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Os pretos devotos do Rosário no espaço público da paróquia, Vila Rica, nas Minas Gerais

The Pretos Devotees of the Rosary in the Public Space of the Parish, Vila Rica, in Minas Gerais

Resumo

Este artigo aborda a espacialização das devoções negras e escravas, no enquadramento territorial das paróquias fronteiriças do termo de Vila Rica. Da dimensão pessoal da devoção, nas situações aflitivas do cotidiano, à corporação coletiva de classificação dos pretos da irmandade de Nossa Senhora do Rosário, examina-se o significado do espaço público para a representação social negra, ancorada na devoção do compromisso, mas realmente constituída na fluidez e no dinamismo político-religioso. A invocação basilar do culto público dos pretos, africanos escravos (e ainda libertos), contribuindo para dispor as divisões socioculturais, desdobrou-se num devocionário especificamente negro que incluiu outras santidades como, principalmente, Mercês e Santa Efigênia. Articula-se essa mobilidade da fé nos mediadores santos à configuração paroquial (efeito do embate de direitos eclesiásticos e seculares entre a matriz e as capelas), à urbanização difusa do território minerário e ao confronto das representações negras e mestiças sob a égide de patronos católicos.

Palavras-chave
Irmandade do Rosário; espaço público; qualidade social

Abstract

This article approaches the spatiality of the black and slave devotions in the territorial framework of border parishes in the county of Vila Rica. From the personal dimension of devotion, in situations of distressing daily life, to the collective corporation in order to classify the pretos of the Brotherhood of Our Lady of the Rosary, this analysis focuses on the meaning of public space for the social representation of blacks that was anchored in the compromise of devotion, in fact, built in the fluidity and in the political-religious dynamism. The basic invocation of public worship of the pretos - African slaves (also freedmen) - contributed to arrange the socio-cultural divisions, and dismantled in a specific black breviary, in which other sanctities were gathered, including Our Lady of Mercy and St. Ephigenia. Through the mediation of saints, this mobility of faith is tied with the parish's space (effect of the clash on ecclesiastical and secular rights between the mother church and chapels), to diffuse urbanization of the mining territory, and the confrontation between the representations of blacks and mestizos, under the aegis of Catholic patrons.

Keywords
Brotherhood of the Rosary; public space; social quality

Devoção pessoal e memória da graça a escravos e libertos

Os quadrinhos pintados dos ex-votos - ou melhor, ex-voto suscepto -, manifestação dos afetos devocionais populares, ajudam a desvendar as práticas religiosas que se integravam à experiência da escravidão no território das Minas, na América Portuguesa. Ex-voto, expressão latina, significava "pela graça recebida [...]. Assim, a intenção do ex-voto (usando o sentido escolástico do termo) é o pagamento de algo que foi recebido" (Scarano, 2004SCARANO, Julita. Fé e milagre: ex-votos pintados. São Paulo: Edusp, 2004., p.36). É consenso, entre os estudiosos dos ex-votos produzidos entre os séculos XVII e XIX no mundo católico, que essas tabuinhas pretendiam denunciar a relação pessoal do fiel cristão - o beneficiado - com o orago ou a divindade - o benfeitor. Elas convergem para a lógica da economia do dom, que se traduz na cadeia beneficial dos serviços, fundamental às noções da soberania no Antigo Regime Português. Com efeito, refletindo sobre as implicações das práticas religiosas, devemos reter as abordagens historiográficas sobre a significação dos prêmios ou das mercês para as concepções do poder político, com interferência direta nos equilíbrios sociais.1 1 "Bartolomé Clavero refere 'une mentalité du béneficie rendu obligatoire par la religion' e a antidora como a doação remuneratória. António Hespanha, por seu turno, sublinha o carácter obrigado da remuneração numa perspectiva da 'economia do dom'. Com referência à liberalidade régia no Portugal moderno, Hespanha acentuou as respectivas raízes clássicas, interpretando-as à luz de uma concepção 'naturalista-corporativa' da sociedade: 'Incluso en el libérrimo acto de dar o recibir un don [...] tienen que acomodarse a un orden de cosas inscrito de uma vez por todas en la naturaleza delas relacionessociales'" (MONTEIRO, 2007, p.84-85).

Os escravos e os libertos, notadamente das Minas, foram personagens dessas pinturas votivas da religiosidade popular. Contudo, afirma-se que essas seriam em menor número do que as representações dos brancos. Evidentemente, os oragos lembrados pelos negros e mulatos não eram forçosamente os que possuíam o mesmo atributo da "cor": os suplicantes afrodescendentes também dirigiam súplicas a santos brancos. Quanto ao gênero dos devotos agraciados, concluiu-se que o número de súplicas votivas dos homens superava o relacionado às mulheres, brancas ou negras. Além disso, representações de ambientes externos eram mais incomuns do que de lugares particulares, como os quartos, onde figurava a situação de enfermidade ou agonia.2 2 SCARANO, 2004, p.85-98. Particularmente, no território de Minas Gerais, essa prática religiosa de gratidão pessoal foi muito expressiva. CASTRO, 1994; MELLO E SOUZA, 1999, p.207-209.

Os conflitos e os acidentes de trabalho, envolvendo personagens de cor, foram mostrados, via de regra, em ambientes externos. Uma tabuinha significativa (Figura 1), datada de 1770, trazia a seguinte legenda: "Mercê que fez o Senhor Jesus de Matozinhos e a Senhora do Carmo a Antonio escravo de José da Costa Gouvea que estando trabalhando na cata lhe cayio hũ banco de terra e ficando emterrado athe os peitos quando o tirarão tinha hua perna quebrada em varias partes e apegandoce com o dito Senhor e sua Mãe Santíssima ficou sem sezão algũa".3 3 Museu Regional de São João del-Rei, ex-voto.

Figura 1
ex-voto, 1770

O ex-voto apresenta a cena do desabamento da mina de ouro situada no morro, onde as lavras ocasionavam acidentes graves que resultavam em ferimentos, fraturas e mortes dos trabalhadores. Dois escravos, próximos ao buraco, carregam nos carumbés sobre as cabeças o material extraído do desmonte. Outro cativo tenta auxiliar o infeliz Antonio que fora soterrado: meio corpo preso num amontoado de terra e rochas. Nota-se que não há feitor ou senhor no lugar encenado. Apesar de parecer um faiscador ou mineiro com atuação própria, o escravo é identificado através do seu senhor, o que reproduz as práticas de escrita dos ex-votos mineiros. No entanto, o proprietário não tem, diretamente pelo menos, papel algum na súplica referida na legenda ou na imagem. Assim, como na situação de autonomia do trabalho, representa-se o protagonismo devoto do escravo, assistido por seus companheiros, com as duas invocações sobre as usuais nuvens, à direita.

Podemos supor a espacialidade envolvida nessa dupla proteção. Sabe-se que o Senhor de Matosinhos alcançou prestígio miraculoso nas Minas Gerais, com a divulgação das graças concedidas por esse orago do povoado de Congonhas do Campo, conforme a administração proveitosa realizada pela irmandade.

Um ex-voto antigo, produzido no ano de 1722, referia-se a um escravo, que vestido decentemente, encontra-se ajoelhado diante da imagem do Senhor de Matosinhos, provavelmente depois de sua peregrinação.4 4 "M. q'. fes o Snr̃ de Matozinho a João escravo de Maria Leme, q. estando gravem.te doente, epegandose com dito Snr̃ Logo teve saude. 1722". Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Coleção de ex-votos. Ainda, conferir Catálogo dos ex-votos inscritos no Livro do Tombo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Promessa e milagre no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Minas Gerais. Brasília: MEC/SPHAN, 1981. A propagação dos feitos milagrosos da invocação, contudo, deve-se à localização do famoso templo em Congonhas, povoado situado no frequentado caminho novo, num ponto praticamente equidistante das urbs populosas - Vila Rica, Mariana, São João del-Rei, Sabará. Assim, a localização favorável às práticas de romaria e a fama das graças conseguidas permitiu alguma mobilização regional (e decididamente coletiva) da devoção. De outro lado, a devoção a Nossa Senhora do Carmo mobilizou talvez as experiências mais locais, ou até familiares, que poderiam associar-se ao poder senhorial desse escravo fiel.5 5 Houve um enraizamento carmelita na capitania de Minas Gerais através das presídias da ordem terceira que, integradas à administração dos terceiros do Carmo das vilas, estimulavam a fidelidade devocional em diversas localidades. Conferir: ANDRADE, Francisco Eduardo de; SANTIAGO, Felipe José Flausino. Presídias dos terceiros do Carmo de Vila Rica: poder e urbanização na América portuguesa, 1752-1822. Relatório científico. Ouro Preto: Universidade Federal de Ouro Preto, 2012. p.1-23 (impresso). Para mais informações: http://www.propp.ufop.br/pesquisa.

Considerou-se que a maioria dos ex-votos pintados em madeira perdeu-se devido ao descaso e à ação deliberada da hierarquia católica, desde fins do século XIX. De qualquer modo, num cálculo da distribuição devocional de uma amostragem de ex-votos de Minas Gerais, produzidos nos séculos XVIII e XIX, verificou-se que a maioria - 62 casos, 43,9% do total - dirigia o seu pleito de auxílio mais imediato a Bom Jesus de Matosinhos. Nossa Senhora de Nazaré e Nossa Senhora do Carmo ocupam o segundo e o terceiro lugares na lista de preferência dos fiéis dessa amostra: 10,6% e 9,2%, respectivamente.6 6 A conservação de um número significativo de ex-votos dedicados a Bom Jesus dos Matozinhos pode ser atribuída à necessidade de legitimar a fama milagreira do orago, no monte sacralizado de Congonhas. Nossa Senhora (com suas diversas invocações: Nazaré, Carmo, Conceição, Rosário, Milagres, Mercês, Dores, Luz, Glória, Oliveira, Soledade, Saúde, Livramento, Boa Morte, Alívio, Bom Despacho) predomina largamente se considerarmos os outros membros, diga-se, de uma corte celestial. Ver: CASTRO, 1994, p.22. Parece que a mercê duplicada foi incomum e poderia indicar a distinção alcançada, ou pretendida, por esse cristão peticionário.

Há outro ex-voto que representou uma cirurgia na perna de um escravo, em um período, significativamente, de aprofundamento dos buracos de minas nas encostas.7 7 O cirurgião Luís Gomes Ferreira, na primeira metade do século XVIII, observando o tratamento de fraturas com emplasto de claras de ovos, cuja ineficácia inutilizava o "escravo bom", concluiu: "nem me parece acerto usá-lo, por considerar o clima, a habitação dentro da água, os que são mineiros e pretos, que estes são os comuns que quebram braços e pernas, e também alguns brancos, considerando também a nutrição dos alimentos, ou sendo brancos pobres, que estes, pela maior parte, levam pior vida sendo forros do que levam os cativos" (FERREIRA, 2002, p.468). Olavo Bilac, no final do século XIX, admirado com os milagres, "desenhos toscos, engraçadissimas télas, quadros adoraveis de ingenuidade", diz que viu esse ex-voto na igreja de Santa Ana, erguida na serra de Vila Rica e situada abaixo da velha capela de São João de Ouro Fino.8 8 BILAC, Olavo. Chronicas e Novellas, 1893-1894. Rio de Janeiro: Cunha e Irmão Ed., 1894, p.107. A cena investiu na atitude piedosa do espectador quando imaginou a agonia do fiel estropiado: o cirurgião branco, com dois ajudantes, corta o fêmur do escravo em um aposento, cuja porta aberta deixa entrever a paisagem montanhosa. A legenda explica: "M. q̃. ffez S. S. Anna, ahũ preto Luis escravo de Luiz Pra. q. quebrando huã perna pella coixa e sendo emcanada 3 vezes sem de nẽhuã soldar lhe abrio o syrugião a perna eserramdolhe as pontas dosossos por entercessão da milagroza S. sevio sam em 20 de 8br.o de 1732 annos".9 9 Capela da Ordem Terceira de São Francisco de Assis, Ouro Preto, ex-voto.

