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Memorial do candidato* * A versão original deste documento foi produzida com o apoio técnico de Diva Azevedo de Farias e Renata Menezes. Contou também com a colaboração de Beatriz Heredia, Lígia Dabul e de meus filhos.

Apresentação

É com muita alegria que trazemos para a seção Documenta o memorial de Moacir Palmeira que compôs, em 1994, uma das peças de seu concurso de Professor Titular de Antropologia do Museu Nacional. Concebida como uma forma de trazer a público textos relevantes que não tenham sido publicados ou o tenham sido em circuitos muito restritos, a Documenta oferece-se como o espaço ideal para um texto que, tendo sido escrito no contexto de um concurso, é muito mais do que uma peça burocrática necessária à mudança de status institucional, desvendando-nos inúmeras questões sobre o fazer antropológico brasileiro nas últimas décadas.

No "Memorial do Candidato", somos levados ao encontro de uma forma de produção de conhecimento, práticas de pesquisa e estabelecimento de redes de interlocução e formação. O incômodo relatado por Moacir Palmeira, logo de início, diante do fato de que, ao se fazer um memorial, a primeira pessoa do singular se impõe, é o primeiro indício da valorização de um estilo de trabalho coletivo que se reafirma a cada memória comentada que compõe o texto. Com isso, a primeira pessoa do singular vai se pluralizando em "nós", coletividades cuja sucessiva configuração se dá em movimentos em direção a focos relativamente comuns de pesquisa, interesse intelectual e artesanato conceitual. Focos para cuja delimitação a dita primeira pessoa teve uma contribuição, justamente, singular, ainda que o texto evite tornar essa contribuição o nó da apresentação, preferindo lembrar os nós que, na prática coletiva de pesquisa, amarraram amplas e diversas referências teórico-etnográficas, buscadas sistematicamente na literatura sobre campesinato, plantation, ou política, a um forte investimento na produção de dados a partir do campo, e à formação de pesquisadores.

Seguir, ao longo do memorial, o fio, ou a (mais robusta e internamente compósita) corda, dessas amarrações, é recordar um bocado do modo pelo qual se conformou o Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional, enredado em projetos como o coordenado por Moacir Palmeira, que foram criando interlocuções entre pesquisadores em diferentes momentos de formação e atuação, e produzindo uma sintonia bastante própria entre cursos, pesquisas de campo, dissertações e teses.

Mas a criação de interlocuções e sintonias, no caso de Moacir, não se restringiu ao campus, e o texto que se segue nos trará notícias sobre efeitos transformadores dos trabalhos de campo com trabalhadores do campo sobre pesquisadores em tempos de ditadura. Se nas grandes cidades esses eram tempos de repressão e desmobilização, na zona da mata pernambucana os pesquisadores inesperadamente se depararam com a retomada da intensa atividade nos sindicatos de trabalhadores rurais. Esse encontro não apenas rendeu elaborações etnográficas sobre temporalidade, mobilização e conflito, como se transformou numa duradoura parceria e interlocução com uma geração de lideranças sindicais, com as quais Moacir viria a trabalhar na Contag. Ele continuaria dialogando com esses sindicalistas em sua incursão breve como diretor no Incra, e acompanharia os seus dilemas quando eles se lançaram na disputa política eleitoral em tempos de redemocratização. Esses dilemas o inspiraram, já de volta ao campus, a juntamente com Beatriz Heredia formular questões que circunscreveram um novo foco de investigação, a política. E aqui um fio da pesquisa sobre as transformações da plantation canavieira retorna enovelado com outros fios para compor novos nós, e novos "nós", em torno de uma antropologia da política.

Por fim, cabe dizer algo sobre os jogos de espelho que o autor propõe acerca de "memoriais" no seu memorial. Desafiando, desdizendo, escolhendo justificadamente e, por vezes, ironizando as definições mais recorrentes ou mistificadoras que esse tipo de peça narrativa propõe, Moacir reitera uma forma de pensar e de fazer pensar que todos que fomos seus alunos conhecemos bem. Nela não cabem reificações, repetições acríticas ou proféticas. Nosso trabalho, afinal, envolve o questionamento constante de nossos próprios pressupostos, algo que é exposto com generosidade intelectual e franqueza ímpar pelo "candidato".

Adriana Vianna John Comerford

A propósito de memoriais

A velha tese dos concursos de antigamente era mais solene e mais trabalhosa. Mas, seguramente, menos constrangedora. Pelo menos para quem, como eu - primeiro efeito do gênero: começo a falar na primeira pessoa - adotou como lema a frase com que um famoso político brasileiro brinda os que lhe querem arrancar definições em momentos que julga inconvenientes: "Detesto ser explícito".

Pouco inclinado às incursões autobiográficas (por todas as razões, precoces), e partilhando a antipatia de Castro Faria pelo memorialismo, defendo-me com as armas que tenho. Na falta de uma Comblain, o Aurélio. Ali, constato satisfeito que a distância entre memorial e memórias é maior do que suspeitava. Em compensação, sou remetido de imediato a memento, em seu terceiro significado: "Papel ou caderneta onde se anotam coisas que devem ser lembradas". Os dois significados seguintes também me soam muito simpáticos: "3. Essa anotação; apontamento; memória. 4. Livrinho onde se acham reunidas as partes essenciais de uma questão". E já que o V das remissões tem, segundo o próprio Aurélio, como primeira serventia mandar "o leitor para uma forma vocabular que é a verdadeiramente boa, ou preferível...", sinto-me salvo. Mas logo abaixo daquele significado de memento sou enviado de volta a memorial e remetido a memorando e memória, no singular. Memorial me faz voltar a temer a tarefa que terei pela frente: "2. Escrito que relata fatos memoráveis; memórias [...]". O memorando me tranquiliza: "2. Participação ou aviso por escrito. 3. Impresso comercial [...] usado para comunicações breves. 4. Nota diplomática de uma nação para outra sobre o estado de uma questão". Vou até memória. Depois de muitas variações em torno de seu significado primeiro - "Faculdade de reter as ideias etc." - encontro a mesma nota diplomática do memorando e sou mandado de volta a memorial. Mas sigo até memórias (no plural): "l. Narrações históricas escritas por testemunhas presenciais. 2. Escrito em que alguém conta sua vida". Volto correndo a memorial, onde, contrastando com a grandiosidade das "narrações históricas", das memórias, ou a pompa da "dissertação acerca de um assunto científico, literário ou artístico" com que também me havia deparado na memória, encontro "petição escrita" como seu terceiro e último significado. Esse toque de humildade me parece adequado a ritos de passagem (afinal de contas, como num concurso há um grau de incerteza muito maior do que na investidura do rei do Gabão, também não seria preciso exagerar) e, de repente, me vem à cabeça, nesse processo de decifração, que o pai do memorial não tenha sido tão irresponsável assim. É um caso de ambiguidade planejada.

Valendo-me dessa ambiguidade instituída, vou falar de tentativas de sociologia (ou de antropologia ou de sociologias, como eu prefiro), carregadas de descontinuidades, interrupções, erros, hesitações, retornos, mas nas quais são assinaláveis alguns traços de continuidade. Não uma continuidade linear, mas, diria, uma continuidade "circular", ou para usar uma fórmula muito do agrado dos que reivindicavam da dialética no início dos anos 60, "elíptica" ou "helicoidal", marcada, para usar a fórmula de um autor mais na ordem do dia, Pierre Bourdieu, "por uma volta obsessiva aos mesmos objetos" - no meu caso, às vezes produtiva, às vezes, simplesmente inútil. Talvez menos por uma questão de método do que por uma questão de fôlego. A quem de pouco dispõe para grandes caminhadas e menos ainda para grandes voos, não resta senão o recurso de olhar bem para o pouco que vê para tentar visualizar um pouco do muito, de acesso direto apenas a algumas inteligências mediúnicas ou mediáticas.

Não acredito muito numa sociologia na primeira pessoa do singular e, sobretudo, acho um esforço inútil tentar uma espécie de sociologia de oitiva dos próprios interesses intelectuais. Esta é uma matéria em que não há inocências possíveis. Reconstituições, como todos nós sabemos, são necessariamente interessadas. A minha não foge à regra. Embora falando de tentativas de sociologia, não estarei fazendo sociologia. Nem tampouco um depoimento para a história, a do PPGAS que seja.

O que vou tentar será, antes, uma espécie de comentário - essa modalidade de segundo texto que se tornou execrável na crítica literária mas que, em se tratando de um memorial, se me afigura adequada. Vou dizer, redizendo em alguns casos, coisas ditas, escritas, pensadas, ensinadas, planejadas, eventualmente praguejadas, no curso desses anos de atividade intelectual dentro, perto, fora, longe (e as combinações possíveis) da universidade. Elementos para uma avaliação externa, como cabe numa petição. Pistas para eu mesmo pensar um trajeto percorrido (e aqui não tenho como evitar que os significados de memorial que quis deixar para trás me grudem na roupa) nem sempre comandado pela consciência ou por um projeto. Argumentos de autoconvencimento do sentido dessa empreitada.

Tomarei alguns temas que têm atravessado as minhas atividades de ensino e pesquisa, mas também algumas atividades extrauniversitárias, como ordenadores desse comentário. Mas só ordenadores, pois poucas das atividades descritas ou das reflexões feitas se encaixarão em apenas um desses temas ou mesmo nessa coleção de temas. E não valeria a pena multiplicá-los.

Uma sociologia da produção intelectual

Apesar de a sociologia do conhecimento e suas variantes serem uma preocupação de ocorrência mais ou menos generalizada entre os da minha geração que faziam ou tinham a pretensão de fazer ciências sociais,1 1 Evidência mais próxima eu não teria para apresentar do que sua inclusão como um dos três primeiros títulos de uma coleção de textos básicos de ciências sociais que me juntou a Antonio Roberto Bertelli e Otávio Guilherme Velho, naqueles anos de semimarginalidade profissional que costumavam se seguir à graduação em sociologia. tomar o conhecimento ou os produtores de conhecimento como objeto de investigação não estava em meus planos quando viajei para Paris, com uma bolsa do governo francês, em novembro de l966.2 2 Como também não constava deles a realização do doutorado. Fui para me integrar durante um ano a um grande programa de pesquisas do Institut des Hautes Etudes de l'Amérique Latine, com um projeto próprio - "Implicações políticas do desenvolvimento do capitalismo no campo". Como inexistisse o tal programa e o curso de dois anos oferecido pelo IHEAL não me parecesse propriamente fascinante, deixei que Pierre Monbeig, então diretor do Instituto, me convencesse a inscrever-me no Doctorat de 3ème Cycle. Foi a impossibilidade de uma vinda intermediária ao Brasil para realizar pesquisa de campo, depois de verificar que o material de que eu dispunha era insuficiente para escrever uma tese sobre o tema proposto, que me levou a tomar a bibliografia existente não como meio, mas como objeto de análise. Pesaram nessa opção a tentativa de meu orientador, François Bourricaud, pensar a estrutura social e política do Peru através de sua literatura, mas sobretudo as leituras de Louis Althusser, com a sua "lecture symptomale" de Michel Foucault, com as suas análises de "práticas discursivas" de alguns dos chamados filósofos e historiadores da ciência e, principalmente, a frequência regular aos seminários de Pierre Bourdieu, além das leituras de seus textos sobre consumo cultural e produção intelectual. Além disso, nunca é demais lembrar que o estruturalismo e as análises de discurso "estavam no ar".

