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Solidificação da zona de fusão na soldagem do AISI 304 com inconel 600 por laser de Nd: YAG

Microstructure development in Nd: YAG laser welding of AISI 304 and Inconel 600

Resumos

Neste trabalho estudou-se a morfologia de solidificação da zona de fusão, numa junta formada a partir de materiais dissimilares, composta por aço inoxidável austenítico AISI 304 e por liga de níquel Inconel 600, soldada com laser pulsado de Nd:YAG. Os parâmetros do feixe laser e do sistema óptico foram selecionados, visando obter uma solda com penetração total e bom acabamento superficial. A caracterização microestrutural foi realizada por microscopia ótica, onde se observou uma zona de fusão com penetração total do tipo keyhole, a presença de pequenos poros e a ausência de trincas. As juntas soldadas foram caracterizadas também, por meio de microscopia eletrônica de varredura (MEV). Medidas realizadas por espectrometria de raios X por dispersão de energia na zona de fusão indicaram uma distribuição levemente heterogênea de níquel e ferro. Observou-se que o início de solidificação da zona de fusão ocorreu por meio de crescimento epitaxial. A morfologia de solidificação da ZF foi basicamente dendrítica e celular sendo, influenciada pelo gradiente de temperatura, velocidade de solidificação e composição química. As variações de composição química e da morfologia de solidificação não alteraram significativamente os valores de microdureza Vickers na zona de fusão. Resultados obtidos nos ensaios de tração indicaram valores de eficiência de soldagem adequados.

Soldagem a Laser de Nd:YAG; Aço inoxidável AISI 304; Inconel 600; Materiais Dissimilares


An autogenous laser welding of dissimilar materials involving AISI 304 austenitic stainless steels and Inconel 600 nickel alloy was investigated in this study. Hence, the aim of this investigation was to study the solidification and microstructure of fusion zone when using a pulsed Nd:YAG laser. The laser and optical beam parameters were chosen to achieve a good weld with total penetration. Optical microscopy pictures showed a typical keyhole weld with total penetration, small pores and free of cracks. The x-ray spectrometry by energy dispersion (EDX) carried out in the melting zone showed a heterogeneous distribution of the nickel and iron. Fusion zone solidification began by epitaxial growth of the base metal along the fusion boundary. The solidification behavior is influenced by thermal gradient, solidification rate and chemical composition. The results of Vickers microhardness carried out in the joint were reasonably homogeneous. Tensile strength measurements showed high values of weld efficiency.

LBW process; AISI 304 Stainless steel; 600 Inconel; Dissimilar Materials


ARTIGOS TÉCNICOS

Solidificação da zona de fusão na soldagem do AISI 304 com inconel 600 por laser de Nd:YAG

Microstructure development in Nd:YAG laser welding of AISI 304 and Inconel 600

Maurício David M. das NevesI; André LottoII; José Roberto BerrettaIII; Wagner de RossiIV; Nilson Dias V. JúniorIV

IInstituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - IPEN-CNEN/SP, Centro de Ciência e Tecnologia de Materiais (CCTM), São Paulo, São Paulo, Brasil, mdneves@ipen.br

IICentro Universitário da Faculdade de Engenharia Industrial de S. B. C

IIICTMSP - Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo

IVInstituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, Centro de Lasers e Aplicações (CLA)

RESUMO

Neste trabalho estudou-se a morfologia de solidificação da zona de fusão, numa junta formada a partir de materiais dissimilares, composta por aço inoxidável austenítico AISI 304 e por liga de níquel Inconel 600, soldada com laser pulsado de Nd:YAG. Os parâmetros do feixe laser e do sistema óptico foram selecionados, visando obter uma solda com penetração total e bom acabamento superficial. A caracterização microestrutural foi realizada por microscopia ótica, onde se observou uma zona de fusão com penetração total do tipo keyhole, a presença de pequenos poros e a ausência de trincas. As juntas soldadas foram caracterizadas também, por meio de microscopia eletrônica de varredura (MEV). Medidas realizadas por espectrometria de raios X por dispersão de energia na zona de fusão indicaram uma distribuição levemente heterogênea de níquel e ferro. Observou-se que o início de solidificação da zona de fusão ocorreu por meio de crescimento epitaxial. A morfologia de solidificação da ZF foi basicamente dendrítica e celular sendo, influenciada pelo gradiente de temperatura, velocidade de solidificação e composição química. As variações de composição química e da morfologia de solidificação não alteraram significativamente os valores de microdureza Vickers na zona de fusão. Resultados obtidos nos ensaios de tração indicaram valores de eficiência de soldagem adequados.

