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Influência da Posição e dos Parâmetros de Soldagem na Soldagem TIG Orbital Aplicada a Tubulações de Aço Baixo Carbono

Influence of Orbital TIG Welding Position and Welding Parameters Applied to Low Carbon Steel Pipes

Resumo

A característica mais marcante da soldagem TIG Orbital é a constante alteração na posição de soldagem enquanto a tocha acompanha o perfil geométrico dos tubos. No contexto da soldagem TIG orbital de tubos de grande diâmetro e paredes espessas, é investigada a relação entre a posição de soldagem, uso de corrente constante ou pulsada e ainda valor da corrente média nas características geométricas dos cordões obtidos. Foram realizadas soldas de deposição em tubos de aço carbono SAE 1020, bem como macrografias das seções transversais dos cordões via microscopia óptica. Filmagens em alta definição contribuíram para a compreensão do comportamento da poça de fusão nas diferentes posições de soldagem. As características geométricas foram quantificadas através das macrografias com o uso de um software e foi traçada a relação destas com as variáveis citadas. Além disso, foi feita uma análise microestrutural das amostras, correlacionando com a microdureza Vickers. Concluiu-se que cordões soldados com corrente pulsada apresentam maiores reforço e largura, bem como maior dureza e microestrutura mais refinada. A posição vertical ascendente resulta em cordões com menor fator de forma e maior penetração, e a posição sobre cabeça resulta em cordões de baixo fator de forma.

Palavras-chave:
Posição de soldagem; TIG orbital; Penetração; Fator de forma

Abstract

The most important characteristic of TIG Orbital welding is the constant change in weld position while the torch follows the geometric profile of the pipes. In this context, large diameter and thick wall pipes orbital TIG welds were investigated, by studying the relation between the welding position, use of constant or pulsed current and magnitude of welding current and the resulting geometric characteristics. Weld beads were made on SAE 1020 carbon steel pipes, as well as transversal section macrographs via optical micrograph. High definition filming contributed to comprehension of the weld pool trend on different welding positions. Geometric characteristics were quantified through the macrographs by using software, and its relations with the cited variables were made. Besides that, a microstructural analysis was made, comparing it to Vickers micro hardness. One could conclude that beads made with pulsed current had higher reinforcement and width, as well as higher hardness and a finer microstructure. The ascendant vertical position resulted in low reinforcement form factor and higher penetration, and the overhead position results in low reinforcement form factor beads.

Key-words:
Welding position; Orbital TIG; Penetration; Reinforcement factor form

1 Introdução

Nos últimos anos, o Brasil tem apresentado crescimentos constantes no número de reservas provadas de petróleo e gás natural [11 Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Anuário estatístico brasileiro do petróleo, gás natural e biocombustíveis. Rio de Janeiro: ANP; 2014.]. Esse intenso crescimento nas reservas demanda a construção de dutovias para o transporte tanto do petróleo cru como de seus derivados. A construção dessas linhas dutoviárias representa um alto custo, principalmente devido ao tempo que demandam para ser construídas [22 Carvalho RS, Dutra JC, Bonacorso NG. Desenvolvimento de um manipulador robótico para a soldagem orbital. In: Rio Oil & Gas Expo and Conference; 2008 Setembro 15-18; Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis; 2008. p. 2-8.]. A soldagem TIG orbital é um processo para soldagem de tubos que proporciona qualidade, reprodutibilidade e produtividade [33 Cunha TV, Dutra JC. Desenvolvimento de um sistema de soldagem orbital de tubos: concepção do equipamento. In: Anais do 4° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Petróleo e Gás; 2007 Outubro 21-14; Campinas. Campinas: Associação Brasileira de P&D em Petróleo e Gás; 2007.]. Nesse processo, a tocha de soldagem é posicionada de maneira a acompanhar o perfil geométrico dos tubos a serem soldados, permanecendo estes estacionários [33 Cunha TV, Dutra JC. Desenvolvimento de um sistema de soldagem orbital de tubos: concepção do equipamento. In: Anais do 4° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Petróleo e Gás; 2007 Outubro 21-14; Campinas. Campinas: Associação Brasileira de P&D em Petróleo e Gás; 2007.,44 Lukkari J. Orbital-TIG – a great way to join pipes. The ESAB Welding and Cutting Journal. 2005;60(01):3-6.]. Essa configuração gera uma peculiaridade que é característica da soldagem orbital: a posição de soldagem é alterada constantemente durante o processo, fazendo com que estudos sobre o efeito da posição sejam importantes para o sucesso da aplicação. A soldagem orbital permite velocidades de soldagem relativamente altas e pode ser executada em ambientes cujo espaço é limitado, além de, por se tratar de um processo automatizado, garantir baixos níveis de defeitos [44 Lukkari J. Orbital-TIG – a great way to join pipes. The ESAB Welding and Cutting Journal. 2005;60(01):3-6.