Informado por aquela literatura, lancei-me à análise de um debate que consumia muito da energia dos intelectuais brasileiros na época e do entusiasmo político das organizações políticas de esquerda: aquele em torno da existência ou não de feudalismo no Brasil. Creio que consegui contornar a armadilha que esse tipo de debate reserva aos que entram na discussão substantiva de seus conteúdos, dissolvendo os autores nas proposições que faziam seus textos e identificando o arsenal ideológico comum, que tornava viável a existência de tal debate e a migração desses autores entre posições aparentemente incompatíveis. Esbocei também as relações entre campo intelectual e campo político (com as limitações de quem tem que estudar a produção a partir dos produtos) que tornavam viável esse jogo.

Essa experiência marcaria meu trabalho posterior de várias maneiras, positiva e negativamente. Passado um primeiro momento, em que uma espécie de reflexo adquirido em dois anos de trabalho diário intensivo me levava a já ir, em qualquer leitura, fragmentando o texto automaticamente, ganhei uma certa capacitação para trabalhar sobre textos, aperfeiçoada, posteriormente, no diálogo mantido com Luiz de Castro Faria no Museu Nacional,3 3 Os cursos que demos juntos foram momentos importantes desse diálogo, mas não os únicos. Conversas, seminários informais, orientação conjunta de alunos foram outros tantos. que seria importante na minha atividade de ensino no PPGAS. Tanto quanto pude, procurei transferir esse instrumento de trabalho aos meus alunos, fazendo de alguns de meus seminários uma espécie de laboratório de trabalho sobre textos.4 4 Não me parece que tenha sido grande o número daqueles que decidiram trabalhar diretamente sobre produção intelectual. Sob uma espécie de orientação a quatro mãos, minha e de Castro Faria, Alfredo Wagner Berno de Almeida produziu uma excelente tese sobre a trajetória política e intelectual de Jorge Amado e fez, através de um número grande de artigos e papers, da análise da produção intelectual uma de suas linhas de trabalho (Almeida 1978).

Na transposição do uso da análise de textos para a pesquisa etnográfica, ao lado da possibilidade aberta de cobrir lacunas inevitáveis nesse tipo de trabalho, ainda mais quando não se conta com períodos de campo muito extensos, e de não se cair tão facilmente na simples transcrição do que dizem os informantes, tive a experiência complicada do "excesso de dados". Fazer textos "falarem" é uma coisa; fazer falas falarem é conduzir essa coisa ao infinito e, se não forem feitos os cortes necessários, impossibilitar qualquer análise. Foi difícil estabelecer esses limites.

Em l976, no bojo do Projeto Emprego e Mudança Socioeconômica no Nordeste, do qual falarei mais adiante, voltei a trabalhar sobre o tema da produção intelectual. Tratava-se de um levantamento bibliográfico extenso destinado a ser uma espécie de preliminar do Projeto em torno de migração e emprego, que deveria fornecer elementos para as várias pesquisas substantivas a serem realizadas. Mas não resisti à tentação de dar peso maior às atividades de pesquisa nessa etapa. O levantamento em bibliotecas, comandado por José Sérgio Leite Lopes e Alfredo Wagner Berno de Almeida, já foi feito com a perspectiva de uma análise de produção intelectual, dando lugar a relatórios primorosos, em que, ao lado da explicitação das cautelas tomadas na constituição das bibliografias, eram explanados os princípios classificatórios operados por catálogos e bibliotecários. A seguir, vieram a elaboração de fichas de leitura e sua análise, nas quais tentei, sem êxito, fazer com que os pesquisadores envolvidos operassem com uma análise de discurso do tipo de que me havia valido quando da construção de "Latifúndio e capitalismo" (Palmeira 1971a___. 1971a. Latifundium et capitalisme au Brésil: lecture critique d'un débat. Tese de 3º ciclo apresentada à Faculté des Lettres et Sciences Humaines de L'Université de Paris, Paris. 169 pp.). O problema talvez estivesse em exercer um trabalho artesanal sobre um material (as fichas analíticas) que era fruto do trabalho coletivo, ou melhor, do trabalho individual e artesanal (mesmo que orientado por diretrizes comuns) de outros pesquisadores.

O processo foi doloroso, mas o resultado não foi tão ruim assim. Em certo momento, Alfredo Wagner e eu (José Sérgio Leite Lopes, nessa fase, ocupava-se, junto com Afrânio Garcia, da análise do material referente a emprego) assumimos diretamente a tarefa5 5 Até praticamente a reta final um número mais restrito de pesquisadores - Amélia Sá Barreto Teixeira, Cristina Marin, Dóris Rinaldi, Leilah Landim, Neide Esterci e Regina Novaes - trabalhou junto conosco e deu uma contribuição efetiva ao equacionamento do trabalho. e produzimos "A Invenção da Migração" (Palmeira & Berno de Almeida 1977___.; BERNO DE ALMEIDA, Alfredo Wagner. 1977. "A invenção da migração". In: Relatório final do Projeto Emprego e Mudança Socioeconômica no Nordeste, convênio UFRJ/FINEP/IPEA/IBGE, Museu Nacional, Rio de Janeiro. Mimeo. 72 pp.), um texto de 70 e poucas páginas que não se preocupa com um debate, mas com a gênese de uma categoria. Aqui, não se tratava de decompor discursos para compor um arsenal de proposições. Diante de uma categoria como migração, investida da legitimidade de um conceito científico, articulando todo um conjunto de conceitos outros - alguns dos quais supostamente seus derivados, como emigração e imigração - e beneficiária da naturalidade própria de uma categoria que não exatamente descreve alguma coisa, mas aponta para um movimento visível de indivíduos ou coletividades num espaço geográfico, o caminho seria - perseguindo textos de diferentes extrações, dos artigos científicos aos verbetes de dicionários, de artigos de publicações governamentais aos "clássicos" do assunto - rastrear significados e desconfiar do que parecesse mais evidente. Tentando aprender a lição de Emile Benveniste, confrontamos supostas derivações com datas e pudemos ver que o par imigração/emigração é anterior à existência de migração como conceito e, fazendo o caminho de volta, constatar como migração é coetâneo de migração interna e da existência de políticas nacionais para a mão de obra ou para a população.

Tendo testado um pouco as possibilidades que a análise da produção, ou pelo menos dos produtos intelectuais, tomados eles próprios como objetos, abre ao conhecimento das estruturas sociais, nem que seja daquelas que os circunscrevem mais de perto, e imbuído da pertinência daquela formulação, entre descritiva e prescritiva, de Bourdieu (1981b)___. 1981b. "Décrire et prescrire: note sur les conditions de possibilité et les limites de l'efficacité politique". Actes de la Recherche en Sciences Sociales, 38:69-73. de que "toda sociologia terá que ser simultaneamente sociologia das condições sociais da sua produção", continuei reservando espaço nos seminários que ofereço e nos meus parcos textos para esse tipo de exercício, que não é apenas de relativização, mas também de colocação em perspectiva do nosso próprio relativismo. Isso me parece tão mais necessário quanto maior seja a "dureza" ou, para citar em mais essa concessão ao revival o velho Padre Mravck, a "concretude" socialmente estabelecida de um tema.

Plantation e camponeses

Minha tese de doutorado é uma tentativa de sociologia da produção intelectual. Mas seu último capítulo vai numa outra direção e busca não propriamente elaborar um modelo do grande domínio rural de traços substantivamente diferentes daqueles apontados pelos textos analisados, mas esboçar um conjunto articulado de questões capazes de delimitar um espaço de investigações impensável nos marcos do debate que circunscrevia o grosso da literatura histórica e sociológica sobre o tema. Impressionado pela coexistência nos textos da afirmação da peculiaridade do arranjo social que caracterizava a plantation - e, em especial, o seu processo produtivo - tanto em sua manifestação colonial quanto em suas manifestações contemporâneas, e da recusa de caracterizá-la como uma forma ou um modo de produção específico,6 6 E não me refiro apenas à literatura brasileira. Isso é verdade também para autores como Eric Wolf e Sidney Mintz (1957) escrevendo sobre a plantationnas Antilhas e na América Central. resolvi trabalhar sobre as implicações da suspensão daquela espécie de interdição. O que aconteceria se tomássemos a plantationcomo um modo de produção7 7 Aqui vale a pena assinalar o "se tomássemos como", que indica a diferença nossa em relação a outros esforços da mesma época que simplesmente afirmavam a existência de um "modo de produção latifundiário", como o fez Carlos Romeo (1968), ou investiam no sentido da formalização do que seria um sistema econômico específico, sem outras qualificações, como o fizeram George Beckford (1968, 1969, 1972), George M. Best (1968), Jay Mandle (1972) e outros pesquisadores ligados aos Social and Economic Studies. e não simplesmente como a expressão menos ou mais perfeita de algum outro modo ou sistema situado além ou aquém dela?

A quebra das periodizações esquemáticas que até então prevaleciam nas análises históricas do marxismo por diferentes vertentes de revisão crítica daquela corrente de pensamento e o restabelecimento do rigor conceitual que guiara Marx na elaboração d'O Capital (1950) operado por autores como Althusser (1966)ALTHUSSER, Louis. 1966. Pour Marx. Paris: François Maspéro. e pelo que seus opositores chamaram de "estruturalismo marxista", abriam espaço para esse tipo de ousadia. A combinação de elementos que configuravam as relações de apropriação real (que era como as forças produtivas passaram a ser formuladas) e de apropriação formal (relações de produção) nos textos analisados era "original" e somente um "discurso da exceção" poderia tomá-la como expressão de qualquer outra coisa que fosse. Havia uma complicação: o que os textos, para além das diferentes tomadas de posição, indicavam era, no meu entender, que a ocorrência dessa combinação original estava associada à presença de um "mercado externo" desenvolvido, quando não a uma espécie de dependência original ao próprio capitalismo. Não se tratava de uma circunstancial subordinação histórica a um outro modo de produção, mas de uma subordinação constitutiva da própria plantation, que nada, todavia, impedia de funcionar como modo de produção principal numa formação social historicamente dada. Lendo, alguns anos depois, o que Witold Kula (1970) diz dos grandes domínios poloneses do século XVIII, passei a duvidar disso.

Mas, naquele momento, a maneira como conciliei aquelas informações contraditórias teve a força de um achado. Aliás, o que me permitiu nominar isso e, ao fazê-lo, tornar aceitável para os que me lessem tudo o que eu dizia (na tese, bem entendido) sobre a plantation foi, como ocorre com certa frequência nas disciplinas que operam com palavras, um tropos de leitura em que transformei o "tributário" com que certos autores se referem ao chamado modo de produção asiático (numa alusão aos tributos pagos pelas comunidades ao soberano) no subsidiário (no sentido de subordinado originalmente/necessariamente a) com que passei a designar a plantation como modo de produção.

A noção de dominância, por outro lado, permitia que se fugisse de um determinismo rígido e se considerasse a possibilidade de que os próprios momentos do processo produtivo - uma formulação, aliás, avançada por Marx na "Introdução" da Contribuição à Crítica da Economia Política (1967) que autores como Maurice Godelier (1964GODELIER, Maurice. 1964. "La notion de 'mode de production, asiatique' et les schemas marxistes d'evolution des societies". Les Cahiers du Centre d'Etudes et de Recherches Marxistes., 1966___. 1966. Rationalité et irrationalité en économie. Paris: Maspéro.) tentavam atualizar - não se dispusessem de uma única maneira (distribuição e consumo sendo segundos sempre em relação à produção propriamente dita) e de que a sua própria universalidade (mesmo que "produção, circulação/distribuição, consumo" pudessem ser úteis como conceitos para se pensar o que é geral em qualquer economia, como está dito na "Introdução") fosse questionável (e Marx mencionava a possibilidade de um momento "engolir" o outro). Ora, o que o material apresentado pelos autores analisados sugeria é que na plantation o crítico não era o processo produtivo estrito senso, ou as relações de trabalho, que era como os sociólogos o traduziam, alteradas e realteradas sem que a plantation perdesse a sua identidade. A distribuição ou, para ser mais preciso, o processo de redistribuição operado pelos proprietários, dos bens produzidos dentro das plantations e/ou daqueles que adquiriam nos mercados é que era o regulador por excelência das relações de cada plantation singular com o "exterior". E o exercício dessa função de redistribuição viabilizava a posição de mediadores dos proprietários de plantations e lhes permitia, dentro de um meio de mercado, garantir a existência de unidades econômicas com ares autárcicos e uma manipulação quase sem limites de uma mão de obra "imobilizada".