Palavras-chave: Soldagem a Laser de Nd:YAG; Aço inoxidável AISI 304; Inconel 600; Materiais Dissimilares.

ABSTRACT

An autogenous laser welding of dissimilar materials involving AISI 304 austenitic stainless steels and Inconel 600 nickel alloy was investigated in this study. Hence, the aim of this investigation was to study the solidification and microstructure of fusion zone when using a pulsed Nd:YAG laser. The laser and optical beam parameters were chosen to achieve a good weld with total penetration. Optical microscopy pictures showed a typical keyhole weld with total penetration, small pores and free of cracks. The x-ray spectrometry by energy dispersion (EDX) carried out in the melting zone showed a heterogeneous distribution of the nickel and iron. Fusion zone solidification began by epitaxial growth of the base metal along the fusion boundary. The solidification behavior is influenced by thermal gradient, solidification rate and chemical composition. The results of Vickers microhardness carried out in the joint were reasonably homogeneous. Tensile strength measurements showed high values of weld efficiency.

Key-words: LBW process; AISI 304 Stainless steel; 600 Inconel; Dissimilar Materials

1. Introdução

Diversas aplicações de soldagem de materiais dissimilares utilizando a interface aço inoxidável AISI 304 e inconel 600 têm sido desenvolvidas em vários segmentos [1]. Utilizações recentes de motores de apogeu instalados em satélites artificiais têm gerado uma demanda cada vez maior por injetores de alta confiabilidade, baixo peso e reduzido consumo de energia. Estes injetores, conforme pode ser observado na figura 1, devem possuir excelente estanqueidade, elevada precisão dimensional e alta complexidade geométrica e, portanto, devem ser produzidos por uma técnica de soldagem, que propicie uma pequena zona afetada pelo calor (ZAC).


Sensores de pressão de diferentes geometrias são utilizados em usinas químicas e petroquímicas, com o objetivo de controlar fluxos, pressões e outros parâmetros, em tubulações e tanques de armazenamento. A função básica desses sensores é fornecer informações sobre os processos, facilitando sua automação. A soldagem de fechamento (selamento) é uma etapa crítica de fabricação e deve ocorrer sem distorção acentuada. Estas uniões, normalmente, de materiais dissimilares devem apresentar elevada estanqueidade e suportar condições agressivas. Usinas nucleares que utilizam tubulações com as interfaces inconel e aço inoxidável, também, devem ser unidas por processos, que possibilitem reduzida zona afetada pelo calor e pequena presença de tensões residuais.

Autilização da soldagem a laser para estas e outras aplicações [2, 3] tem crescido nos últimos anos, uma vez que, o processo propicia soldas precisas, elevada relação penetração / largura do cordão, pequena ZAC e reduzida distorção dos materiais de base.

A soldagem de MB similares ou dissimilares realizada com processo laser forma uma região denominada por zona de fusão (ZF). No caso da soldagem de materiais dissimilares, diferenças de composição química da ZF podem provocar em serviço, um comportamento mecânico e metalúrgico distinto dos MB. Alguns fatores podem ser responsáveis por falhas nestas soldas, tais como: formação de fases frágeis e solubilidade limitada de um constituinte ou fase das ligas, diferenças nos pontos de fusão, condutividade térmica distintas, característica inicial de solidificação da ZF (crescimento epitaxial) e alterações na morfologia de solidificação [4].

O processo de solidificação da ZF ocorre pelos mecanismos de nucleação e crescimento de novas fases, a partir de uma interface sólido-líquido. O início de solidificação da zona de fusão pode acontecer de três formas distintas, respectivamente, nucleação homogênea, nucleação heterogênea e crescimento epitaxial. Na figura 2 são mostrados esquematicamente, os vários tipos do início de crescimento de uma ZF. A forma de crescimento da fase sólida na ZF está ligada às tensões superficiais do líquido e do sólido, conforme pode ser observado na figura 3, que determinam o ângulo de molhamento (θ), vide equação 1. Sem molhamento ou ângulo de molhamento (θ) próximo de 180º ocorre nucleação homogênea, este crescimento é o mais raro de ocorrer e necessita de elevado super-resfriamento. Para um ângulo de molhamento próximo de 90º ocorre nucleação heterogênea, isto é, uma superfície sólida atua como núcleo de solidificação para o líquido em contato [4].



