX, essas práticas e disputas se mantiveram e se acentuaram. O discurso da mestiçagem tornou-se intenso entre autoridades políticas e intelectuais. Predominavam, então, as teorias evolucionistas que afirmavam a hierarquia das raças e a inferioridade dos índios considerados, no entanto, redimíveis "mediante a catequese que os retiraria de sua situação 'bárbara e errante' para inseri-los no interior da civilização".46 46 SCHWARCZ, Lílian M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil -1870-1930, p.112. O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, criado em 1838, lançou, em 1840, um concurso para selecionar a melhor proposta para uma História do Brasil. O vencedor, Von Martius, vinculava o desenvolvimento do país ao aperfeiçoamento das três raças, cada qual com características e papel próprio: o branco era o agente civilizador que deveria ajudar o índio a resgatar sua dignidade original através da civilização, enquanto o negro era detratado e visto como empecilho ao progresso.47 47 SCHWARCZ, Lílian M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil -1870-1930; GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Projeto de uma história nacional. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Cpdoc/FGV, n°.1, p.5-27, 1988.

A proposta em relação aos índios estava bem de acordo com a política indigenista do Império e com o interesse de câmaras municipais e moradores interessados em apoderarem-se das terras das aldeias. Convém lembrar que a legislação do oitocentos, apesar de prever a extinção das aldeias, quando os índios atingissem o estado de civilização, mantinha, como fizera o Diretório, seu direito à terra coletiva, enquanto eles fossem considerados como tais.48 48 O Regulamento das Missões de 1845 manteve os direitos dos índios nas aldeias, decretando ser obrigação do Diretor Geral designar terras para plantações comuns, para plantações particulares dos índios e para os arrendamentos. No entanto, de acordo com as orientações assimilacionistas predominantes, ao referir-se às aldeias, decretava, em seu artigo 1° § 2, que se informasse ao "governo Imperial sobre a conveniência de sua conservação, ou remoção, ou reunião de duas, ou mais, em uma só". Decreto n°.426 – de 24 de Julho de 1845 – Regulamento acerca das Missões de catechese e civilização dos Índios. In: BEOZZO, José Oscar. Leis e Regimento das missões, p.169, p.174. A Lei de Terras de 1850 explicitava ainda mais nitidamente a política assimilacionista do Império: reservava as terras para os índios em usufruto, afirmando que "não poderão ser alienadas, enquanto o governo Imperial, por ato especial, não lhes conceder o pleno gozo delas, por assim o permitir o seu estado de civilização". In: WOLNEY, Maria Jovita Valente. (org.) Coletânea: legislação agrária, legislação de registros públicos, jurisprudência, Ministério Extraordinário para Assuntos Fundiários. Brasília, 1983, p.371. Apud: MOTTA, Marcia. Terra, nação e tradições inventadas: uma outra abordagem sobre a Lei de Terras de 1850. In: MENDONÇA, Sônia & MOTTA, Márcia. (orgs.) Nação e poder: As dimensões da história. Niterói: EDUFF, 1998, p.81-92. A partir de 1861, o encargo da catequese e civilização dos índios passou ao Ministério dos Negócios, Agricultura, Comércio e Obras Públicas, evidenciando que, no século XIX, a questão dos índios tornara-se, em algumas regiões, essencialmente uma questão de terras, como afirma CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.133-154. Assim é que razões políticas, econômico-sociais e ideológicas somavam-se para incentivar autoridades, moradores e intelectuais a proclamar o estado de mistura e mestiçagem dos índios, contribuindo para o seu desaparecimento enquanto categoria, o que justificaria a extinção das aldeias.

De meados do século XVIII ao XIX, as políticas indigenistas da Coroa Portuguesa e do Império brasileiro apresentam, pois, continuidade quanto à proposta de promover a assimilação dos índios aos seus respectivos impérios. Não obstante, os procedimentos eram diversos.49 49 Sobre a aplicação da política pombalina em diferentes regiões da América portuguesa ver MEDEIROS, Ricardo Pinto de. Política indigenista do Período Pombalino e seus reflexos nas capitanias do Norte da América portuguesa. In: MEDEIROS, Ricardo Pinto de e OLIVEIRA, Carla Mary S. (org.) Novos olhares sobre as capitanias do norte do Estado do Brasil. João Pessoa. Editora Universitária UFPB, 2007, p.125-159; DOMINGUES, Ângela. Quando os índios eram vassalos: colonização e relações de poder no Norte do Brasil na segunda metade do século XVIII. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2000, p.199-237; GARCIA, Elisa F. As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo sul da América Portuguesa. Niterói: UFF, 2007 (História, Tese de Doutorado). Para integrar os índios à ordem colonial e assimilá-los era necessário agir conforme as diferentes situações locais e as populações com as quais se lidava. Em algumas regiões efetuavam-se descimentos e estabeleciam-se novas aldeias; em outras desencadeavam-se guerras; e em áreas de colonização mais antiga, pregava-se o fim das aldeias, com o argumento de que os índios já estavam civilizados e misturados à massa da população. Guerras violentas de extermínio, criação de novos aldeamentos e extinção de antigos eram, portanto, práticas que coexistiam e se sucediam no tempo de Debret. Com procedimentos diversos, as propostas assimilacionistas da Coroa Portuguesa e do novo império brasileiro visavam essencialmente civilizar os índios e incorporá-los como membros de suas sociedades, sem quaisquer distinções em relação aos demais.

