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Acelerações em escala regional: A transformação do vale do Rio Doce, ca. 1880-1980

Accelerations on a Regional Scale: The Transformation of the Doce River Valley, ca. 1880-1980

Resumo

O artigo apresenta uma perspectiva de longa duração sobre o vale do Rio Doce e analisa processos de aceleração numa escala de experiência e agência humanas. Foca em quatro momentos que são representativos das percepções e apropriações da região no contexto de mudanças na demanda global por recursos e novas tecnologias de transporte. O conceito de "paisagens imaginadas" é usado para analisar o nexo entre imaginação espacial e transformação infraestrutural. Representado como frente da civilização na década de 1880, por volta de 1910 o vale passou a ser associado com o futuro do Brasil como nação industrial e fornecedora do minério de ferro. As ideologias espaciais de desenvolvimento territorial vs. corredor de transporte estavam em conflito, o que se tornou especialmente visível durante a Segunda Guerra Mundial e no processo de fundação da Companhia Vale do Rio Doce. Na década de 1970, minerodutos estenderam ainda mais o alcance da frente minerária. Esta aceleração é uma das dimensões históricas do rompimento da barragem de Mariana, em 2015.

Palavras-chave:
Vale do Rio Doce; paisagem; infraestrutura

Abstract

The article presents a longue durée perspective on the Doce river valley and analyzes acceleration processes on a scale of human experience and agency. It focuses on four moments which are representative of perceptions and appropriations of the region in the context of global changes in resource demand and transport technologies. The concept of "imaginary landscapes" accounts for the interrelation between spatial imagination and material transformation. Represented as a frontier of civilization in the 1880s, around 1910 the valley became associated with Brazil's future as an industrial nation and supplier of iron ore. The spatial ideologies of territorial development and those that saw the region as a transport corridor were in conflict, which became particularly visible in the wake of the Second World War and the foundation of the Companhia Vale do Rio Doce. During the 1970s, slurry pipelines extended the territorial reach of the mining frontier. This acceleration is one historical dimension of the 2015 Mariana dam disaster.

Keywords:
Vale do Rio Doce; landscape; infrastructure

Em 2015, o vale do Rio Doce atraiu a atenção do mundo inteiro após o rompimento da barragem de resíduos tóxicos de Fundão, que recebia, entre outros, rejeitos da mina de Germano, operada pela empresa Samarco desde os anos 1970. O desastre deixou 19 mortos, além de destruir ecossistemas e a base de vida de milhares de pessoas. O vale do Rio Doce se tornou um símbolo para as devastações resultantes da expansão desfreada de regimes extrativistas. Chegou a representar as vulnerabilidades e os riscos inerentes aos modos de extração, produção e consumo do capitalismo moderno. O sociólogo alemão Stephan Lessenich (2016)LESSENICH, Stephan. Neben uns die Sintflut: Die Externalisierungsgesellschaft und ihr Preis. Berlin: Hanser, 2016., no seu livro sobre a "sociedade externalizante", usa o desastre de Mariana como ponto de partida para mostrar como os modos de vida baseados em um alto padrão de uso de recursos naturais destroem vidas e ecossistemas em outras partes do mundo - e assim externalizam os custos e riscos associados ao seu próprio consumo. Assim, o vale do Rio Doce pós-desastre representa relações da sociedade com a natureza baseadas em "modos imperiais de vida" (Brand; Wissen, 2013BRAND, Ulrich; WISSEN, Markus. Crisis and Continuity of Capitalist Society-Nature Relationships: the Imperial Mode of Living and the Limits to Environmental Governance. Review of International Political Economy, vol. 20, n. 4, p.687-711, 2013.), que se espalharam globalmente com a Grande Aceleração.

Como se deve escrever a história da Grande Aceleração? Esta pergunta visa explorar a narrabilidade do Antropoceno. Até agora dominam as abordagens em vista aérea que agregam dados sobre matrizes energéticas, crescimento populacional, consumo d'água ou urbanização (McNeill; Engelke, 2014MCNEILL, John R.; ENGELKE, Peter. The Great Acceleration: an Environmental History of the Anthropocene Since 1945. Cambridge, Mass.: Belknap Press of Harvard University Press, 2014.). Essas histórias mundiais da Grande Aceleração têm o mérito indubitável de inspirar um novo e radical materialismo na nossa percepção do mundo moderno, mas o seu potencial de inovação narrativa é limitado, porque não tangem a escala de experiência e agência humana. Mesmo assim, o conceito de Aceleração nos permite descer da altitude dos pássaros, ou satélites, para focarmos em um problema central da condição antropocênica, já que abre espaço para perguntas como: o que é acelerado, como, por quem, com quais ferramentas técnicas, econômicas, políticas, discursivas? Se o Antropoceno é o resultado de todas as acelerações, das novas formas dos humanos disporem de ambientes não-humanos, proponho uma análise a partir de lugares concretos. A expectativa é a de que, através da reconstrução de microescalas e o seu entrelaçamento com escalas meso e macro, seja possível construir alternativas ao roteiro hermético e linear da narrativa do Antropoceno e reconectá-lo com as escalas de experiência e agência humanas como parte de uma História Global das Acelerações. É desnecessário mencionar que, como nos tem ensinado já a história da globalização, a aceleração não deve ser pensada como um processo linear, e uma História Global das Acelerações sempre contará com desacelerações, acelerações fracassadas e fluxos interruptos (Osterhammel; Petersson, 2005OSTERHAMMEL, Jürgen; PETERSSON, Niels P. Globalization: a Short History. Princeton, N.J.: Princeton University Press, 2005.; Cooper, 2001COOPER, Frederick. What is the Concept of Globalization Good For? An African Historian’s Perspective. African Affairs vol. 100, n. 399, p.189-213, 2001).

O Brasil oferece muitos elementos para tal história. Até hoje, o país é um dos grandes fornecedores de matérias-primas, e seu modelo de extrativismo predatório está vivendo mais um renascimento. Contudo, desde a sua Independência, o país nunca foi uma "frente de recursos" passiva. Os termos de acesso à natureza brasileira, os condicionamentos da aceleração, eram sujeitos a negociações complexas. Diferentemente do que sugeria a vertente marxista ortodoxa da teoria da dependência, representada por autores como André Gunder Frank, a inserção do Brasil nos mercados internacionais de matérias-primas foi um processo mais complexo do que uma simples sequência de pilhagens orquestradas por interesses alheios. Desde a Independência, o estado brasileiro formulava estratégias de valorização e de condições de acesso para empresas privadas e indivíduos. Com o passar do tempo, houve mudanças nas regras de acesso, assim como nos mecanismos políticos de redistribuição dos lucros: passou-se do favoritismo na atribuição de concessões minerárias durante o Império, à nacionalização dos recursos naturais na era Vargas, chegando à virada neoliberal dos anos 1990 e ao neo-extrativismo do século XXI (Calógeras, 1904-1905CALÓGERAS, João Pandiá. As minas do Brasil e a sua legislação, 2 vols. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1904-1905.; Triner, 2011TRINER, Gail D. Mining and the State in Brazilian Development. London: Pickering & Chatto, 2011.; Milanez; Santos, 2015MILANEZ, Bruno; SANTOS, Rodrigo S. P. Topsy-Turvy Neo-Developmentalism: an Analysis of the Current Brazilian Model of Development. Revista de Estudos Sociais, n. 53, p.12-28, 2015.).

Igualmente importante foi a atuação do estado na outorga de concessões para a construção de infraestruturas necessárias para a aceleração de fluxos materiais. Se a abertura de estradas de rodagem era uma tarefa que o estado assumia autonomamente, a construção de ferrovias requeria grandes investimentos privados que, por sua vez, dependiam de garantias e privilégios estatais para atrair capital suficiente. Desta forma, órgãos estatais e interesses particulares determinavam as condições sob as quais novas regiões eram conectadas aos mercados internacionais. Essas determinações e negociações, assim como o significado cultural das tecnologias de transporte e do seu impacto na configuração do tempo e do espaço, devem ocupar um lugar central na história das acelerações, já que infraestruturas são um meio central nas relações entre sociedade e natureza (van Laak, 2004VAN LAAK, Dirk. Technological Infrastructures: Concepts and Consequences. Icon: Journal of the International Committee for the History of Technology, vol. 10, p.53-64, 2004.). A historiografia brasileira já conta com uma riquíssima bibliografia referente à história cultural-ambiental-espacial dos sistemas de transporte (Hardman, 1988HARDMAN, Francisco Foot. Trem fantasma: a modernidade na selva. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.; Arruda, 2000ARRUDA, Gilmar. Cidades e sertões: entre a história e a memória. Bauru: EDUSC, 2000.; Espidola; Ferreira; Mifarreg, 2017ESPINDOLA, Haruf Salmen; FERREIRA, Natália Moreira; MIFARREG, Iesmy Elisa Gomes. Território da mineração: uma contribuição teórica. Revista Brasileira de Geografia, vol. 62, n. 2, p.67-93, 2017.). Infraestruturas marcam a transição para novos e intensificados regimes de extração e possibilitam a ampliação de processos transformatórios de paisagens e ecossistemas.