Eu não estava fazendo nenhuma descoberta. Eric Wolf e Sidney Mintz (1957) já diziam isso e foi em seus textos que fui buscar o conceito de imobilização da mão de obra, que eles, por sua vez, haviam tomado dos "teóricos da colonização" (Merivale 1967MERIVALE, Herman. 1967. Lectures on colonization and colonies. London: Frank Cass.; Wakefield 1969WAKEFIELD, Edward G. (ed.). 1969. "A view of the art of colonization in present reference to the British empire". In: Letters between a statesman and a colonist. New York: Augustus M. Kelley.; Nieboer 1971NIEBOER, H. J. 1971. Slavery as an industrial system: ethnological researches. 2 ed. New York: Burt Franklin.); do mesmo modo, em relação à mediação e à redistribuição, pouco acrescentei ao que estava dito no "Haciendas and Plantations". Tudo o que fiz foi levar a sério as suas formulações e dar um outro statusteórico a algo que aparecia como característica substantiva de um tipo dentro de uma tipologia de grandes explorações agrícolas cuja natureza conceitual não era objeto de questionamento, relacionando os componentes daquele "tipo" a outras tantas características apontadas pela literatura sociológica e historiográfica, formulando novas questões e partindo para uma investigação sistemática do "sistema de plantation" e das suas transformações. Se era ali, no jogo entre mediação e redistribuição, que estava a articulação básica do "sistema", por lá haveríamos de começar e não pelos lugares ritualmente visitados pelos estudiosos.

A construção daquela "hipótese plausível" - a plantation como modo de produção - elaborada na própria linguagem da teoria de referência dos autores envolvidos no debate "feudalismo ou capitalismo", mesmo daqueles que se contrapunham a suas formulações substantivas - o materialismo histórico - me permitia compatibilizar teoricamente o que era discernido empiricamente pelos autores, mas cuja coexistência era considerada espúria (vinculação ao mercado x trabalho não livre; vinculação ao mercado x caráter semiautárcico dos grandes domínios x isolamento dos trabalhadores; violência nas relações proprietários/trabalhadores x paternalismo) e incorporar conceitualmente tudo aquilo que, por não caber nos seus escaninhos classificatórios, era rejeitado como "resíduos", "sobrevivências", "restos" ou similares (os exemplos mais frequentes sendo os barracões de engenho, os vales de barracão, a condição e o cambão), fantasmas nas construções dos cientistas sociais, mas presenças muito reais no cotidiano das populações das áreas de plantation, como eu teria oportunidade de constatar algum tempo depois.

Se a articulação crucial da plantation passava pela posição de mediação/função de redistribuição dos proprietários, para entender a plantation brasileira (e já na tese, numa espécie de desafio, eu adotara como referência a plantation canavieira nordestina, que era a referência por excelência dos autores nacionais) e as mudanças que nela ocorriam, era preciso estudar o "sistema de barracão" - que tinha espaço garantido nas denúncias políticas, mas que nas análises teóricas era tratado como um simples "resíduo" - e as transformações que ele próprio parecia estar sofrendo (havia informações sobre um processo de concentração de barracões e de uma certa autonomização dos barraqueiros vis-à-vis os senhores de engenho).

Era preciso, igualmente, estudar formas de distribuição que lhe faziam concorrência. No caso do Nordeste brasileiro, as feiras (que só existiam, para os cientistas sociais, no calendário turístico) em primeiro lugar,8 8 Estas, por acaso contempladas, com uma certa generosidade, pela literatura antropológica internacional. Até Malinowski se interessou pelas feiras mexicanas! E, menos remotamente, Sidney Mintz gastou boa parte de sua energia de pesquisador estudando-as no Haiti, no México e em outros países da América Central, sendo que, no caso da Jamaica, identificou nessas praças de mercado, que se foram formando ainda na vigência da escravidão, um elemento importante de desagregação da plantation escravista (Malinowski & De La Fuente1957; Mintz 1959). pela extensão da sua presença e pela importância que tinham no abastecimento da população rural. Ademais, no caso da zona canavieira de Pernambuco, onde essas feiras eram consideradas menos importantes do que no Agreste e no Sertão, incorporadas que estavam à imagem externa dessas áreas (vide a feira de Caruaru), havia indicações de seu crescimento em paralelo à saída de moradores dos engenhos para as cidades próximas. Também havia algumas evidências de que, ao lado da progressiva absorção de antigos engenhos pelas usinas de açúcar, acompanhada de uma crescente proletarização da força de trabalho, proclamada pelos estudos que eram feitos da região, outros processos estavam em curso, entre eles a fragmentação de algumas dessas grandes propriedades. Formulei, então, inspirado no exemplo jamaicano de Mintz (Mintz & Hall 1960___.; HALL, Douglas. 1960. "The origins of the Jamaican internal marketing system". Papers in Caribbean Anthropology, compiled by Sidney W. Mintz. New York: Yale University, Department of Anthropology. Yale University Publications in Anthropology, numbers 57-64.), a hipótese de que as feiras estivessem dando suporte ao surgimento de um neocampesinato (e aqui pesou a leitura das obras de Redfield e Weber) que estaria emergindo na região junto com um proletariado rural, a partir da desagregação da plantation que essas feiras, entre outros elementos, propiciaria, e do desaparecimento do morador, que estaria na origem, através de uma espécie de bifurcação das suas funções, tanto de camponeses quanto de proletários rurais.

Foi assim que o programa de pesquisas que fui montando ao longo dos anos 70 na área canavieira de Pernambuco para entender a plantation e suas mudanças centrou-se no estudo das formas de distribuição - Projeto "Os Mercados Locais como Elemento de Mudança numa Área de Plantation" (1969-1972), depois transformado no mais consistente, até por ter incorporado a experiência de trabalho de campo intermediária, "Sistemas de Distribuição e Estruturas de Poder no Nordeste", de l974 - e na investigação das categorias sociais que articulavam, em especial daquelas para cuja constituição pareciam pesar decisivamente. Enquanto, pessoalmente, ocupava-me de forma mais direta dos barracões e das feiras, solicitei a Beatriz Heredia e Afrânio Garcia, então alunos do mestrado do PPGAS, como, aliás, todos os que participaram do estudo da plantation canavieira nessa época, a realização de estudos de caso que explorassem a questão do neocampesinato. Lygia Sigaud, movida por uma preocupação pessoal com a questão das representações, juntou-se ao grupo, concentrando sua atenção sobre moradores e trabalhadores de ponta de rua.

Algumas surpresas me aguardavam nas primeiras idas a campo (final de l969 e primeiro semestre de l970). A maior delas, no que dizia respeito às formulações teóricas da pesquisa, encontrar feiras dentro de usinas e até mesmo em alguns engenhos. Analisar essa "exceção" às "regras" que eu estava formulando criava uma situação de quase experimento. Marie-France Garcia encarregou-se de fazer um estudo de caso. Surpresa do mesmo porte foi encontrar "núcleos urbanos" dentro de alguns engenhos e usinas, alguns até com o status legal de vilas e com o aparato administrativo correspondente - cartório, coletoria, escola pública e mercado municipal. Doris Rinaldi, alguns anos depois, iria estudar uma delas.

Que a zona da mata de Pernambuco conhecera movimentos sociais de peso antes de l964 e que continuava sendo uma área de tensão social era um fato do domínio público. Mas eu jamais teria pensado em encontrar naquela área em l969 e l970 sindicatos atuantes, a Justiça do Trabalho abarrotada de reclamações, trabalhadores reunidos na porta das Juntas de Conciliação e Julgamento pressionando por decisões favoráveis aos seus reclamos, eleições sindicais disputadíssimas e muito menos uma Federação de Trabalhadores à frente de toda essa movimentação. Luís Maria Gatti prontificou-se a estudar os sindicatos e suas lideranças e Vera Maria Echenique, motivada pelos seminários que Shelton Davis então ministrava no PPGAS, partiu para o estudo do processo de resolução de conflitos na região.9 9 Infelizmente, esses projetos não tiveram continuidade. No entanto, os temas continuaram na alça de mira da equipe e foram objeto de trabalhos feitos posteriormente por Lygia Sigaud (1979) e Moema Marques de Miranda (1991) e, ainda na época, de um artigo meu (Palmeira 1979a, 1979b). A experiência de criação de cooperativas de consumo conduzida pelos sindicatos de trabalhadores rurais me colocava, tal como no caso das feiras de usina, os bacuraus, e das vilas, diante de uma outra situação experimental. Leilah Landim, tal como Doris, de uma "segunda geração" de pesquisadores, iria analisar uma cooperativa que fazia incursões para além da esfera do consumo e que era considerada "bem-sucedida".

Antes mesmo que os primeiros contatos com o campo me levassem a situações que punham em dúvida o "modelo" que eu havia esboçado na tese de doutorado, a literatura disponível colocava-me questões que não podia deixar de lado. A plantation não era apenas uma unidade agrícola. O seu lado industrial era assinalado como uma das marcas que a singularizavam em face de outros domínios rurais. Mas, curiosamente, na hora das descrições substantivas dos mecanismos econômicos ou da vida social em engenhos e usinas, o que aparecia era seu lado agrícola. Mesmo quando se tratava de processos sociais que atingiam os que trabalhavam no fabrico do açúcar, como o desemprego dos mestres de açúcar nos anos 10 e 20, com a diminuição do número de engenhos banguês e a primeira onda de concentração entre as próprias usinas, a imagem que era passada ao leitor era a da proletarização de trabalhadores rurais. Afora os estudos técnicos e contábeis da produção de açúcar e outros derivados da cana que consumiam uma enorme quantidade de papel nas publicações oficiais e das associações de usineiros e fornecedores de cana, nada encontrei sobre a indústria do açúcar propriamente dita. Sobre os operários dessas fábricas "rurais", que eu me lembre, tudo o que existia era um inquérito sobre suas condições de vida, realizado no Rio de Janeiro por Vasconcelos Torres e publicado pelo IAA nos anos 40. José Sérgio Leite Lopes aceitou o desafio de estudar os operários industriais das usinas.

A literatura nacional e internacional enfatizava que a plantation criara um mundo próprio e dera lugar a instituições peculiares. Mas os limites geográficos e sociais desse "mundo" e o alcance da "influência" da plantation (uma outra questão obrigatória) sempre foram objeto de discussões. A presença de trabalhadores sazonais na plantation em diferentes regiões do globo estava longe de ser alguma coisa recente. Julian Steward (1964)STEWARD, Julian H. 1964. "Perspectivas de las plantaciones". In: Sistemas de plantaciones en el Nuevo Mundo. Washington, D.C.: Union Panamericana. considerava-os parte integrante do mundo da plantation, uma exigência do próprio calendário produtivo deste tipo de exploração. No caso da área canavieira nordestina, a existência de uma reserva de mão de obra na periferia dos engenhos havia sido assinalada já no período colonial por cronistas e viajantes e a presença nos períodos de safra de uma grande quantidade de trabalhadores do agreste e do sertão na palha da cana, desde pelo menos as grandes secas do século XIX, tornara-se regular. Se as pesquisas de Afrânio Garcia e Beatriz Heredia poderiam, como o fizeram, lançar luz sobre as relações entre os pequenos produtores da região canavieira e o trabalho na cana, era necessário que alguém se ocupasse dos migrantes sazonais, os corumbas, que provinham daquelas outras regiões. Esta tarefa caberia a Roberto Ringuelet.