Trata-se novamente de um escravo beneficiado (supostamente fiel à devoção, fiel ao senhor...); no entanto, nota-se certa ambiguidade relacionada ao seu agenciamento no pleito da graça. Mesmo no momento de dor física, supondo que isso determinasse a experiência individual, é improvável que houvesse um pedido solitário. Pelo menos é o que o texto da legenda sugeriu, no seu laconismo, o que não eximiria o cativo de guardar pessoalmente a fé. Assim, como sugeriam os acontecimentos de outros ex-votos, que remetiam às relações sociais, outros personagens - pessoas livres ou escravas - representados ou não, deviam testemunhar o pedido e a mercê. Esses poderiam juntar-se à súplica do socorro celestial, em meio à situação de risco de morte do agente principal.

O proprietário de escravos poderia estar ausente na imagem, mas comumente ele era mencionado na inscrição, o que permitiu, além da identificação distintiva do escravo, a extensão do desfecho feliz, com o alcance da graça, até atingir o próprio senhor.

Observamos um ex-voto a respeito de escravo doente em que o senhor tornou-se o sujeito do acontecimento, embora ele não apareça na cena, reforçando a ambiguidade do ajuste que integra o escravo, a casa do senhor e a santidade de proteção: "M. q fez a Snr.a S. Ana a João escravo de An.to Dias Godim q. se achava gram[gravemente] enfermo e ia sem esperanças devida erecorrendo o Snr. do d.o escravo a milagroza Snr.a logo se achou com saude no anno de 1758".10 10 Capela da Ordem Terceira de São Francisco de Assis, Ouro Preto, ex-voto. Quem recorreu à devoção foi o senhor, devido à natureza das relações de poder; mas, qual o personagem verdadeiramente merecedor: o senhor ou o cativo? Se, no texto, o senhor foi explicitamente o mediador da mercê ou do milagre, conformando-se à estratificação social, na representação visual, o escravo foi o devoto beneficiário, dissimulando a intromissão do dono. O negro, agora privilegiado num leito suntuoso de homens livres e poderosos, parece escapar ao domínio político mundano. Desse ponto de vista, anunciou-se o sentimento, sob o signo religioso, da libertação pessoal do cativo.11 11 Como expressão da religião popular, notou-se a relação direta e hierarquizada com a divindade (apesar da pastoral tridentina). "Direta, porque os paroquianos desobedientes, na ótica da prática imposta, esperam da divindade uma presença imediata em sua vida pessoal" (VOVELLE, 1987, p.192). A definição de pessoa, com as suas dimensões anímica e corporal, devia seguir a pastoral da predominante ótica neotomista, conforme a síntese de MASSIMI, 2005, p.158-163.

Esses ex-votos, embora tratassem de feitos milagrosos particulares, deviam irradiar-se no espaço público. Serviam à socialização de uma memória, disseminando condutas entre os católicos, especialmente entre os fiéis da devoção eleita, de ajustes pessoais com as santidades, que se clamavam nas rezas e se mobilizavam na manipulação dos artefatos santos (rosários, bentinhos) (Mott, 1996MOTT, Luiz. Santo Antônio, o divino capitão-do-mato. In: REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos (orgs.). : história dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. p.110-138., p.133), no âmbito do espaço doméstico ou de trabalho. Nesse sentido, concebiam uma moralidade prática do cotidiano, tramada conforme os matizes significativos do exercício tradicional dos poderes. Até a resistência devota, efeito do sentimento de injustiça, predispunha a graça divina, conferida no ordenamento mais legítimo de sujeição, conforme um ex-voto datado de 29 de dezembro de 1720 sobre honra senhorial. Aquela, atingida pela violência dos agentes do governo, amparou-se na soberania absoluta da divindade. O narrador, capitão-mor da vila e patrono da capela de Nossa Senhora do Ó, em Sabará, relatou que os soldados da companhia dos dragões quiseram matá-lo, "mas nem com as espadas nem com varios tiros q. lhe deram foi possível q. conseguisem o imtento porque a mai de Deos deu forças ao seo devoto p.a q. ele de tudo se defendese sem reseber o menor perigo nem em si nem em os escravos q. o acompanhavam".12 12 Capela de Nossa Senhora do Ó, Sabará, ex-voto; reprodução de VASCONCELOS, 1964, p.20.

Nesse gênero pictórico, as cenas não se pretendiam realistas, mas de evocação direta do acontecimento - doenças, acidentes de trabalho, ofensas à pessoa - singularizado através de recursos imagéticos que possibilitavam o pleno reconhecimento. Os elementos que compunham o lugar - paisagem ou aposento da casa - eram estilizados. Notadamente, nos ex-votos de adoecimento de pessoas comuns, é evidente que o artífice não se propunha a imitar os objetos, ou a representação fidedigna dos aspectos únicos dos relatos - exceção ao traçado básico de classificação social da figura do beneficiado, como a cor, o gênero e a idade. Para cenas dos enfermos e dos que viviam no risco da morte, usava-se representar os objetos que denotavam esse conteúdo do pedido: a cama (sobre a qual se estendia o doente, às vezes, com dossel), a colcha e o travesseiro. O requinte do mobiliário ou das roupagens, portanto, codificavam os signos de distinção social da época, atuando para abrilhantar o rito da invocação, e não se prestavam a uma figuração autêntica do drama cotidiano. Concluiu-se que as imagens das santidades, geralmente postadas no canto direito dos quadrinhos (conforme a crença de que o santo estaria à direita de Deus no céu), durante o século XVIII, eram, muitas vezes, apropriações da iconografia das esculturas em madeira. Ainda, podiam ser criações baseadas em algum material visual, como os registros dos santos ou as gravuras e quadros dos temas sacros (Scarano, 2004SCARANO, Julita. Fé e milagre: ex-votos pintados. São Paulo: Edusp, 2004., p.44-46).

Nas Minas, o costume previa que, sendo os fiéis de maior idade e de condição livre, e, portanto, no gozo da vontade plena (com a sua liberdade de eleição) e doutrinados no catolicismo, não deveria haver a mediação de outro personagem na inscrição da súplica à invocação. Porém, nos casos de doentes inconscientes ou de moribundos, o arbítrio ou o cálculo pessoal e intransferível na negociação do milagre dependia da rede familiar, ordenada por distintas relações com o beneficiado, que incluíam os parentes, os amigos e os senhores. Restava, então, a mediação de um parente ou do senhor, o que, por si só, conferia legitimidade social a essa intercessão terrena, eficaz em alcançar a santidade celestial, conforme a legenda do ex-voto de João, escravo de Antônio Dias Godim. Nas súplicas protagonizadas pelos senhores, a mercê divina, antes de atingir a sua finalidade (a saúde física e espiritual do escravo), transitava pelo favor do senhor. Por outro lado, a culpa, conforme já previa o direito canônico, não deixava de recair no senhor, o responsável pela doutrinação doméstica daqueles submetidos ao seu governo e que errava quando era conivente com os vícios e pecados dos seus escravos.13 13 Assim, conforme as Constituições do Arcebispado da Bahia (estabelecidas em 1707), os párocos e os capelães podiam responsabilizar os pais e os senhores pelo fracasso pastoral, pois "se algumas das sobreditas pessoas [pais e senhores], esquecidas da obrigação cristã, a [doutrina] não forem ouvir e não mandarem as pessoas que estão a seu cargo para a ouvirem, sejam certos que se fazem réus de quantos pecados se cometerem por falta de doutrina, de que Deus Nosso Senhor lhes fará rigoroso juízo". VIDE, Sebastião Monteiro da. Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia (1707). Estudo crítico e edição de Bruno Feitler e Evergton Sales Souza. São Paulo: Edusp, 2010, p.127-128.

Apegar-se, suplicar à devoção eleita eram expressões modelares dos relatos de ex-votos que, representando a autonomia da vontade, e ao mesmo tempo o compromisso moral (inscrito na cadeia do favor divino), tornavam-se sinais distintivos da experiência legítima dessa liberdade cristã.14 14 CASTRO, 1994, p.48, apresenta um exemplo de relato votivo que se fez para uma mulher negra em 1798, que estando gravemente enferma, "apegouce com fe viva com o S.o Snr̃" Nota-se, ainda, na cena (óleo sobre madeira), o uso dos sinais de requinte nas roupas de cama e das cores como "o vermelho e o azul, que correspondem não somente ao gosto acentuadamente popular do português como do africano", segundo Luís Jardim. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Promessa e milagre no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Minas Gerais. Brasília: MEC/SPHAN, 1981, p.26.

O livre-arbítrio, base da economia cristã, supunha que até o escravo decidiria sobre o prêmio ou o castigo resultantes das suas obras e merecimentos. Paradoxalmente, essa liberdade natural, que se presumia nas práticas constantes de evangelização, justificava uma dose de violência para fazer a vontade dos sujeitos cativos corresponder às expectativas de eficácia do governo senhorial (que se podia observar na perspectiva do jesuíta Jorge Benci, cuja obra Economia cristã dos senhores no governo dos escravos integrou o acervo de fontes das Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia ). Como já foi pressuposto, a gestão violenta não poderia advir da certeza econômica da reificação do escravo, mas justamente do seu potencial criativo, sua reação à lógica da exploração senhorial (Marquese, 2004MARQUESE, Rafael de Bivar. Feitores do corpo, missionários da mente: senhores, letrados e o controle dos escravos nas Américas, 1660-1860. São Paulo: Companhia das Letras, 2004., p.82-83).

A instituição pública da devoção dos pretos do rosário

As invocações e as práticas religiosas difusas, inscritas na convivência doméstica ou familiar, e redimensionadas no mundo dos trabalhos associados da capilaridade urbana das Minas, conjugavam-se com as crenças dos moradores unidos nas irmandades de devoção ou de "obrigação".15 15 É extensa a bibliografia sobre as instituições de confrarias da América Portuguesa, especialmente da capitania de Minas Gerais. Retomamos as investigações que privilegiaram as irmandades dos africanos e dos seus descendentes: SCARANO, 1975; AGUIAR, 1993; BORGES, 2005; PRECIOSO, 2014. Os fiéis africanos, crioulos e mestiços das congregações eram os moradores dos povoados de freguesia ou aqueles que, sendo trabalhadores volantes - como jornaleiros, faiscadores, quitandeiras - integravam-se de algum modo às devoções das capelas instituídas nesses lugares. Entre a casa familiar, a corporação dos moradores e a capela paroquial, entre o particular e o público desenhava-se o circuito das práticas religiosas do catolicismo popular na América Portuguesa, conforme apontamento da historiografia (Mott, 1997MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: MELLO E SOUZA, Laura de (org.). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras , 1997. p.155-220., p.156-163). Promessas ou apelos prementes e circunstanciais aos santos, sedimentados com bom desfecho, se anotados e divulgados, como na memória da graça dos quadros votivos, serviam para compor e acumular um capital religioso ou devocional, distinguindo o orago, a capela e a irmandade que a administrava. Os relatos dos milagres mantinham tal propósito, que as ordens missionárias ensinavam. Frei Jaboatão, no final do século XVIII, referindo-se a um "treslado de hum processo de testemunhas" do livro do cartório da província franciscana, que atendia à solicitação do frade dirigente do mosteiro carioca do início do século XVII, lembrou a eficácia milagrosa do orago São Benedito, santo "preto", que se manifestara um guardião dos seus iguais. Uma escrava, mãe de uma criança moribunda (com uma espinha presa à garganta), não sabia mais o que devia fazer,

pedindo, contudo ao Senhor, que dando saúde à criança lha oferecia ao seo serviço [isto é, do santo, da ordem, de Deus], promettendo, além do sobredito, huã missa com huã candêa a S. Benedicto de São Fratel, Religiozo Tapanhuno", professo da ordem seráfica. No outro dia, a criança, com a saúde restabelecida, dissera que um "fradinho viéra dos Céos, e o sarára". Indagado sobre a identidade do frade, a criança respondera: "hum meo parente.16 16 JABOATÃO, Frei Antônio de Santa Maria. Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Crônica dos frades menores da província do Brasil. Rio de Janeiro: Tipografia Brasiliense de Maximiano Gomes Ribeiro, 1859, p.432-433.