Observa-se, então, que, desde as reformas pombalinas, as propostas de mestiçagem para a incorporação das populações indígenas à sociedade colonial portuguesa passaram a integrar a política indigenista e as contradições sobre a classificação dessas populações nas categorias de índios e mestiços tornaram-se bastante visíveis na documentação. Enquanto políticos e moradores afirmavam a condição de mistura, dispersão e desaparecimento dos índios das aldeias do Rio de Janeiro, estes últimos continuavam reivindicando, com base na identidade indígena, antigos direitos que lhes haviam sido dados pela Coroa Portuguesa, contrariando os discursos assimilacionistas.50 50 ALMEIDA, M. Regina Celestino de Almeida. Política indigenista e etnicidade: estratégias indígenas no processo de extinção das aldeias do Rio de Janeiro - século XIX. In: OHMSTEDE, Antonio Escobar; MANDRINI, Raúl e ORTELLI, Sara. (coord.) Sociedades en movimiento: los pueblos indigenas de America Latina en el siglo XIX, Anuario del IEHS, Tandil (Argentina), p.219-233, 2007.

Assim, essas disputas por classificações étnicas podem ser vistas como disputas políticas e sociais.51 51 BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización. Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, (ww.ehess.fr/cerma.Revuedebates.htm) Lembrando que as as categorias étnicas são construções históricas que assumem diferentes significados, conforme tempos, espaços e agentes sociais, convém tecer algumas considerações sobre os significados de "ser índio" e "ser mestiço" para os aldeados e para as autoridades políticas e moradores no decorrer do oitocentos, quando estava em curso o processo de extinção das antigas aldeias coloniais.

A documentação referente aos aldeamentos, no oitocentos, é reveladora da preocupação do Estado em obter o máximo de informações possíveis sobre aldeias e índios com o objetivo de dar cumprimento à política assimilacionista, a ser implementada conforme as situações específicas de cada região. A tônica dos documentos insistia na decadência, miserabilidade, dispersão, mistura, diminuição e desaparecimento dos índios das aldeias. Tal discurso, no entanto, não se restringia aos políticos. Intelectuais simpáticos aos índios também consideravam a necessidade de integrá-los e defendiam isso, não apenas em benefício da nação, mas também dos próprios índios. Em sua concepção, as condições de miserabilidade e exploração nas quais viviam os índios das aldeias, só podiam trazer-lhes prejuízos. A terra coletiva e a possibilidade de vida comunitária por ela garantida, tão caras aos grupos indígenas, não eram, absolutamente, valorizadas por intelectuais que comungavam com a lógica do progresso e da civilização.52 52 A Memória histórica e documentada das aldeias de índios da província do Rio de Janeiro, escrita por Joaquim Norberto de Souza Silva (1854), insere-se nesse contexto. Apesar da simpatia com que o autor trata dos índios, demonstrando preocupação com sua sorte e sobrevivência, a tônica de seu texto é a decadência e miserabilidade das aldeias que deviam caminhar para a extinção. Os inúmeros relatos de viajantes que passaram pelo Rio de Janeiro nesse período, apresentam conteúdo semelhante e Debret é um exemplo disso, embora em suas imagens e textos possamos observar a pluralidade das identidades dos "índios mestiços" e dos "selvagens civilizados" nas aldeias e nos sertões.

Sem negar que essas descrições podiam conter grande dose de verdade, sobretudo aos olhos das autoridades e dos viajantes em busca da "civilização" e do desenvolvimento econômico e social nos moldes europeus, é fundamental considerarmos a contrapartida dessa situação que se expressa na persistência desses "grupos diminutos e miseráveis" que teimavam em continuar existindo e reivindicando direitos apesar de todas as pressões e discriminações contra eles. É interessante perceber que apesar de irrisórios, mal administrados, sujeitos a usurpações e insuficientes para cobrir as despesas das aldeias e a assistência aos índios necessitados, como descritos pelos Juízes de Órfãos, os rendimentos das aldeias eram muito disputados e os índios conseguiram mantê-los por várias décadas do oitocentos, até que as aldeias fossem finalmente extintas.53 53 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Política indigenista e etnicidade: estratégias indígenas no processo de extinção das aldeias do Rio de Janeiro - século XIX.

Em outro trabalho afirmei que os aldeados souberam valer-se da proteção da lei e, com o apoio de algumas autoridades civis e eclesiásticas, conseguiram, a meu ver, retardar o processo de extinção de suas aldeias.54 54 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuações político-culturais no Rio de Janeiro oitocentista. Embora misturados e transformados no longo processo de contato e experiência compartilhada no interior das aldeias com diferentes grupos étnicos e sociais, vários índios aldeados chegaram ao século XIX, afirmando-se como tais, em contradição com discursos que os consideravam mestiços. Se, de acordo com Cohen,55 55 COHEN, Abner. O homem bidimensional: a antropologia do poder e o simbolismo em sociedades complexas. Rio de Janeiro: Zahar,1978. os grupos têm interesse em manter-se distintos, enquanto condições políticas e econômicas estão ligadas a essa distinção, essa parece ter sido uma forte razão para os aldeados, no século XIX, terem resistido à política assimilacionista, mantendo, para usar a expressão de Roberto C. de Oliveira,56 56 OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. Identidade étnica, identificação e manipulação. In: OLIVEIRA, R.C. Identidade, etnia e estrutura social. São Paulo: Editora Pioneira, 1976, p.1-31. sua "identidade contrastiva" em relação aos moradores com os quais interagiam e até dividiam o mesmo espaço. As contendas nessa época se faziam principalmente pela manutenção do patrimônio, ao qual tinham direito como grupo: as terras e os rendimentos das aldeias. Foi principalmente em torno da ação política comum pela manutenção desses direitos que essas identidades, a meu ver, se mantiveram e até se fortaleceram neste período, contra as pressões que se faziam no sentido de reconhecê-los como mestiços.