O vale do Rio Doce, devido à sua localização geográfica assim como suas características ecológicas e demográficas, era muitas vezes visto como uma miniatura do Brasil no que se referia às dinâmicas de ocupação de espaços de fronteira. Também servia para comparações com regiões em outros países que tinham um significado "estratégico" parecido, como os vales do Ruhr, na Alemanha, ou do Rhône, na França. As projeções do futuro que emanaram dessas percepções e alegorias têm sido objeto de análises históricas: Judy Bieber, por exemplo, descreve os significados associados à ideia da navegabilidade do Rio Doce na primeira metade do século XIX. O maior especialista na história da região, Haruf Salmen Espindola, mostrou em vários trabalhos como, principalmente na primeira metade do século XX, o vale do Rio Doce chegou a ser uma região de relevância nacional em relação à política econômica, além de como sua transformação se tornou uma medida da "independência nacional" do Brasil (Espindola, 2015ESPINDOLA, Haruf Salmen. Vale do Rio Doce: fronteira, industrialização e colapso socioambiental. Fronteiras: Journal of Social, Technological and Environmental Science, vol. 4, n. 1, p.160-206, 2015.; 2016ESPINDOLA, Haruf Salmen. Território, fronteira e natureza no vale do Rio Doce. In: FRANCO, José Luiz de Andrade; DRUMMOND, José Augusto; SILVA, Sandro Dutra e; TAVARES, Giovana Galvão (Org.). História ambiental: territórios, fronteiras e biodiversidade, vol. 2. Rio de Janeiro: Garamond, 2016. p.201-235.).

Partindo dessas constatações, esse artigo procura examinar as percepções do vale do Rio Doce sob a perspectiva do conceito de aceleração. Reconstrói o vale do Rio Doce como paisagem imaginada e materialmente transformada a partir de projetos de infraestrutura de transporte num período de longa duração. Por um lado, infraestruturas representam o que o geógrafo marxista David Harvey chamou de spatial fix, espaços artificiais criados pela expansão do capitalismo justamente para destruir o espaço - para tornar irrelevantes as distâncias na globalização da produção e da acumulação (Harvey, 2001HARVEY, David. Globalization and the ‘Spatial Fix’. Geographische Revue, n. 2, p.23-30, 2001.). Por outro lado, o conceito de imaginary landscape enfatiza a dimensão cultural-representacional e a compreensão de que "paisagens podem servir como pano de fundo para a projeção de certas ordens sociais e futuros idealizados" (Etzemüller, 2012ETZEMÜLLER, Thomas. Romantischer Rhein - Eiserner Rhein: Ein Fluß als Imaginary Landscape der Moderne. Historische Zeitschrift, vol. 295, n. 2, p.390-424, 2012., p.424). Essa perspectiva não distingue entre percepções "distorcidas" e natureza "real". Indaga sobre a função social dessas projeções e, ao mesmo tempo, considera como essas ordens idealizadas se concretizam em práticas transformatórias, como na construção de infraestruturas.

O texto se divide em quatro momentos representativos de mudanças nas interpretações e apropriações da região: em 1882, um jovem engenheiro britânico experimenta o vale como última fronteira da civilização, um local selvagem a ser domado pela tecnologia moderna. Ao mesmo tempo, o Rio Doce já fazia parte de fantasias edênicas, sonhos de desenvolvimento agrícola e minerário, quando, por volta de 1911, ele é inserido aos planos das infraestruturas de um desenvolvimento transitista - uma percepção que entende o próprio vale como "paisagem-duto", como infraestrutura para o escoamento de minério. Se, em grande medida, a aceleração dos fluxos materiais no vale permanece no âmbito dos planos e projetos, em 1942 ela se "concretiza" através do aparelhamento da Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM), finalizada em 1951, que agora passa a existir principalmente em razão do transporte de minério das minas de Itabira. O último momento aqui considerado, 1977, marca uma nova fase na aceleração do extrativismo e uma nova independência entre o vale e os fluxos de minério: a era da polpa. Trata-se da introdução da tecnologia dos minerodutos que permitiam um novo alcance geográfico e um novo ritmo do extrativismo.

O uso de fontes de arquivos europeus e americanos mostra a forma como o vale do Rio Doce, adquiriu seus significados através de sua articulação com outras regiões do mundo. Várias articulações entre o regional e o global fazem parte da narrativa aqui desenvolvida: novas tecnologias aceleradoras são introduzidas, enquanto as matérias-primas extraídas e comercializadas contribuem para os processos de industrialização em outras partes do mundo. Nesse contexto, atores transnacionais participavam da produção de saberes que favoreciam a ressignificação do vale, com suas características topográficas e geológicas, em paisagem ambiental-tecnológica (envirotechnical landscape), na feliz expressão recentemente adaptada ao debate por Haruf Espindola, Natália Ferreira e Iesmy Mifarreg (2017)ESPINDOLA, Haruf Salmen; FERREIRA, Natália Moreira; MIFARREG, Iesmy Elisa Gomes. Território da mineração: uma contribuição teórica. Revista Brasileira de Geografia, vol. 62, n. 2, p.67-93, 2017.. Com o foco em alguns desses atores transnacionais, pretendo reconstruir histórias conectadas ou compartilhadas das paisagens reais e imaginárias desta região e, ou mesmo tempo, introduzir novas fontes empíricas à historiografia sobre o vale do Rio Doce.

1882: um jovem engenheiro em busca do outro

A partir da década de 1870, a elite capixaba visava a construção de uma malha ferroviária para integrar o interior da província com as zonas de café no sul, assim como ao porto e ao centro administrativo de Vitória. Contou com o apoio do governo imperial, principalmente do ministro da agricultura, José Fernandes da Costa Pereira Júnior, que anteriormente tinha atuado como presidente da província do Espírito Santo. Foi mediante a sua influência que seu sucessor nesse cargo, Domingos Monteiro Peixoto, pôde anunciar a "faustuoza noticia, que com enthusiasmo foi recebida pela população desta capital e de toda a província" que tinha-se iniciado o estudo sobre o melhor traçado para uma linha ferroviária de Vitória a Minas Gerais.1 1 ESPÍRITO SANTO (Província). Falla com que o exm. sr. dr. Domingos Monteiro Peixoto installou a Assembléa Provincial do Espirito Santo na sessão do dia 18 de setembro de 1875. Vitória: Typ. do Espirito-Santense, 1875. p.55. A concessão para a construção da Estrada de Ferro Vitória a Natividade (EFVN, a futura EFVM) mostra claramente uma nova tendência na política ferroviária brasileira da época: o uso consciente das estradas de ferro como meio para "abrir" novas regiões para colonos pioneiros em vez de simplesmente conectar zonas de produção ou modalidades de transporte já existentes. Neste sentido, tratava-se da expansão das áreas de colonização europeia, principalmente alemã, que começara no interior do Espírito Santo em 1847 (Fischer, 2008FISCHER, Georg. Imigrantes de língua alemã e as visões do paraíso da elite capixaba, 1847-1862. Espaço Plural, vol. 9, n. 19, p.59-66, 2008.). O mapa de Hermillo Alves, de 1876, mostra o imaginário geográfico do projeto: levar a civilização às "mattas desconhecidas e inhabitadas pelos Indios Botocudo".2 2 ALVES, Hermillo Candido da Costa. Estrada de Ferro da Victoria para Minas: relatorio apresentado ao illm. e exm. sr. conselheiro Thomaz José Coelho de Almeida, ministro e secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio & Obras Publicas. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1876. s/p. Destaca a presença de índios antropófagos nas proximidades da capital e lembra ainda das imensas riquezas escondidas em seus territórios, como ouro, ferro e pedras preciosas. Todos esses motivos eram provenientes de imaginários da época colonial e das primeiras décadas do século XIX (Bieber, 2016BIEBER, Judy. ‘The Brazilian Rhône’: Economic Development of the Doce River Basin in Nineteenth-Century Brazil, 1819-49. Journal of Latin American Studies, vol. 48, n. 1, p.89-114, 2016.; Espindola, 2005ESPINDOLA, Haruf Salmen. Sertão do Rio Doce. Aimorés: Instituto Terra, 2005.). O governo provincial possuía a mesma visão do sertão do Rio Doce e via a estrada de ferro como meio para civilizar e/ou exterminar os índios.3 3 ESPÍRITO SANTO (PROVÍNCIA). Relatorio com que o Exm. Sr. Dr. Affonso Peixoto de Abreu Lima passou a administração da provincia do Espírito Santo ao Exm. Sr. tenente-coronel Alpheu Adelpho Monjardim d'Andrade e Almeida, primeiro Vice-Presidente, 19 de fevereiro de 1878. Vitória: Typ. da Gazeta da Victoria, 1878. p.27. A ideia da EFVN pode, portanto, ser interpretada como uma solução "moderna" para "problemas" antigos, baseada no imaginário das novas tecnologias e infraestruturas: questionava se os índios deveriam ser exterminados ou sujeitados ao Estado e à produção capitalista, e como os assentamentos europeus poderiam ser ligados aos centros para incentivar a sua "radiação".