À medida que avançávamos nas pesquisas - e os resultados parciais obtidos por cada um eram amplamente discutidos e incorporados por toda a equipe10 10 Houve momentos em que essa equipe foi ampliada. Assim, em julho de 1974, para a realização de um survey dos barracões da zona da mata de Pernambuco, contamos, além das pessoas já mencionadas, com o concurso dos pesquisadores Regina Novaes, Silvana Araújo, Leila Barsted e Denis Barsted. - novos processos sociais iam sendo identificados e novas questões iam sendo postas, ao mesmo tempo em que se ia configurando um quadro mais completo das posições e das oposições sociais de que se fazia aquele mundo da plantation.11 11 É importante assinalar que o projeto de pesquisa que então desenvolvia fazia parte do projeto maior "Estudo Comparativo do Desenvolvimento Regional" (1969-1972), dirigido por Roberto Cardoso de Oliveira e David Maybury-Lewis. Estando Maybury-Lewis empenhado numa pesquisa sobre as elites econômicas e políticas de Pernambuco e levando em conta as dificuldades de, num contexto de conflitos intensos entre proprietários rurais e trabalhadores, realizar trabalho de campo simultaneamente entre as duas categorias, concentrei minha atenção e os esforços da equipe que começava a formar sobre os últimos e sobre os processos sociais a que se vinculavam, tendo o cuidado, todavia, de em cada situação de campo procurar, minimamente que fosse, cobrir, através de entrevistas ou de documentos escritos, as posições socialmente significativas que, por questões estratégicas, estava sendo obrigado a deixar de lado

Ao lado dos barracões e dos bacuraus havia as vendas, algumas subordinadas aos barracões, outras competindo com eles, umas dentro dos próprios engenhos, outras em algum sítio das imediações; havia usinas que tinham redes de barracões comandadas por um barracão central; havia barraqueiros que eram pouco mais que empregados dos senhores de engenho; mas havia os que tinham seus próprios empregados e controlavam vários barracões; havia deles que se transformavam em comerciantes nas cidades próximas e havia comerciantes dessas cidades que estendiam seus negócios até os engenhos transformando-se em barraqueiros também. As feiras articulavam-se em circuitos que, às vezes, envolviam mais de uma dezena de municípios; alguns de seus setores tinham relações com o comércio estabelecido e com os negociantes dos mercados públicos municipais, enquanto outros eram abertos e recebiam como vendedores desde moradores de engenho e trabalhadores da rua até camelôs que vinham da capital do estado ou de cidades de outras regiões.

Na rua, os trabalhadores expulsos dos engenhos, que apesar de continuarem a trabalhar na palha da cana proclamavam sua condição de libertos, estavam vinculados aos empreiteiros e às vendas.

Os neocamponeses não eram apenas ex-moradores que tinham conseguido adquirir lotes de terra de engenhos quebrados e que passavam a produzir alimentos para abastecer os novos proletários rurais. A fronteira entre aqueles e os que continuavam foreiros, resistindo à expulsão, e os que, expulsos, somavam ao trabalho na cana o arrendamento a título precário de pequenas parcelas de terra, ou ainda entre todos esses e aqueles - menos numerosos e que, pequenos proprietários ou posseiros, já estavam na terra há algumas gerações - era tênue. Independentemente de sua origem histórica e social, combinavam de modo similar - digamos, chayanovianamente - as forças de trabalho da família, o consumo familiar e a venda de seus produtos no mercado. E a regra, longe de ser só agricultura, era antes a combinação da agricultura com algum tipo de negócio. Era mais nítida a fronteira entre todos esses pequenos agricultores e aqueles que se especializavam, como lavradores ou microfornecedores, na agricultura da cana de açúcar.12 12 Esta, talvez, a única categoria social importante que deixamos de estudar na área canavieira de Pernambuco.

O quadro também era complexo no lado industrial da plantation. A homogeneidade, olhando de fora, sugerida a quem estabelecia comparações com o "campo" tinha sido substituída, na tese de mestrado de José Sérgio Leite Lopes (1975)LOPES, José Sergio Leite. 1975. O "vapor do diabo": o trabalho dos operários do açúcar. Dissertação de Mestrado em Antropologia Social. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ/Museu Nacional. Rio de Janeiro., por uma diversidade de modos de relacionamento das usinas com os seus operários e por clivagens importantes - artistas x profissionistas; permanentes x temporários - além de uma sofisticada hierarquia no processo de trabalho. Não se tratava de diferenças apenas para "uso interno", mas de alguma coisa que tinha repercussão no mercado de trabalho.

O mundo dos engenhos se revelava mais complexo do que nos faziam crer. E, para parodiar a um só tempo Gilberto Freyre e Genovese, o mundo que o(s) pesquisador(es) criou(aram) o era ainda mais. Havia mais do que plantation na zona canavieira; as relações sociais de que se fazia a plantation se projetavam para além dos seus limites.

Por outro lado, o contato com a literatura internacional sobre camponeses13 13 De volta ao Brasil, na segunda metade de l969, para trabalhar no PPGAS, por indicação de Otávio Velho, tive oportunidade, inicialmente acompanhando o seminário "Sociedades Campesinas" ministrado por Roberto Cardoso de Oliveira e, posteriormente, dando o seminário "Sociedades Camponesas", de entrar em contato com a bibliografia propriamente antropológica sobre campesinato, extremamente extensa e diversificada, naquele momento de crise de objeto da antropologia (uma das várias) e de glória dos chamados "estudos camponeses" que se desenvolvem numa espécie de fronteira entre antropologia, sociologia, correntes da história social, certas tradições da economia e a vertente marxista de estudo da questão agrária, a que poderíamos somar os estudos latino-americanos sobre estrutura agrária, marcando uma certa oposição com a sociologia e a economia rurais convencionais. Ofereci esse curso inúmeras vezes, sozinho ou em parceria com professores como Otávio Velho, Afrânio Garcia, Beatriz Heredia, Lygia Sigaud e Giralda Seyferth. abria novas perspectivas. Os anos 70 marcaram uma espécie de auge da preocupação da antropologia e de uma convergência de disciplinas acadêmicas e não propriamente acadêmicas com "os camponeses" - disciplinas estas movidas por questões internas a elas, mas certamente também por uma motivação política diante daqueles que, no dizer quase ritual dos textos com pretensão de síntese ou introdução, constituíam mais da metade da humanidade e que faziam aparecer uma nova imagem sua nas revoluções e nas guerras de libertação nacional. O confronto da vasta bibliografia então gerada - o que incluía a recuperação de "clássicos" tanto da antropologia quanto de algumas daquelas outras disciplinas, como os textos da chamada "escola organizacional" russa, sobretudo os de A.V. Chayanov (1966)CHAYANOV, A.V. 1966. The theory of peasant economy. Illinois: The American Economy Association. - com a nossa experiência de pesquisa estimulava novas pesquisas, explorando novos temas, como seria o caso da herança camponesa analisada numa comunidade do sul de Minas Gerais, ou combinando preocupações do grupo que se ocupava com a plantationnordestina com outras questões, como se passaria com o trabalho feito por Eliane Cantarino O´Dwyer Bastos (1977)BASTOS, Eliane Cantarino O'Dwyer Gonçalves. 1977. Laranja e lavoura branca: um estudo das unidades de produção camponesa da Baixada Fluminense. Dissertação de Mestrado em Antropologia Social. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ/Museu Nacional, Rio de Janeiro. no interior do Rio de Janeiro. Mas também repercutia dentro do projeto plantation, no qual questões novas, como aquela da diferenciação social do campesinato (Palmeira s/d), iam sendo incorporadas, e velhas obsessões, como as que envolviam o cálculo econômico camponês e o trabalho familiar, iam sendo buriladas.14 14 Esse não foi um movimento limitado ao círculo dos meus orientados. Primeiro, porque outros professores passavam por experiência semelhante. Depois, porque o curso Sociedades Camponesas tinha um alcance bem mais amplo. O fato é que dessa dinâmica acabou resultando uma sequência volumosa de trabalhos sobre camponeses, conduzidos sob a orientação de diferentes professores, cujas qualidade e originalidade acabaram se constituindo em uma das marcas do PPGAS.

Fizemos, por volta de l975/76, uma espécie de balanço do trabalho realizado e resolvemos, associando-nos a outros pesquisadores, partir para um projeto mais ambicioso, que incluiria, além de outras áreas de plantation, espaços que entretinham, por assim dizer, ligações orgânicas com o mundo da cana - agreste e sertão, mas também as grandes cidades do Nordeste e do Sudeste do país e a fronteira amazônica (Palmeira 1976a___. 1976a. "Emprego e mudança socioeconômica no Nordeste" (em colaboração). Anuário Antropológico, 1976:201-238.). Isso sem prejuízo das pesquisas que alguns de nós continuavam a desenvolver na zona da mata de Pernambuco.

Nessa nova etapa,15 15 Montado num diálogo com um grupo de economistas ligados ao IPEA, o projeto se dispunha também a contribuir para se responder a algumas questões que eram objeto de preocupação de alguns setores da sociedade, como as migrações e o emprego. Por isso, tivemos que desviar um pouco a rota e realizar um amplo levantamento bibliográfico sobre esses temas e investir certo esforço na leitura e na análise de parte da bibliografia identificada. partimos para o estudo da plantation no sul de Alagoas e na Paraíba, áreas que, durante os anos 70, conheceram uma forte expansão dos canaviais e onde o processo de transformação da plantation parecia tomar rumos diferentes dos que havíamos identificado em Pernambuco. Alagoas foi estudada por Beatriz Heredia, que centrou sua atenção sobre as relações entre as mudanças espaciais e as alterações que se processavam na estrutura social. No Brejo da Paraíba, onde encontrou um processo mais acentuado de fragmentação de antigos engenhos do que em Pernambuco, Afrânio Garcia deteve-se na análise das relações entre as migrações para o Sudeste do país e a reprodução das explorações camponesas. Alfredo Wagner Berno de Almeida e Neide Esterci, no Ceará, e Eliane Cantarino O'Dwyer, na Paraíba, estudaram as grandes fazendas do "complexo gado-algodão" e detiveram-se sobre um tipo de barracão que, além de fornecer, recebia a produção dos moradores. Marie-France Garcia ocupou-se dos circuitos de feira na Paraíba, explorando a diversidade social dos feirantes e a questão da organização espacial das feiras. Regina Novaes analisou a estratégia econômica de um grupo de pequenos agricultores do agreste pernambucano, num município que estava conhecendo um certo boom comercial com o cultivo da cenoura. Alfredo Wagner Berno de Almeida e Neide Esterci iriam dirigir seu olhar para a plantationdecadente da Baixada Maranhense e tentar entender a lógica da saída de migrantes em direção ao Pará, onde Alfredo Wagner acompanharia a trajetória desses filhos de camponeses em busca de recursos para se constituírem como chefes de família em seus locais de origem. José Sergio Leite Lopes, Luiz Antonio Machado da Silva e um grupo de pesquisadores ocuparam-se com as cidades.16 16 José Sérgio Leite Lopes, além de coordenar, com Machado, as pesquisas em áreas urbanas, deu sequência a seu trabalho anterior nas usinas, estudando, ao lado de Rosilene Alvim, uma espécie de situação-limite de fábrica com vila operária, em que estava em jogo toda uma cidade.