Afinal, ser índio para os aldeados significava a manutenção dos direitos à terra coletiva e à vida comunitária que lhes tinham sido garantidos séculos antes pela legislação do antigo regime por sua condição de índios aliados do Rei. Por outro lado, para as autoridades, considerá-los misturados, portanto, mestiços era a possibilidade de extinguir oficialmente suas aldeias e incorporar as terras às câmaras municipais.

Esse processo ocorreu em várias regiões do Brasil.57 57 CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.133-154; SILVA, Edson . Confundidos com a massa da população: o esbulho das terras indígenas no nordeste no século XIX, Revista do Arquivo Público de Pernambuco, n°.46, v.42, p.17-29, 1996. No Rio de Janeiro, dando cumprimento às ordens do governo central, o presidente da província estabeleceu significativa correspondência com as autoridades municipais, sobretudo juízes de órfãos para saber se "existem povoações de índios, qual o estado de seu aldeamento, nação e patrimônio".58 58 Rio de Janeiro. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ). Fundo Presidência da Província (PP) col.115, dossiê 312, pasta 1, n.3. O teor dos documentos aponta para o interesse das autoridades em extinguir as aldeias. Para isso era preciso, como visto, constatar seu desaparecimento ou estado de decadência, o que se revela em muitos relatos com referência a antigas aldeias abandonadas há muitos anos, por índios que viviam dispersos, vagando pelos sertões.

Sobre isso é particularmente instigante observarmos o caso de extinção da aldeia de São Lourenço, onde na segunda década do XIX, as práticas indígenas ainda eram tão presentes, como destacou ao Debret ao nos apresentar o índio flecheiro. A aldeia foi declarada extinta em 1866 sob a alegação de "que os poucos índios ali existentes com esta denominação se acham nas circunstâncias de entrarem no gozo dos direitos comuns a todos os brasileiros".59 59 AN. Série Agricultura, IA7 –1, f.70v. No ano seguinte, documento, provavelmente da Câmara Municipal, negava a pretensão de "intitulados índios, que solicitam a continuação de mensalidades outrora arbitradas", afirmando que "não há que deferir-lhes, desde que o Aviso de 31 de outubro do ano próximo findo, extinguindo o mencionado aldeamento, fez desaparecer a entidade Índios e proveu ao bem estar dos que com essa denominação ainda ali existiam".60 60 AN. Série Agricultura, IA7-1, f.78v.

Do exposto, percebe-se que para autoridades políticas do Rio de Janeiro oitocentista, transformar os índios em mestiços significava a possibilidade de extinguir as aldeias oficialmente e incorporar suas terras às câmaras municipais. Para os índios, a condição de mestiçagem implicava na perda da condição jurídica especial que lhes dava direitos, sobretudo, à terra, aos rendimentos das aldeias e à vida comunitária.

Considerações Finais

Mestiços ou índios, os aldeados chegaram ao final do XVIII e ao XIX, agindo com base em uma cultura política que, originária de um processo de mestiçagem, fundamentava-se na identidade indígena construída nas aldeias missionárias. Os processos de mestiçagem e de reconstrução identitária parecem, pois, ter caminhado juntos nas aldeias coloniais e não devem ser considerados de forma separada e muito menos excludente. Afinal, a mestiçagem cultural, ao invés de apagar identidades indígenas contribuiu, como visto, para reconstruí-las e reforçá-las.

Essas considerações são possíveis a partir das novas proposições teórico-conceituais que enfatizam a historicidade das categorias étnicas e a idéia de identidades plurais que continuamente se constroem e reconstroem nas relações entre os diversos grupos em contato. Essa perspectiva permite um outro olhar sobre os registros classificatórios a respeito dos diferentes grupos de índios, negros e mestiços nas sociedades coloniais e pós-coloniais americanas e permitem também compreender e atribuir vários significados aos aparentes equívocos.

As classificações ambivalentes de Debret devem partir, me parece, de sua própria experiência de vida no Brasil, bem como de suas convicções sobre as amplas possibilidades do Brasil se tornar um país civilizado. Ainda que informado por uma concepção que dividia os índios e os espaços entre selvagens e civilizados, a obra do autor fala muito mais das intensas interações entre eles. Textos e imagens de Debret apontam, pois, para complexidade dos processos de mestiçagem e de relações interétnicas, tanto nas aldeias quanto nos sertões, ao mesmo tempo que permitem reafirmar o duplo papel da aldeia colonial como espaço de mestiçagem e de reconstrução identitária.

Sobre isso, é instigante observar os vários movimentos contemporâneos de etnogênese do nordeste, nos quais vários grupos indígenas considerados extintos reaparecem afirmando suas origens em aldeamentos missionários do período colonial.61 61 OLIVEIRA, João Pacheco de. (org.) A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no nordeste indígena. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1999. São os índios mestiços que, invisibilizados por conjunturas políticas desfavoráveis no século XIX, reaparecem hoje, evidenciando que metamorfoses étnicas e culturais não significam necessariamente a extinção de identidades indígenas.

Artigo recebido em 15/10/2008.