Depois de vários projetos fracassados, a companhia Waring Brothers, de Londres, obteve a concessão para as obras e enviou, em agosto de 1882, uma equipe de engenheiros.4 4 PROPOSTAS para a construcção da estrada de ferro da Victoria á Natividade. Rio de Janeiro: Imprensa Industrial, 1882. Um deles foi o jovem engenheiro David Angus, um bom exemplo de uma "carreira imperial", embora ele nunca tenha sido empregado numa colônia britânica formal (Mair, 1989MAIR, Craig. David Angus: the Life and Adventures of a Victorian Railway Engineer. Stevenage: Strong Oaks Press, 1989.). Depois de trabalhar no Brasil e na Argentina, na década de 1890, ainda projetou a estrada de ferro de Otavi no Sudoeste Africano Alemão. É também notável que muitos engenheiros carreiristas imperiais se tornaram experts sobre uma determinada região e trabalharam, em seguida, como conselheiros técnicos ou investidores na City de Londres. Ao se aposentar, Angus tinha acumulado conhecimentos enormes e possuía um grande interesse na América Latina, como pode ser verificado em seu acervo pessoal, que inclui mapas e relatórios de grandes projetos como o canal de Panamá, a Madeira-Mamoré, e a correspondência da sua atuação como conselheiro técnico da rede ferroviária no Triângulo Mineiro.

Para um jovem engenheiro britânico, a província do Espírito Santo do fim do século XIX representava uma terra de oportunidades. O salário de Angus no Brasil era quatro vezes maior do que o que ele recebia na Inglaterra.5 5 David Angus a Mary Wilson, 16 nov. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Em pouco mais de um ano, ele estabeleceu uma rede profissional que logo o permitiria conseguir uma colocação na Argentina. Mas, para ele, a noção de "oportunidades" ia muito além da própria carreira. Tentou arrumar empregos para parentes, sonhou com a fundação de uma colônia escocesa nas margens do Rio Doce e montou um esquema de contrabando de diamantes, junto com seu chefe e seu irmão que trabalhava nas minas de ouro na Califórnia.6 6 David Angus a Mary Wilson, 17 jun. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1; David Angus a Mary Wilson, 4 mar. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Mas nem o primeiro diamante chegou ao seu destino. Mesmo assim, Angus se entusiasmou com a abundância que o rodeava e começou a perceber todo elemento natural como comercializável. Iniciou experimentos com a gramínea "Capim Angola", porque "podia conter dinheiro".7 7 David Angus a Mary Wilson, [?] mai. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Descobriu que três engenheiros da E.F. Rio Minas haviam comprado uma mina de ouro a 50 quilômetros de Três Corações e considerou comprar participações no negócio.8 8 David Angus a Mary Wilson, 16 nov. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1.

Essa percepção da natureza, porém, tinha um lado oposto: o Rio Doce como paisagem perigosa e selvagem. O Rio Doce era "cheio de jacaré, peixe espada, tamboril de tamanho enorme e tomar banho nele significa seguramente a morte".9 9 David Angus a Mary Wilson, 10 dez. 1882, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. As selvas e os pântanos da região tinham uma reputação notória. "Encontramos uns rapazes que conheciam o lugar aonde estamos indo, e nos contaram que fervilhava de animais selvagens e serpentes, perto de Natividade a floresta é impenetrável e lá devemos encontrar puma e onça pintada".10 10 David Angus a Mary Wilson, 15 out. 1882, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Além disso, Angus imaginava os botocudos como uma constante ameaça, e não faltavam histórias e rumores sobre atos de incrível violência e canibalismo que tinham cometido. Imergiu no mundo de aventuras que já conhecia dos livros dos grandes desbravadores. De noite, na barraca, lia Grattan Geary's "Viagens pela Turquia asiática"11 11 GEARY, Grattan. Through Asiatic Turkey: Narrative of a Journey from Bombay to the Bosphorus. London: S. Low, 1878. e confirmou em carta a Mary Wilson, sua noiva, que a realidade no Espírito Santo era parecida.

As cartas e os diários de Angus evidenciam que o vale do Rio Doce era percebido como frente pioneira da civilização, palco do drama heroico dos desbravadores que já não eram mais os bandeirantes, mas engenheiros vitorianos. Angus nunca encontrou o "outro" nesse limite, mas constantemente sentia a sua presença, pelos relatos já tradicionais dos colonos vítimas da antropofagia botocuda, pelas histórias e legados dos assentamentos fracassados. A identidade vitoriana também se alimentava dos encontros com a sociedade brasileira, a percebida ineficiência dos seus técnicos, a falsidade das suas elites e a sujeira escondida nas casas brancas dos vilarejos. Angus não é o único exemplo desse pensamento fronteiriço. William Steains, outro engenheiro ferroviário que visitou a região em 1886, quando estava empregado numa obra ferroviária em Alagoas, apresentou os "resultados" de sua visita aos botocudos na Royal Geographical Society. A discussão que seguia à palestra de Steains mostra o alto grau de conhecimento entre a comunidade acadêmica europeia. Nas palavras de Mr. Wells, membro da Royal Geographical Society,

[e]sses vadios errantes podem ser, e sem dúvida eram, uma fonte de terror ao colono do Doce, degenerado e tímido, mas se em algum momento tentativas sérias de desenvolver essa região fossem feitas, os pobres índios seriam levados, como algumas raças mais guerreiras de outros países já foram, pelo vendaval do irresistível avanço do homem branco [...]. [N]o momento em que a estrada de ferro percorrer o interior selvagem do Brasil não haverá escassez de imigrantes.12 12 STEAINS, William J. An Exploration of the Rio Doce. Proceedings of the Royal Geographic Society and Monthly Record of Geography, vol.10, n.2, p.61-84, 1888. p.83.

Essa afirmação expressa bem a função "civilizatória" que as estradas de ferro tinham na imaginação de imperialistas vitorianos e das elites brasileiras. Para David Angus, importavam mais os efeitos econômicos e o conforto que a construção da ferrovia prometia: "A estrada de ferro ou qualquer meio de comunicação é muito preciso por aqui, ninguém cuida das estradas [de rodagem], e em alguns lugares as mulas afundam-se 2 ou 3 pés na lama".13 13 David Angus a Mary Wilson, 11 fev. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Reconhecia o potencial econômico do interior capixaba, principalmente na produção de café, que a nova ferrovia, mesmo num processo demorado, podia impulsionar.14 14 David Angus a Mary Wilson, 16 set. 1883 [?], National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Comentou sobre as expectativas que o projeto da ferrovia despertara entre os donos de terra da região: "Todos esperam fazer fortunas com as suas terras quando for finalizada a estrada de ferro, embora há um ano se alegrassem de achar alguém que desse alguma coisa para o lugar".15 15 David Angus a Mary Wilson, 3 jun. 1883, National Library of Scotland (Edimburgo), David Angus Papers, Acc. 6905/1. Contudo, por motivos políticos e econômicos, a estrada de ferro que Angus planejou não saiu do papel até a primeira década do século XX.