Por outro lado, a fidelidade aos oragos coletivos, abrigados em capelas prestigiadas ou ornadas com os artefatos do poder sobrenatural, mobilizava no devoto, nos momentos supostamente mais vulneráveis à sua conservação, a lembrança de requerer a intercessão ou a proteção à santidade. Essa teatralização do sagrado, de qualquer forma, produzia uma emulação mais consistente no rebanho cristão.

O mercado de bens religiosos, isto é, simbólicos, com valores sociais e políticos, que assim se constituía, não deixava de ser comumente conflituoso, num circuito que enredava autoridades clericais (da organização eclesial ordinária ou das ordens religiosas), governantes, senhores, livres pobres, libertos e escravos. Com efeito, o processo constitutivo do orago público da capela coletiva dependeria dos contextos específicos, desde uma devoção particular ou corporativa (família e irmandade) até a participação da agremiação numa unidade paroquial, forma de expressão na república citadina.

Observou-se, a esse respeito, que a veneração dos africanos, sobretudo da procedência mina, a Santo Elesbão e Santa Efigênia, na cidade do Rio de Janeiro, teve início em "casa particular" na freguesia do porto, Candelária, na primeira metade do século XVIII. Após instituírem a sua irmandade com compromisso (datado de 1740) na capela de São Domingos da mesma freguesia, os associados buscaram, ainda na década de 1740, construir a própria capela na vizinhança, o que exigira a reforma do compromisso, apresentando-a ao "culto público" em 1754 (Soares, 2002SOARES, Mariza de Carvalho. O Império de Santo Elesbão na cidade do Rio de Janeiro, no século XVIII. Topoi, vol. 3, n. 4, p.59-83, jan./jun. 2002., p.63-65; Oliveira, 2006OLIVEIRA, Anderson José Machado de. Devoção e identidades: significados do culto de Santo Elesbão e Santa Efigênia no Rio de Janeiro e nas Minas Gerais no Setecentos. Topoi, vol. 7, n. 12, p.60-115, jan./jun. 2006., p.80-82, p.107-108). No entanto, não se poderia simplesmente concluir que, tendo começado "numa casa", esse culto viria a ser "privado", "secreto" ou "clandestino", o que denotaria práticas "heterodoxas" ou africanas (Quintão, 2002QUINTÃO, Antonia Aparecida. Lá vem o meu parente: as irmandades de pretos e pardos no Rio de Janeiro e em Pernambuco (século XVIII). São Paulo: Annablume; Fapesp, 2002., p.41-42). Os ritos costumeiros das capelas domésticas ou mesmo dos recintos dos oratórios, embora fossem criticados quando abusivos, eram reconhecidos por autoridades eclesiásticas, pretendendo a difusão da catequese e a observância de distinções sociais no exercício religioso.17 17 MOTT, 1997, p.161. Sobre as apropriações pública ou "privada" dos altares e das capelas no Rio de Janeiro da América portuguesa, conferir CHAHON, 2008.

Observou-se que a expansão do "fenômeno confrarial" foi notável nas Minas Gerais, onde, sobretudo, as irmandades de negros e mulatos seriam "numericamente mais expressivas no Brasil colonial".18 18 AGUIAR, 1993, p.22-23. Ainda claramente subestimado, o número dos Rosários do bispado de Mariana (23), nas Minas, supera até o do Arcebispado da Bahia, considerando-se os requerimentos de confirmação dos estatutos compromissais enviados à Mesa da Consciência e Ordens (entre 1765 e 1801). Ver: SIMÃO, 2010, p.105-108. Há registros, compreendidos no período 1708-1820, de 63 irmandades do Rosário dos pretos na capitania de Minas Gerais. BORGES, 2005, p.225-228. Entre essas confrarias, Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, instituída nas freguesias, tornou-se a mais representativa das eleições devocionais dos cativos e dos libertos, sobretudo aqueles identificados como procedentes da África.19 19 Como atesta os dados quantitativos sobre a condição e o gênero (e a "qualidade" de cor) dos irmãos das irmandades do Rosário e das Mercês em Vila Rica. AGUIAR, 1993, p.319-324; SOUZA, 2011, p.6, tabela 2. Essa invocação-matriz reuniu ou subordinou outras devoções dos cativos e libertos negros, principalmente os de origem africana, integrando-as à sua administração, como a de São Benedito, Santa Efigênia, Santo Antônio de Catalagerona, Santo Antônio do Noto, Santo Elesbão e, no final do século XVIII, Santa Rita.20 20 SOUZA, 2011, p.12. A autora, embora pretendesse discutir as implicações socioculturais das distinções devocionais, não parece articular as práticas religiosas às mudanças da sensibilidade católica ou da organização eclesiástica. Tudo parece depender das intenções (africanas, em muitos casos) dos escravos ou dos libertos.

Abordou-se a gênese da devoção portuguesa do Rosário - promovida pelos dominicanos, em Lisboa do século XVI - que se disseminou entre os negros e os seus descendentes, talvez por sua configuração que a aproximaria dos cultos africanos - os objetos (rosário mariano análogo ao "rosário de Ifá", instrumento mágico utilizado na comunicação divina) ou os ritos (sacralidade lusa compondo-se dos recursos valorizados por culturas africanas, aquelas oriundas da África centro-ocidental) (Tinhorão, 1988TINHORÃO, José Ramos. Os negros em Portugal: uma presença silenciosa. Lisboa: Editoral Caminho, 1988., p.126-127; Mello e Souza, 2002MELLO E SOUZA, Marina de. Reis negros no Brasil escravista: história da festa de coroação do Rei Congo. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2002., p.160-164).

Além das explicações de caráter antropológico ou religioso, indicou-se uma estratégia política para compreender a expansão moderna da invocação na população cativa: "a associação entre libertação da escravidão, alforria, resgate (algumas traziam essa função no próprio título) e Nossa Senhora do Rosário" (Quintão, 2002QUINTÃO, Antonia Aparecida. Lá vem o meu parente: as irmandades de pretos e pardos no Rio de Janeiro e em Pernambuco (século XVIII). São Paulo: Annablume; Fapesp, 2002., p.79, itálico nosso). Nesse sentido, a concepção da salvação libertária da alma, baseada no livre-arbítrio do devoto, teria aberto caminho à expectativa da liberdade física ou corporal. Porém, não se trataria somente de um resgate dos sujeitos - cativos da heresia, dos infiéis -, mas de consumação social, ou pública, da universalidade cristã, rumo ao transcendente.

Assim, supõe-se que os discursos teológicos poderiam assumir conotações sociopolíticas entre os afrodescendentes e africanos da América Portuguesa. Mas, ainda perscrutando as relações entre representação ou qualidade social e as concepções religiosas, deve-se precaver das explicações mecânicas. Afinal, não se poderia presumir simplesmente que os negros ou os escravos devotos (quais?) perseguissem a liberdade terrena da justiça civil (a alforria) em detrimento da libertação da alma, com seus afetos espirituais convergentes à pastoral de reação ao gentilismo, que seria avançar para outro campo semântico e simbólico.21 21 O valor da devoção às Almas do Purgatório, desdobrando-se no empenho de salvação das almas dos irmãos mortos e vivos, pode ser conferido na manutenção, mesmo com as alegações de decadência do país, das missas de domingos e dias santos (dias de carga simbólica), oferecidas às Almas na capela do Rosário dos Pretos do Caquende. A capela de missas dependeu dos recursos dos devotos, como os do confrade capitão Joaquim José dos Santos, forro, "grande possuidor de escravos no primeiro terço do XIX", que quis "cobrir as despesas de um ano com seus bens, completando o que faltasse à remuneração do capelão" (CAMPOS, 2013, p.99).

Os párocos e os compromissos do Rosário das Minas buscaram, ciosamente, manter a devoção na senda da salvação das almas aflitas. A figura católica de Maria serviria a esse propósito de eficaz consolação psicológica: Maria, por sua concepção humana (Mãe prestimosa que se apresentava mediadora entre dois mundos), era a "advogada" modelar, na corte celestial, das causas humanas junto a Jesus Cristo. Daí, Maria ser comparada à escada, ou ser intitulada "tesoureira" de bens e "registradora das mercês" do seu filho. A confraria do Rosário, de qualquer forma, quando propôs a equidade dos irmãos nos seus estatutos tradicionais de instituição, certamente atraiu o conjunto estamental popular. Em 1573, o dominicano português Frei Nicolau Dias indicava, além da expressão teológica de Maria, o motivo social dessa preferência estendida pela confraria do Rosário: "porque comumente nas outras confrarias não são admitidos senão particulares estados de pessoas. Mas na confraria do Rosário de nossa Senhora, recebem-se todos os estados e condições de pessoas, homens, mulheres, grandes, pequenos, pobres, ricos, velhos, moços, livres, escravos, eclesiásticos, e seculares, e também dos defuntos".22 22 DIAS, Frei Nicolau. Livro do Rosário de Nossa Senhora. Lisboa: casa de Francisco Correa, 1573, p.44-45. Atualizamos a ortografia desta citação.

Havendo, ainda, a comunicação das "obras meritórias", e os consequentes favores do céu, entre os irmãos, pode-se forjar um sentido de "comunidade de caridade", mais vantajoso para todos esses cristãos do que a "irmandade natural", ou a "civil".23 23 DIAS, 1573, p.46.

Essa devoção de Nossa Senhora do Rosário, na América Portuguesa, enraizou-se, certamente difundindo-se com o trabalho missionário das ordens dos jesuítas e dos franciscanos. Nos conventos desses últimos, em Recife (Pernambuco) e em Cairu (Bahia), as capelas do Rosário, ornadas, compunham os espaços da formação dos religiosos, pois se articulavam aos claustros (Borges, 2009BORGES, Sílvia Barbosa Guimarães. Azulejaria portuguesa no Convento de Santo Antônio de Recife. In: FERREIRA-ALVES, Natália Marinho (org.). Os franciscanos no mundo português: artistas e obras I. Porto: CEPESE - Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade, 2009. p.225-243., p.229-233).

Em São Paulo, no século XVII, houve senhores apresadores de índios que mantiveram capelas desse orago nos aldeamentos que estabeleceram. Já há registro de uma imagem do Rosário, no aldeamento jesuíta de Pinheiros, que, em 1590, foi quebrada pelos índios (Holanda, 1941HOLANDA, Sérgio Buarque de. Capelas antigas de São Paulo. Revista do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, n. 5, p.105-120, 1941., p.110). Uma esposa de paulista conquistador dos negros da terra, Catarina Camacho, mostra sua fidelidade à santa, em testamento, datado de 1668:

Declarou que na sua fazenda do Bohy [Embú] tinha uma igreja da Virgem do Rosário muito bem paramentada pedia e rogava a seus herdeiros a conservem e aumentem solenizando o seu dia quando for possível. Declarou mais que o curral que tinha na dita fazenda é da Virgem do Rosário, procedido de sete novilhos que lhe deu de esmola para limpeza de seu altar e para o sustento dos religiosos assistentes na fazenda e para na festa da Sra. se dar à gente duas ou três reses.24 24 Apud HOLANDA, 1941, p.114. Atualizamos a ortografia desta citação.

É sabido que, num sentido doutrinário ou teológico, a devoção do rosário, como obrigação tridentina de exercício espiritual alinhado à narrativa do Novo Testamento, era uma pedagogia do evangelho e devia modelar o neófito para a conduta persistente na fé católica. O trabalho missionário, desde a tradição medieval de conversão dos hereges (e libertação da sua alma), sob os auspícios de Nossa Senhora do Rosário, visava então dois efeitos, sobretudo nos entendimentos considerados mais rudes: a sistemática doutrinação e a imitação cristãs. O rosário seria um engenho (a indicação de força mecânica aqui é significativa) de memória, entendimento e vontade da salvação espiritual, como explicou Vieira, numa chave tomista.25 25 "E tudo isto obra o Rosário por meio das três potências de nossa Alma nos mistérios da vida, morte e paixão de Cristo, de que ele se compõe, e não só em todos, senão em cada um. Com a potência da memória recebe e retém o mistério por meio da apreensão: com a potência do entendimento altera-o e assemelha-o a si (ou a si a ele) por meio da meditação: e com a potência da vontade converteu e uniu em si mesma por meio da imitação". [Sermão de Nossa Senhora do Rosário, 1654]. VIEIRA, Antônio. Sermões: Padre Antônio Vieira, t. 2. São Paulo: Hedra, 2001, p.42. Um historiador católico mineiro lembrou que o rosário era um eficaz

meio de oração que, intercalando as Ave-Marias com as pequenas meditações dogmáticas da vida, paixão e morte de Jesus Cristo, continha toda a doutrina cristã e encerrava uma prece muito cara ao coração da Santíssima Virgem, ao alcance das pessoas mais humildes, ensinando, ao mesmo tempo que rezava o Rosário, o Evangelho resumido, que conquistava as almas e as colocava em atitude de humildade diante da Mãe do Salvador do Mundo. (Lima Júnior, 2008LIMA JÚNIOR, Augusto de. História de Nossa Senhora em Minas Gerais: origens das principais invocações. Belo Horizonte: Autêntica Editora, Editora PUC Minas, 2008., p.88-89).