O resultado desse esforço, que atravessou os anos 70 e ainda estava dando frutos em meados dos 80, traduziu-se num extenso conjunto de teses, algumas das quais transformadas em livros, artigos e outros tipos de publicações, ou simplesmente em relatórios de pesquisa, de circulação mais restrita.17 17 Para não me alongar, lembraria que dessas pesquisas resultaram, dentre outros trabalhos, as teses de mestrado e doutorado de Afrânio Raul Garcia Junior (1976, 1983); Beatriz Heredia (1977, 1986); José Sergio Leite Lopes (1975, 1986); Lygia Sigaud (1979) e Marie-France Garcia (1977, 1984); e as de mestrado de Doris Rinaldi Meyer (1978), Leilah Landim Assumpção (1978), Regina Novaes (1982) e Roberto Ringuelet (1977). Seria inviável, mesmo tendo acompanhado muito de perto a elaboração de quase todos esses textos, tentar resumi-los ou sistematizar tudo o que dizem. Em primeiro lugar, porque seria descabido fazê-lo aqui. Mas, principalmente, porque as pesquisas realizadas por cada um foram muito além das indagações em torno da plantation que eu havia oferecido como um ponto de partida, aportaram contribuições originais e investiram em novas problemáticas. Impressionisticamente, eu ressaltaria que esse conjunto de textos contribuiu para pôr em evidência uma série de mecanismos e práticas sociais e revelar identidades sociais e formas de sociabilidade supostamente secundárias e fatalmente "submersas" (na verdade, secundarizadas e submergidas pelos pressupostos teóricos avançados pela literatura como evidências), a exemplo daquelas articuladas pelas redes de comércio, pela convivência na rua de trabalhadores rurais até não muito tempo atrás "isolados" nos engenhos, pelas novas formas de recrutamento da força de trabalho, pela participação em entidades sindicais e grupos religiosos, pela inserção em mercados de trabalho restritos e assim por diante. Dito de outro modo, essas pesquisas concorreram para redesenhar a imagem da estrutura social da área canavieira (mas não apenas dela) e dar elementos para se repensar a história recente da região, ao mesmo tempo em que ofereceram uma contribuição teórica de certo peso ao conhecimento da economia camponesa, dos modos de dominação etc.

No que diz respeito mais diretamente à questão da plantation e de suas transformações, que serviu de eixo a esse conjunto de investigações, eu diria que os estudos que fizemos de algum modo mostraram o acerto do caminho trilhado. A especificidade do arranjo social que articulava moradores e proprietários, enriquecida pelo conhecimento de variantes, foi testada e confirmada. A centralidade dos barracões, graças ao estudo daquela sua realização mais completa encontrada no semiárido, ficou bem estabelecida. A incompatibilidade entre feiras e barracões tornou-se mais nítida, em grande parte graças à análise do bacurau, que antes de ser uma invasão da plantation pelo princípio do mercado, como sugerido por Shepard Forman (Forman & Riegelhaupt 1970FORMAN, Shepard; RIEGELHAUPT, Joyce F. 1970. "Market place and marketing system: toward a theory of peasant economic integration". Comparative Studies in Society and History, 12(2)), opera como um conversor de relações estranhas à plantation às regras da plantation e constitui um instrumento fundamental para que as relações pessoais de que se faz a morada se atualizem numa situação em que a escala dessa dominação já não é a do engenho individual e a presença contínua do proprietário em seus domínios tenha se tornado problemática. Incompatibilidade também marcada pela existência não apenas de circuitos de feira, mas de circuitos de vendedores de feira que vão muito além do mundo da plantation ou mesmo do mundo camponês. Nada próximo a qualquer imanentismo das relações de troca como o sugerido por Mintz (Mintz & Hall 1960___.; HALL, Douglas. 1960. "The origins of the Jamaican internal marketing system". Papers in Caribbean Anthropology, compiled by Sidney W. Mintz. New York: Yale University, Department of Anthropology. Yale University Publications in Anthropology, numbers 57-64.) para a Jamaica escravista ou de um circuito de trocas exclusivamente camponês como identificado pelo próprio Mintz (1959)MINTZ, Sidney. 1959. "Internal market systems as mechanisms of social articulation". In: V.F. Ray (ed.), Intermediate societies, social mobility and communication proceedings of the 1959 Annual Spring Meeting of the American Ethnological Society. Seatlle: University of Washington Press. para o Haiti e por um sem-número de autores que estudaram as praças de mercado em outras partes. Isso sem prejuízo, lembre-se bem, da existência e da importância de circuitos propriamente camponeses dentro das feiras.

A presença de um maquinismo moderno e de uma hierarquia administrativa e profissional mais elaborada na parte industrial da plantation - e até mesmo de uma "cultura operária" e de uma tradição sindical como a que parece existir entre operários de usina de Pernambuco - não significa que a indústria escape às relações de morada. A casa como requisito da ligação mais definitiva à usina, a dependência do barracão, as relações pessoais com o usineiro (que no Nordeste brasileiro foram facilitadas pelo fabrico e a reposição dos meios de produção feitos dentro das próprias usinas) podem ser dadas como evidência. Mas a evidência maior é o próprio corte estabelecido entre indústria e agricultura dentro das usinas, parte do sistema de privilégios que atravessa todas as relações entre proprietários e dependentes, colocando estes últimos, categorialmente (trabalhadores de fora x moradores, moradores de condição x moradores foreiros, na parte agrícola; artistas x profissionistas, aprendizes x profissionais, permanentes x temporários, na indústria; do campo x operários, entre os dois setores) ou individualmente (pessoalmente) disputando os favores do patrão ou de seus prepostos. Se tomarmos como referência, não usinas e usinas tecnologicamente modernas (mesmo que um moderno de algumas décadas, em alguns casos) que José Sergio Leite Lopes estudou, mas os velhos banguês, em que a distância era bem menor entre a agricultura e a transformação da cana, talvez cheguemos à conclusão de que Gilberto Freyre não estivesse sendo tão impreciso assim quando se referiu à dispensa dos mestres de açúcar como proletarização de trabalhadores rurais; afinal de contas, eles também eram moradores.

Tanto quanto a presença interna do processo industrial e de operários especializados, trabalhadores de fora na plantation e trabalhadores daplantation residindo fora de seus limites não são incompatíveis com as relações de morada. Ao contrário, não há moradores sem que existam trabalhadores de fora, e a incorporação de alguns desses trabalhadores como moradores é um momento crucial no estabelecimento da fronteira que separa uma plantationsingular do resto do mundo, e não é por acaso que descrever a relação de morada coincide, em grande parte, com descrever o pedido de morada. Mais do que mão de obra imobilizada, o que caracterizará a plantation será o movimento constante de imobilizar mão de obra e, portanto, a circulação de trabalhadores (isso é o que, um tanto economicisticamente, designamos como a lei de população própria da plantation). Assim, mesmo uma expropriação radical de moradores, como a que ocorreu nos anos 60 e 70 na área canavieira de Pernambuco, não apenas expulsando trabalhadores de dentro dos engenhos para as pontas de rua, mas liquidando com os contratos de morada, não é suficiente, por si só, para enterrar aquela "lei de população", as esperanças de muitos expulsos de uma reincorporação, ou de uma volta do engenho do passado não ser simplesmente uma quimera.

A ocorrência de um campesinato (o termo aqui designando pequenos produtores livres ou subordinados, mas investidos de um certo grau de autonomia) antigo ou novo também não representa uma ameaça que a plantation não possa conjurar. Não só pela funcionalidade que, já vimos, teria como mão de obra sazonal, mas porque uma maior liberdade de plantar pode ser compensada, como nas fazendas do semiárido, por uma maior dependência ao barracão.

As disputas em torno do quantum de autonomia que terão os moradores dentro dos engenhos e fazendas - por cruciais que sejam, como alguns dos trabalhos mostraram e, em especial, o que Afrânio Garcia desenvolveu no Brejo da Paraíba; a competição pela terra, tão marcante no sul de Alagoas analisado por Beatriz Heredia; os conflitos ligados à expulsão de moradores e os conflitos trabalhistas que se tornaram parte do cotidiano da área canavieira de Pernambuco, estes formulados, como é lembrado por Lygia Sigaud, como um confronto entre duas ordens, uma encarnada na lei propriamente dita, na "lei do governo", e a outra na "lei do patrão" - são enfrentamentos que não conduzem, por eles mesmos, à quebra da plantation.

O ponto de ruptura parece estar,18 18 Digo "parece" porque a destituição dos engenhos da condição de unidades de produção das usinas foi, por assim dizer, a última das surpresas de campo de que só uma nova pesquisa - e esta não foi feita - poderia dar conta. como previsto no projeto inicial, na questão da mediação/redistribuição dos barracões, mas não, como imaginávamos, numa espécie de confronto direto com outros mediadores ou formas de distribuição alternativas. A ruptura se dará efetivamente na dissociação entre a plantation como unidade de residência e unidade de produção, que inviabilizará o barracão (mesmo o barracão fraquinho pós-expulsão), transformará todos os trabalhadores em trabalhadores de fora (de fora do local de trabalho), mesmo os que continuam morando no campo, e os subordinará simultaneamente a dois esquemas de autoridade, mesmo aqueles que continuam a residir num engenho (trabalhando não em outros engenhos, mas em novas subdivisões agrícolas em que, ao invés da casa grande, são as exigências técnicas da irrigação ou as exigências funcionais da administração que articulam) - engenho este que pertença, tanto quanto os locais onde planta, limpa ou corta cana, a um único dono.

Uma das vantagens do caminho trilhado foi que ele nos permitiu ver, com pouco tempo de percurso, bem sinalizado que era, certos impasses nos quais poderíamos desembocar. Para ficar com a morada, que estava no centro das minhas preocupações pessoais dentro daquele projeto maior, rapidamente se revelou a limitação que representava ter que traduzi-la numa linguagem econômica, mesmo que crítica. Assim, andei no sentido de uma tradução da lógica social dessas relações num idioma que preservasse, infundindo a consistência lógica necessária à sua transformação em instrumento de conhecimento, as categorias em que ela se expressava no discurso e na prática das populações observadas. Num texto manuscrito de l972, transformado em artigo em l976 (Palmeira 1976b___. 1976b. "Casa e trabalho: nota sobre as relações sociais na 'plantation tradicional'". Actes du XLII e. Congrès International des Américanistes, 1:305-315. Congrès de Centenaire. Paris, 2 a 9 septembre 1976., 1977___. 1977. "Casa e trabalho: nota sobre as relações sociais na 'plantation tradicional'". Contraponto, 2(2):103-114.), tentei pensar - e oferecer uma referência para os que trabalhavam comigo - as relações de "morada", as relações que ligavam e faziam existir socialmente "moradores" e "senhores de engenho", em termos de uma oposição entre "casa" e "trabalho", não redutível simplesmente a uma oposição entre consumo e produção ou a uma forma determinada de extração do sobretrabalho (ainda que, evidentemente, pudesse ser pensada nestes termos, como exemplo de um arranjo específico).