1911: o Rio Doce na nova geografia do ferro

O próximo momento de transformação corresponde à integração do vale do Rio Doce na geografia ferrífera. O ciclo de ferro se iniciava aos poucos no início do século XX e chegou a marcar profundamente o pensamento econômico e desenvolvimentista no Brasil (Martins, 1976MARTINS, Luciano. Pouvoir et développement économique: formation et évolution des structures politiques au Brésil. Paris: Editions Anthropos, 1976.; Callaghan, 1981CALLAGHAN, William S. Obstacles to Industrialization: the Iron and Steel Industry in Brazil During the Old Republic. Tese (Doutorado em História) - University of Texas. Austin, 1981.; Barros, 2011BARROS, Gustavo de. O problema siderúrgico nacional na primeira república. Tese (Doutorado em Economia) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 2011.; Triner, 2011TRINER, Gail D. Mining and the State in Brazilian Development. London: Pickering & Chatto, 2011.; Fischer, 2017FISCHER, Georg. Globalisierte Geologie: Eine Wissensgeschichte des Eisenerzes in Brasilien (1876-1914). Frankfurt am Main: Campus, 2017.). A região central de Minas Gerais, hoje conhecida como "quadrilátero ferrífero", foi palco da primeira fase deste ciclo. Nesse momento, o vale do Rio Doce se transformou num elemento essencial dos debates sobre o ferro nacional e sobre o futuro do Brasil. E, de novo, não podemos entender essa dinâmica sem considerar o impacto das escalas transnacionais e globais.

A abundância de minério de ferro nas montanhas mineiras era um fato conhecido desde a época do ouro. Já em 1822, o geólogo alemão a serviço da coroa portuguesa previa que "enquanto o mundo existe poderá ser provido de ferro daqui".16 16 ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Geognostisches Gemälde von Brasilien und Wahrscheinliches Muttergestein der Diamanten. Weimar: Landes-Industrie-Comptoir, 1822. p.30. A íntima associação metalogenética dos dois minerais caracterizou muitos conflitos no processo da transformação desta paisagem: de uma marcada pela materialidade e territorialidade em outra, caracterizada pela materialidade e territorialidade do ferro. O estudo das jazidas de ferro fazia parte do programa da Escola de Minas de Ouro Preto desde a publicação do primeiro número de seus anais.17 17 GORCEIX, Henri. Prefácio. Anais da Escola de Minas de Ouro Preto, vol. 1, n. 1, p.V-IX, 1881. Estava presente ainda na agenda da Comissão Geográfica e Geológica do Estado de Minas Gerais nos primeiros anos da República, embora as triangulações desta comissão nunca chegassem além da Zona da Mata por falta de verbas (Fischer, 2017FISCHER, Georg. Globalisierte Geologie: Eine Wissensgeschichte des Eisenerzes in Brasilien (1876-1914). Frankfurt am Main: Campus, 2017., p.113-122). O quadro técnico dessa comissão deixou claro que a produção de saberes sobre o ferro tinha como objetivo a sua comercialização nos mercados internacionais.18 18 MINAS GERAIS (ESTADO). Relatorio apresentado ao Dr. Secretario de Estado da Agricultura do Estado de Minas Geraes pelo Inspector de Terras e Colonização Dr. Carlos Prates em 1898. Ouro Preto: Imprensa Official do Estado de Minas Geraes, 1898. p.123. Porém, nas revistas europeias e americanas raramente se citavam essas riquezas.

Esse quadro mudou com a escassez mundial de ferro percebida na primeira década do século XX, quando especialistas no mundo inteiro alertaram para o forte desequilíbrio entre as reservas mundiais e o crescimento do consumo do mineral, principalmente pelas indústrias das novas potências econômicas: Estados Unidos e Alemanha (Fischer, 2017FISCHER, Georg. Globalisierte Geologie: Eine Wissensgeschichte des Eisenerzes in Brasilien (1876-1914). Frankfurt am Main: Campus, 2017., p.82-83). As primeiras publicações internacionais em inglês sobre o ferro brasileiro foram escritas por Herbert Scott, engenheiro britânico contratado pela empresa brasileira Usina Wigg, que atuou na produção de manganês - exportação em escala relativamente larga que antecedeu a do ferro. Numa palestra lida pelo seu irmão no Iron and Steel Institute, em 1900, Scott afirmou que

[o]s afloramentos desnudados de jacutinga [...] estão geralmente cobertos de avultadas camadas de um conglomerado grosso ferrífero chamado de "canga" ou Tapanhoacanga (cabeça de negro), consistindo de fragmentos arrebentados de minério de ferro, e a sua ocorrência enorme da Serra do Espinhaço fazem dela um dos maiores, se não o maior, distritos de ferro do mundo.19 19 SCOTT, Herbert K. The Manganese Ores of Brazil. Journal of the Iron and Steel Institute, vol. 57, n. 1, p.179-218, 1900. p.182.

As redes transnacionais que inseriram o ferro brasileiro num cenário global de recursos minerais se formaram, novamente, a partir da iniciativa de engenheiros britânicos que atuavam em outros projetos no Brasil, mas descobriram o futuro quadrilátero ferrífero como terra de imensas oportunidades (Fischer, 2017FISCHER, Georg. Globalisierte Geologie: Eine Wissensgeschichte des Eisenerzes in Brasilien (1876-1914). Frankfurt am Main: Campus, 2017., p.233-238).

No âmbito do décimo primeiro Congresso Internacional de Geologia, em Estocolmo, em 1910, o Brasil se consagrou internacionalmente como retentor das mais concentradas - em termos químicos e geográficos - jazidas de ferro do mundo.20 20 ANDERSSON, Johan G. (Org.). The Iron Ore Resources of the World, 2 vols. Estocolmo: Generalstabens Litografiska Anstalt, 1910. A corrida internacional culminou com dois grupos principais de atores no distrito ferrífero: um dominado por industriais e comerciantes britânicos - a Itabira Iron Ore - e o outro controlado por geólogos americanos - a Brazilian Iron and Steel. O banco Barings tentou harmonizar os interesses de ambos, mas essas tentativas foram frustradas e britânicos e americanos chegaram a disputar até o Pico do Cauê, a emblemática montanha de ferro em Itabira do Mato Dentro (Fischer, 2017FISCHER, Georg. Globalisierte Geologie: Eine Wissensgeschichte des Eisenerzes in Brasilien (1876-1914). Frankfurt am Main: Campus, 2017., p.251-261).21 21 JUIZO SECCIONAL DE MINAS GERAIS. Acção de demarcação: Penha Company, Inc. - Auctora. The Itabira Iron Ore Company Limited e outros - Réos. Memorial da auctora pelo advogado Flavio Fernandes dos Santos. Belo Horizonte: Imprensa Official, 1919.

Foi no curso dessa corrida internacional pelas jazidas de ferro em Minas Gerais que o vale do Rio Doce adquiriu um novo significado: o de corredor de transporte, um espaço transitório, uma base natural para as novas infraestruturas que permitiriam o escoamento eficiente e econômico de uma nova commodity, a peça chave do novo ciclo de exportação dos recursos naturais do Brasil. Vale destacar que se trata de uma reinvenção da região e não de uma característica conhecida a priori. Por exemplo, nos debates no congresso que seguiram o plano formulado pelo presidente Nilo Peçanha, em 1908, para a implementação de uma política de aproveitamento do ferro que visava o desenvolvimento de uma indústria siderúrgica nacional, a E.F. Central do Brasil de Minas para o Estado do Rio de Janeiro era vista como a futura via de transporte para o minério de ferro.22 22 Ver, por exemplo, a fala de Eduardo Sócrates, Anais da Câmara dos Deputados, 29 set. 1909, p.743. Em dezembro 1909, poucos meses depois do diretor do Serviço Geológico e Mineralógico Brasileiro, Orville Derby, publicar os primeiros resultados dos trabalhos que seriam enviados ao comitê organizador do congresso da Suécia,23 23 Orville A. Derby: Os minerios de ferro do Brasil. Jornal do Commercio, 25 ago. 1909. a EFVM obteve a concessão a construir um ramal a Itabira do Mato Dentro, "afim de poder exportar minerio de ferro dessa região".24 24 MINAS GERAIS (ESTADO). Directoria de Viação, Obras Publicas e Industria do Estado de Minas Geraes. Relatorio referente ao anno de 1909 apresentado ao Sr. Secretario do Estado dos negocios das finanças pelo engenheiro Lourenço Baeta Neves. Belo Horizonte: Imprensa Official do Estado de Minas Geraes, 1910. p.15.