5 Ribeiro JCB, Silva RG. Desenvolvimento de procedimentos de soldagem TIG e análise de diferentes parâmetros para a soldagem de raiz em tubos de aço API 5L grau A. In: Anais do 37° Congresso Nacional de Soldagem; 2011 Outubro 3-6; Natal. São Paulo: Associação Brasileira de Soldagem; 2011.

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7 Latifi H. Advanced orbital pipe welding [tese de douttorado]. Lappeenranta: Lappeenranta University of Technology; 2012.
-88 Pigozzo IO. Soldagem TIG orbital: otimização de equipamentos e prospecções tecnológicas para procedimentos de passe de raiz [dissertação de mestrado]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2015.].

Além do setor de óleo e gás, esse processo encontra aplicabilidade no setor aeroespacial devido à grande responsabilidade relacionada às soldas submetidas às altas pressões, fazendo-se necessário alto nível de qualidade e reprodutibilidade, difíceis de serem alcançados por processos de soldagem manuais [99 Fronius International GmbH. Orbital welding facts. Wels, Austria: Polysoude Nantes Frankreich SAS; 2010. v. 2. 52 p.

10 Samardzic I, Despotovic B, Klaric S. Automatic pipe butt welding processes in steam boiler production. Welding World. 2007;51(07):615-624.

11 Garcia JAO, Lima GL, Pereira WDB, Guimarães VA, Moura C No, Paranhos RPR. Characterization of titanium welded joints by the orbital gas tungsten arc welding process for aerospace application. Journal of Aerospace Technology and Management. 2010(2),2:211-218. http://dx.doi.org/10.5028/jatm.2010.02026710.
http://dx.doi.org/10.5028/jatm.2010.0202...
-1212 Garcia JAO, Dias NS, Lima GL, Pereira WDB, Nogueira NF. Advances of orbital gas tungsten arc welding for Brazilian space applications - experimental setup. Journal of Aerospace Technology and Management. 2010;02(02):203-210. http://dx.doi.org/10.5028/jatm.2010.02026610.
http://dx.doi.org/10.5028/jatm.2010.0202...
].

O presente trabalho tem como objetivo estudar a influência das posições de soldagem, da corrente média e do uso de corrente constante ou pulsada nas características geométricas dos cordões, como reforço, largura, penetração e fator de forma, bem como realizar uma análise microestrutural.

2 Materiais e Métodos

Para soldagem TIG orbital foram utilizados tubos de aço baixo carbono SAE 1020 com 16” (406,4 mm) de diâmetro e 1/2” (12,7 mm) de espessura seccionados em anéis de aproximadamente 200 mm de largura. O arame de adição foi o AWS ER70S-6 com 1,2 mm de diâmetro e gás de proteção argônio de pureza 99,99%. As composições químicas típicas do material base e do arame de adição (certificado de qualidade) são mostradas na Tabela 1. Foi utilizada uma fonte IMC Digi PLUS A7, tocha TIG Abicor Binzel série AUT-WIG 400 W e eletrodo de tungstênio EW Ce-2, diâmetro de 3,2 mm e ângulo de afiação de 30º.