Ao contrário do que as tentativas de pensar conceitualmente situações como esta sugeriam, não se tratava de uma resposta com colorido local a uma questão geral ou da formulação ideológica de uma relação de dominação que, no mais, seria igual a todas as outras, mas sim de viabilizar uma certa produção de mercado nos marcos dessa lógica social. Não fosse assim seria impensável a manutenção pelas usinas de açúcar (festejadas por muitos como exemplos de modernidade técnica e gerencial) dos antigos engenhos (no caso de Pernambuco, guardando até mesmo a denominação) como unidades de produção agrícola e de localização de seus trabalhadores (mesmo quando a expulsão dos engenhos já seguia adiantada). Mais do que um conjunto de formulações para adocicar as relações entre proprietários dos meios de produção e trabalhadores (proletários rurais disfarçados), o que encontramos foi uma conivência eficaz no reconhecimento de que consumo e produção se misturavam num processo produtivo que não era apenas processo produtivo. O "consumo" dos moradores passava por n possibilidades de alguma produção relativamente autônoma (e, significativamente, os trabalhadores expulsos iriam continuar operando com essa lógica, buscando terras para arrendar ou plantando alguma coisa nas beiradas de estrada) dentro de um domínio em que a autonomia era o que de mais difícil havia; a produção dos donos de engenho ou de usinas passava pela possibilidade de alimentar (e vestir e, para tanto e sobretudo, abrigar, dar morada em sua casa, i. e. , em seus domínios) aqueles que produziam por (e para) ele.

O trabalhar teoricamente as relações entre moradores e senhores de engenho, valendo-me de um idioma da morada, deixava todavia de fora, de alguma forma, as relações estabelecidas no barracão entre proprietários, barraqueiros e moradores, nas quais, afinal de contas, parecia estar em jogo um processo de endividamento monetário que apenas um nó teórico externo era capaz de pôr junto daquela relação de morada tal como eu a havia descrito. Só em 1979, num texto redigido para compor a introdução do livro que iria apresentar os trabalhos sobre a área rural do Projeto Emprego, é que eu conseguiria resolver esse problema. A consideração de outras variantes de barracão, que não as que eu havia estudado diretamente na zona da mata de Pernambuco, sugeriu-me que, se a morada e o barracão fossem pensados a partir da ótica de uma teoria da reciprocidade, o fosso entre os dois desapareceria, a dívida material no barracão mostraria o seu lado de dívida social e se revelaria como um objetivador do estado das relações sociais que uniam moradores e senhores de engenho.19 19 À medida que a pesquisa avançava, as limitações do modelo explicativo adotado iam sendo explicitadas. A pergunta ingênua, mas pertinente, sobre o que acontecia com os moradores de engenho durante o tempo em que permaneciam sem morada indicava que uma maior atenção deveria ser dada às redes de sociabilidade que não passavam pela mediação dos proprietários (e que a monografia escrita por Allen Johnson sobre uma fazenda do Ceará indicava serem extensas e densas) e abria espaço para se pensar em algo como uma "cultura camponesa". Dentro dessa linha de preocupações, estimulei Margarita Gaviria a estudar a família camponesa numa área já pesquisada da zona canavieira de Pernambuco, não como unidade econômica, mas como "grupo" no sentido de Znaniecki (Thomas & Znaniecki 1919), do que resultou sua dissertação de mestrado. É nessa mesma frente que se insere a investigação em curso de Louis Herns Marcelin sobre a família negra no Recôncavo baiano, com vistas à sua tese de doutoramento (1996).

Questão agrária

Não sou exatamente um agrarista, termo que, de designar os especialistas em direito agrário, acabou tendo seu uso estendido para designar os estudiosos da chamada questão agrária, juristas ou não. Ao contrário, sempre manifestei, ao lado da minha simpatia política pelas forças sociais que se batem pela redistribuição da propriedade da terra, a antipatia - tradução talvez de alguma dificuldade intelectual minha - pelos instrumentos desse saber quase autônomo (um pouco como a sociologia rural nos Estados Unidos, em que pese a distância ideológica) a que me referi na minha tese de doutoramento como "um misto de agronomia e marxismo" em que se constituíram esses estudos agrários, centrados em torno de noções como estrutura agrária, uma fórmula boa, redonda, para denúncias políticas, mas que escamoteia as relações sociais que seria preciso identificar para se atacarem eficazmente as questões para onde aponta. Diga-se de passagem, que bons trabalhos têm sido produzidos por alguns desses especialistas. Apenas aponto que seu recorte não me atrai.

Essas fronteiras, que a gente estabelece com certo gosto e às vezes até se permitindo alguma acidez na vida acadêmica, são de difícil construção na vida civil. Explicar que o camponês da antropologia não é o camponês da zona da mata ou que uma análise do debate "feudalismo ou capitalismo" é uma peça de sociologia da produção intelectual e não da produção agrícola, além de ser apenas uma meia verdade, é tarefa pouco factível. E menos ainda se torna quando você exerce algum tipo de atividade cívica, para falar como os americanos, junto aos camponeses da "vida real". Nessas circunstâncias, resta-lhe aprender a falar a linguagem própria e usá-la da melhor maneira possível.

Felizmente, os que estão envolvidos diretamente na luta social são, simultaneamente, mais sujeitos e mais rebeldes do que outros grupos a essas construções intelectuais. Afastando-me durante dois anos da Universidade (l978-l980) e permanecendo mais alguns anos em regime de 20 horas, tive a oportunidade de trabalhar como assessor da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Não estando ali com nenhuma pretensão de trabalho acadêmico (muita gente me procurava para saber como eu dava um assessoramento antropológico e, certa feita, cheguei a ser convidado - e obviamente não aceitei - para participar de um grupo de trabalho, não me lembro mais se na Anpocs ou na SBPC, sobre a atuação de antropólogos em atividades de assessoria), recusando-me a oferecer cursos de marxismo ou sobre resultados do meu trabalho intelectual, pude, dialogando com as lideranças, dando forma a suas ideias, mas também formulando coisas na linguagem dos agraristas (fiz muita palestra e escrevi muito texto sobre "estrutura agrária e...") (Palmeira s/d, 1980a___. 1980. "Intervenções no debate sobre reforma agrária", promovido pela FASE, fevereiro de 1980. Proposta n. 14. Mimeo., 1980b___. 1980b. "Comentário sobre o trabalho 'Notas sobre o processo de produção na parceria'", de Edgard Malagodi. In: Encontro Realidade Nordestina. Mestrado em Sociologia e Economia. Universidade Federal da Paraíba, Campina Grande - Convênio UFPB e Fundação Ford. 10 a 12 de junho de 1980. Parte II. pp. 396-399. Mimeo., 1980c___. 1980c. "Comentário sobre o trabalho 'Modernização da Economia Sisaleira: estudo do caso de Pocinhos'", de Maria de Lourdes Lucena et al. In: Encontro Realidade Nordestina. Mestrado em Sociologia e Economia. Universidade Federal da Paraíba, Campina Grande - Convênio UFPB e Fundação Ford. 10 a 12 de junho de 1980. Parte II. pp. 247-271. Mimeo., 1981___. (org.). 1981. As lutas camponesas no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Marco Zero/CONTAG., 1987___. 1987a. "Reforma agrária e constituição". Ciência Hoje, 6(35):68-69., 1993___. 1993a. "A reforma agrária na virada do século". Cadernos da Associação Brasileira de Reforma Agrária, 1(1):45-49., 1994b___. 1994b. "Burocracia, política e reforma agrária". In: Leonilde Medeiros et al. (orgs.), Assentamentos rurais: uma visão multidisciplinar. São Paulo: UNESP. pp. 49-65, 1995), contribuir para a renovação da linguagem sindical e, de algum modo, para o arejamento da linguagem e das concepções dos agraristas. Imagino que por isso se tornou difícil deixar de ser considerado como um membro da família. O que não deixa de ser honroso.

Esse é um campo em que, mais do que pesquisas específicas, acabei transferindo para o que dizia e o que escrevia o que ia acumulando na pesquisa acadêmica e nessa espécie de reflexão a quente que fazia na prática sindical (e, durante um ano, na prática administrativa ou governamental de uma diretoria do Instituto de Colonização e Reforma Agrária). Deixando de lado a minha tese de doutoramento, lida por alguns como uma contribuição à análise da questão agrária, mas que é anterior a tudo isso, em dois momentos tentei inverter o percurso e formular em termos de conhecimento, tal como o entendemos na academia (Palmeira 1979a___. 1979a. "Desmobilização e conflito: relações entre trabalhadores e patrões na agro-indústria pernambucana". Revista de Cultura e Política, 1(1):41-56., 1979b___. 1979b. "The aftermath of pesant mobilization: rural conflicts in the Brazilian Northeast since 1964". In: Neuma Aguiar (ed.), The structure of brazilian development. New Jersey: Transaction Books. pp. 71-98., 1984___. 1984. "Nasce uma força política". Jornal do Brasil, Suplemento Especial. Rio de Janeiro, 4 de dezembro de 1984, pp. 1., 1985___. 1985. "A diversidade de luta no campo: luta camponesa e diferenciação do campesinato". In: Vanilda Paiva (org.), Igreja e questão agrária. São Paulo: Loyola. pp. 43-51., 1987___. 1987a. "Reforma agrária e constituição". Ciência Hoje, 6(35):68-69.), essa massa de informações que eu acumulava em duas frentes. O primeiro, em uma intervenção feita num seminário promovido pelo Cedec, em l979 (Palmeira 1982___. 1982. "Significado da reforma agrária". In: Abdias Carvalho et al. (orgs.), Significado e viabilidade da reforma agrária. Petrópolis: Vozes. pp. 17-45.), no qual afirmei que a reforma agrária se colocava como questão independentemente das formulações que se fizessem em torno dela, e o que estava em jogo era, antes de qualquer exigência econômica, a questão da cidadania (que, aliás, nos últimos anos, virou uma espécie de mote, esvaziada em muito do seu significado). O segundo foi em um trabalho de maior alcance apresentado originalmente numa reunião do Clacso em Recife e que, transformado, viria a ser exposto num seminário no Instituto de Estudos Avançados da USP, e posteriormente publicado, com alguns truncamentos, na sua revista (Palmeira 1989___. 1989. "Modernização, Estado e questão agrária". Estudos Avançados, 3(7):87-108.).

Neste texto, eu compro a questão agrária como tema e o faço de duas maneiras. A primeira, questionando o que até então havia sido dito sobre a modernização da agricultura no Brasil (Palmeira 1993b___. 1993b. "Estado e terras públicas no Brasil". Mimeo.), um pouco como fizera vinte anos antes em "Latifúndio e Capitalismo", só que, contrariamente a este texto em que desagrego discursos para chegar a um arsenal ideológico comum, dessa vez fiz um exercício de agregação. Considerei verdadeiras todas as afirmações feitas pelos autores a respeito da modernização, para mostrar o quão estreito era o alcance dos fenômenos que analisavam; que as transformações sofridas pelo campo brasileiro, através de processos sociais que guardavam uma certa autonomia entre si, haviam sido muito mais profundas. E que essas transformações, ao mesmo tempo em que contribuíam para ilegitimar os padrões de dominação "tradicionais" no campo, reforçavam o peso político do setor agrário ao criarem dentro do Estado uma coalizão de interesses em torno da especulação com a terra, e faziam com que a questão agrária, redefinida em termos de um antagonismo entre esses dois processos, se recolocasse no centro das "questões nacionais", contrariando a ideia, difundida sobretudo por economistas, de que se tratava de uma questão superada pelos rumos que tomou o desenvolvimento econômico do país. Ao lado disso, tentei fazer uma sociologia da questão agrária, indagando sobre como e em que termos se constituíra como questão.

Posteriormente, dentro dessa nova linha de interesse, escrevi um trabalho sobre Estado e terras públicas no Brasil, em que tento, numa abordagem preliminar, explorar algumas das implicações teóricas e políticas de os estudiosos do Estado não considerarem a sua dimensão territorial. Além disso, estou tentando transformar num projeto de pesquisa um dossiê que organizei no período em que estava saindo do Incra, que sugere que os grandes conflitos no campo têm um perfil que só excepcionalmente coincide com o conflito direto e exclusivo entre proprietários e camponeses ou posseiros e grileiros ou outra oposição no gênero, envolvendo múltiplos agentes, inclusive, em posições diferentes, múltiplas instituições de um Estado fragmentado, o que parece coerente com as formulações feitas em "Modernização, Estado e Questão Agrária" (Palmeira 1989___. 1989. "Modernização, Estado e questão agrária". Estudos Avançados, 3(7):87-108., 1990___. 1990. "Modernização, Estado e questão agrária". Síntesis, 12:13-26.).