De acordo com o padre Antônio Vieira, as práticas do Rosário conjugavam-se ao ministério pastoral (de missionários, párocos e capelães) na América Portuguesa, pois promovia nos conversos ou pessoas batizadas a vontade constante dos sacramentos, que incluía, de acordo com os preceitos canônicos, a eucaristia, a confissão, e o matrimônio.26 26 Falando aos escravos africanos da irmandade do Rosário, na capela de um engenho baiano, Vieira salientou: "Começando pois pelas obrigações que nascem do vosso novo e tão alto nascimento [com o batismo], a primeira e maior de todas é que deveis dar infinitas graças a Deus por vos ter dado conhecimento de si, e por vos ter tirado de terras, onde vossos pais e vós vivíeis como gentios; e vos ter trazido a esta [América], onde instruídos na Fé, vivais como Cristãos, e vos salveis". [Sermão XIV]. VIEIRA, Antônio Vieira. Sermões: Padre Antônio Vieira, t. 1. São Paulo: Hedra, 2000, p.646. Essa perspectiva do jesuíta, de acordo com Luiz Felipe de Alencastro, fornecia o fundamento ideológico ao comércio escravista na medida em que fazia uma analogia entre a violenta diáspora e a redenção americana dos africanos. Alencastro comentou com ironia: "Por obra e graça de Nossa Senhora do Rosário solucionara-se a dúvida principal - alentadamente discutida por teólogos e juristas - a respeito das condições em que o africano havia sido julgado, capturado, escravizado e vendido nas feitorias africanas" (Alencastro, 2000ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul. São Paulo: Companhia das Letras, 2000., p.184).

Supôs-se que, nas Minas Gerais, os franciscanos, operando a teologia mariana (imaculada conceição), contribuíram para a disseminação da devoção do Rosário,27 27 LIMA JÚNIOR, 2008, p.92, notório defensor do papel civilizador da ordem franciscana, concluiu que os frades franciscanos contribuíram decisivamente para espalhar essa devoção entre os escravos africanos, notadamente na capitania de Minas Gerais. O autor não comprovou a afirmação. Mas, de fato, encontramos frequentemente a devoção franciscana de São Benedito reunida ao título do Rosário em irmandades das Minas, no século XVIII. o que se desdobrou na instituição da corporação religiosa. Seus membros mais atuantes, protagonistas nas mesas de regência dessa família extensa de afeto religioso, reviam e sedimentavam laços com os outros irmãos ou fiéis, sobretudo, nas festividades: missa cantada (ou solene), coroação e cortejo do rei e da rainha, acompanhamento musical, coreografia, dramatização e procissão.28 28 Apesar das nítidas generalizações, conferir BORGES, 2002. Tornar a associação popular significava ornar, ritualizar e festejar, isto é, comunicar a representação devocional aos outros moradores ou vizinhos, o que já dinamizava o espaço urbano.

Sabe-se que na freguesia de Nossa Senhora do Pilar, em Vila Rica, a irmandade do Rosário promoveu a sua devoção pública, a princípio, na capela lateral da igreja matriz. Reagindo certamente às ingerências das irmandades dos brancos e à vigilância do pároco, a confraria do Rosário dos Pretos - de qualquer "nassão", conforme o compromisso aprovado pelo bispo do Rio de Janeiro - fundou capela própria no morro das proximidades, na paragem do Caquende.29 29 Para a separação dos confrades pretos do Rosário, distinguindo-se dos brancos e dos senhores na configuração da gênese paroquial, foram utilizados argumentos tradicionais, ainda semelhantes aos dos pretos do Rosário de Lisboa. Ver: SCARANO, 1975, p.43-47, p.81; BORGES, 2005, p.106-108; AGUIAR, 1997, p.73-74. Esse templo do Rosário, que abrigou os ofícios religiosos da irmandade a partir de 1715-1716, filiou-se à matriz e tornou-se, durante dois anos, sede paroquial enquanto a capela-mor de Nossa Senhora do Pilar esteve em obras, no início da década de 1730. Na segunda metade do século XVIII, os irmãos do Rosário pretenderam a confirmação régia da doação camarária do terreno do patrimônio da capela e lembraram que, no planejamento do retorno festivo do santíssimo sacramento ao templo matriz, "por não haver rua, nem comodidade para hir a Procissão", eles "romperão morros íngremes incapazes de habitação" e fizeram uma "rua" que se tornou a "a melhor e de mais comerço" da vila. O governo da vila doara o terreno, que "se achava inculto e inhabitado", em retribuição ao que os irmãos, "homens pobres, e a mayor p. te. delles escravos", haviam "obrado em utelidade publica".30 30 Apud LOPES, 1955, p.194-195. Ver: MENEZES, 1975, p.58. Assim, embora tivesse buscado uma fábrica de igreja independente, a irmandade manteve os estreitos laços com a sua paróquia, e as ligações da civilidade urbana - passagem dos moradores e cortejo dos fieis nas festividades ou procissões - reforçaram a vinculação. O trajeto popular, usual, delineara, sobretudo, o quadro de sujeição aos governos pastoral e político-administrativo.

Na extremidade oposta do traçado urbano de Vila Rica, na paróquia de Nossa Senhora da Conceição, a confraria do Rosário dos Pretos do Alto da Cruz, onde houve predominância dos negros libertos, manteve a sua capela no caminho entre os arraiais minerários. Tudo indica ter sido a maior confraria do Rosário da capitania das Minas, considerando-se o número de irmãos e a receita auferida.31 31 Calculou-se que havia 4.139 confrades nesse Rosário entre 1770 e 1810. AGUIAR, 1993, p.321-326, Tabelas 4, 6, 11.b, 12; SOUZA, 2011, p.4, tabela 1; KLEIN; LUNA, 2010, p.260, tabela 8.5. Sua história esteve marcada pela pretensão de representação pública, relacionando-se conflituosamente com outros agrupamentos étnicos e civis e o pároco. Essa irmandade também saíra da matriz, onde possuiu altar lateral. Anos depois, consta ter havido um conflito interno, que dera origem à associação do Rosário dos Brancos, abrigada na capela vizinha do arraial do Padre Faria. Na segunda metade do século XVIII, veio à tona a rivalidade entre os pretos do Rosário do Alto da Cruz e os crioulos, pardos ou mulatos das Mercês dos Perdões, vinculada, numa amplitude política, à representação pública negra.32 32 SALLES, 2007, p.72; AGUIAR, 1993, p.296-300; BOSCHI, 1986, p.151. Esse Rosário não se instituiu em capela subordinada à matriz da Conceição da povoação de Antônio Dias (e nem se admitiu um coadjutor do vigário) na vila, opondo-se fortemente às pretensões do pároco (administração dos ritos sacramentais; regência das cerimônias litúrgicas e das festas; sujeição do capelão) na sua capela supostamente "particular do arraial do Padre Faria". Os confrades dirigentes salientaram, no novo compromisso de 1733, que essa capela, no Alto da Cruz, "feita a expensas da devoção e fiéis", e não sendo uma filial da matriz, "em razão de não ter concorrido a mãe com coisa alguma, se não pagará nada ao dito pároco, ou fábrica, e será só sujeita no temporal aos Doutores corregedores e no Espiritual ao [...] Bispo, e ao seu Padre Capelão". Observando prerrogativas, ressalvaram que o capelão "fará todas as ações de festividades, e do mais como em casa sua própria pela concessão da dita Irmandade, pois tem mostrado a experiência as continuadas desordens, que os vigários fazem e promovem tudo a benefício do seu interesse".33 33 Casa dos Contos, Arquivo Eclesiástico da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição/Antônio Dias [AEPNSC/AD], códice 1733-1788, Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, denominada do Alto da Cruz [1733]. Atualizamos a ortografia. AGUIAR, 1997, p.85. É incerta a data de criação da irmandade do Rosário do Alto da Cruz e do compromisso original. Supõe-se que a irmandade foi instituída na década de 1710, pois o seu "compromisso velho", apodrecido, já estava destruído desde o fim dessa década, conforme o testemunho dos irmãos em 1733. MENEZES, 1975, p.106-107, p.152; Casa dos Contos, AEPNSC/AD, códice 1733-1788, despacho do bispo do Rio de Janeiro e instrumento de justificação [1733].

As manifestações populares, embora fossem fundamentais à visibilidade social na vila, não alcançavam forçosamente a instituição civil pública da associação, e nem o seu agenciamento estatal, que requeriam a integração da confraria ao quadro administrativo eclesiástico e civil. Mas, quando relacionada à comunidade paroquial ou, ainda, à república - a configuração político-administrativa da vila - por meio de regras escritas do compromisso associativo dos moradores, a confraria dimensionava-se no espaço e conferia direitos e prerrogativas de membro do corpo místico e político: assumia a codificação pública no Antigo Regime católico.34 34 Frei Vicente do Salvador, no início do século XVII, indicou a contraposição jurídica (e teológica) entre público e particular, não sendo aquele simplesmente a consequência da soma das partes. A dimensão pública constituía um todo, que se expressava na praça ou no mercado, regida pelo bem comum dos moradores e pela lógica da equidade. NOVAIS, 2005, p.205-207. Sobre certas concepções de república nas Minas da crise do colonialismo. FURTADO, 2002, p.162-167. De qualquer modo, as expressões pessoais de cidadania eram balizadas pela convivência específica do locus urbano, sujeito à governança, conforme as proposições da junta que reuniu autoridades régias e os "principais" do povo, em 1711, para a fundação da primeira vila das Minas, Vila do Carmo: "para se erigir [vila] era conveniente e preciso concorrerem os ditos moradores para a fábrica da igreja e casa da câmara e cadeia, como era útil e pertencia a todas as repúblicas, deviam eles ditos moradores, cada um conforme suas posses, concorrerem para o dito feito" (apud Vasconcelos, 2014VASCONCELOS, Diogo de. História da Civilização Mineira: Bispado de Mariana. Belo Horizonte: Autêntica Editora , 2014., p.159).

As confrarias do Rosário, sobretudo, convinham à representação pública, pois assim como as matrizes - a tradução ritual e arquitetônica do corpo sacramental de Deus e da paróquia (esta remetendo à significação etimológica de vizinhança) -, elas buscavam legitimar-se na integração de qualquer fiel morador.35 35 Nas Minas Gerais, as irmandades do Santíssimo Sacramento foram responsáveis pelo culto eucarístico (encarnação eclesial ou mística do Cristo na missa), pelas fábricas das matrizes e pela promoção da festividade socialmente integradora do corpo de Deus (Corpus Christi ). Essas confrarias tradicionais de poder, "lideravam o movimento das irmandades, unificando-as no seio das matrizes, estabelecendo uma hierarquia social na prática da vida religiosa dos grupos" (SALLES, 2007, p.61, p.155). Esses significados, simbólico e social, fundamentavam a eleição, em muitos casos, dos templos de Rosário para, temporariamente, abrigar a capela de outra devoção (e irmandade) ou mesmo funcionar como matriz.