Tabela 1
Composição química típica do metal base e do arame de adição (%. p.).

A metodologia consistiu em levantar uma curva característica estática através de ensaios preliminares, para conhecer possíveis erros sistemáticos da fonte e, principalmente, a tensão de referência do AVC (Automatic Voltage Control ). Em seguida, foram executados ensaios a fim de determinar uma relação velocidade de arame / potência (va/Pot) que garantisse alimentação contínua de metal de adição na poça de fusão. Na ocorrência de alimentação descontínua (pela ocorrência de destacamentos), a velocidade de alimentação foi aumentada (aumentando assim a relação va/Pot). Por outro lado, quando o arame atingia a poça de fusão ainda sólido, diminuiu-se a velocidade de alimentação (diminuindo a relação va/Pot). A característica desejada de alimentação contínua foi encontrada de maneira empírica, entre esses dois limites citados. A relação foi calculada a partir da Expressão 1, como segue:

( v a P o t ) = 60 × v a P o t (1)

onde (va/Pot) é a relação velocidade de arame/potência, a ser calculada, em unidades de [m.J-1], va é a velocidade de alimentação de arame em [m.min-1] e Pot é a potência do arco em [W].

Realizados os ensaios preliminares, foram depositados cordões de solda sobre os tubos, separadamente nas quatro posições de soldagem (vertical ascendente, plana, vertical descendente e sobre cabeça), e com diferentes valores de corrente de soldagem, incluindo o uso de corrente constante e pulsada. A parametrização utilizada encontra-se na Tabela 2.

Tabela 2
Parametrização dos ensaios em corrente constante e corrente pulsada.

A poça de fusão nas diferentes posições de soldagem foi investigada com o uso de uma câmera digital Canon 60D com lente da mesma marca, referência EF 180mm F/4L macro, munida de filtro passa-banda de 650 nm.

A preparação metalográfica das amostras para macrografia e micrografia consistiu em lixamento com lixas d’água de granulometrias de 320, 400, 600 e 1200 mesh, seguido de polimento em pasta de diamante de granulometria de 1µm. As micrografias foram feitas após ataque químico com Nital 3%, usando um microscópio óptico Olympus modelo BX51M e software de captura e análise de imagem Analysis 5.1. Para a análise macrográfica foi utilizado o ataque químico com Nital 6%. As características geométricas, conforme mostrado na Figura 1, foram medidas com o auxílio do software ImageJ . Além das características geométricas mostradas na Figura 1, foi calculado o fator de forma, definido como a razão entre largura e reforço da seção transversal do cordão.

Figura 1
Características geométricas medidas nas macrografias, onde: L: largura do cordão; ZTA: área da zona termicamente afetada; AP: área de penetração; P: penetração linear; AR: área de reforço; R: reforço linear.

Ensaios de microdureza Vickers foram realizados, usando o microdurômetro Insize modelo ISH – TDV 1000, com penetrador de diamante de base quadrada e ângulo de 136º. Foi utilizada uma carga de 500 gf e tempo de permanência de 15 segundos, com as indentações sendo feitas a partir do metal de base em direção à zona fundida em intervalos de 0,5 mm entre si.

3 Resultados e Discussão

Ensaios preliminares permitiram encontrar uma relação va/Pot que garantisse uma alimentação contínua de metal. A relação encontrada foi da ordem de 1,2x10–5 m.J–1, com variações menores que 3,4% entre as posições de soldagem. Levando-se em conta a resolução do tracionador de arame utilizado no trabalho (0,1 m.min–1), pode-se dizer que foi encontrada uma relação va/Pot constante para todas as posições de soldagem. Essa relação foi utilizada nos ensaios subsequentes e garantiu uma boa estabilidade da alimentação de metal de adição, sendo um resultado de grande relevância tecnológica, uma vez que a partir da relação va/Pot pode-se encontrar a velocidade de alimentação adequada para uma dada corrente de soldagem.