Política, Poder, Política

Meu primeiro trabalho pessoal de pesquisa foi sobre política. Não sobre algum dos temas nobres, desses que mereciam e ainda merecem a atenção de cientistas políticos ou de políticos de muita ciência. Quando tive, em l962, que definir um tema para o meu trabalho final no Curso de Treinamento Básico em Ciências Sociais, no Instituto de Ciências Sociais da Universidade da Bahia, minha escolha recaiu sobre o banditismo político, que era a expressão usada então para designar o uso da violência física nas lutas que contrapunham blocos político-familiares nas disputas políticas nordestinas. Em Alagoas, especialmente, o fenômeno havia atingido, poucos anos antes, um certo grau de exacerbação, com um tiroteio generalizado entre deputados durante uma sessão da Assembleia Legislativa que iria julgar o pedido de impeachment do então governador, acusado pelos adversários de favorecer a violência no estado. Havia indícios de que alguma coisa de diferente estava ocorrendo, perturbando o equilíbrio, mantido à base dessa violência semiprivada, mas equilíbrio de qualquer modo, que caracterizava a política local.

Por outro lado, Alagoas colocava-se completamente à margem da maré montante de mobilização camponesa que atravessava estados como Paraíba e Pernambuco e começava a aparecer em Sergipe e na Bahia, para não falar de outros estados. Ali não existia uma só liga camponesa e mesmo a ala mais conservadora da Igreja Católica tinha dificuldade de organizar sindicatos que buscassem "a harmonia entre o capital e o trabalho". Eu imaginava que houvesse uma relação entre esses fatos e resolvi estudá-los. Thales de Azevedo entusiasmou-se com a ideia. Ele, que já me fizera escrever um pequeno trabalho de curso sobre "La Guerre Sainte au Brésil", a tese de doutorado de Maria Isaura Pereira de Queiroz, recomendou-me seus trabalhos sobre a "Dança de São Gonçalo" e "Liderança política num povoado baiano". E me apresentou aos trabalhos de Costa Pinto, Pedro Calmon, Nestor Duarte, Wilson Lins, Oliveira Vianna, Capistrano de Abreu, Gustavo Barroso e por aí afora. E aos recentíssimos Rui Facó e Walfrido Moraes.

Depois, foi um mês ou um pouco mais de trabalho intensivo em Maceió, onde Werther Brandão, Félix Lima Junior, Théo Brandão, Moacir Santana e outros mais fizeram crescer aquela bibliografia, com a incorporação dos historiadores locais. Ali, também tive uma proveitosa experiência de trabalho em arquivo e pude realizar uma série de entrevistas com estudiosos e também com protagonistas do processo que eu estava querendo analisar. Finalmente, a volta a Salvador e a redação, quase de um fôlego, de "Banditismo Político e Estrutura Social" (Palmeira 1963PALMEIRA, Moacir. 1963. Banditismo político e estrutura social. Monografia de Conclusão do Curso de Treinamento Básico em Ciências Sociais, no Instituto de Ciências Sociais da Universidade da Bahia. 53 pp.). Eu devorara toda aquela bibliografia, mas a grande referência, na hora da montagem do trabalho, seria "Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional", de Fernando Henrique Cardoso, recém-lançado e que me havia sido recomendado por outro professor do ICS, Luiz Henrique Dias Tavares, historiador.

Em "Banditismo Político e Estrutura Social", de que apenas dois pedaços foram encontrados na montagem do curriculum, depois de fazer um histórico de uma história (que hoje percebo, necessariamente) fragmentária, a da violência política no estado (i.e., a das ocorrências de assassinato, tentativas de assassinato e coisas do gênero, registradas nas fontes a que pude ter acesso na época), chamava a atenção para características diferentes que o fenômeno assumia então nas várias zonas geoeconômicas; explorava a ideia corrente de que a coisa se explicava pela existência de um "sindicato do crime" ou "sindicato da morte", descrito por um de seus supostos integrantes como "uma sociedade que não tinha fim porque, quando um sócio ia morrendo, ia nascendo o outro" e, relativizando essa concepção, percebia nela, todavia, uma sugestão de continuidade que era a ponte que eu tinha para buscar a explicação do fenômeno na estrutura social, numa estrutura social na qual a violência era um valor e tinha o lugar de um valor central.

De um desdobramento desse trabalho iria resultar meu primeiro artigo publicado: "Nordeste: mudanças políticas no século XX" (Palmeira l966___. 1966. "Nordeste: mudanças políticas no século XX". Cadernos Brasileiros, 39.). Era uma tentativa de, apoiando-me no trabalho anterior, na literatura disponível e em algum material de campo não utilizado, entender a história política recente da região, devidamente enquadrada no arcabouço marxoweberiano que emoldurava a sociologia que se fazia então no eixo Rio-São Paulo. Lido hoje, aparece-me senão como uma inversão, pelo menos como uma espécie de troca de erros. Para me contrapor ao equívoco que consistia em pensar o Nordeste, então mais região do que nunca, a partir do seu centro político - Pernambuco - fazendo tábula rasa das diferenças entre os estados e, segundo erro, a um centro concebido, como era esperável que ocorresse num momento de intensa mobilização popular por reformas sociais, fundamentalmente em termos de conflitos de classe, eu acabei projetando para esse centro e, consequentemente, para toda a região, um esquema explicativo montado para um estado da periferia.

Não que eu tenha ingenuamente substituído os conflitos de classe pelas lutas faccionais (até porque o esquema proposto sugeria um determinado tipo de articulação entre conflitos de classe - em que os conflitos entre setores da própria classe dominante tinham um peso especial - e as contendas entre blocos político-familiares e, além disso, porque o peso do coronelismo na política pernambucana era algo muito presente tanto na literatura sociológica quanto na imprensa diária). Mesmo atribuindo pesos diferentes aos dois tipos de conflito na periferia e no centro, não me dei conta de que isso tinha outras implicações e acabei interpretando alianças políticas feitas na política pernambucana calcado no exemplo de Ala goas, quando o caminho seria ter realizado um estudo empírico específico. De qualquer forma, considerando que Love, Levine e Wirth ainda não haviam desembarcado no Brasil, estimo que alguma contribuição tenha sido dada.

Continuei trabalhando mais alguns anos sobre a questão do banditismo e sobre temas próximos. Sempre que tinha oportunidade, voltava ao Arquivo Público de Alagoas; lia e recortava sistematicamente os jornais locais; em bibliotecas e sebos, procurava ampliar a base bibliográfica da pesquisa. Manuel Diégues Junior me apontara algumas bobagens nos dois textos e eu tratei de corrigi-las. Em outras frentes, tentava investimentos que pudessem me ajudar a avançar na pesquisa. Na minha avaliação da época, não tinha resolvido bem a questão da estrutura social e dos valores. O que significava exatamente aquela história da violência como valor? A transposição feita por Fernando Henrique Cardoso da dialética senhor-escravo da Fenomenologia para pensar as relações entre proprietários e escravos nas estâncias e charqueadas gaúchas como relações de violência e alienação, de que eu me havia apropriado no "Banditismo", era brilhante, mas não me resolvia o problema.

Corri atrás das interpretações funcionalistas dos conflitos sociais. Fui atrás de Lewis Coser, através dele cheguei a Simmel e voltei à coletânea editada pela Associação Internacional de Sociologia. Frequentei a teoria da agressão de Johanen Galtung. Procurei, cheio de esperanças, Monsenhor Gusmán e Orlando Fals Borda e sua interpretação (?) da Violência (assim mesmo, com V maiúsculo), nos anos que se seguiram ao Bogotazo. Procurando por esse lado da violência, fui atrás dos "clássicos". Queria editar um volume dos textos básicos, reunindo Engels, Sorel e Fanon. Li-os, mas a coletânea não saiu, e eu continuei no ar. Só não digo que essa viagem bibliográfica tenha sido inútil porque estou aqui contando a estória. Mas também porque me forneceu elementos para montar alguns cursos na época e, posteriormente, ensinar a meus alunos do PPGAS que existem caminhos menos tortuosos para pensar as relações entre teoria e fatos. No meu período de França, ainda trabalhei um pouco em cima daquele material de pesquisa. E cheguei a fazer uma palestra para professores e alunos do PPGAS, em l969, sobre o banditismo político e como eu pensava em continuar trabalhando a questão.

Meu envolvimento no longo processo de investigação da plantation, de que já falei, e todas as rotações teóricas operadas nesse meio tempo levaram-me, todavia, a um progressivo distanciamento do tema, ainda que imaginasse que um mergulho no estudo das relações de domínio-submissão que articulavam proprietários de terras e trabalhadores acabasse por me devolver à política. No texto do projeto que apresentei ao CNPq em l973 - "Sistemas de distribuição e estruturas de poder no Nordeste" - isso transparece claramente:

[...] Se a existência de um sistema de distribuição alternativo ao barracão representa um tipo de alteração que a plantation não consegue absorver, isto se dá porque ela atinge a própria fonte de poder e autoridade dos proprietários que é a sua condição de mediadores. Se a perda da condição de mediadores exclusivos entre os trabalhadores isolados nas unidades produtivas e o resto do mundo tem consequências diretas sobre o próprio tipo de dominação que os proprietários exercem sobre seus dependentes, a alteração desse tipo de dominação deve ter consequências sobre o poder exercido por esses proprietários ao nível da sociedade propriamente dita. A perda da condição de mediadores deve diminuir o peso político dos proprietários tanto em nível local quanto em nível regional. Se, como querem alguns, já há algumas décadas, os proprietários de terras, os antigos senhores de engenho em particular representavam o caso de um grupo que, sem poder econômico e político em termos nacionais, continuava a exercer um verdadeiro monopólio político em termos locais e regionais, a mudança que estamos apontando pode representar o seu desaparecimento como grupo dominante. Isso tanto deve ser verdade quanto a presença na cena política de novos grupos sociais implica novas demandas políticas que devem ser formuladas de algum modo e que dificilmente comportam o tipo de mediação tradicional. Por outro lado, as feiras, embora não sendo mediadores plurifuncionais como eram os proprietários de engenhos, mas mediadores fundamentalmente econômicos (Forman & Riegelhaupt l970) entre a massa de trabalhadores e a sociedade nacional, contribuem decisivamente para a quebra do isolamento a que a plantation submete esses trabalhadores, expondo-os a novas redes de comunicação e à ação de novos mediadores políticos, quer se trate do próprio Estado, através de seus organismos fiscais, repressivos ou assistenciais, ou dos sindicatos rurais. Ora, a simples presença desses novos mediadores pode alterar radicalmente os termos em que se põe a política local e regional, rompendo o fosso (que não seja puramente analítico) entre o "local" e o "nacional". Todavia, não está excluída a possibilidade de que apenas se crie um circuito político paralelo que deixe intocados os mecanismos tradicionais para a resolução de certos conflitos específicos e para a formulação de um tipo de demanda política tradicional que continuaria a existir [...].

A pesquisa foi realizada, mas, por uma série de circunstâncias, essa parte relativa às estruturas políticas locais e regionais não pôde ser trabalhada.