  • 1 Vários trabalhos nas últimas décadas tęm apontado para a falácia da existęncia de fronteiras rígidas entre espaços e populaçőes dentro e fora das administraçőes espanhola e portuguesa nas Américas. Sobre isso, para a América espanhola, ver, entre outros, POLONI-SIMARD, Jacques. Redes y Mestizaje Propuestas para el análisis de la sociedad colonial. In: BOCCARA, Guillaume e GALINDO, S. (org.) Lógica mestiza en América. Temuco: Ed. Universidad de La Frontera-Instituto de Estudios Indígenas, 2000, p.113-137;
  • ORTELLI, Sara. Del discurso oficial a las fuentes judiciales. El enemigo y el proceso de mestizaje en el norte novohispano tardocolonial. Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.53-81, 2005;
  • NACUZZI Lídia R. Las identidades étnicas y sus límites. In: .Identidades impuestas. Tehuelches, aucas y pampas en el norte de la Patagonia. Buenos Aires: Sociedad Argentina de Antropología, 2005, p.103-164;
  • RATTO, Silvia. Rompecabezas para armar: el estudio de la vida cotidiana en un ámbito fronterizo. Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.180-207, 2005.
  • Para a América portuguesa, ver: RESENDE, Maria Leônia Chaves de e LANGFUR, Hal. Minas Gerais indígena: a resistęncia dos índios nos sertőes e nas vilas de El Rei. Revista Tempo, Rio de Janeiro, n°.23, p.15-32, 2007;
  • GARCIA, Elisa F., As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo Sul da América Portuguesa. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, no prelo; MALHEIROS, Márcia. "Homens da Fronteira": índios e capuchinhos na ocupaçăo dos sertőes do Leste, do Paraíba ou Goytacazes. Niterói: UFF, 2008 (História, Tese de Doutorado);
  • KOK, Gloria O sertăo itinerante expediçőes da capitania de Săo Paulo no Século XVIII Săo Paulo: Hucitec/FAPESP, 2004;
  • LEMOS, Marcelo. "O Índio virou pó de café?" A resistęncia dos índios coroados de Valença frente ŕ expansăo cafeeira no Vale do Paraíba (1788-1836). Rio de Janeiro: UERJ, 2004 (História, Dissertaçăo de Mestrado), entre outros.
  • 2 JONG, Ingrid de. Introducción. Dossier Mestizaje, Etnogénesis y Frontera. Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.9-19, 2005;
  • BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del nuevo mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización. Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000,
  • 3 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Limitada; Săo Paulo: EDUSP, 1989, tomo 1.
  • 4 LIMA, Valéria. J. B. Debret historiador e pintor. Campinas: Editora da UNICAMP, 2007, p.35.
  • 5 LIMA, Valéria. J. B. Debret historiador e pintor, p.40.
  • 6 De acordo com Valéria Lima, esse aspecto classificatório da obra de Debret foi particularmente ressaltado por Wilson Coutinho. Cf. COUTINHO, Wilson. E os franceses chegaram. In: Catálogo Missăo Artística Francesa e pintores viajantes. Rio de Janeiro: Instituto Cultural Brasil-França e Fundaçăo Casa França-Brasil, 1990.
  • 7 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 9 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 11 Sobre isso ver SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituiçőes e questăo racial no Brasil - 1870-1930. Săo Paulo: Companhia das Letras, 2001.
  • 12 Sobre isso ver LIMA, Valéria. J. B. Debret historiador e pintor, p.35.
  • 13 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 14 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47-48.
  • 15 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003.
  • 16 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro.
  • 17 SCHWARTZ, Stuart e SALOMON, Frank. News people and new kind of people: adaptation, readjustment, and ethnogenesis in South American Indigenous societies (Colonial Era). In: SCHWARTZ, Stuart e SALOMON, Frank. (orgs.) The Cambridge History of Native Peoples of the Américas. New York: Cambridge University Press, 1999;
  • HILL, Jonathan. (org.) History, power and identity: ethnogenesis in the Americas, 1492-1992. Iowa City: University of Iowa Press, 1996;
  • BOCCARA, Guillaume. Poder colonial e etnicidade no Chile: territorializaçăo e reestruturaçăo entre os Mapuche da época colonial. Revista Tempo, Rio de Janeiro, n°.23, p.67-83, 2007, entre outros.
  • 18 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuaçőes político-culturais no Rio de Janeiro Oitocentista. In: SOIHET, Rachel; BICALHO, M. Fernanda; GOUVĘA, M de Fátima S. (coord.) Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Rio de Janeiro: Mauad, 2005, p.235-255.
  • 19 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro.
  • 21 WEBER, Max. Relaçőes comunitárias étnicas. In: WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: Editora da Universidade de Brasilia, 1994, p.267-277;
  • BARTH, Frederick Os grupos étnicos e suas fronteiras. In: TOMKE, Lask. (org.) O guru, o iniciador e outras variaçőes antropológicas Rio de Janeiro: ContraCapa, 2000, p.25-67.
  • 22 GRUZINSKI, Serge. O pensamento mestiço, 2003;
  • BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización; JONG, Ingrid de. Introducción. Dossier Mestizaje, Etnogénesis y Frontera, p.9-19;
  • MATTOS, Hebe. Escravidăo e cidadania no Brasil monárquico Rio de Janeiro: Zahar, 2000;
  • LIMA, Ivana Stolze. Cores, marcas e fala: sentidos da mestiçagem no Império do Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003.
  • 23 Sobre isso ver CADENA, Marisol de la. Are mestizos hybrids? The conceptual politics of Andean identities. Journal of Latin American Studies, n°.37, p.259-284, 2005;
  • WADE, Peter. Rethinking mestizaje: ideology and lived experience. Journal of Latin American Studies, n°.37, p.239-257, 2005.