Um ângulo de molhamento próximo de 0º, ou seja, molhamento total provoca crescimento epitaxial, onde a energia de ativação é praticamente nula e não é necessário um superresfriamento. Nesta forma de solidificação as superfícies sólidas são formadas em menor quantidade, portanto, menor energia é necessária, em relação às mencionadas anteriormente (nucleação homogênea e heterogênea). Os átomos aderem ao substrato existente favorecendo seu crescimento. Este tipo de solidificação ocorre normalmente, quando um líquido solidifica-se sobre um substrato de composição química e estrutura cristalina similar, como a observada em soldas [5, 6].

O início de solidificação da ZF na soldagem de MB (materiais de base) similares ocorre por meio do crescimento epitaxial. No caso da soldagem de materiais dissimilares, o início da solidificação da ZF pode ocorrer por meio do crescimento epitaxial. Diversos estudos sobre a soldagem de MB dissimilares confirmam que, o início da solidificação da ZF ocorre por meio do crescimento epitaxial, a partir do substrato (sólido) e prossegue com o crescimento competitivo dos grãos em direção à região central da solda [7-10].

O crescimento epitaxial é um fenômeno, no qual os grãos da zona de fusão crescem com a mesma orientação cristalina dos grãos da ZAC. A força motriz necessária para a nucleação dos novos grãos é baixa, uma vez que a barreira termodinâmica para a solidificação é praticamente eliminada. Portanto, cada um desses novos grãos se solidifica, ao longo da mesma direção cristalográfica dos grãos da ZAC. Esta redução da energia livre é consequência da redução na energia de interface, que é efetivamente alcançada se o sólido se formar sobre outra superfície com orientação cristalina similar, como no crescimento epitaxial [11-13].

Depois de iniciada a solidificação em direção ao centro da ZF, o crescimento dos grãos prossegue na direção paralela ao máximo gradiente de temperatura, favorecendo um crescimento competitivo de grãos. Os grãos com orientação favorável à direção do máximo gradiente de temperatura apresentam maior crescimento em relação, aos grãos que coincidem com direções menos favoráveis. A direção de crescimento preferencial nos materiais cúbico de corpo centrado (CCC) e cúbico de fase centrada (CFC) é a <100> [5, 14, 15]. Na figura 4 podem ser observadas esquematicamente as presenças do crescimento epitaxial e do crescimento competitivo dos grãos.


O crescimento epitaxial é benéfico nas soldagens, pois propicia na ZF uma continuidade dos grãos a partir do metal de base. Portanto, evita-se que a zona de ligação (interface ZF-ZAC) se torne uma região de concentração de tensões.

Nas soldagens, normalmente, é realizada uma limpeza das superfícies, para facilitar aderência do metal líquido no MB. A conseqüência é uma maior interação do MB com metal líquido da zona de fusão.

A morfologia de solidificação da zona de fusão (ZF) é controlada basicamente pelo grau do super-resfriamento constitucional, que depende de: gradiente térmico, velocidade de solidificação e concentração de soluto na fase sólida e líquida (S-L). O gradiente térmico (G) é a variação de temperatura no líquido em relação à distância, a partir da interface sólidolíquido (S-L). A velocidade de solidificação (R) está relacionada ao avanço da interface sólido-líquido e esta por sua vez depende da variação na temperatura liquidus [4].

O super-resfriamento constitucional ocorre na solidificação de uma liga, em razão da composição química da fase sólida ser diferente da composição química da fase líquida. A solubilidade do soluto na fase sólida é menor do que na fase líquida. Portanto, existe um gradiente de concentração de soluto da interface sólido-líquido para o metal líquido. A variação de concentração provoca uma diminuição da temperatura liquidus, facilitando a solidificação numa direção, contribuindo para um superresfriamento constitucional a partir da interface (S-L).

Diferentes modos de solidificação podem ocorrer na ZF, tais como: planar, celular, celular dendrítico, colunar dendrítico e dendrítico equiaxial. Na figura 5a estão representados esquematicamente, as várias morfologias de crescimento, em relação, ao gradiente de temperatura imposto no resfriamento (G) e a velocidade de avanço da interface sólido-líquido (R). Pode-se observar um aumento gradual do super-resfriamento constitucional, representado pela área entre a linha líquidus (temperatura "liquidus") e a linha do gradiente térmico imposto, em relação à redução do gradiente térmico, conforme figura 5b. No crescimento planar, o super-resfriamento constitucional é praticamente nulo, e seu valor vai aumentando do crescimento celular para o dendrítico.