A ideia de que o controle da EFVM significaria uma posição monopolística na comercialização do minério mineiro emergia aos poucos. O diretor da americana Brazilian Iron and Steel Company, Charles Richard Van Hise, professor de geologia e presidente da Universidade de Wisconsin, chegou a essa conclusão numa carta de 11 de setembro de 1911:

Me parece óbvio que a estrada de Vitória terá um monopólio no transporte de minério do Brasil para os mercados do mundo. Em primeiro lugar, a maior parte do minério [...] é tributária à estrada; e em segundo lugar o caráter do terreno pelo qual as outras estradas passam é tal que impossibilita qualquer transporte econômico de minério. [...] [A]té onde posso ver, não tem outra saída a não ser pelo Rio Doce.25 25 Charles R. Van Hise a Barings, Rio de Janeiro, 11 set. 1911, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 1, fols. 185-188.

O reconhecimento do vale como monopólio natural intensificou a rivalidade entre os grupos estrangeiros. James Hill, diretor da Great Northern Railway e um dos grandes magnatas ferroviários americanos da época, recomendava que Barings se concentrasse na EFVM, não só porque era de se esperar que o dono da infraestrutura de transporte teria o maior lucro uma vez que começasse a exploração minerária, mas também porque, segundo ele, se construída da forma apropriada, essa linha chegaria até a determinar os preços mundiais de ferro.26 26 James J. Hill a Gaspard Farrer, 17 mar. 1912, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 2, fols. 326-331. A Itabira Iron Ore foi a primeira a atuar nesse sentido quando, em 1911, firmou acordos com a EFVM, que ora estava sendo construída e pouco a pouco se estendia para o interior capixaba.27 27 Memorandum from Itabira Iron Ore Company Report, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 1, fol. 154; Itabira Iron Ore Company, Limited: Report Persuant to Section 65 of the Companies (Consolidation) Act 1908, 4 jul. 1911, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 1, fol. 123. Em fevereiro de 1912, o investidor Alexander Henderson, que já controlava o porto de Vitória e a Estrada de Ferro Leopoldina adquiriu, com um empréstimo de Barings, a EFVM dos antigos proprietários franceses para a Itabira Iron Ore.28 28 Thomas H. Carlton Levick a Barings, 23 abr. 1912, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 3, fols. 78-79. Em seguida, vários engenheiros europeus e americanos atravessaram o vale estudando as possibilidades de converter a precária EFVM numa verdadeira estrada para minérios industriais, obra que se projetava como um dos maiores projetos de engenharia do mundo, motivo pelo qual foi contratado o americano John Stevens, realizador do Canal de Panamá, como um dos assessores técnicos (Fischer, 2017FISCHER, Georg. Globalisierte Geologie: Eine Wissensgeschichte des Eisenerzes in Brasilien (1876-1914). Frankfurt am Main: Campus, 2017., p.186-212). Porém, quando Cecil Baring tentou renegociar com o governo Hermes da Fonseca os prazos e as garantias de juros para este enorme empreendimento, o governo brasileiro já adotara uma política nacionalista e protecionista, impossibilitando a realização do primeiro plano de exportação de minério de ferro em larga escala (Fischer, 2017, p.212-225).

Uma consequência do descobrimento do monopólio natural de transporte da EFVM pelo vale do Rio Doce foi a fixação dos olhos tanto dos investidores internacionais como do governo brasileiro nas montanhas de Itabira. O complexo de jazidas de ferro chamado de Alegria, localizado 100 quilômetros ao sul de Itabira, que incluía, entre outras, as minas de Germano e Fundão, ficou excluído das negociações. Os americanos compraram Alegria em 1911 por 150 contos de reis junto com uma cachoeira para o abastecimento energético.29 29 Extracts from South American Journal, 12 ago. 1911, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 1; A siderurgia em Minas Geraes, O Paiz, 12 out. 1913, p.23. Rollin Chamberlin, geólogo de Chicago a serviço da Brazilian Iron and Steel Company, afirmou que a companhia possuía as maiores e, ao mesmo tempo, menos conhecidas jazidas de ferro do mundo.30 30 Rollin T. Chamberlin a Thomas C. Chamberlin, 8 jun. 1911, University of Wisconsin Archives (Madison), General Files, C.K. Leith, 7/13/12-4, Box 4: Brazilian Iron & Steel Co. Reports - Summary of Operations to April 15, 1911. Van Hise calculava que o complexo de Alegria continha 450.000.000 toneladas de minério com um teor ferrífero de 64 a 66 por cento.31 31 Memorandum of a Conversation with Mr. Charles R. Van Hise at 8 Bishopsgate. 11 jul. 1911, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 1, 1911. Contudo, depois se depararam com o fato de que seria impossível organizar o transporte do minério de forma rentável e a exploração de Alegria foi adiada para um momento mais oportuno.

O significado do vale do Rio Doce mudou profundamente naquele momento, mas também continuou sendo controverso durante as próximas décadas. Isto fica aparente nos seguintes trechos do livro "O desbravamento das selvas do rio Doce", de 1959, no qual o engenheiro Ceciliano Abel de Almeida recordou o tempo que serviu na construção da EFVM. Diz, no início do livro, a partir do qual leva o leitor a uma viagem imaginária pelo vale, que na altura da Ilha de Domingos Sousa, perto de Linhares,

[a]tinge-se o princípio de um labirinto intricado que forma o canal através do qual a navegação se faz penosamente. As margens do rio continuam, sem interrupção, cobertas de matas virgens inigualáveis. Nesse solo prodigioso, mais tarde surgirão as lavouras de cacau. Multiplicar-se-ão as fazendas, e o Espírito Santo passará a ser produtor e exportador da apreciada amêndoa. A fertilidade do Vale do Rio Doce, proclamada desde os tempos coloniais, tornar-se-á confirmada, e mais um produto agrícola encontrará nesse vale o seu ambiente natural. O devassamento das florestas, o viço dos cacaueiros, as fazendas, as escolas, as estradas, o saneamento, a civilização enfim, atestarão a inteligência, a pujança do brasileiro, 'do homo-dinamicus, no conceito ratzeliano', e provocarão admiração e registros elogiosos, assim de brasileiros como de estrangeiros.32 32 ALMEIDA, Ceciliano Abel de. O desbravamento das selvas do rio Doce: memórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1959. p.18-19.

A sensação de estar participando na abertura de uma fronteira pioneira para a lavoura e na transformação de um "sertão" em empório agrícola transluze na descrição do início das obras da EFVM. Já no final do livro, descrevendo a situação das obras em 1911, o tom é outro:

E assim, dominando dificuldades, debatendo-se na penúria de recursos e enfrentando intempéries, foi construída a estrada de ferro de Vitória a Minas até a região descampada do Piracicaba. E os trilhos venceram as selvas (...). Referia-se a ela Pedro Nolasco [o seu diretor] com imenso entusiasmo. Era, dizia, "o caminho de serviço" da outra que a substituirá, ao passo que a crítica a chamou, com certo desdém, de "caminho de cabrito". O nosso encolhimento não nos estorva de nos orgulhar de havermos colaborado na construção dêsse "caminho de serviço", que concorreu para a saída do minério de ferro de inigualável teor do maciço de Itabira. 33 33 ALMEIDA, Ceciliano Abel de. O desbravamento das selvas do rio Doce: memórias. p.251.

Nessa visão, a EFVM e o vale do Rio Doce já não constituem um eixo de desenvolvimento territorial, mas adquirem um papel de infraestrutura auxiliar na nova geografia do ferro, meros "caminhos de serviço" no desenvolvimento transitista. É também nessa mudança de significado que se expressa a ambiguidade inerente à infraestrutura como spatial fix: havia um conflito entre o motivo de produção de espaço versus destruição de espaço.