  • 24 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.48.
  • 26 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Săo Paulo: Ed. da Universidade de Săo Paulo, 1978, tomo I, p.41-42
  • 27 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.43-44.
  • 28 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.52-54.
  • 29 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.36-37.
  • 30 LIMA, Valéria. J. B. Debret, historiador e pintor, p.260.
  • 31 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, p.56. (grifo meu).
  • 32 Carta Régia ao Governador e Capităo General da capitania de Minas Gerais sobre a guerra aos Índios Botocudos. 13/05/1808. In: CUNHA, Carneiro da. Legislaçăo indigenista no século XIX: uma compilaçăo (1808-1809). Săo Paulo: Edusp, 1992, p.57-61.
  • Sobre os Botocudos, ver MISSAGIA, Isabel de Mattos. Civilizaçăo e revolta: os botocudos e a catequese na Província de Minas. Săo Paulo: EDUSC, 2004.
  • 33 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, tomo I, p.56.
  • 34 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, tomo I, p.56-57.
  • 35 SILVA, Joaquim Norberto de Souza e. Memória histórica e documentada das aldeias de índios do Rio de Janeiro. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, Rio de Janeiro, n°.62, p.250, abril/junho de 1854.
  • 39 Sobre isso ver LIMA, Valéria J.B. Debret historiador e pintor, p.48.
  • 40 BOCCARA, Guillaume. mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización. Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, (www.ehess.fr/cerma.Revuedebates.htm).
  • 41 Sobre a política indigenista do período colonial ver PERRONE-MOISÉS, Beatriz. Índios livres e índios escravos; e BEOZZO, José Oscar. Leis e regimentos das missőes, 1983.
  • Para o século XIX, ver CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX. In: CUNHA, Manuela Carneiro da. História dos índios no Brasil Săo Paulo: Companhia das Letras, 1992, p.133-154;
  • CUNHA, Manuela Carneiro da. (coord.) Legislaçăo indigenista no século XIX: uma compilaçăo (1808-1809).
  • 42 Citado em CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.152.
  • 43 Diretório que se deve observar nas Povoaçőes dos Índios do Pará e Maranhăo, enquanto Sua Majestade năo mandar o contrário. In: ALMEIDA, Rita Heloísa de. O Diretório dos Índios: um projeto de "civilizaçăo" no Brasil do século XVIII. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997, Apęndice.
  • 44 Sobre isso ver: CUNHA, Manuela Carneiro da. (coord.) Legislaçăo indigenista no século XIX: uma Compilaçăo (1808-1809).
  • 45 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuaçőes político-culturais no Rio de Janeiro Oitocentista, p.235-255.
  • 46 SCHWARCZ, Lílian M. O espetáculo das raças: cientistas, instituiçőes e questăo racial no Brasil -1870-1930, p.112.
  • 47 SCHWARCZ, Lílian M. O espetáculo das raças: cientistas, instituiçőes e questăo racial no Brasil -1870-1930;
  • GUIMARĂES, Manoel Luiz Salgado. Naçăo e civilizaçăo nos trópicos: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Projeto de uma história nacional. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Cpdoc/FGV, n°.1, p.5-27, 1988.
  • 48 O Regulamento das Missőes de 1845 manteve os direitos dos índios nas aldeias, decretando ser obrigaçăo do Diretor Geral designar terras para plantaçőes comuns, para plantaçőes particulares dos índios e para os arrendamentos. No entanto, de acordo com as orientaçőes assimilacionistas predominantes, ao referir-se ŕs aldeias, decretava, em seu artigo 1° § 2, que se informasse ao "governo Imperial sobre a convenięncia de sua conservaçăo, ou remoçăo, ou reuniăo de duas, ou mais, em uma só". Decreto n°.426 de 24 de Julho de 1845 Regulamento acerca das Missőes de catechese e civilizaçăo dos Índios. In: BEOZZO, José Oscar. Leis e Regimento das missőes, p.169, p.174. A Lei de Terras de 1850 explicitava ainda mais nitidamente a política assimilacionista do Império: reservava as terras para os índios em usufruto, afirmando que "năo poderăo ser alienadas, enquanto o governo Imperial, por ato especial, năo lhes conceder o pleno gozo delas, por assim o permitir o seu estado de civilizaçăo". In: WOLNEY, Maria Jovita Valente. (org.) Coletânea: legislaçăo agrária, legislaçăo de registros públicos, jurisprudęncia, Ministério Extraordinário para Assuntos Fundiários. Brasília, 1983, p.371.
  • Apud: MOTTA, Marcia. Terra, naçăo e tradiçőes inventadas: uma outra abordagem sobre a Lei de Terras de 1850. In: MENDONÇA, Sônia & MOTTA, Márcia. (orgs.) Naçăo e poder: As dimensőes da história. Niterói: EDUFF, 1998, p.81-92.
  • 49 Sobre a aplicaçăo da política pombalina em diferentes regiőes da América portuguesa ver MEDEIROS, Ricardo Pinto de. Política indigenista do Período Pombalino e seus reflexos nas capitanias do Norte da América portuguesa. In: MEDEIROS, Ricardo Pinto de e OLIVEIRA, Carla Mary S. (org.) Novos olhares sobre as capitanias do norte do Estado do Brasil. Joăo Pessoa. Editora Universitária UFPB, 2007, p.125-159;
  • DOMINGUES, Ângela. Quando os índios eram vassalos: colonizaçăo e relaçőes de poder no Norte do Brasil na segunda metade do século XVIII. Lisboa: Comissăo Nacional para as Comemoraçőes dos Descobrimentos Portugueses, 2000, p.199-237;
  • GARCIA, Elisa F. As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo sul da América Portuguesa Niterói: UFF, 2007 (História, Tese de Doutorado).
  • 50 ALMEIDA, M. Regina Celestino de Almeida. Política indigenista e etnicidade: estratégias indígenas no processo de extinçăo das aldeias do Rio de Janeiro - século XIX. In: OHMSTEDE, Antonio Escobar; MANDRINI, Raúl e ORTELLI, Sara. (coord.) Sociedades en movimiento: los pueblos indigenas de America Latina en el siglo XIX, Anuario del IEHS, Tandil (Argentina), p.219-233, 2007.