Valores baixos de R e elevados de G, como ocorrem no início da solidificação favorecem uma morfologia de solidificação planar à frente da interface S-L [8]. Conforme a frente avança na direção do centro da ZF, o valor de R se eleva rapidamente, resultando numa transição de morfologia planar para celular ou dendrítica. Cada grão possui uma orientação cristalográfica única, que coincide com a direção do eixo principal da dendrita [16].

Utiliza-se a relação , mostrada na figura 5a, para estudar o modo de solidificação. Um valor baixo desta relação significa que, o líquido está super-resfriado constitucionalmente e o crescimento dendrítico da interface é estável para uma determinada porcentagem de soluto. Por outro lado, para valores elevados, o líquido não está super-resfriado constitucionalmente e favorece o crescimento planar da interface.

O aumento do gradiente de temperatura (G) está relacionado com a diminuição da região super-resfriada constitucionalmente, favorecendo crescimento planar. Quando o gradiente é diminuído, a região super-resfriada é maior e a tendência é beneficiar um crescimento dendrítico, conforme representado nas figuras 5a e 5b.

Altas densidades de energia fornecidas pelo feixe laser geram elevados gradientes de temperatura, da ordem de 105 a 107 K/m, que permitem usar altas velocidades de soldagem (1 a 100 mm/s). Estudos realizados nestas condições indicam que, as morfologias de solidificação do AISI 304 [16-18] e do Inconel 600 [19, 20] devem ser dendríticas ou celular-dendríticas e ZAC totalmente austenítica. O processo laser possui uma alta concentração de energia, assim os parâmetros R e G são elevados. A relação G.R que indica a velocidade de resfriamento da ZF possui um elevado valor, favorecendo a solidificação com uma microestrutura fina e pode propiciar melhores propriedades mecânicas nestas regiões fundidas [15, 16].

O objetivo deste trabalho é estudar as características microestruturais e mecânicas das regiões denominadas por zona de fusão (ZF) e zona de ligação (ZL) na soldagem com laser pulsado de Nd:YAG, entre aço inoxidável austenítico AISI 304 e a liga de Inconel 600.

2. Materiais e Métodos

2.1. Materiais

As composições químicas dos materiais de base estão apresentadas na tabela 1.

2.2. Metodologia

As soldagens dos materiais foram realizadas em um equipamento desenvolvido no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), denominado de central de processamento de materiais a laser (CPML). O laser empregado foi de Nd:YAG, do tipo pulsado, com energia por pulso de até 10 J, taxa de repetição maior que 300 Hz, potência média de 100 W e potência pico de 3 KW. As amostras foram preparadas a partir de chapas de 0,8 mm de espessura, cortadas nas dimensões de 20 mm x 50 mm. Os materiais foram soldados e montados em um dispositivo desenvolvido, conforme mostrado na figura 6, para auxiliar no posicionamento e fixação.


As juntas dos MB foram de topo com folga próxima a zero. Os parâmetros do laser foram: energia (E) = 6,0 J, potência média (Pm) = 84 W, tempo de pulso (tp) = 7 ms (7.10 -3 s) e freqüência (f) = 14 Hz. O feixe laser foi focalizado por uma lente de comprimento focal (f) = 100 mm, e o ponto focal ficou localizado a 3 mm abaixo da superfície do MB, portanto fora do MB. Os cordões de solda foram executados em passe único, com velocidade de soldagem (v) = 300 mm/min (5 mm/s) e sobreposição parcial dos pulsos de 30% [1]. Utilizou-se proteção gasosa de argônio (10 l/min); soprado por um bocal com 6 mm de diâmetro, concêntrico ao feixe e distante 4 mm das superfícies.

As amostras soldadas foram cortadas nas seções transversal e longitudinal. Após a preparação metalográfica e ataque eletroquímico, as amostras foram caracterizadas por microscopia ótica (MO) e eletrônica de varredura (MEV). A caracterização por MO foi realizada nos laboratórios de Metalurgia do Pó do IPEN e no LabMat do Centro Universitário da Faculdade de Engenharia Industrial (FEI). Utilizou-se o microscópio eletrônico de varredura (Philips XL 30) alocado no IPEN, para observação da interface ZF/ZAC e verificação da distribuição dos elementos (Fe, Cr e Ni) na ZF. O perfil de microdureza Vickers, em relação à distância foi obtido num equipamento Shimatzu alocado na FEI. As medidas foram realizadas com carga de 40 gramas na superfície da amostra, com posicionamento similar à análise por espectrometria de raios X por dispersão de energia (EDX). Realizaram-se ensaios de tração e determinou-se a eficiência da soldagem, calculada em porcentagem, como sendo o quociente entre a carga de ruptura da junta soldada pela carga de ruptura do material base.