É importante frisar que parametrizações que levam a uma baixa relação va/Pot ocasionam uma transferência metálica descontínua que, por sua vez, resulta em cordões com fator de forma significativamente menor (cordões com baixa molhabilidade). Esse fato foi constatado nos ensaios preliminares, por meio de análises comparativas entre aquisição de dados de tensão e a geometria dos cordões de solda. A transferência descontínua é percebida com facilidade no oscilograma de tensão por apresentar uma variação desse parâmetro, na forma de um ruído, porém de amplitude maior que o ruído de fundo, intrínseco ao funcionamento da fonte. Uma vez que a tensão do arco é proporcional ao comprimento deste, os autores acreditam que a transferência descontínua está associada a uma variação no comprimento energizado do arco, que ora está acoplado diretamente à poça de fusão (momento que sucede o destacamento de uma gota, associado a um comprimento energizado do arco mais longo), ora sobe ou “escala” o arame de adição (no momento que precede o destacamento, proporcionando um comprimento mais curto). Essa variação no comprimento energizado do arco é evitada quando a relação va/Pot é ajustada a valores que garantem uma alimentação metálica contínua. Esse comportamento foi constatado através das filmagens realizadas durante o estudo. As variações no sinal de tensão podem ser vistas na Figura 2, que mostra (a) uma aquisição de tensão para um cordão com relação va/Pot adequada e (b) um oscilograma relacionado a uma relação va/Pot baixa.

Figura 2
Sinal de tensão associado a transferências metálicas (a) contínua e (b) descontínua.

As Figuras 3, 4 e 5 referem-se às principais características geométricas mensuradas no estudo. Na Figura 3 são mostradas as macrografias da seção transversal dos cordões de solda realizados sob corrente constante e corrente pulsada, separadas por valor de corrente média e por posição de soldagem (A: vertical ascendente; P: plana; D: vertical descendente; S: sobre cabeça). A Figura 4 apresenta o fator de forma em função da posição e corrente de soldagem, enquanto que a Figura 5, por sua vez, ilustra a penetração em função da posição de soldagem. Já a Figura 6 traz imagens congeladas de ensaios nas quatro posições de soldagem, onde é possível observar as diferentes configurações de posicionamento do arco elétrico em relação à poça de fusão e ao arame de adição.

Figura 3
Macrografias da seção transversal dos cordões de solda realizados com corrente constante e corrente pulsada.
Figura 4
Fator de forma em função da posição e corrente de soldagem.
Figura 5
Penetração em função da posição de soldagem para corrente constante e corrente pulsada.
Figura 6
Imagens congeladas das filmagens nas quatro posições de soldagem.

Como esperado, quanto maior a corrente de soldagem, maiores foram os valores das características geométricas obtidas (Figura 3), como largura e reforço do cordão, penetração linear, área penetrada (área fundida do metal de base), reforço linear, área de reforço e zona termicamente afetada (ZTA). Isso se explica pela maior quantidade de energia imposta à peça na forma de calor, bem como a maior quantidade de metal de adição, uma vez que foi mantida durante os ensaios a relação va/Pot constante.

Cordões soldados nas posições vertical ascendente e sobre cabeça apresentam menor fator de forma (Figura 4) que as demais posições de soldagem. Esse fato fica ainda mais evidente observando-se a macrografia dos cordões com menores valores de corrente de soldagem. A baixa molhabilidade na posição vertical ascendente se explica pelo fato da poça de fusão escoar na direção contrária à frente de solidificação, enquanto que na sobre cabeça a poça escoa no sentido de se afastar do metal de base (Figura 6).