  • 51 BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización. Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, (ww.ehess.fr/cerma.Revuedebates.htm)
  • 53 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Política indigenista e etnicidade: estratégias indígenas no processo de extinçăo das aldeias do Rio de Janeiro - século XIX.
  • 54 ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuaçőes político-culturais no Rio de Janeiro oitocentista.
  • 55 COHEN, Abner. O homem bidimensional: a antropologia do poder e o simbolismo em sociedades complexas. Rio de Janeiro: Zahar,1978.
  • 56 OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. Identidade étnica, identificaçăo e manipulaçăo. In: OLIVEIRA, R.C. Identidade, etnia e estrutura social. Săo Paulo: Editora Pioneira, 1976, p.1-31.
  • 57 CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.133-154;
  • SILVA, Edson. Confundidos com a massa da populaçăo: o esbulho das terras indígenas no nordeste no século XIX, Revista do Arquivo Público de Pernambuco, n°.46, v.42, p.17-29, 1996.
  • 61 OLIVEIRA, Joăo Pacheco de. (org.) A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboraçăo cultural no nordeste indígena. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1999.
  • *
    Autor convidado.
  • 1
    Vários trabalhos nas últimas décadas têm apontado para a falácia da existência de fronteiras rígidas entre espaços e populações dentro e fora das administrações espanhola e portuguesa nas Américas. Sobre isso, para a América espanhola, ver, entre outros, POLONI-SIMARD, Jacques. Redes y Mestizaje Propuestas para el análisis de la sociedad colonial. In: BOCCARA, Guillaume e GALINDO, S. (org.)
    Lógica mestiza en América. Temuco: Ed. Universidad de La Frontera-Instituto de Estudios Indígenas, 2000, p.113-137; ORTELLI, Sara. Del discurso oficial a las fuentes judiciales. El enemigo y el proceso de mestizaje en el norte novohispano tardocolonial.
    Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.53-81, 2005; NACUZZI Lídia R. Las identidades étnicas y sus límites. In: .
    Identidades impuestas. Tehuelches, aucas y pampas en el norte de la Patagonia. Buenos Aires: Sociedad Argentina de Antropología, 2005, p.103-164; RATTO, Silvia. Rompecabezas para armar: el estudio de la vida cotidiana en un ámbito fronterizo.
    Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.180-207, 2005. Para a América portuguesa, ver: RESENDE, Maria Leônia Chaves de e LANGFUR, Hal. Minas Gerais indígena: a resistência dos índios nos sertões e nas vilas de El Rei.
    Revista Tempo, Rio de Janeiro, n°.23, p.15-32, 2007; GARCIA, Elisa F.,
    As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo Sul da América Portuguesa. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, no prelo; MALHEIROS, Márcia. "
    Homens da Fronteira": índios e capuchinhos na ocupação dos sertões do Leste, do Paraíba ou Goytacazes. Niterói: UFF, 2008 (História, Tese de Doutorado); KOK, Gloria
    O sertão itinerante expedições da capitania de São Paulo no Século XVIII. São Paulo: Hucitec/FAPESP, 2004; LEMOS, Marcelo.
    "O Índio virou pó de café?" A resistência dos índios coroados de Valença frente à expansão cafeeira no Vale do Paraíba (1788-1836). Rio de Janeiro: UERJ, 2004 (História, Dissertação de Mestrado), entre outros.
  • 2
    JONG, Ingrid de. Introducción. Dossier Mestizaje, Etnogénesis y Frontera.
    Memoria Americana, Buenos Aires, n°.13, p.9-19, 2005; BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del nuevo mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización.
    Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, (
    O pensamento mestiço. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
  • 3
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia Limitada; São Paulo: EDUSP, 1989, tomo 1.
  • 4
    LIMA, Valéria.
    J. B. Debret historiador e pintor. Campinas: Editora da UNICAMP, 2007, p.35.
  • 5
    LIMA, Valéria.
    J. B. Debret historiador e pintor, p.40.
  • 6
    De acordo com Valéria Lima, esse aspecto classificatório da obra de Debret foi particularmente ressaltado por Wilson Coutinho. Cf. COUTINHO, Wilson. E os franceses chegaram. In:
    Catálogo Missão Artística Francesa e pintores viajantes. Rio de Janeiro: Instituto Cultural Brasil-França e Fundação Casa França-Brasil, 1990. Citado em LIMA, Valéria.
    J.B. Debret historiador e pintor, p.34.
  • 7
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 8
    Rio de Janeiro. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ). Fundo Presidência da Província (PP), col.115, dossiê 312, pasta 1, n°.3.
  • 9
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 10
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 11
    Sobre isso ver SCHWARCZ, Lilia Moritz.
    O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil - 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
  • 12
    Sobre isso ver LIMA, Valéria.
    J. B. Debret historiador e pintor, p
    .35.
  • 13
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47.
  • 14
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.47-48.
  • 15
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de.
    Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003.
  • 16
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de.
    Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro.
  • 17