3. Resultados e Discussão

As análises realizadas por microscopia ótica (MO) da seção dos cordões de solda estão apresentadas nas figuras 7 e 8. Na figura 7a é observada uma imagem característica da geometria da seção transversal da zona de fusão. Nas condições empregadas neste estudo observa-se uma penetração total de soldagem e a geometria típica por "keyhole", isto é, elevada relação profundidade / largura. Na figura 7b observam-se perfis da distribuição dos elementos na zona de fusão, quando o feixe laser (L) está posicionado na junta (J). Verifica-se a existência de gradientes de concentração na zona de fusão, em especial níquel e ferro em conseqüência das diferenças de composição química dos materiais de base. As distribuições dos elementos níquel e ferro são razoavelmente, homogêneas na região central da ZF, enquanto próximo da interface ocorrem maiores diferenças de composição.



 




Nas figuras 8a, 8b e 8c conseguidas por MO e figura 8d obtida por MEV verifica-se que a microestrutura da ZF é fina, em conseqüência da alta velocidade de solidificação e de resfriamento, sendo gerada pela elevada taxa de extração de calor da junta soldada. Pode ser observada a presença de pequenos poros com dimensões inferiores a 20 µm (20.10-6 m), atribuída a penetração por keyhole. Não é observada a presença de trincas na ZF, independentemente da região analisada estar próxima da interface com o AISI 304 ou do inconel 600.

Nas figuras 8c e 8d são observadas imagens da seção longitudinal da ZF. A penetração da solda é total e homogênea, apesar de na figura 8c sugerir uma penetração heterogênea. Este efeito é causado pelo corte inclinado da seção analisada para facilitar a observação da região onde ocorre a penetração total. Observa-se que, a sobreposição dos pontos obtida pelos pulsos do feixe laser é uniforme nas condições empregadas.

Nas figuras 9 e 10 são mostradas imagens obtidas por MO e nas figuras 11 e 12 são observadas imagens conseguidas por MEV. A maioria destas imagens é da interface ZF/ZAC, também conhecido por zona de ligação (ZL). Observa-se que, a solidificação da poça de fusão começa com o crescimento epitaxial dos grãos da zona parcialmente fundida, ao longo da interface sólido-líquido, conforme pode ser verificado nas figuras 9 a 12. O metal líquido da ZF solidifica-se formando uma continuação dos grãos do metal de base. Apesar das diferenças de composição química, conforme figura 7b verificam-se evidências de crescimento epitaxial, isto é, não existe uma perda de correlação entre a direção dos novos grãos da ZF com os grãos do MB.





Na ZF, uma baixa velocidade de solidificação e um elevado gradiente de temperatura no início de solidificação da ZF favorecem a frente planar de solidificação. Depois da solidificação inicial, a interface S-L avança para o centro e a velocidade de solidificação aumenta, em relação, ao início de solidificação da ZF, resultando numa transição da frente de solidificação de planar para celular, celular-dendrítica ou dendrítica.

Observa-se que cada grão da ZF apresenta uma orientação cristalográfica, na qual coincide com a orientação das dendritas ou células, conforme observada nas figuras 9 a 12. As dendritas que apresentam menor ângulo entre o eixo principal e a direção do máximo gradiente de temperatura possuem maior velocidade de crescimento e cessam o crescimento de outros grãos, em especial daqueles que não tem orientação favorável.

O início de crescimento da ZF ocorre de forma epitaxial assim, é importante que os grãos da ZAC tenham menor tamanho, para gerar menor tamanho de grão na zona de fusão O crescimento epitaxial é benéfico para a solda, pois proporciona uma continuidade dos grãos existentes no MB, reduzindo regiões com a presença de concentradores de tensões na solda, em especial as trincas [16].

A microestrutura típica da ZF é mostrada na figura 13. Podese observar que a morfologia de solidificação da ZF é basicamente dendrítica nas áreas de maior profundidade do pulso, conforme regiões inferiores da figura 13. Enquanto nos locais de menor profundidade do passe, vide regiões na parte superior da figura, a microestrutura tende para celular ou celular-dendrítica.