Na posição sobre cabeça, os cordões obtidos apresentam maior reforço (tanto área de reforço como comprimento), resultando em menor fator de forma (Figura 4), característica esperada devido ao escoamento da poça de fusão frente à força gravitacional nessa posição. Além disso, ao se comparar a corrente constante com a corrente pulsada, têm-se como regra geral os cordões realizados com corrente pulsada apresentando maior área de reforço. Isso se deve ao fato de que, com a mesma corrente média, o processo com corrente pulsada demanda mais adição de arame, fato este constatado nas aquisições de dados.

A posição que apresenta maiores valores de penetração linear (Figura 5) é a vertical ascendente. Nessa posição, a poça de fusão escoa no sentido contrário à velocidade de soldagem, o que faz com que o arco seja acoplado mais diretamente ao metal de base, comportamento perceptível na Figura 6. Comparando-se com a posição vertical descendente, onde a poça escoa no mesmo sentido da velocidade de soldagem, o arco fica acoplado diretamente sobre a poça, fazendo com que o metal ainda sólido receba menos calor do arco.

A Figura 7 apresenta a microestrutura do metal base (MB) e da zona fundida (ZF), extraídas da área central de cada uma das zonas por serem consideradas como representativas. A microestrutura do MB consiste em grãos equiaxiais de ferrita e perlita fina, indicando que o material sofreu uma normalização final. A zona fundida apresenta uma microestrutura de grãos alotriomórficos de ferrita (ferrita primária ou ferrita de contorno de grão - αa), com ferrita acicular (FA) e ferrita de Widmänstatten (ferrita com segunda fase alinhada - αW). Estas microestruturas são tipicamente reportadas para zona fundida de aços baixo carbono [1313 Grong O, Matlock DA. Microstructural development in mild and low-alloy carbon weld metals. Int. Metal Reviews. 1986;31(1):27-48.

14 Babu SS, David SA. Inclusion formation and microstructure evolution in low alloy steel welds. ISIJ International. 2002;42(12):1344-1353. http://dx.doi.org/10.2355/isijinternational.42.1344.
http://dx.doi.org/10.2355/isijinternatio...

15 Hu F, Hodgson PD, Wu KM. Acceleration of the super bainite transformation through a coarse austenite grain size. Materials Letters. 2014;122:240-243. http://dx.doi.org/10.1016/j.matlet.2014.02.051.
http://dx.doi.org/10.1016/j.matlet.2014....
-1616 Santos TFA, Torres EA, Vilela JMC, Andrade MS, Cota AB. Caracterização microestrutural de aços baixo carbono por microscopia de força atômica. Revista Latinoamericana de Metalurgia y Materiales. 2015;35(1):118-133.]. A ferrita acicular normalmente permite aumentar a tenacidade da junta soldada [1414 Babu SS, David SA. Inclusion formation and microstructure evolution in low alloy steel welds. ISIJ International. 2002;42(12):1344-1353. http://dx.doi.org/10.2355/isijinternational.42.1344.
http://dx.doi.org/10.2355/isijinternatio...
], fornecendo boas propriedades mecânicas ao metal de solda [1313 Grong O, Matlock DA. Microstructural development in mild and low-alloy carbon weld metals. Int. Metal Reviews. 1986;31(1):27-48.]. Ao se comparar as micrografias da zona fundida de amostras soldadas numa mesma posição (plana), com corrente constante, mas com diferentes valores de corrente média (Figura 7 c, d), é perceptível uma microestrutura mais refinada nas amostras soldadas com menor corrente (120 A), sendo maior a presença de ferrita primária nas amostras soldadas com maior corrente (160 A), enquanto que na amostra de 120 A é maior a presença de ferrita acicular. A maior quantidade de ferrita alotriomórfica (ferrita primária ou ferrita de contorno de grão) é propiciada pela taxa de resfriamento mais lenta, como é o caso para a corrente de soldagem de 160 A [1717 Leitner RE, McElhinney GH, Pruitt EL. An investigation of pulsed GTA welding variables. In: Proceedings of the 54th AWS Annual Meeting; 1973 Abril 2-6; Chicago. Chicago: AWS; 1973.]. Para a corrente pulsada, a formação da ferrita acicular é ainda mais acentuada devido ao fato desta propiciar menor aporte térmico do que a corrente constante, causando uma maior taxa de resfriamento. Esse fato é muito coerente com a literatura [77 Latifi H. Advanced orbital pipe welding [tese de douttorado]. Lappeenranta: Lappeenranta University of Technology; 2012., 99 Fronius International GmbH. Orbital welding facts. Wels, Austria: Polysoude Nantes Frankreich SAS; 2010. v. 2. 52 p.], que justifica o uso da corrente pulsada pelo melhor controle da poça de fusão obtido com o uso dessa forma de onda, principalmente na soldagem fora da posição plana. Segundo Grong e Matlock [1313 Grong O, Matlock DA. Microstructural development in mild and low-alloy carbon weld metals. Int. Metal Reviews. 1986;31(1):27-48.], a formação da ferrita cresce inicialmente a partir de bordas e contornos de grão austeníticos sob uma cinética parabólica favorecendo a formação da estrutura alotriomórfica, cuja continuidade da redistribuição do carbono compromete este crescimento parabólico permitindo o movimento lateral de saliências ao longo de interfaces de baixa energia, descrevendo uma estrutura de Widmänstatten. A ferrita acicular pode iniciar a nucleação com mecanismo similar à ferrita de Widmänstatten intragranularmente em inclusões de forma paralela à formação das estruturas alotriomórfica/Widmänstatten. A predominante presença da FA é coerente, visto que o arame de adição possui maior quantidade de Mn que o metal base, favorecendo o aumento proporcional da ferrita acicular [1313 Grong O, Matlock DA. Microstructural development in mild and low-alloy carbon weld metals. Int. Metal Reviews. 1986;31(1):27-48.].