    SCHWARTZ, Stuart e SALOMON, Frank. News people and new kind of people: adaptation, readjustment, and ethnogenesis in South American Indigenous societies (Colonial Era). In: SCHWARTZ, Stuart e SALOMON, Frank. (orgs.)
    The Cambridge History of Native Peoples of the Américas. New York: Cambridge University Press, 1999; HILL, Jonathan. (org.)
    History, power and identity: ethnogenesis in the Americas, 1492-1992. Iowa City: University of Iowa Press, 1996; BOCCARA, Guillaume. Poder colonial e etnicidade no Chile: territorialização e reestruturação entre os Mapuche da época colonial.
    Revista Tempo, Rio de Janeiro, n°.23, p.67-83, 2007, entre outros.
  • 18
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuações político-culturais no Rio de Janeiro Oitocentista. In: SOIHET, Rachel; BICALHO, M. Fernanda; GOUVÊA, M de Fátima S. (coord.)
    Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Rio de Janeiro: Mauad, 2005, p.235-255.
  • 19
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de.
    Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro.
  • 20
    Vários trabalhos que apontam essas interações, tanto na América portuguesa como na espanhola, estão citados na nota 1.
  • 21
    WEBER, Max. Relações comunitárias étnicas. In: WEBER, Max.
    Economia e sociedade. Brasília: Editora da Universidade de Brasilia, 1994, p.267-277; BARTH, Frederick Os grupos étnicos e suas fronteiras. In: TOMKE, Lask. (org.)
    O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Rio de Janeiro: ContraCapa, 2000, p.25-67.
  • 22
    GRUZINSKI, Serge.
    O pensamento mestiço, 2003; BOCCARA, Guillaume.
    Mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización; JONG, Ingrid de. Introducción. Dossier Mestizaje, Etnogénesis y Frontera, p.9-19; MATTOS, Hebe.
    Escravidão e cidadania no Brasil monárquico. Rio de Janeiro: Zahar, 2000; LIMA, Ivana Stolze.
    Cores, marcas e fala: sentidos da mestiçagem no Império do Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003.
  • 23
    Sobre isso ver CADENA, Marisol de la. Are mestizos hybrids? The conceptual politics of Andean identities.
    Journal of Latin American Studies, n°.37, p.259-284, 2005; WADE, Peter. Rethinking mestizaje: ideology and lived experience.
    Journal of Latin American Studies, n°.37, p.239-257, 2005.
  • 24
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.48.
  • 25
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p.48.
  • 26
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1978, tomo I, p.41-42
  • 27
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.43-44.
  • 28
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.52-54.
  • 29
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1978, tomo I, p.36-37.
  • 30
    LIMA, Valéria.
    J. B. Debret, historiador e pintor, p.260.
  • 31
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, p.56. (grifo meu).
  • 32
    Carta Régia ao Governador e Capitão General da capitania de Minas Gerais sobre a guerra aos Índios Botocudos. 13/05/1808. In: CUNHA, Carneiro da.
    Legislação indigenista no século XIX: uma compilação (1808-1809). São Paulo: Edusp, 1992, p.57-61. Sobre os Botocudos, ver MISSAGIA, Isabel de Mattos.
    Civilização e revolta: os botocudos e a catequese na Província de Minas. São Paulo: EDUSC, 2004.
  • 33
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, tomo I, p.56.
  • 34
    DEBRET, Jean Baptiste.
    Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, 1989, tomo I, p.56-57.
  • 35
    SILVA, Joaquim Norberto de Souza e
    . Memória histórica e documentada das aldeias de índios do Rio de Janeiro.
    Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, Rio de Janeiro, n°.62, p.250, abril/junho de 1854.
  • 36
    Lisboa. Arquivo Histórico Ultramarino, (AHU) Câmara da Vila de Santo Antonio de Sá, 19 de novembro de 1768, Caixas Rio de Janeiro, Cx.93, doc.43.
  • 37
    AHU. Câmara da Vila de Santo Antonio de Sá, 19 de novembro de 1768, Caixas Rio de Janeiro, Cx.93, doc.43.
  • 38
    MALHEIROS, Márcia.
    "Homens da fronteira" índios e capuchinhos na ocupação dos sertões do leste, do Paraíba ou Goytacazes.
  • 39
    Sobre isso ver LIMA, Valéria
    J.B. Debret historiador e pintor, p.48.
  • 40
    BOCCARA, Guillaume. mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización.
    Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, (
  • 41
    Sobre a política indigenista do período colonial ver PERRONE-MOISÉS, Beatriz. Índios livres e índios escravos; e BEOZZO, José Oscar. Leis e regimentos das missões, 1983. Para o século XIX, ver CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX. In: CUNHA, Manuela Carneiro da.
    História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p.133-154; CUNHA, Manuela Carneiro da. (coord.)
    Legislação indigenista no século XIX: uma compilação (1808-1809).
  • 42
    Citado em CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.152.
  • 43
    Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará e Maranhão, enquanto Sua Majestade não mandar o contrário. In: ALMEIDA, Rita Heloísa de.
    O Diretório dos Índios: um projeto de "civilização" no Brasil do século XVIII. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997, Apêndice.
  • 44
    Sobre isso ver: CUNHA, Manuela Carneiro da. (coord.)
    Legislação indigenista no século XIX: uma Compilação (1808-1809).
  • 45
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuações político-culturais no Rio de Janeiro Oitocentista, p.235-255.
  • 46
    SCHWARCZ, Lílian M.
    O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil -1870-1930, p.112.
  • 47
    SCHWARCZ, Lílian M.