1942: do vale à Vale

A tensão entre as duas ideologias espaciais - a do desenvolvimento territorial e a do desenvolvimento transitista - nunca desapareceu e durante décadas caracterizou os embates entre o nacionalismo econômico brasileiro e os interesses do capital estrangeiro. É assim que devemos entender os conflitos entre o governo de Arthur Bernardes, sempre sob influência de membros da elite tecnocientífica mineira como Clodomiro de Oliveira, e o investidor americano Percival Farquhar. Não era só uma briga sobre a construção de plantas siderúrgicas, mas também sobre a bitola e o trajeto exato da ferrovia no vale do Rio Doce. A bitola da estrada de ferro definia o grau da sua inserção na economia regional. Já os primeiros estudos em 1911 mostram a tensão entre a "solução europeia", de bitola métrica, mais compatível com outros fins, como o transporte de produtos agrícolas, e a "solução americana" que previa uma bitola larga o que possibilitaria o trânsito de 15 trens especializados, carregando até 2.000 toneladas de minério entre o quadrilátero ferrífero e o litoral capixaba.34 34 Gustave Gillman, Report on the Transport of Iron Ore in Brazil [dezembro de 1911], Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 2, fols. 75-116; Alexander M. Lupfer, General Report, 21 de dezembro de 1911, Barings Archive (Londres), Brazil Iron Ore Project, vol. 2, fols. 6-24, aqui fol. 13. Em 1932, a Comissão Nacional de Siderurgia estabeleceu "que as estradas de ferro que servem as zonas ferríferas, excetuados os ramais de interêsse exclusivamente industrial, tenham o caráter público, isto é, transportem toda e qualquer mercadoria de toda e qualquer pessôa, afim de não monopolizar o transporte de minérios e matérias destinados à industria mineral ou siderurgica[.]".35 35 Edmundo de Macedo Soares e Silva, Exposição feita perante o Conselho Técnico de Economia e Finanças, na sessão de 27/V/1938, sobre os problemas da siderurgia e exportação de minérios, 27 de maio de 1938, Arquivo Nacional (Rio de Janeiro), Gabiente Civil da Presidência da República, Lata 507, Pr. 67.

Especialmente na era Vargas, o desenvolvimento do vale do Rio Doce adquire um significado industrial. Num parecer de 1935, Euvaldo Lodi expressou essa linha de pensamento segundo a qual "[o] Valle do Rio Doce [é] fadado a ser, no Brasil futuro, o maior centro metallurgico do Mundo, razão pela qual temos o imperativo, de patriotismo e de consciencia, de sabel-o defender contra os assaltos de alienigenas que teimam em não acreditar no evento historico brasileiro que constituiu o 'Grito de Ypiranga'".36 36 Euvaldo Lodi ao Conselho Federal de Comércio Exterior: Parecer. 18 de fevereiro de 1935, Arquivo Nacional (Rio de Janeiro), Conselho Nacional de Economia, Lata 160, Pr. 89/35 - Exportação de minério de ferro e manganês. Os políticos mineiros e seus assessores técnicos argumentavam que, através da conversão das selvas do Rio Doce em carvão, o Brasil se tornaria independente do carvão importado. Havia sinais de que o sonho do vale industrializado podia se tornar realidade. Em 1940, a fábrica da Belgo-Mineira, em Monlevade, no vale do Piracicaba, era a maior siderúrgica do Brasil e considerada pela Revista Mineira da Engenharia "Uma etapa na emancipação econômica e no esforço de guerra do Brasil" (Espindola, 2015ESPINDOLA, Haruf Salmen. Vale do Rio Doce: fronteira, industrialização e colapso socioambiental. Fronteiras: Journal of Social, Technological and Environmental Science, vol. 4, n. 1, p.160-206, 2015., p.194).37 37 UMA ETAPA na emancipação economica e no esforço de guerra do Brasil. Revista Mineira de Engenharia, vol. 5, n. 37-38, 1942.

No entanto, uma decisão do governo Vargas mudou completamente os parâmetros da controvérsia sobre o ferro e a siderurgia nacional. Entre 1938 e 1940, o governo adotou a doutrina defendida pelo major Edmundo de Macedo Soares que visava à separação do problema da "grande siderurgia" do tema da comercialização do minério de ferro. A nova doutrina partia da compreensão de que 1) havia forte demanda internacional; 2) havia ferro em abundância, assim que qualquer preocupação com a escassez do recurso ficou fora da equação; 3) que o problema do ferro representava, em primeiro lugar, um problema de transporte.

A oportunidade para solucionar o problema do transporte veio com a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial e o fechamento dos acordos de Washington, em 1942. As jazidas de ferro em Itabira foram transferidas, sem ônus, ao estado brasileiro. Fundou-se a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) para a exploração das minas e exportação do minério que abasteceria as indústrias bélicas dos Estados Unidos e do Reino Unido. Era uma estatal de capital misto, financiada com créditos americanos. O presidente da companhia era nomeado pelo presidente da República, mas a diretoria consistia de dois brasileiros e dois americanos nomeados pela Eximbank. A cooperação técnica com os Estados Unidos incluía também o saneamento do vale do Rio Doce realizado pelo Serviço Especial de Saúde Pública (Campos, 2006CAMPOS, André Luiz Vieira de. Políticas internacionais de saúde na era Vargas: o Serviço Especial de Saúde Pública, 1942-1960. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006.). Concentrava-se na erradicação do mosquito anopheles darlingi nas margens do rio ao oeste de Governador Valadares e nos pântanos ao leste de Colatina, assim como a instalação de saneamento básico nas cidades de Governador Valadares, Aimorés e Colatina. A malária, a febre tifoide e a tuberculose representavam sérios obstáculos para qualquer obra de infraestrutura na região.38 38 Combate à malaria no vale do Rio Doce. Folha do Dia, 12 mar. 1946.

A composição da diretoria da CVRD gerou graves conflitos, principalmente quando a guerra acabou e o engenheiro Dermeval José Pimenta, nativo de Peçanha no vale do Rio Doce, assumiu a presidência da empresa (Fischer, 2014FISCHER, Georg. Das Staatsunternehmen als Expertenarena: Die Anfangsjahre der Companhia Vale do Rio Doce. RINKE, Stefan; GONZÁLEZ DE REUFELS, Delia (Org.). Expert Knowledge in Latin American History: Local, Transnational, and Global Perspectives. Stuttgart: Heinz, 2014. p.109-138.). Os conflitos giravam em torno de dois problemas: 1) a insistência dos diretores americanos para que a CVRD continuasse a exportar principalmente para o mercado americano. Não se tratava de interferência direta, mas de sinais sutis, por exemplo, a negação da autorização para uma viagem do assessor Glycon de Paiva à Europa para conversar com potenciais compradores; 2) além disso, havia opiniões divergentes em relação à vocação econômica do próprio vale do Rio Doce e do papel da estrada de ferro na economia regional. O nacionalismo/regionalismo econômico de Dermeval inspirou-se no corporativismo e na ideologia da mineiridade. A modernidade industrial mineira dissolveria as contradições da industrialização, imaginava um equilíbrio entre a vida rural agropecuária e centros urbanos industriais, uma harmonia entre café e aço.39 39 FREYRE, Gilberto. Ordem, liberdade, mineiridade: conferência lida na Faculdade de Direito de Belo Horizonte, a convite dos estudantes, na noite de 16 de julho de 1946. Rio de Janeiro: Vida Turfista, 1946. Assim, o vale do Rio Doce adquiriu o significado de laboratório para esse novo modelo de progresso planejado.40 40 Dentro de poucos anos, o vale do Rio Doce ser, mais do que o Vale das Maravilhas: será o Vale da Redenção da economia brasileira. O Diário, 5 mai. 1946, p.5 e 8.

A presença de americanos na diretoria e em várias altas posições técnicas da empresa preocupava Dermeval que diagnosticava uma incompatibilidade sistêmica de interesses (Fischer, 2014FISCHER, Georg. Das Staatsunternehmen als Expertenarena: Die Anfangsjahre der Companhia Vale do Rio Doce. RINKE, Stefan; GONZÁLEZ DE REUFELS, Delia (Org.). Expert Knowledge in Latin American History: Local, Transnational, and Global Perspectives. Stuttgart: Heinz, 2014. p.109-138.). Segundo ele, os americanos não tinham nenhum interesse pelo desenvolvimento econômico da região, embora este estivesse fixado nos estatutos da CVRD como um dos objetivos da empresa. De fato, em 1944 a EFVM, já incorporada à CVRD, faturou mais com o transporte de café e de passageiros do que com minério de ferro. A empresa apoiava pecuaristas e agricultores no vale assim como os governos de Minas e do Espírito Santo na construção de estradas de rodagem.41 41 Companhia Vale do Rio Doce S.A. Jornal do Commercio, 25 abr. 1946, p.10. Colonos viajavam de graça e máquinas agrícolas eram isentas de frete. Assim, a EFVM se inseria no processo de crescimento produtivo na região que marcou as décadas de 1930 a 1970 e que foi mais forte em setores como a indústria siderúrgica a base de carvão de madeira e a plantação de café e cacau, e que teve como consequência uma acelerada degradação ambiental, principalmente pela rápida destruição da cobertura florestal (Espindola, 2016ESPINDOLA, Haruf Salmen. Território, fronteira e natureza no vale do Rio Doce. In: FRANCO, José Luiz de Andrade; DRUMMOND, José Augusto; SILVA, Sandro Dutra e; TAVARES, Giovana Galvão (Org.). História ambiental: territórios, fronteiras e biodiversidade, vol. 2. Rio de Janeiro: Garamond, 2016. p.201-235.).