Da matriz à capela de fronteira no termo de Vila Rica: qualidade e segregação

Quando se trata da significação sociopolítica das confrarias negras do Rosário, deve-se investigar a sua configuração espacial e o enraizamento institucional, tendente a buscar os lugares do trânsito urbano e dos tratos mercantis. Assim, a localização territorial afetava a organização da irmandade, trazendo problemas relacionados ao proselitismo dos irmãos, ao potencial de acúmulo de recursos em esmolas e doações e à capacidade de agregação, que deveria suplantar os riscos de desagregação ruinosa num contexto de dispersão urbana e expansão das fronteiras econômicas.

Em Vila Rica, sede do governo da capitania das Minas Gerais (a partir de 1720), as duas irmandades do Rosário - do Caquende e do Alto da Cruz - balizaram o espaço urbano, situando-se as capelas em lugares mais periféricos que, adjacentes aos locais de extração aurífera, foram passagens sabidamente frequentadas por moradores, viajantes e agentes mercantis. Eram duas confrarias que, embora identificadas pela qualidade estamental dos pretos, mantiveram sua separação e autonomia, integrando duas demarcações paroquiais que distinguiram os arraiais das minas do ouro: Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto e Nossa Senhora da Conceição de Antônio Dias.36 36 Agostinho de Santa Maria, no início da década de 1710, relata que os irmãos do Rosário, com capela na matriz de Nossa Senhora do Pilar, desentenderam-se com o pároco e haviam "comprado sítio [para edificação de uma capela do Rosário] à entrada da Vila em um lugar alegre". SANTA MARIA, Agostinho de. Santuário Mariano e história das imagens milagrosas de Nossa Senhora e das milagrosamente aparecidas, que se veneram em todo o Bispado do Rio de Janeiro, e Minas e em todas as ilhas do Oceano, t. 10, t. 11. Lisboa: Oficina de Antônio Pedroso Galram, 1723, p.240-241, p.244-245. Porém, estimou-se que, em Vila Rica, o número de cativos associados às irmandades do Rosário não atingia 20% da escravaria desse núcleo urbano. Na paróquia de Antônio Dias, entre 1719 e 1818, nem 10% dos escravos da freguesia, considerando-se os dados de óbitos coligidos por Iraci Del Nero da Costa, havia sido membro de confraria (Aguiar, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993., p.49-52; Costa, 1979COSTA, Iraci Del Nero da. Vila Rica: população (1719-1826). Dissertação (Mestrado em Economia) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1979., p.99). Ainda assim, integrando-se à tessitura urbana dos povoados, houve confraria do Rosário nas paróquias do território da vila: Nossa Senhora da Conceição das Congonhas do Campo, Nossa Senhora da Boa Viagem da Itabira (Itabirito), Nossa Senhora de Nazaré da Cachoeira, Santo Antônio do Ouro Branco, Santo Antônio da Itatiaia, Santo Antônio da Casa Branca (Glaura), São Bartolomeu.37 37 Encontramos livros de irmandades ou estatutos compromissais no Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana (AEAM). BORGES, 2005, p.225-228. Sobre as a localização das freguesias, conferir ROCHA, 1995, p.105.

Desde a mobilidade mais intensa dos agentes coloniais a partir de meados do século XVIII (Fonseca, 2012FONSECA, Cláudia Damasceno. Urbs e civitas: a formação dos espaços e territórios urbanos nas Minas setecentistas. Anais do Museu Paulista, vol. 20, n. 1, p.77-108, 2012., p.84, p.89), os limites paroquiais e as demarcações territoriais pretendidas por vigários ou por capelães dependeriam, em suma, da subordinação dos fieis e dos confrades livres, libertos ou escravos, que passaram a morar ou percorrer os lugares fronteiriços das paróquias. Esses souberam influir nos planos das autoridades eclesiásticas, que disputavam entre si os benefícios e emolumentos advindos da pastoral religiosa.

A difusão das confrarias dos fieis de cor, com suas capelas integradas à administração paroquial, estimulou as rivalidades de jurisdição ou de poder sobre os devotos. Envolvendo o pároco e o capelão, essas disputas relacionadas à atração corporativa, numa luta pela legitimidade de participação no espaço público (Aguiar, 1997AGUIAR, Marcos Magalhães de. Tensões e conflitos entre párocos e irmandades na capitania de Minas Gerais. Textos de História: Revista de Pós-graduação em História da Unb, vol. 5, n. 2, p.43-100, 1997., p.83-99), parecem favorecer os planos de admissão de qualquer devoto nas irmandades do Rosário, independente da qualidade (preto, pardo ou branco), da procedência (etnia africana ou origem crioula, natural do lugar ou forasteiro), do gênero ou da condição (escravo, forro ou livre), tornando-se uma estratégia costumeira nos compromissos das associações na capitania das Minas.

Na irmandade do Rosário do Pilar de Vila Rica, porém, visou-se primeiramente a admissão da "pessoa preta", que fosse de qualquer "sexo", condição ou "nasção". Mas, no Rosário do Alto da Cruz, sob a influência do seu capelão, atento à circulação da rota urbana, sintetizou-se a descrição do devoto, sem lembrar as divisões da estratificação social: "Entrará nesta irmandade toda a qualidade de pessoas", sendo fieis ao catolicismo romano, ressalvando-se, porém, o governo dos "irmãos pretos" oficiais da mesa (apud Aguiar, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993., p.40; Borges, 2005BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais, séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2005., p.104).

No título dessas confrarias, continuou a designação específica "dos pretos"; mas, nas cláusulas de discriminação dos associados, ampliou-se a perspectiva do prosélito e o espaço social da expressão devocional. É certo que determinadas funções da mesa dirigente das irmandades do Rosário continuaram reservadas aos pretos, como as de juiz ou juíza, de rei ou rainha e de procurador, mas sem apontar quaisquer diferenças entre os confrades negros (Lopes, 1955LOPES, Francisco Antonio. Os palácios de Vila Rica. Ouro Preto no ciclo do ouro. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1955., p.195; Borges, 2005BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais, séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2005., p.80-84).

Essa homogeneidade parecia mais assegurada no campo, ou nas roças, pois os párocos, buscando a união dos seus dispersos fregueses nas matrizes campestres, não pareciam dispostos a acatar as clivagens étnicas ou da escravidão no âmbito das povoações negras. Com efeito, no arraial fronteiriço de Bacalhau, situado na freguesia de Guarapiranga (agrícola e minerária), a direção da irmandade do Rosário, entre as décadas de 1760 e 1830, era compartilhada por mesários crioulos (48,16%) e mesários provenientes da África central (42,09%) - Benguela, Angola e Congo, especialmente.38 38 KIDDY, 2005, p.116-118, p.254, tabela 3. Na Bahia e em Pernambuco, verificou-se que os crioulos e os africanos angolas costumaram estabelecer alianças para a direção das irmandades do Rosário, opondo-se a africanos ocidentais e orientais. REGINALDO, 2005, p.101-104, p.156-162. Por outro lado, houve a segregação/oposição entre os africanos e os crioulos, que tenderam a exercer sua autoridade, desde meados do século XVIII, nas confrarias de Nossa Senhora das Mercês, sobretudo nos lugares de maior densidade urbana e diversificação ocupacional.39 39 COSTA, 1981, p.176-180. A instituição de confraria das Mercês nas paróquias parece resultar da concentração de crioulos, forros e cativos, ajustada à diversificação ocupacional e às especificidades das trajetórias no cativeiro. No distrito de São Caetano (censo de 1804), onde foi criada uma associação das Mercês, 59% dos escravos de origem conhecida nasceram no Brasil (a mesma proporção observada em Vila Rica), com acentuado predomínio dos crioulos. No lugar do Inficionado, que também teve irmandade mercedária, a cifra invertia: 59 % dos escravos eram africanos, mas tornou-se relativamente elevada a concentração de cativos. KLEIN; LUNA, 2010, p.53. Não encontramos referência à instituição de irmandade das Mercês nas freguesias fronteiriças do termo de Vila Rica, exceto em São Bartolomeu e em Itabira do Campo. BOSCHI, 1986, p.194. Essa diferenciação entre as experiências devocionais reforçou a grade de concepções tradicionais, inscrita na gênese do enraizamento territorial das confrarias do Rosário, que conferiu para a qualidade de preto a procedência africana e a condição servil.

Para os confrades de cor interessados na segregação e para os seus capelães, tornou-se imperativo compor qualificativos de discriminação socialmente expressiva na identificação de outros grupos. Assim, forjaram-se designações de "crioulos pretos, e mestiços forros [conforme a escrita na Corte portuguesa]" que revelavam deslizamentos ou contrastes na representação legítima dos pretos, ou dos pardos/mulatos, e estratégias de revisão política da estratificação social.40 40 Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos, Minas Gerais, Requerimento dos crioulos pretos e mestiços forros, moradores em Minas, pedindo ao Rei a concessão de privilégios vários [...], 07/01/1756 [1755], documento 5, caixa 69. PRECIOSO, 2014, p.40. Nessa mesma representação, porém, os peticionários das Minas assinalaram a identificação comum de liberto: "crioulos, pretos e mestissos forros". Sugere-se nesse empenho renovado de reclassificação, notadamente nas especificações compromissais das irmandades negras do Rosário e das Mercês - esta reunindo, por exemplo, "crioulos da cor preta nacionais do Reino e conquista de Portugal" -, que ser africano, sobretudo, e ser escravo naturalmente conviria à qualidade de preto.41 41 A descrição consta dos estatutos da Arquiconfraria das Mercês de Sabará. PRECIOSO, 2014, p.100-101.

As mudanças socioeconômicas, ainda, na crise minerária, contribuíram para a ausência de restrição na associação do Rosário, pelo menos nos compromissos de perspectiva regalista, evocando assim a cláusula tradicional dominicana. A irmandade do arraial do Morro Vermelho, um lugar de exploração minerária de jornaleiros ou de faiscadores da freguesia de Caeté, em 1790, esclareceu: "Toda a pessoa de qual quer quallidade, condição, ou estado que quizer ser Irmão desta Irmandade, pedirá a Mesa, para q. a haja de admittir".42 42 Compromisso da Irmandade da Virgem Senhora do Rosário dos pretos do Arraial do Morro Vermelho da freguesia da Senhora do Bom Sucesso do Caeté Comarca de Sabará [1790], Coleção Brasiliana/USP. Num outro povoado com faisqueiras de negros e mestiços, na paróquia do Rio das Pedras, que ficava entre a Vila de Sabará e Vila Rica, a irmandade dos "Pretos de Nossa Senhora do Rosário", refazendo, em 1755, o compromisso para a sua nova capela, dispunha:

Todo qualquer preto, ou preta, que se quiser admitir, e ser Confrade desta Sancta Irmandade, irá ter com o Escrivão da dita, o qual informandose primeiro dos seus costumes, e achando[...] ser izento de vícios, e principalmente do da bebida, o admitti[...] fazendolhe o termo de entrada no livro, que para isso ha[...] Assignará junto com o mesmo Escrivão, e Thesourei[ro] [...]; e dará logo o dito Irmão de entrada tres [...] our[o], sem os quaes não será admittido, e meya oitava [...] nos de anual [...].43 43 AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Freguesia do Rio das Pedras (Acuruí), Compromissos, rendimentos e despesas, 1756, Prateleira A, Livro 21, f. 5.

Os irmãos da mesa regedora admitiriam o devoto, depois de averiguação sobre a qualidade do sujeito (índice da tessitura entre procedência, cor, trajetória e condição), a conduta pessoal e a sua capacidade de arcar com as taxas anuais e as esmolas de benfeitores.44 44 Sobre as categorias de classificação social - nome, qualidade, condição - utilizadas em textos coevos da América Portuguesa, conferir PAIVA, 2015, p.125-136.