No caso da interface com o aço inoxidável, a ZF solidifica-se como dendritas de ferrita δ, que é estabilizada pelos teores superiores de cromo e ferro nesta região, conforme mostrado na figura 7b e na tabela 1. O níquel é rejeitado para o líquido estabilizando a formação da fase sólida austenítica (γ). Ocorre uma reação de estado sólido da ferrita-δ para austenita-γ, mas permanece um pequeno teor residual de ferrita δ na temperatura ambiente. A presença de ferrita-δ indicada na figura 13 está associada à maior porcentagem localizada de cromo na matriz medida por EDX, facilitando a estabilização desta fase metaestável na temperatura ambiente. Na interface da ZF com o inconel, a solidificação prossegue pelo crescimento das dendritas de austenita, que é estabilizada pelo alto teor de níquel nesta região, como mostrado na figura 7b. Portanto, a ZF é composta apenas por uma fase austenítica nas regiões próximas da interface do inconel e com a aproximação da interface do aço inoxidável pode ocorrer a presença de ferrita δ.

Após o crescimento epitaxial, a velocidade de avanço da interface S-L (R) mantém um valor praticamente constante [14], modificações no gradiente de temperatura e na composição química provocam alterações na morfologia de solidificação. O tamanho da célula ou da dendrita é determinado pela relação G . R (velocidade de resfriamento). Na figura 15 observa-se uma microestrutura fina com espaçamentos de células ou dendritas próximos a 30 µm.

Outro fator que altera a morfologia da ZF é o efeito provocado por um pulso do laser, sobre a área de incidência do pulso anterior. A sobreposição dos pulsos de 30 %, conforme observado nas figuras 8c e 8d, provoca mudanças na morfologia de solidificação da ZF. As alterações de morfologia e tamanho das células ou dendritas podem ser observadas na figura 13. O reaquecimento provoca alterações nos parâmetros G, R e na composição química local. A microestrutura da região sobreposta ao pulso do laser é reaquecida e refundida e pode ser observada que a morfologia passa de dendrítica para celular-dendrítica, indicando uma maior velocidade de resfriamento desta região.

Algumas propriedades mecânicas obtidas a partir de ensaios de tração estão mostradas na tabela 2. Nesta tabela são mencionadas: carga máxima suportada pela junta soldada, carga máxima suportada pelos materiais de base, deformação e eficiência de solda. Segundo Souza [21], a carga de ruptura é o valor que deve ser registrado em soldas com a presença de descontinuidades. Pode-se medir também a eficiência da solda em porcentagem, a partir da relação entre a carga máxima sustentada na junta soldada pela carga máxima suportada pelo MB de menor resistência. A carga máxima suportada pelo material de base de menor resistência mecânica, que corresponde ao aço AISI 304 é de 687,9 kgf (6879 N) e a carga máxima de ruptura da junta é de 617,9 kgf (6179 N), conforme a tabela 2. Portanto, a eficiência de solda nestas condições é próxima de 90 %. A deformação da junta soldada apresenta valor inferior ao obtido nos MB, em consequência da presença de poros e outras possíveis descontinuidades não detectadas, além da presença de estrutura bruta de fusão.

Medidas de microdureza Vickers realizadas na zona de fusão conduzem ao valor médio de (205±19) HV. A variação de composição química e a morfologia de solidificação não provocam alteração significativa do perfil de microdureza Vickers ao longo da seção transversal da junta soldada.

4. Conclusões

Nas condições usadas na soldagem a laser as profundidades de penetração são praticamente totais e constantes.

Observa-se a presença de crescimento epitaxial no início da ZF, nos lados do aço AISI 304 e inconel 600.

Existe um gradiente de concentração dos elementos ferro e níquel na ZF.

A morfologia de solidificação das juntas é basicamente dendrítica e celular-dendrítica

A morfologia de solidificação da ZF é alterada pelas condições de resfriamento, composição química e sobreposição dos pulsos.

A variação dos valores de microdureza Vickers na ZF não é elevada.

Nas condições empregadas a eficiência de soldagem, aproximadamente, de 90 % indica um comportamento da união similar aos materiais de base.

5. Agradecimentos

Ao Centro Universitário da FEI pelo auxílio financeiro ao bolsista de IC André Lotto. Ao técnico MSc. Luis Carlos Elias da Silva e ao bolsista Luis Gustavo C. de Oliveira ambos do IPEN pela colaboração em geral durante este trabalho. Ao CNPq pelo apoio financeiro.

6. Referências bibliográficas

(Recebido em 09/04/2008; Texto Final em 02/02/2009).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Nov 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2009

Histórico

  • Recebido
    09 Abr 2008
  • Aceito
    02 Fev 2009
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