Figura 7
Microestrutura do (a) metal de base, da (b) zona fundida com corrente pulsada de 160 A, (c) da zona fundida com corrente constante de 120 A e (d) 160 A para a posição plana de soldagem.

A Figura 8 mostra imagens da microestrutura da ZTA de amostras soldadas na posição plana, com corrente constante e pulsada, extraídas da área central de cada uma das zonas por serem consideradas como representativas. Segundo Babu e David [1414 Babu SS, David SA. Inclusion formation and microstructure evolution in low alloy steel welds. ISIJ International. 2002;42(12):1344-1353. http://dx.doi.org/10.2355/isijinternational.42.1344.
http://dx.doi.org/10.2355/isijinternatio...
], a ferrita de Widmänstatten e a ferrita acicular formam-se pelo mesmo mecanismo, todavia em diferentes sítios de nucleação; a ferrita de Widmänstatten cresce a partir da ferrita alotriomórfica, enquanto que a ferrita acicular nucleia no interior do grão austenítico em inclusões. As microestruturas encontradas na ZTA consistiram de ferrita primária (alotriomórfica), placas de ferrita (Widmänstatten) com alinhamentos (FS(A)) ou não (FS(NA)) de segunda fase, bem como ferrita acicular.

Figura 8
Microestrutura da ZTA para corrente constante de (a) 120 e (b) 160 A e para corrente pulsada de (c) 120 A e (d) 160 A na condição de soldagem plana.

Analisando a Figura 8, observa-se que há mais formação de ferrita alotriomórfica para a corrente de soldagem de 160 A seja constante, seja pulsada; como discutido anteriormente, a menor taxa de resfriamento destas amostras favorece a formação de ferrita alotriomórfica e, em consequência, as ferritas de segunda fase alinhada, FS(A), e não-alinhada, FS(NA). Observa-se ainda uma quantidade de ferrita alotriomórfica maior na corrente pulsada do que na constante para corrente de soldagem de 160 A, o que pode ser relacionado à maior taxa de resfriamento que, embora desfavoreça a ferrita alotriomórfica, induz um tamanho de grão austenítico prévio menor contribuindo, portanto, sítios de nucleação da ferrita alotriomórfica.