Havia uma imposição paroquial sobre a devoção coletiva dessas irmandades dos negros, porque a freguesia desempenhava um papel fundamental no enquadramento civil e religioso do território das Minas Gerais, conforme a lógica da administração estatal, principalmente a partir de meados do século XVIII, com a criação do governo episcopal em Mariana. Os bispos, com apoio na Mesa da Consciência e Ordens, tendiam a reagir às difusas práticas dos fieis pouco constantes - os negros e mestiços, os forros e escravos - que, muitas vezes, levavam ao abandono da matriz original, retirando do vigário o capital econômico e o capital simbólico que constituíam os seus poderes político-religiosos. Os moradores que, inicialmente, instituíam a sua irmandade sob o abrigo da matriz, estabelecendo as atividades de devoção em altar próprio e lateral do templo, costumavam diminuir gradualmente as suas contribuições com a fábrica da matriz quando construíam uma capela própria (ou relativamente autônoma). O prejuízo da matriz crescia, quando, à medida que estendiam as fronteiras de colonização, os moradores rompiam os laços sociais e econômicos com o arraial sede, autonomizando-se da paróquia quando passavam a manter os ofícios divinos numa outra capela e a invocar novos padroeiros. Muitas vezes, as igrejas paroquiais, falidas, arruinaram-se, enquanto determinadas capelas, apesar de permaneceram filiais, funcionavam com relativa independência político-religiosa, sendo mantidas por associações corporativas dos moradores, com rendimentos crescentes.

Daí a cautela do bispo de Mariana, quando vislumbrou o prejuízo da fábrica da matriz se parte significativa dos seus rendimentos fossem desviados para a capela pública da irmandade do Rosário do Rio das Pedras. A ofensiva partiu da mesa regedora dessa confraria: alegando a sua "considerável despesa na obra principiada" do templo, os oficiais pediram a posse de 18 sepulturas livres da tributação paroquial para privilegiar benfeitores - ou esmoleres - e irmãos devotos da confraria. A mesa também pretendeu ter o direito a enterrar qualquer fiel na sua capela, desde que o interessado previsse em testamento "alguma esmola" para a irmandade. O pároco, evidentemente, opôs-se, alegando que faltava renda à matriz para o decoro mínimo do seu templo (pia batismal de pedra, ornatos das grades do local, por exemplo). Ainda assim, o governo do bispado resolveu negociar: concedeu 12 sepulturas livres da imposição paroquial, mas desde que a confraria dos negros pagasse anualmente seis oitavas de ouro.45 45 AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Freguesia do Rio das Pedras, Compromissos, rendimentos e despesas, 1756, Prateleira A, Livro 21, f. 14-15. Essa paróquia, apesar de integrar o termo da vila de Sabará, reuniu fregueses da jurisdição de Vila Rica.

Os interesses do pároco e dos visitadores diocesanos, porém, não se reduziam às taxas das sepulturas: preocupados com os benefícios eclesiásticos, eles buscavam garantir os direitos paroquiais (como se pretendeu em outras capelanias do Rosário) que incidiriam sobre os ofícios do capelão dos confrades nos ritos litúrgicos, festivos ou fúnebres. Para as autoridades episcopais, uma cerimônia pública, de qualquer modo, deveria ficar na órbita da matriz.46 46 AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Freguesia do Rio das Pedras, Compromissos, rendimentos e despesas, 1756, Prateleira A, Livro 21, f. 16. Ainda, cf. AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Congonhas do Campo, 1757-1850, Prateleira H, Livro 29, f. 26. Contudo, as capelas próprias significavam um passo fundamental na luta de representação pública dos negros libertos e escravos dos Rosários que, no fundo, atingia a natureza do ordenamento estamental inscrito nos compromissos e conferido pela unidade paroquial.47 47 O Rosário de Congonhas preferiu, em 1774, reduzir os festejos da padroeira para usar as "esmolas" obtidas nas obras da sua capela - AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Congonhas do Campo, 1757-1850, Prateleira H, Livro 29, f. 17, 22.

Tratou-se aqui da espacialização dinâmica da economia religiosa: o trânsito entre as devoções pessoais e coletivas, a constituição do corpo de confraria, a integração da irmandade à esfera pública com a sua capela filiada à matriz. No entanto, a expressão pública das capelas do Rosário poderia ser afetada, resultando até na insolvência, pelo esgarçamento do quadro paroquial, da fluidez devocional e do divisionismo orgânico da agregação. O divisionismo na irmandade do Rosário e de São Benedito da paróquia de Santo Antônio de Itatiaia estimulou as mudanças das devoções, com implicações na capacidade de manutenção da irmandade, do vigário e da própria fábrica da igreja matriz, que dependia do apoio do Rosário desde, pelo menos, a década de 1720.48 48 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 28-28v.

Os visitadores episcopais, durante o século XVIII, chamaram a atenção para as dificuldades financeiras da irmandade e para a negligência dos irmãos, pois os associados não conseguiam arcar devidamente com todas as obrigações festivas e rituais do seu compromisso. As graves dificuldades de receita, em parte relacionadas a problemas de gestão (com escrituração bastante deficiente), afetaram decisivamente o desempenho da confraria na segunda metade do século, pois não se conseguia cumprir as suas obrigações semanais de missas e os sufrágios das almas dos irmãos defuntos.49 49 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 87.

No entanto, significativamente, conforme a circunstância ou o mês do ano, os eclesiásticos notaram que haveria condições mais favoráveis ao funcionamento da confraria, quando os apelos coletivos de religiosidade popular confrontavam a administração clerical. Assim, diz um visitador em 1761, observando que não se fizesse festa aos santos padroeiros, enquanto não se cumprisse a obrigação dos sufrágios de missas pelos irmãos defuntos, apesar do que "tem mostrado a experiência que nesta Irmandad.e se não faz festa não contribuem os Irmaons com suas esmollas".50 50 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 78. Com efeito, a quantia em ouro arrecadada nas festas de Nossa Senhora e de São Benedito, em 1740, era cerca de cinco ou oito vezes superior às esmolas da mesa regedora obtidas nos períodos de desmobilização festiva, como abril ou setembro.51 51 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 28v. A ambiência festiva parecia suspender momentaneamente as forças centrífugas, consolidando os laços de associação (ou de comunidade cristã) e os ajustes diversos, comumente proveitosos, dos devotos. Especialmente, nesses acontecimentos ligados ao calendário litúrgico, sob a proteção dos patronos católicos, deram-se, ao mesmo tempo, os batuques dos afrodescendentes e os tratos do pequeno comércio, inclusive clandestino (Andrade, 2008ANDRADE, Francisco Eduardo de. Viver à Gandaia: Povo Negro nos Morros das Minas. In: PAIVA, Eduardo França; IVO, Isnara Pereira (orgs.). Escravidão, mestiçagem e histórias comparadas. São Paulo: Annablume, 2008. p.161-178.).

Em 1762, numa reunião, o pároco de Itatiaia e os "irmãos pretos" do Rosário revelaram ao visitador da diocese de Mariana que os motivos dos diminutos rendimentos da irmandade eram a "decadência, e pobreza das Faysqueiras", e "p. serem poucos os Irmãos desta Santa Irmandade". Em seguida, ajuntaram uma causa que, mais do que implicar na extinção da irmandade antiga, levaria à sua desagregação (danosa para a sua sede) e a nova associação em outro lugar com maior potencial econômico e populacional: "e tambem porque a mayor quantidade de Irmãos se achão no Destrito da Capella das Lavras Novas", "descontentes p. não terem la Sepulturas da Irmandade".52 52 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 87. Um desses recalcitrantes, Antônio de Miranda, "nas Lavras Novas", preto forro, eleito um dos juízes da irmandade no início da década de 1760, foi lembrado pela irmandade como um caso perdido: "este he traste e não quis vir nem quis dar nada". 53 53 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 83v.

A mesa regedora já havia pretendido aproveitar-se dessa dispersão territorial dos confrades. Em 1755, foi eleito um juiz de Nossa Senhora do Rosário, José Pinto, casado, certamente livre ou forro, que tomou posse no lugar da capela de Lavras Novas. Também foram eleitas três juízas (livres e/ou forras) que, por serem moradoras de três povoados da freguesia, podiam estender o raio de representação da confraria e agenciar o conjunto dos irmãos: Sebastiana de Matos tomou posse na Chapada; Catarina Ferreira Pires em Lavras Novas; Francisca Pinta no arraial-sede de Itatiaia.54 54 AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 68.

Nessa emulação das capelas e das associações dos fieis anunciaram-se outras devoções e distinguiu-se a representação pública dos moradores em corpo de confraria. O visitador, em 1749, percebendo essa lógica, sobretudo numa freguesia onde ajuntavam "muitos Escravos forros e captivos, vindos de outras partes", ameaçou em vão: "nenhuma [pessoa] de qualquer estado ou condição que seja possa erigir Irmandade, Confraria ou devoção nas Capelas filiais nem concorrer para ellas em prejuízo das Irmandades da Matriz e sem que primeiro assigne termo de concorrer com sua esmola para a Irmandade da Matriz e de aceytar e servir nellas as occupaçoens e cargos que por legítima elleiçam se lhe der".55 55 Itatiaia, Livro n. 36, Letra M, p. 37v. Ver: RODRIGUES, Flávio Carneiro (org.). Cadernos Históricos do Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana. Segunda coletânea das Visitas Pastorais do século XVIII no Bispado de Mariana. Mariana: Editora Dom Viçoso, 2004, p.159-160.

O dinamismo demográfico e do poder, constante na territorialidade da América Portuguesa, conspirou para o novo, numa fronteira do povoamento. Os moradores das Lavras Novas, aplicados à capela de Nossa Senhora dos Prazeres, usaram o instrumento de pressão econômica, escusando-se de pagar as anuidades e oferecer as esmolas ou as doações necessárias à administração prestigiosa da capela do Rosário, efeito do proselitismo dessa devoção e das festividades da comunidade.

Considerações finais

Escravos ou libertos, os africanos associaram-se à devoção do Rosário, configurando, no espaço público - político e religioso -, a qualidade de pretos. Mas essa qualidade se refazia no embate significativo com os brancos, os pardos e os crioulos (ou com os outros negros). Se, ao perscrutar a devoção pessoal ou particular dos escravos e libertos, não observamos a primazia de Nossa Senhora do Rosário, na comunidade negra, ou no corpo social, essa devoção enraizava-se no sentido multifacetado da identidade de pretos, inscrita na experiência da escravidão.

Por sua vez, o trânsito das representações públicas afrodescendentes contribuiu para a fluidez das devoções e para a instabilidade da fidelidade aos patronos celestiais e terrenos. A irmandade negra de Itatiaia, por exemplo, concebendo a divisão, ampliou a sua antiga designação, no final do século XVIII, para guardar a imagem, a festa e a memória de Efigênia, mulher preta da nobreza, convertida numa África cristianizada, de acordo com o devocionário carmelita (Oliveira, 2006OLIVEIRA, Anderson José Machado de. Devoção e identidades: significados do culto de Santo Elesbão e Santa Efigênia no Rio de Janeiro e nas Minas Gerais no Setecentos. Topoi, vol. 7, n. 12, p.60-115, jan./jun. 2006., p.62-63). Nomeou-se, então, irmandade do Rosário, São Benedito e Santa Efigênia. De modo geral, parece certo que a dinâmica do fervor devocional repercutiu as mudanças sociais e políticas concernentes à gente de cor no século XVIII (além de mutações mais amplas da religiosidade popular), efeito tanto das trajetórias dos sujeitos quanto da configuração comunitária das hierarquias de qualidade. E ocorreram distinções no interior da associação religiosa dos pretos que, articuladas a uma conflitualidade intergrupal ou do conjunto confrarial urbano, conduziram ao posicionamento de elite negra, com seu protagonismo na regência (ou governo) da irmandade dos moradores.

A espacialização paroquial expressou, nos atritos entre a matriz e as capelas filiais, e também entre essas, que atingiam as comunidades negras e mestiças, a mobilidade da fé nos mediadores santos, o que indicaria práticas de autonomia da experiência religiosa. O fenômeno de esgarçamento das instituições da ordem civil-religiosa lastreou-se na economia urbana difusa, urdida nas trajetórias dos moradores escravos e livres negros e mestiços com agências de faiscadores, vendeiros, artesãos, jornaleiros e roceiros.