    O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil -1870-1930; GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Projeto de uma história nacional.
    Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Cpdoc/FGV, n°.1, p.5-27, 1988.
  • 48
    O Regulamento das Missões de 1845 manteve os direitos dos índios nas aldeias, decretando ser obrigação do Diretor Geral designar terras para plantações comuns, para plantações particulares dos índios e para os arrendamentos. No entanto, de acordo com as orientações assimilacionistas predominantes, ao referir-se às aldeias, decretava, em seu artigo 1° § 2, que se informasse ao "governo Imperial sobre a conveniência de sua conservação, ou remoção, ou reunião de duas, ou mais, em uma só". Decreto n°.426 – de 24 de Julho de 1845 – Regulamento acerca das Missões de catechese e civilização dos Índios. In: BEOZZO, José Oscar.
    Leis e Regimento das missões, p.169, p.174. A Lei de Terras de 1850 explicitava ainda mais nitidamente a política assimilacionista do Império: reservava as terras para os índios em usufruto, afirmando que "não poderão ser alienadas, enquanto o governo Imperial, por ato especial, não lhes conceder o pleno gozo delas, por assim o permitir o seu estado de civilização". In: WOLNEY, Maria Jovita Valente. (org.)
    Coletânea: legislação agrária, legislação de registros públicos, jurisprudência, Ministério Extraordinário para Assuntos Fundiários. Brasília, 1983, p.371. Apud: MOTTA, Marcia. Terra, nação e tradições inventadas: uma outra abordagem sobre a Lei de Terras de 1850. In: MENDONÇA, Sônia & MOTTA, Márcia. (orgs.)
    Nação e poder: As dimensões da história. Niterói: EDUFF, 1998, p.81-92. A partir de 1861, o encargo da catequese e civilização dos índios passou ao Ministério dos Negócios, Agricultura, Comércio e Obras Públicas, evidenciando que, no século XIX, a questão dos índios tornara-se, em algumas regiões, essencialmente uma questão de terras, como afirma CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.133-154.
  • 49
    Sobre a aplicação da política pombalina em diferentes regiões da América portuguesa ver MEDEIROS, Ricardo Pinto de. Política indigenista do Período Pombalino e seus reflexos nas capitanias do Norte da América portuguesa. In: MEDEIROS, Ricardo Pinto de e OLIVEIRA, Carla Mary S. (org.)
    Novos olhares sobre as capitanias do norte do Estado do Brasil. João Pessoa. Editora Universitária UFPB, 2007, p.125-159; DOMINGUES, Ângela.
    Quando os índios eram vassalos: colonização e relações de poder no Norte do Brasil na segunda metade do século XVIII. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2000, p.199-237; GARCIA, Elisa F.
    As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo sul da América Portuguesa. Niterói: UFF, 2007 (História, Tese de Doutorado).
  • 50
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de Almeida. Política indigenista e etnicidade: estratégias indígenas no processo de extinção das aldeias do Rio de Janeiro - século XIX. In: OHMSTEDE, Antonio Escobar; MANDRINI, Raúl e ORTELLI, Sara. (coord.) Sociedades en movimiento: los pueblos indigenas de America Latina en el siglo XIX,
    Anuario del IEHS, Tandil (Argentina), p.219-233, 2007.
  • 51
    BOCCARA, Guillaume. Mundos nuevos en las fronteras del Nuevo Mundo: relectura de los procesos coloniales de etnogénesis, etnificacón y mestizaje en tiempos de globalización.
    Mundo Nuevo Nuevos Mundos - Revista Eletrônica, Paris, 2000, (ww.ehess.fr/cerma.Revuedebates.htm)
  • 52
    A
    Memória histórica e documentada das aldeias de índios da província do Rio de Janeiro, escrita por Joaquim Norberto de Souza Silva (1854), insere-se nesse contexto. Apesar da simpatia com que o autor trata dos índios, demonstrando preocupação com sua sorte e sobrevivência, a tônica de seu texto é a decadência e miserabilidade das aldeias que deviam caminhar para a extinção.
  • 53
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Política indigenista e etnicidade: estratégias indígenas no processo de extinção das aldeias do Rio de Janeiro - século XIX.
  • 54
    ALMEIDA, M. Regina Celestino de. Índios, missionários e políticos: discursos e atuações político-culturais no Rio de Janeiro oitocentista.
  • 55
    COHEN, Abner.
    O homem bidimensional: a antropologia do poder e o simbolismo em sociedades complexas. Rio de Janeiro: Zahar,1978.
  • 56
    OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. Identidade étnica, identificação e manipulação. In: OLIVEIRA, R.C.
    Identidade, etnia e estrutura social. São Paulo: Editora Pioneira, 1976, p.1-31.
  • 57
    CUNHA, Manuela Carneiro da. Política indigenista no século XIX, p.133-154; SILVA, Edson
    . Confundidos com a massa da população: o esbulho das terras indígenas no nordeste no século XIX,
    Revista do Arquivo Público de Pernambuco, n°.46, v.42, p.17-29, 1996.
  • 58
    Rio de Janeiro. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ). Fundo Presidência da Província (PP) col.115, dossiê 312, pasta 1, n.3.
  • 59
    AN. Série Agricultura, IA7 –1, f.70v.
  • 60
    AN. Série Agricultura, IA7-1, f.78v.
  • 61
    OLIVEIRA, João Pacheco de. (org.)
    A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no nordeste indígena. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1999.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Ago 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Recebido
      15 Out 2008
    Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos, 6627 , Pampulha, Cidade Universitária, Caixa Postal 253 - CEP 31270-901, Tel./Fax: (55 31) 3409-5045, Belo Horizonte - MG, Brasil - Belo Horizonte - MG - Brazil
    E-mail: variahis@gmail.com