Em relação à corrente de 120 A, observa-se uma microestrutura mista de placas de ferrita com segunda fase e alguma quantidade de ferrita acicular, o que faz sentido visto que a taxa de resfriamento é maior do que em corrente de soldagem de 160 A e ferrita acicular é desfavorecida. Para a corrente pulsada, o menor aporte térmico e a maior taxa de resfriamento induzem menor tamanho de grão e maior disponibilidade de sítios de nucleação da ferrita primária e ferrita acicular.

A Figura 9 ilustra os valores de microdureza Vickers, realizados seguindo-se uma linha de indentações do metal de base (MB) até a zona fundida (ZF), passando pela zona termicamente afetada (ZTA), em seis amostras, sendo três soldadas com corrente constante e três com corrente pulsada, todas na posição plana. O valor de dureza do MB foi tipicamente em torno de 150 HV0,5/15. A ZTA apresentou um aumento ligeiro de dureza partindo da interface com o MB crescente até a interface com a ZF, conforme era de se esperar. Os valores de dureza na ZTA próximo da interface com a ZF (d = 4 mm) indicam valores superiores para corrente pulsada de 120 A, o que está em concordância com a microestrutura descrita nesta região (ferrita com segunda fase e ferrita acicular). Para a corrente constante de 120 A, a dureza diminui razoavelmente devido aos menores sítios de nucleação da ferrita primária influenciando a dureza. Para a corrente de soldagem de 160 A nota-se um dureza menor, o que está relacionado à microestrutura predominantemente de ferrita alotriomórfica e ferrita de segunda fase com presença de alguma ferrita acicular.

Figura 9
Perfil de dureza por microindentação partindo do metal de base até a zona fundida.

Já em relação à zona fundida, a maior dureza das amostras com corrente pulsada se explica pela predominância da ferrita acicular, em comparação com a corrente constante. Analisando as amostras soldadas com uma mesma forma de onda, é perceptível dureza maior naquelas com menor corrente de soldagem, devido à maior taxa de resfriamento levar a uma microestrutura mais refinada, tipicamente de ferrita acicular.

4 Conclusões

A alimentação contínua de metal foi garantida com uma relação va/Pot da ordem de 1,2x10–5 m.J–1, contribuindo com estabilidade do processo e fator de forma adequado.

As posições vertical ascendente e sobre cabeça resultaram em soldas com menor fator de forma, devido à configuração do escoamento da poça de fusão frente à gravidade nessas posições. Pelo mesmo motivo, cordões soldados na posição vertical ascendente apresentam maior penetração linear.

A zona fundida de amostras soldadas com menor corrente apresenta microestrutura mais refinada, com maior presença de ferrita acicular, enquanto amostras com maior corrente de soldagem possuem mais ferrita alotriomórfica e de Widmänstatten. Além disso, a corrente pulsada favorece a formação de ferrita acicular, devido ao menor aporte térmico em comparação com a corrente constante, levando a diferentes taxas de resfriamento.

A microestrutura consistiu em ferrita de segunda fase, ferrita alotriomórfica e uma menor quantidade de ferrita acicular no caso da ZTA. Existe um efeito competitivo no que tange à formação de ferrita alotriomórfica na ZTA em função do aporte térmico; o menor aporte térmico resultante da corrente pulsada leva a um menor tamanho de grão austenítico prévio e consequentemente mais área de contorno de grão, o que favorece a formação da ferrita alotriomórfica. Por outro lado, correntes de soldagem de menor magnitude levam a um aporte térmico também menor, aumentando a taxa de resfriamento, o que prejudica a formação da ferrita alotriomórfica e favorece a formação da ferrita de segunda fase.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao LABSOLDA da UFSC pela estrutura fornecida durante a realização do trabalho, à FINEP, ANP/Petrobras e CAPES pelo apoio financeiro e concessão de bolsas.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    25 Set 2015
  • Aceito
    17 Dez 2015
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