  • 1
    "Bartolomé Clavero refere 'une mentalité du béneficie rendu obligatoire par la religion' e a antidora como a doação remuneratória. António Hespanha, por seu turno, sublinha o carácter obrigado da remuneração numa perspectiva da 'economia do dom'. Com referência à liberalidade régia no Portugal moderno, Hespanha acentuou as respectivas raízes clássicas, interpretando-as à luz de uma concepção 'naturalista-corporativa' da sociedade: 'Incluso en el libérrimo acto de dar o recibir un don [...] tienen que acomodarse a un orden de cosas inscrito de uma vez por todas en la naturaleza delas relacionessociales'" (MONTEIRO, 2007MONTEIRO, Nuno Gonçalo. Elites e poder: entre o antigo regime e o liberalismo. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2007., p.84-85).
  • 2
    SCARANO, 2004SCARANO, Julita. Fé e milagre: ex-votos pintados. São Paulo: Edusp, 2004., p.85-98. Particularmente, no território de Minas Gerais, essa prática religiosa de gratidão pessoal foi muito expressiva. CASTRO, 1994CASTRO, Márcia de Moura. Ex-votos mineiros. As tábuas votivas no ciclo do ouro. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1994.; MELLO E SOUZA, 1999MELLO E SOUZA, Laura de. Norma e conflito: aspectos da história de Minas no século XVIII. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999., p.207-209.
  • 3
    Museu Regional de São João del-Rei, ex-voto.
  • 4
    "M. q'. fes o Snr̃ de Matozinho a João escravo de Maria Leme, q. estando gravem.te doente, epegandose com dito Snr̃ Logo teve saude. 1722". Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Coleção de ex-votos. Ainda, conferir Catálogo dos ex-votos inscritos no Livro do Tombo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Promessa e milagre no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Minas Gerais. Brasília: MEC/SPHAN, 1981.
  • 5
    Houve um enraizamento carmelita na capitania de Minas Gerais através das presídias da ordem terceira que, integradas à administração dos terceiros do Carmo das vilas, estimulavam a fidelidade devocional em diversas localidades. Conferir: ANDRADE, Francisco Eduardo de; SANTIAGO, Felipe José Flausino. Presídias dos terceiros do Carmo de Vila Rica: poder e urbanização na América portuguesa, 1752-1822. Relatório científico. Ouro Preto: Universidade Federal de Ouro Preto, 2012. p.1-23 (impresso). Para mais informações: http://www.propp.ufop.br/pesquisa.
  • 6
    A conservação de um número significativo de ex-votos dedicados a Bom Jesus dos Matozinhos pode ser atribuída à necessidade de legitimar a fama milagreira do orago, no monte sacralizado de Congonhas. Nossa Senhora (com suas diversas invocações: Nazaré, Carmo, Conceição, Rosário, Milagres, Mercês, Dores, Luz, Glória, Oliveira, Soledade, Saúde, Livramento, Boa Morte, Alívio, Bom Despacho) predomina largamente se considerarmos os outros membros, diga-se, de uma corte celestial. Ver: CASTRO, 1994CASTRO, Márcia de Moura. Ex-votos mineiros. As tábuas votivas no ciclo do ouro. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1994., p.22.
  • 7
    O cirurgião Luís Gomes Ferreira, na primeira metade do século XVIII, observando o tratamento de fraturas com emplasto de claras de ovos, cuja ineficácia inutilizava o "escravo bom", concluiu: "nem me parece acerto usá-lo, por considerar o clima, a habitação dentro da água, os que são mineiros e pretos, que estes são os comuns que quebram braços e pernas, e também alguns brancos, considerando também a nutrição dos alimentos, ou sendo brancos pobres, que estes, pela maior parte, levam pior vida sendo forros do que levam os cativos" (FERREIRA, 2002FERREIRA, Luís Gomes. Erário mineral. Organização Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro; Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz, 2002., p.468).
  • 8
    BILAC, Olavo. Chronicas e Novellas, 1893-1894. Rio de Janeiro: Cunha e Irmão Ed., 1894, p.107.
  • 9
    Capela da Ordem Terceira de São Francisco de Assis, Ouro Preto, ex-voto.
  • 10
    Capela da Ordem Terceira de São Francisco de Assis, Ouro Preto, ex-voto.
  • 11
    Como expressão da religião popular, notou-se a relação direta e hierarquizada com a divindade (apesar da pastoral tridentina). "Direta, porque os paroquianos desobedientes, na ótica da prática imposta, esperam da divindade uma presença imediata em sua vida pessoal" (VOVELLE, 1987VOVELLE, Michel. Ideologias e mentalidades. São Paulo: Brasiliense, 1987., p.192). A definição de pessoa, com as suas dimensões anímica e corporal, devia seguir a pastoral da predominante ótica neotomista, conforme a síntese de MASSIMI, 2005MASSIMI, Marina. Palavras, almas e corpos no Brasil colonial. São Paulo: Edições Loyola, 2005., p.158-163.
  • 12
    Capela de Nossa Senhora do Ó, Sabará, ex-voto; reprodução de VASCONCELOS, 1964VASCONCELOS, Sylvio de. Capela de Nossa Senhora do Ó. Belo Horizonte: Escola de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais, 1964., p.20.
  • 13
    Assim, conforme as Constituições do Arcebispado da Bahia (estabelecidas em 1707), os párocos e os capelães podiam responsabilizar os pais e os senhores pelo fracasso pastoral, pois "se algumas das sobreditas pessoas [pais e senhores], esquecidas da obrigação cristã, a [doutrina] não forem ouvir e não mandarem as pessoas que estão a seu cargo para a ouvirem, sejam certos que se fazem réus de quantos pecados se cometerem por falta de doutrina, de que Deus Nosso Senhor lhes fará rigoroso juízo". VIDE, Sebastião Monteiro da. Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia (1707). Estudo crítico e edição de Bruno Feitler e Evergton Sales Souza. São Paulo: Edusp, 2010, p.127-128.
  • 14
    CASTRO, 1994CASTRO, Márcia de Moura. Ex-votos mineiros. As tábuas votivas no ciclo do ouro. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1994., p.48, apresenta um exemplo de relato votivo que se fez para uma mulher negra em 1798, que estando gravemente enferma, "apegouce com fe viva com o S.o Snr̃" Nota-se, ainda, na cena (óleo sobre madeira), o uso dos sinais de requinte nas roupas de cama e das cores como "o vermelho e o azul, que correspondem não somente ao gosto acentuadamente popular do português como do africano", segundo Luís Jardim. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Promessa e milagre no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Minas Gerais. Brasília: MEC/SPHAN, 1981, p.26.
  • 15
    É extensa a bibliografia sobre as instituições de confrarias da América Portuguesa, especialmente da capitania de Minas Gerais. Retomamos as investigações que privilegiaram as irmandades dos africanos e dos seus descendentes: SCARANO, 1975SCARANO, Julita. Devoção e escravidão. A irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos no Distrito Diamantino no século XVIII. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1975.; AGUIAR, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993.; BORGES, 2005BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais, séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2005.; PRECIOSO, 2014PRECIOSO, Daniel. Terceiros de cor: pardos e crioulos em ordens terceiras e arquiconfrarias (Minas Gerais, 1760-1808). Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2014..
  • 16
    JABOATÃO, Frei Antônio de Santa Maria. Novo Orbe Seráfico Brasílico ou Crônica dos frades menores da província do Brasil. Rio de Janeiro: Tipografia Brasiliense de Maximiano Gomes Ribeiro, 1859, p.432-433.
  • 17
    MOTT, 1997MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: MELLO E SOUZA, Laura de (org.). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras , 1997. p.155-220., p.161. Sobre as apropriações pública ou "privada" dos altares e das capelas no Rio de Janeiro da América portuguesa, conferir CHAHON, 2008CHAHON, Sérgio. Os convidados para a Ceia do Senhor: as missas e a vivência leiga do catolicismo na cidade do Rio de Janeiro e arredores (1750-1820). São Paulo: Edusp, 2008..
  • 18
    AGUIAR, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993., p.22-23. Ainda claramente subestimado, o número dos Rosários do bispado de Mariana (23), nas Minas, supera até o do Arcebispado da Bahia, considerando-se os requerimentos de confirmação dos estatutos compromissais enviados à Mesa da Consciência e Ordens (entre 1765 e 1801). Ver: SIMÃO, 2010SIMÃO, Maristela dos Santos. As irmandades de Nossa Senhora do Rosário e os africanos no Brasil do século XVIII. Dissertação (Mestrado em História da África) - Universidade de Lisboa. Lisboa, 2010., p.105-108. Há registros, compreendidos no período 1708-1820, de 63 irmandades do Rosário dos pretos na capitania de Minas Gerais. BORGES, 2005BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais, séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2005., p.225-228.
  • 19
    Como atesta os dados quantitativos sobre a condição e o gênero (e a "qualidade" de cor) dos irmãos das irmandades do Rosário e das Mercês em Vila Rica. AGUIAR, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993., p.319-324; SOUZA, 2011SOUZA, Daniela dos Santos. Devoção e Identidade: o culto de Nossa Senhora dos Remédios na Irmandade do Rosário de São João del-Rei - séculos XVIII e XIX. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História - ANPUH, p.1-20, 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org; Acesso em: 01 abr. 2013.
    http://www.snh2011.anpuh.org...
    , p.6, tabela 2.
  • 20
    SOUZA, 2011SOUZA, Daniela dos Santos. Devoção e Identidade: o culto de Nossa Senhora dos Remédios na Irmandade do Rosário de São João del-Rei - séculos XVIII e XIX. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História - ANPUH, p.1-20, 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org; Acesso em: 01 abr. 2013.
    http://www.snh2011.anpuh.org...
    , p.12. A autora, embora pretendesse discutir as implicações socioculturais das distinções devocionais, não parece articular as práticas religiosas às mudanças da sensibilidade católica ou da organização eclesiástica. Tudo parece depender das intenções (africanas, em muitos casos) dos escravos ou dos libertos.
  • 21
    O valor da devoção às Almas do Purgatório, desdobrando-se no empenho de salvação das almas dos irmãos mortos e vivos, pode ser conferido na manutenção, mesmo com as alegações de decadência do país, das missas de domingos e dias santos (dias de carga simbólica), oferecidas às Almas na capela do Rosário dos Pretos do Caquende. A capela de missas dependeu dos recursos dos devotos, como os do confrade capitão Joaquim José dos Santos, forro, "grande possuidor de escravos no primeiro terço do XIX", que quis "cobrir as despesas de um ano com seus bens, completando o que faltasse à remuneração do capelão" (CAMPOS, 2013CAMPOS, Adalgisa Arantes. As irmandades de São Miguel e as Almas do Purgatório: culto e iconografia no Setecentos mineiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2013., p.99).
  • 22
    DIAS, Frei Nicolau. Livro do Rosário de Nossa Senhora. Lisboa: casa de Francisco Correa, 1573, p.44-45. Atualizamos a ortografia desta citação.
  • 23
    DIAS, 1573, p.46.
  • 24
    Apud HOLANDA, 1941HOLANDA, Sérgio Buarque de. Capelas antigas de São Paulo. Revista do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, n. 5, p.105-120, 1941., p.114. Atualizamos a ortografia desta citação.
  • 25
    "E tudo isto obra o Rosário por meio das três potências de nossa Alma nos mistérios da vida, morte e paixão de Cristo, de que ele se compõe, e não só em todos, senão em cada um. Com a potência da memória recebe e retém o mistério por meio da apreensão: com a potência do entendimento altera-o e assemelha-o a si (ou a si a ele) por meio da meditação: e com a potência da vontade converteu e uniu em si mesma por meio da imitação". [Sermão de Nossa Senhora do Rosário, 1654]. VIEIRA, Antônio. Sermões: Padre Antônio Vieira, t. 2. São Paulo: Hedra, 2001, p.42.
  • 26
    Falando aos escravos africanos da irmandade do Rosário, na capela de um engenho baiano, Vieira salientou: "Começando pois pelas obrigações que nascem do vosso novo e tão alto nascimento [com o batismo], a primeira e maior de todas é que deveis dar infinitas graças a Deus por vos ter dado conhecimento de si, e por vos ter tirado de terras, onde vossos pais e vós vivíeis como gentios; e vos ter trazido a esta [América], onde instruídos na Fé, vivais como Cristãos, e vos salveis". [Sermão XIV]. VIEIRA, Antônio Vieira. Sermões: Padre Antônio Vieira, t. 1. São Paulo: Hedra, 2000, p.646.
  • 27