No entanto, a CVRD chegou a ser uma peça chave no desenvolvimentismo brasileiro (Silva, 2004SILVA, Marta Zorzal e. A Vale do Rio Doce na estratégia do desenvolvimentismo brasileiro. Vitória: EDUFES, 2004.). Durante seu mandato, desconfiado dos americanos, Dermeval conduzia a silenciosa brasileirização da CVRD.42 42 PIMENTA, Dermeval José. A Vale do Rio Doce & sua história. Belo Horizonte: Ed. Vega, 1981. A demora das obras de reconstrução da EFVM e da mecanização das minas de Itabira, assim como as dificuldades das vendas, fizeram necessário um novo empréstimo da Eximbank. Dessa vez, o governo federal garantiu o pagamento da dívida. Com essa fiança, tornou-se obsoleta a interferência americana na empresa. Ao deixar a presidência da CVRD em 1951, Dermeval tinha conseguido a retirada dos americanos com as conclusões da nova estrada de ferro e da mecanização das minas. O impacto na produção de minério de ferro foi imediato: as cifras, para o Brasil inteiro, cresceram de 2 milhões de toneladas em 1950 para mais de 4 milhões em 1956 e quase 17 milhões em 1964.43 43 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estatísticas do século XX, https://seculoxx.ibge.gov.br/ (acesso em 16 fev. 2018). O quadrilátero ferrífero e o vale do Rio Doce agora estavam intimamente ligados, sendo partes fundamentais do novo desenvolvimentismo brasileiro e do ciclo de ferro na história econômica do país.

1977: a era da polpa

A grande aceleração dos fluxos de minérios se dá nos anos pós-guerra, apesar de baseado em planos que antecedem a Primeira Guerra Mundial. O local desse salto qualitativo foi Itabira, chamada por um período de Presidente Vargas. A cidade se tornou um símbolo do desenvolvimentismo brasileiro. O pico de Cauê, hoje um enorme buraco, se tornou apenas um postal na nova era do aço.

Outras mega jazidas de ferro, como o complexo Alegria, permaneceram fora na nova geografia de exportação de minério. Diferentemente do Cauê, Alegria não era uma jazida de hematita maciça, mas tratava-se de minério resultante de processos secundários de enriquecimento, mais notavelmente o itabirito. Era menos puro, mais poroso, o seu teor diminuía conforme a profundidade.44 44 DORR, John V.N.; BARBOSA, Aluízio Linício Miranda. Geology and Ore Deposits of the Itabira District Minas Gerais, Brazil. Washington, D.C.: United States Government Printing Office, 1963. p.80. Com estas qualidades, não podia ser economicamente transportado com as tecnologias disponíveis.

Esse cenário mudou em 1972, quando uma nova tecnologia de transporte começou a ser introduzida pela primeira vez no Brasil. Tratava-se do sistema Marconaflo. Com a incorporação da Samarco, subsidiária da Samitri - que, por sua vez, era uma subsidiária da Belgo-Mineira, subsidiária da luxemburguesa ARBED - e da Marcona -, subsidiária da mineradora americana Utah International, de São Francisco, e da Cyprus Mining, de Los Angeles, e, consequentemente, da General Electric -, transferiu-se a nova tecnologia dos minerodutos ao Brasil.45 45 S.A. Mineração da Trindade - SAMITRI: Relatório da Diretoria - Exercício de 1972. Jornal do Brasil, 4 de maio de 1973, p. 25. Projetava-se como sistema de transporte para a exploração da mina de Germano, que fazia parte do complexo Alegria e cujas reservas eram estimadas em 280 x 106 toneladas de minério com um teor ferrífero de 67,5% (Henstock, 1975HENSTOCK, Michael E. Some Aspects of Metal Production in South America. Resources Policy vol. 1, n. 4, p.230-235, 1975., p.231). O primeiro duto para minério de ferro tinha sido inaugurado em 1967, na mina do Savage River, na Tasmânia. Vários outros entraram em funcionamento, entre 1971 e 1976, no México, na Coréia do Norte, e na Argentina. Contudo, o cumprimento e a capacidade de transporte eram pequenos em comparação com o mineroduto da Samarco: com uma extensão de 400 km, era o maior do mundo (Lower, 1986LOWER, Ann K. Engineering, Vested Interests, and Threshold Choice. Pipelines, Coal, and the Railroads. Journal of Economic Issues, vol. 20, n. 2, p.471-480, 1986., p.474).46 46 William Weber. Vitória, uma nova opção para o desenvolvimento. Jornal do Brasil, 9 mai. 1975, p.19. Mesmo com o desenvolvimento simultâneo do complexo Carajás, pela CVRD, o projeto da Samarco, construído quase completamente com equipamento fornecido pela japonesa Mitsui e finalizado em 1977, era considerado o investimento mais importante na modernização da mineração em grande escala durante o regime militar (Lopes, 1991LOPES, Lucas. Memórias do desenvolvimento. Rio de Janeiro: Centro da Memória da Eletricidade no Brasil, 1991., p.201).47 47 Samarco tem financiamento para projeto. Jornal do Brasil, 20 dez. 1974, p.18; Samitri/Marcona fazem incorporação em Minas. Jornal do Brasil, 21 out. 1972, p.17; A história da Samarco. Jornal do Brasil, 23 mai. 1975, p.9. Seu traçado não seguia mais o vale do Rio Doce, mas entrou o território capixaba pelo município de Itapemirim.

Na liderança do projeto estava um dos mais proeminentes tecnocratas na área de infraestrutura de transporte da época do regime militar, o engenheiro mineiro Eliseu Resende. Desde 1964, tinha passado por vários cargos altos em agências de planejamento viário estaduais e regionais até ser nomeado, em 1969, diretor geral do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. Nessa função, orientou projetos como a construção da ponte Rio-Niterói e da Transamazônica. Ao aceitar o cargo de diretor-presidente da Samarco, Resende passou a atuar, temporariamente, no setor privado. Concluído o projeto dutoviário, aceitou, em 1979, o convite do presidente Figueiredo para servir como ministro de transportes.48 48 Verbete Resende, Eliseu. MONTEIRO, Norma de Gois (ed.). Dicionário Biográfico de Minas Gerais, vol. 2. Belo Horizone: Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, 1994. p.575-576.

Marconaflo prometia uma verdadeira revolução no transporte de minérios industriais, precisando de menos trabalhadores, menos força motriz e de instalações portuárias mas simples e baratas. Proclamava-se a "era dos pipelines para polpa mineral" (Leite, 1984bLEITE, Daltro Barbosa. Experiência adquirida com mineroduto brasileiro para minério de ferro, parte final. Mineração e metalurgia, vol. 48, n. 456, p.32-33, 1984b., p.33). A partir de 1975, a "área dutoviária" foi tema de debates em vários encontros de engenheiros (Leite, 1984aLEITE, Daltro Barbosa. Experiência adquirida com mineroduto brasileiro para minério de ferro, parte I. Mineração e metalurgia, vol. 48, n. 455, p.43-46, 1984a., p.43). O custo era considerado dez vezes menor ao ferroviário.49 49 Samarco transportará minério com o menor custo de todo o país. Jornal do Brasil, 23 jul. 1975, p.25. De fato, era o divórcio da mineração de ferro do vale do Rio Doce e suas contingências naturais. Os técnicos destacavam a computarização das operações, o melhoramento do controle de qualidade do minério transportado, e principalmente a confiabilidade do sistema como grandes vantagens da nova tecnologia (Lara; Busse, 1979LARA, Fausto G.; BUSSE, Georg H. The Samarco Pipeline: Operation Experience Gained with an Ore Pipeline. Mitteilungen aus dem Leichtweiß-Institut für Wasserbau, vol. 67, p.53-74, 1979.). Já em 1979, quando fortes chuvas interromperam o tráfego ferroviário de todo o quadrilátero ferrífero por vários dias, o mineroduto da Samarco funcionou normalmente. Greves de operários ferroviários não ameaçavam mais o fluxo de minério - como aconteceu nos Estados Unidos, onde os ferroviários entraram em greve precisamente para protestar contra a construção de dutos para carvão em polpa.50 50 Douglas B. Feaver. Coal Slurry Pipeline Battle Ignited on Hill. Washington Post, 4 mar. 1983, p.A5.