    LIMA JÚNIOR, 2008LIMA JÚNIOR, Augusto de. História de Nossa Senhora em Minas Gerais: origens das principais invocações. Belo Horizonte: Autêntica Editora, Editora PUC Minas, 2008., p.92, notório defensor do papel civilizador da ordem franciscana, concluiu que os frades franciscanos contribuíram decisivamente para espalhar essa devoção entre os escravos africanos, notadamente na capitania de Minas Gerais. O autor não comprovou a afirmação. Mas, de fato, encontramos frequentemente a devoção franciscana de São Benedito reunida ao título do Rosário em irmandades das Minas, no século XVIII.
  • 28
    Apesar das nítidas generalizações, conferir BORGES, 2002BORGES, Célia Maia. A festa do Rosário: a alegoria barroca e a reconstrução das diferenças, 2002. Disponível em: http://www.upo.es/depa/webdhuma/areas/arte/3cb/documentos/097f.pdf; Acesso em: 05 abr. 2013.
    http://www.upo.es/depa/webdhuma/areas/ar...
    .
  • 29
    Para a separação dos confrades pretos do Rosário, distinguindo-se dos brancos e dos senhores na configuração da gênese paroquial, foram utilizados argumentos tradicionais, ainda semelhantes aos dos pretos do Rosário de Lisboa. Ver: SCARANO, 1975SCARANO, Julita. Devoção e escravidão. A irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos no Distrito Diamantino no século XVIII. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1975., p.43-47, p.81; BORGES, 2005BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais, séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2005., p.106-108; AGUIAR, 1997AGUIAR, Marcos Magalhães de. Tensões e conflitos entre párocos e irmandades na capitania de Minas Gerais. Textos de História: Revista de Pós-graduação em História da Unb, vol. 5, n. 2, p.43-100, 1997., p.73-74.
  • 30
    Apud LOPES, 1955LOPES, Francisco Antonio. Os palácios de Vila Rica. Ouro Preto no ciclo do ouro. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1955., p.194-195. Ver: MENEZES, 1975MENEZES, Joaquim Furtado de. Igrejas e irmandades de Ouro Preto. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1975., p.58.
  • 31
    Calculou-se que havia 4.139 confrades nesse Rosário entre 1770 e 1810. AGUIAR, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993., p.321-326, Tabelas 4, 6, 11.b, 12; SOUZA, 2011SOUZA, Daniela dos Santos. Devoção e Identidade: o culto de Nossa Senhora dos Remédios na Irmandade do Rosário de São João del-Rei - séculos XVIII e XIX. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História - ANPUH, p.1-20, 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org; Acesso em: 01 abr. 2013.
    http://www.snh2011.anpuh.org...
    , p.4, tabela 1; KLEIN; LUNA, 2010KLEIN, Herbert S.; LUNA, Francisco Vidal. Escravismo no Brasil. São Paulo: Edusp, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010., p.260, tabela 8.5.
  • 32
    SALLES, 2007SALLES, Fritz Teixeira de. Associações religiosas no ciclo do ouro: introdução ao estudo do comportamento social das irmandades de Minas no século XVIII. São Paulo: Perspectiva, 2007., p.72; AGUIAR, 1993AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 1993., p.296-300; BOSCHI, 1986BOSCHI, Caio César. Os leigos e o poder: Irmandades leigas e política colonizadora em Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986., p.151.
  • 33
    Casa dos Contos, Arquivo Eclesiástico da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição/Antônio Dias [AEPNSC/AD], códice 1733-1788, Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, denominada do Alto da Cruz [1733]. Atualizamos a ortografia. AGUIAR, 1997AGUIAR, Marcos Magalhães de. Tensões e conflitos entre párocos e irmandades na capitania de Minas Gerais. Textos de História: Revista de Pós-graduação em História da Unb, vol. 5, n. 2, p.43-100, 1997., p.85. É incerta a data de criação da irmandade do Rosário do Alto da Cruz e do compromisso original. Supõe-se que a irmandade foi instituída na década de 1710, pois o seu "compromisso velho", apodrecido, já estava destruído desde o fim dessa década, conforme o testemunho dos irmãos em 1733. MENEZES, 1975MENEZES, Joaquim Furtado de. Igrejas e irmandades de Ouro Preto. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1975., p.106-107, p.152; Casa dos Contos, AEPNSC/AD, códice 1733-1788, despacho do bispo do Rio de Janeiro e instrumento de justificação [1733].
  • 34
    Frei Vicente do Salvador, no início do século XVII, indicou a contraposição jurídica (e teológica) entre público e particular, não sendo aquele simplesmente a consequência da soma das partes. A dimensão pública constituía um todo, que se expressava na praça ou no mercado, regida pelo bem comum dos moradores e pela lógica da equidade. NOVAIS, 2005NOVAIS, Fernando Antônio. Aproximações: ensaios de história e historiografia. São Paulo: Cosac Naify, 2005., p.205-207. Sobre certas concepções de república nas Minas da crise do colonialismo. FURTADO, 2002FURTADO, João Pinto. O manto de Penélope: história, mito e memória da Inconfidência Mineira de 1788-9. São Paulo: Companhia das Letras, 2002., p.162-167.
  • 35
    Nas Minas Gerais, as irmandades do Santíssimo Sacramento foram responsáveis pelo culto eucarístico (encarnação eclesial ou mística do Cristo na missa), pelas fábricas das matrizes e pela promoção da festividade socialmente integradora do corpo de Deus (Corpus Christi ). Essas confrarias tradicionais de poder, "lideravam o movimento das irmandades, unificando-as no seio das matrizes, estabelecendo uma hierarquia social na prática da vida religiosa dos grupos" (SALLES, 2007SALLES, Fritz Teixeira de. Associações religiosas no ciclo do ouro: introdução ao estudo do comportamento social das irmandades de Minas no século XVIII. São Paulo: Perspectiva, 2007., p.61, p.155).
  • 36
    Agostinho de Santa Maria, no início da década de 1710, relata que os irmãos do Rosário, com capela na matriz de Nossa Senhora do Pilar, desentenderam-se com o pároco e haviam "comprado sítio [para edificação de uma capela do Rosário] à entrada da Vila em um lugar alegre". SANTA MARIA, Agostinho de. Santuário Mariano e história das imagens milagrosas de Nossa Senhora e das milagrosamente aparecidas, que se veneram em todo o Bispado do Rio de Janeiro, e Minas e em todas as ilhas do Oceano, t. 10, t. 11. Lisboa: Oficina de Antônio Pedroso Galram, 1723, p.240-241, p.244-245.
  • 37
    Encontramos livros de irmandades ou estatutos compromissais no Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana (AEAM). BORGES, 2005BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais, séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2005., p.225-228. Sobre as a localização das freguesias, conferir ROCHA, 1995ROCHA, José Joaquim da. Geografia histórica da Capitania de Minas Gerais. Descrição geográfica, topográfica, histórica e política da Capitania de Minas Gerais. Memória histórica da Capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro / Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1995., p.105.
  • 38
    KIDDY, 2005KIDDY, Elizabeth W. Blacks of the rosary: memory and history in Minas Gerais, Brazil. Pennsylvania: Pennsylvania State University Press, 2005., p.116-118, p.254, tabela 3. Na Bahia e em Pernambuco, verificou-se que os crioulos e os africanos angolas costumaram estabelecer alianças para a direção das irmandades do Rosário, opondo-se a africanos ocidentais e orientais. REGINALDO, 2005REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas: irmandades negras, experiências escravas e identidades africanas na Bahia setecentista. Tese (Doutorado em História) - Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2005., p.101-104, p.156-162.
  • 39
    COSTA, 1981COSTA, Iraci Del Nero da. Populações mineiras: sobre a estrutura populacional de alguns núcleos mineiros no alvorecer do século XIX. São Paulo: IPE/USP, 1981., p.176-180. A instituição de confraria das Mercês nas paróquias parece resultar da concentração de crioulos, forros e cativos, ajustada à diversificação ocupacional e às especificidades das trajetórias no cativeiro. No distrito de São Caetano (censo de 1804), onde foi criada uma associação das Mercês, 59% dos escravos de origem conhecida nasceram no Brasil (a mesma proporção observada em Vila Rica), com acentuado predomínio dos crioulos. No lugar do Inficionado, que também teve irmandade mercedária, a cifra invertia: 59 % dos escravos eram africanos, mas tornou-se relativamente elevada a concentração de cativos. KLEIN; LUNA, 2010KLEIN, Herbert S.; LUNA, Francisco Vidal. Escravismo no Brasil. São Paulo: Edusp, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010., p.53. Não encontramos referência à instituição de irmandade das Mercês nas freguesias fronteiriças do termo de Vila Rica, exceto em São Bartolomeu e em Itabira do Campo. BOSCHI, 1986BOSCHI, Caio César. Os leigos e o poder: Irmandades leigas e política colonizadora em Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986., p.194.
  • 40
    Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos, Minas Gerais, Requerimento dos crioulos pretos e mestiços forros, moradores em Minas, pedindo ao Rei a concessão de privilégios vários [...], 07/01/1756 [1755], documento 5, caixa 69. PRECIOSO, 2014PRECIOSO, Daniel. Terceiros de cor: pardos e crioulos em ordens terceiras e arquiconfrarias (Minas Gerais, 1760-1808). Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2014., p.40. Nessa mesma representação, porém, os peticionários das Minas assinalaram a identificação comum de liberto: "crioulos, pretos e mestissos forros".
  • 41
    A descrição consta dos estatutos da Arquiconfraria das Mercês de Sabará. PRECIOSO, 2014PRECIOSO, Daniel. Terceiros de cor: pardos e crioulos em ordens terceiras e arquiconfrarias (Minas Gerais, 1760-1808). Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2014., p.100-101.
  • 42
    Compromisso da Irmandade da Virgem Senhora do Rosário dos pretos do Arraial do Morro Vermelho da freguesia da Senhora do Bom Sucesso do Caeté Comarca de Sabará [1790], Coleção Brasiliana/USP.
  • 43
    AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Freguesia do Rio das Pedras (Acuruí), Compromissos, rendimentos e despesas, 1756, Prateleira A, Livro 21, f. 5.
  • 44
    Sobre as categorias de classificação social - nome, qualidade, condição - utilizadas em textos coevos da América Portuguesa, conferir PAIVA, 2015PAIVA, Eduardo França. Dar nome ao novo: uma história lexical da Ibero-América entre os séculos XVI e XVIII (as dinâmicas de mestiçagens e o mundo do trabalho). Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015., p.125-136.
  • 45
    AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Freguesia do Rio das Pedras, Compromissos, rendimentos e despesas, 1756, Prateleira A, Livro 21, f. 14-15. Essa paróquia, apesar de integrar o termo da vila de Sabará, reuniu fregueses da jurisdição de Vila Rica.
  • 46
    AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Freguesia do Rio das Pedras, Compromissos, rendimentos e despesas, 1756, Prateleira A, Livro 21, f. 16. Ainda, cf. AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Congonhas do Campo, 1757-1850, Prateleira H, Livro 29, f. 26.
  • 47
    O Rosário de Congonhas preferiu, em 1774, reduzir os festejos da padroeira para usar as "esmolas" obtidas nas obras da sua capela - AEAM, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Congonhas do Campo, 1757-1850, Prateleira H, Livro 29, f. 17, 22.
  • 48
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 28-28v.
  • 49
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 87.
  • 50
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 78.
  • 51
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 28v.
  • 52
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 87.
  • 53
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 83v.
  • 54
    AEAM, Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, Freguesia de Itatiaia, 1730-1791, Prateleira M, Livro n. 23, f. 68.
  • 55
    Itatiaia, Livro n. 36, Letra M, p. 37v. Ver: RODRIGUES, Flávio Carneiro (org.). Cadernos Históricos do Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana. Segunda coletânea das Visitas Pastorais do século XVIII no Bispado de Mariana. Mariana: Editora Dom Viçoso, 2004, p.159-160.

Agradecimentos

Este artigo é o resultado parcial das pesquisas apoiadas pela Fapemig (2013-2015) e pela Capes (2013-2014).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    04 Ago 2015
  • Revisado
    21 Nov 2015
  • Aceito
    28 Nov 2015
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