A exportação de minério através do mineroduto da Samarco estava voltada aos mercados asiáticos. Tinha uma capacidade de transportar 12 milhões de toneladas de minério por ano, que passaram ainda por um processo de pelotização no porto de Ubu, no Espírito Santo. Somente a siderúrgica japonesa Kobe Steel se comprometeu a comprar 4,8 milhões toneladas por ano.51 51 Kobe Steel comprará minério da Samarco. Jornal do Brasil, 11 mai. 1977, p.23. O mineroduto contribuiu para a produção nacional bruta de ferro que, entre 1967 e 1987, cresceu mais de 800 por cento, chegando a 183 milhões de toneladas.52 52 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estatísticas do século XX, https://seculoxx.ibge.gov.br/ (acesso em 16 fev. 2018).

Há uma lacuna nos estudos sobre a história do mineroduto da Samarco que este artigo não pode preencher. O tema é importante, não só para uma intervenção nos debates sobre o desastre de 2015, mas também para entender as lutas atuais contra minerodutos no Brasil. O novo mineroduto Minas-Rio, da Anglo American, começou a funcionar em 2015 conectando outras jazidas que estavam fora do alcance das infraestruturas de exportação, nesse caso as jazidas de Conceição do Mato Dentro. Havia protestos contra as - previsíveis - violações ao direito humano à água nos municípios afetados pelo empreendimento, e em março de 2018 ocorreram dois vazamentos de polpa de minério na Zona da Mata mineira, parecidos com os vazamentos de polpa ocorridos no mineroduto da Samarco, entre 2006 e 2010, em municípios mineiros e capixabas. Já na década de 1970, houve críticas contra o mineroduto da Samarco, por exemplo quando o deputado da ARENA Jesús Barreto reclamou que ele "vem danificando rodovias estaduais e municipais, além de arrasar propriedades individuais".53 53 Denúncia. Jornal do Brasil, 16 dez. 1976, p.35. Os geólogos do Departamento Nacional de Produção Mineral avaliaram que "não há no mundo um projeto do vulto desse, e, se por falta de energia elétrica o sistema de bombeamento de água parar, a mistura endurecerá dentro do encanamento. Nesta hipótese, dizem, a tubulação teria que ser simplesmente desmontada".54 54 Samitri, Novo Capital. Jornal do Brasil, 25 mai. 1976, p.25. Contudo, essas críticas se referiam aos prejuízos causados pela nova infraestrutura à existente. Não questionavam nem o consumo de água - inimaginável -, nem as consequências mais gerais da expansão desfreada da frente de mineração.

Conclusão

A análise dos planos, projetos e significados que se associavam ao vale do Rio Doce em quatro momentos históricos foi uma tentativa para desenvolver uma narrativa para contar a história da Grande Aceleração. A perspectiva regional nos ajuda a entender que os complexos técnicos dessa aceleração não eram novas estruturas implantadas em espaços vazios. Emergiam de ou se sobrepunham a visões, planos e ordenamentos territoriais pré-existentes. Portanto, para compreendermos as bases concretas das cadeias produtivas que possibilitaram a Grande Aceleração, é preciso manter flexibilidade na escolha dos recortes temporais. Ao mesmo tempo, é preciso evitarmos que o foco em momentos de aceleração resulte em explicações demasiado teleológicas de eventos históricos. É correta a afirmação que o lamaçal que destruiu Bento Rodrigues e intoxicou o Rio Doce representa os custos externalizados dos padrões "modernos" e acelerados de consumo e da nossa amnésia ecológica. Mas será correto relacionar o desastre de Mariana com a construção do mineroduto na década de 1970? Por um lado, sim, considerando que, com as tecnologias convencionais de transporte, a comoditização do complexo de Alegria teria levado mais tempo e teria sido menos rentável. Assim, o caso da mina de Conceição do Mato Dentro e do mineroduto Minas-Rio é parecido. Para este complexo, será necessária a construção de barragens para rejeitos ainda maiores do que as de Mariana. Por outro lado, historicamente, os minerodutos significam a aceleração e intensificação do regime extrativista já estabelecido, não uma mudança estrutural nesse regime.

O desenvolvimento infraestrutural do vale se delineou aos poucos, no final do século XIX, embasado em um discurso colonial da missão civilizatória. A percepção da região se transformou de forma significativa com a reinterpretação das montanhas mineiras como distrito ferrífero. Se o ciclo do ouro setecentista resultara na designação do vale como "zona proibida", dessa vez o motivo dominante foi o de "abertura" - ao transporte de minério e ao desenvolvimento industrial e agrícola. Embora a EFVM se estendesse lentamente pelo vale até o distrito minerário, foi só com a mecanização das minas e o melhoramento da EFVM que se iniciou o fluxo de minério em grande escala. Especialmente nessa fase, mostra-se a coexistência de diferentes paisagens imaginadas que até se expressavam na concorrência entre os engenheiros brasileiros e americanos dentro da CVRD. Independentemente de posturas liberais ou protecionistas, o olhar brasileiro costumava ver na infraestrutura de transporte para o escoamento do minério, além da sua função exportadora, uma oportunidade para o desenvolvimento integral do vale, ou seja, para a produção do espaço, enquanto a perspectiva "de fora" geralmente privilegiava a inserção do sistema no comércio internacional, ou seja, visava a destruição do espaço. Na década de 1970, a frente minerária se deslocou, e uma parte significativa dos fluxos começou a ser transportado pelo mineroduto da Samarco. No transporte dutoviário realizava-se a tendência, inerente de muitas infraestruturas técnicas, de tornar os fluxos movidos invisíveis, contínuos e intangíveis por contingências naturais e sociais. No entanto, a dissociação de parte dos fluxos minerários do vale do Rio Doce acabou criando novos territórios de degradação e contestação socioambiental.

O Estado desempenhou um papel central no planejamento das infraestruturas que inseriram o Brasil na Grande Aceleração. Atribuía concessões, fiscalizava planos técnicos, determinava royalties e fixava regras contratuais aos quais os investidores privados tinham que se submeter - embora muitas vezes existissem maneiras informais de fazê-lo. As paisagens imaginadas que formavam a base desses projetos compunham-se de várias lógicas de atuação do Estado: "catequese" e ocupação de fronteiras, colonização e povoamento, estratégia militar, incremento das finanças públicas. Contudo, por muito tempo a capacidade do Estado de implementar tais planejamentos foi limitada. Assim como em outros setores e em outras regiões, com a Segunda Guerra Mundial se abriram novas possibilidades devido a circunstâncias internas e externas: por um lado, o fortalecimento das agências técnicas e do poder dos quadros técnicos do Estado e, por outro lado, a aliança estratégica com os Aliados contra o Eixo. No entanto, é importante lembrar que a história da Grande Aceleração deve considerar também o papel das empresas e dos investidores. Estes tinham lógicas próprias de imaginar paisagens e muitas vezes dispunham de práticas mais eficientes para produzir os saberes e delinear as ordens espaciais associadas com os fluxos materiais acelerados.

  • 1
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  • 36
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  • 38
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  • 39
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  • 40
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  • 41
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  • 50
    Douglas B. Feaver. Coal Slurry Pipeline Battle Ignited on Hill. Washington Post, 4 mar. 1983, p.A5.
  • 51
    Kobe Steel comprará minério da Samarco. Jornal do Brasil, 11 mai. 1977, p.23.
  • 52
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    18 Fev 2018
  • Revisado
    09 Abr 2018
  • Aceito
    12 Abr 2018
Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos, 6627 , Pampulha, Cidade Universitária, Caixa Postal 253 - CEP 31270-901, Tel./Fax: (55 31) 3409-5045, Belo Horizonte - MG, Brasil - Belo Horizonte - MG - Brazil
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