Ironicamente, quase vinte anos depois, voltando a um dos municípios que havia estudado mais de perto na década de 70, para acompanhar o processo de eleições municipais, no quadro de outra pesquisa de que falarei um pouco adiante, encontrei a prefeitura sendo disputada por um ex-barraqueiro que, naquela época, era um dos "monopolistas do mercado público" e estendia seu controle a um setor importante da feira da cidade (cf. "Feira e mudança econômica", (Palmeira 1971b___. 1971b. "Feira e mudança econômica". Simpósio de Pesquisas. Museu Nacional, Centro Latino-americano de Pesquisas em Ciências Sociais. Rio de Janeiro. pp. 117-146. Mimeo.), e um contador, cujo vice e principal financiador da campanha era o dono do mais antigo supermercado da cidade, implantado por volta de 1974, em competição aberta com o ex-barraqueiro. Confesso que uma certa satisfação intelectual misturou-se à minha indignação cívica.

A preocupação com os modos de dominação e sua articulação com a política, além dos temas e dos trabalhos mencionados no tópico "Plantation, campesinato, questão agrária", gerou outros campos de interesse, como movimentos sociais, sindicalismo, identidade e participação política do campesinato, que se consubstanciaram em alguns artigos meus, novos seminários (em especial os seminários sobre "modos de dominação"), alguns artigos e teses de alunos e, no início dos anos 80, na tentativa, que não progrediu, de articulação de um grupo de pesquisas.20 20 Foi em grande parte dentro desse grupo de pesquisas que se geraram a dissertação de mestrado de Mário Grynszpan, "Mobilização camponesa e competição política no estado do Rio de Janeiro (1950-1964)" (1987) e a tese de doutorado de Odaci Coradini (1988), "Representações sociais e conflitos nas políticas de saúde e previdência social rural", além de artigos e relatórios destes e de outros pesquisadores, como Jorge Romano, Lígia Dabul, Nina Almeida Braga e Mirian Nutti.

Mas a preocupação com aquele tipo de política que estava em jogo no "Banditismo" e no "Mudanças políticas" voltou a se colocar, curiosamente, por um caminho completamente diferente. Os anos durante os quais assessorei a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura coincidiram com o período daquela quase interminável "abertura política". Aos poucos, os debates propriamente políticos iam se instalando dentro dos sindicatos, e a perspectiva de uma intervenção do movimento sindical dos trabalhadores rurais - que emergia do período autoritário implantado nacionalmente e com uma imagem de autonomia diante do Estado, no processo eleitoral - começava a se pôr na ordem do dia. A eleição de uma Assembleia Constituinte era o pretexto que faltava. O movimento articulou-se nacionalmente e lançou candidatos em praticamente todos os estados. Apenas um candidato, no Rio Grande do Sul, foi eleito.

O resultado foi um choque para as lideranças, mas, na realidade, confirmava uma tendência, que eu já havia entrevisto no contato quase diário, ao longo de alguns anos, com dirigentes e delegados sindicais, à dissociação entre a intensidade da mobilização sindical (ou a qualidade da ação sindical) e o voto. Já tinha me deparado com situações em que líderes, à frente de um grupo de posseiros e que tinham chegado a enfrentar tropas do Exército, apoiavam o candidato considerado mais conservador e até mesmo com um delegado sindical que, não muito tempo depois de ter defendido à mão armada a sua posse, votara no próprio agressor. As discussões ocorridas por ocasião da avaliação nacional dos resultados da eleição de l986, promovida pela Contag, reunindo dirigentes e vários dos candidatos, foram muito reveladoras. Ao lado de todas as mágoas esperáveis de derrotados, que não eram poucas, havia uma generosa condescendência com o dirigente sindical, em outros momentos acusado de traidor. Este, depois de defender (ou até mesmo de tomar a iniciativa de lançar) em assembleia a candidatura de um companheiro, ao voltar para seu município apoiara o candidato do "chefe político": "A gente entende. Ele já tinha um compromisso".

Com essa experiência no horizonte e estimulado pela leitura do "Negara" de Geertz, dos textos de Bourdieu sobre a representação política e da extensa literatura sobre patronagem, em especial pelo que Landé diz a respeito das alianças diádicas, elaborei o projeto "Concepções de política e ação sindical". Na sua primeira versão, a questão estava posta assim:

O entendimento da dissociação constatada entre mobilização sindical e mobilização política ou entre lutas sociais e manifestações político-eleitorais passa, em nosso entender, pela identificação dos circuitos efetivos da atividade política e das representações que lhes são solidárias. O conceber-se tal ou qual atividade como política ou não política não é sem consequência para a sua eficácia política objetiva. Nossa suposição é que, a exemplo do que ocorre em algumas "economias primitivas", em que se formam "esferas de troca" relativamente estanques, com moedas e regras de intercâmbio próprias, bem como com regras de conversão entre elas bem determinadas (Bohannan 1968), em sociedades complexas ou em segmentos de sociedades complexas, atividades, que o senso comum intelectual reúne sob o termo política, podem estar dispersas em esferas de atividades distintas, pensadas como tais pelos que delas participam, cujas regras de funcionamento e conversão é preciso investigar.

Para investigar essas regras e aquelas concepções, Beatriz Heredia, professora do IFCS que se associou a mim na coordenação do projeto, e eu entendemos que o melhor caminho seria acompanhar um processo eleitoral. A decisão do movimento sindical de trabalhadores rurais de participar organizadamente das eleições municipais de l988 criava-nos uma situação de pesquisa extremamente favorável.

A experiência de campo em Pernambuco e no Rio Grande do Sul iria dar um novo rumo ao projeto. Ao lado de diferenças importantes entre os dois estados, iria revelar recorrências que eram surpreendentes, quando se considerava a diversidade cultural e social e se abriam novas perspectivas de investigação e de elaboração teórica. Assim, ao contrário da atividade sindical, que é pensada como uma atividade permanente, política está associada a eleições. Há um tempo da política que corresponde ao período eleitoral. É o período em que os políticos aparecem, em que se faz política, em que as facções políticas ganham contornos nítidos e tendem a tornar-se inclusivas. Fora desse tempo, as facções existem apenas potencialmente ou de forma dissimulada. A atuação permanente das lideranças, pelo menos quando formulada a partir do tempo da política, não é caracterizada como uma atuação política, mas sim em termos de assistência, ajuda ou de sua negação.

É no tempo da política que a sociedade permite ver suas próprias divisões e de uma forma profundamente ritualizada: na exacerbação das disputas (minimizadas fora desse período), na delimitação de espaços próprios a aliados e adversários, na utilização de símbolos, como cores e músicas, que assinalam as diferenças, no recurso às passeatas e aos comícios. Num quadro como esse, tanto quanto o voto pesa a declaração de voto - a manifestação de indecisão sendo lida como uma declaração de apoio ao candidato adversário. O voto, mais do que uma escolha, aparece como uma manifestação de adesão a uma facção. A disputa eleitoral entre facções é uma disputa pela incorporação daqueles que não pertencem a facções. O que faz com que alguém não vinculado permanentemente a uma facção lhe dê seu voto e, portanto, seja absorvido por ela no momento ritual da eleição, garantindo-lhe o prestígio necessário fora do tempo da política e garantindo-se o acesso privilegiado aos que terão o poder de assegurar privilégios, não são seguramente plataformas de governo ou programas partidários, mas circuitos de reciprocidade, que atravessam tanto o tempo da política quanto o da não política e cujas moedas de troca são favores, ajuda, proteção, dinheiro etc. (Palmeira 1992c___. 1992c. "Tempo de política", resumo do artigo "Política, facção e compromisso", feito pela equipe do Serviço de Apoio à Pesquisa em Educação - SAPÉ, para a publicação Almanaque do Aluá, 1(0):48.).

O peso atribuído a essa espécie de faccionalismo e a dimensão temporal da política, tal como formulados e vividos pelas populações estudadas, representaram complicadores para o projeto original. O primeiro nos fez desconfiar de que os recortes adotados pudessem ser solidários com o contexto de eleições majoritárias e locais, cabendo reestudar as mesmas áreas ao longo de um processo eleitoral com características diferentes. Já a associação política-eleições, com todas as implicações que traz, obrigava-nos a verificar se esta é uma concepção que também tem vigência fora do período eleitoral. Voltamos ao campo em 90 para acompanhar eleições de outra natureza.

O trabalho de análise do material colhido nas duas experiências de campo que tivemos, somado à revisão da literatura, realizada através de seminários com a equipe de pesquisadores e de cursos ministrados no PPGAS, fez com que os objetivos do projeto sofressem uma certa alteração. Hoje, sem abandonar as preocupações iniciais, estamos mais próximos de um estudo do que seria chamado por alguns de "política tradicional" ou "política em nível local", ainda que com uma diferença básica: ao invés de aceitar essas noções pré-construídas que induzem à incorporação de polaridades do tipo moderno/tradicional ou nacional/local, trabalhamos sobre as formulações da população estudada.21 21 Essa pesquisa gerou, além dos artigos e dos relatórios dos coordenadores, uma série de trabalhos de alunos sobre temas como a patronagem e as relações pessoais na política, o faccionalismo ou eleições - com os de Cláudia Guebel, Carlos Kuz e Margarita Gaviria - e deu lugar a duas excelentes dissertações de mestrado: a de Marcos Otávio Bezerra, sobre corrupção, e a de Gabriela Scotto, sobre uma campanha eleitoral no Rio de Janeiro. Também no bojo daquelas preocupações mais amplas sobre a política, inscreve-se o projeto de pesquisa de Renata Castro Menezes, sobre festa e política (em fase de elaboração de dissertação), o de John Cunha Comerford, sobre reuniões sindicais, e o de Adriana Barreto Vianna (sob orientação do professor Antonio Carlos Souza Lima), sobre menoridade.

Seguindo esse caminho, percebemos que estávamos lidando com concepções de política que não eram apenas de camponeses ou, no outro extremo, apenas de uma certa "elite local" e que, sem rastrear as diferentes relações que lhes davam suporte e "explicavam" as suas variações (o que a bibliografia sobre política local no Brasil não consegue nos oferecer), dificilmente poderíamos responder às questões originalmente postas pelo projeto (Palmeira 1991___. 1991. "Política, facção e compromisso: alguns significados do voto". Anais do IV Encontro de Ciências Sociais no Nordeste, 1:111-130., 1992a___. 1992a. "Política local e voto". Tempo e Presença, 214(14):37-40., 1992b___. 1992b. "Voto: racionalidade ou significado?". Revista Brasileira de Ciências Sociais, 20(7):26-30., 1992c___. 1992c. "Tempo de política", resumo do artigo "Política, facção e compromisso", feito pela equipe do Serviço de Apoio à Pesquisa em Educação - SAPÉ, para a publicação Almanaque do Aluá, 1(0):48.). Quem sabe, continuando nessa trilha, não acabaremos topando com a política do Banditismo político, que o tempo mostrou estar muito mais longe da extinção que a vontade de mudança de quem tinha 20 anos na década de 60 lhe vaticinava - ao contrário, acontecimentos muito recentes lembram que é portadora de uma invejável vitalidade - mas que o nosso tempo da política sugere ser apenas uma realidade "perversa" ou "anômica", uma transição mal realizada ao cotidiano "sem política" de uma ordem social de cujos pressupostos somos, todos nós, muito mais prisioneiros do que a nossa vã (cons)ciência, por social ou política que seja, é capaz de imaginar.

Referências bibliográficas

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  • *
    A versão original deste documento foi produzida com o apoio técnico de Diva Azevedo de Farias e Renata Menezes. Contou também com a colaboração de Beatriz Heredia, Lígia Dabul e de meus filhos.
  • 1
    Evidência mais próxima eu não teria para apresentar do que sua inclusão como um dos três primeiros títulos de uma coleção de textos básicos de ciências sociais que me juntou a Antonio Roberto Bertelli e Otávio Guilherme Velho, naqueles anos de semimarginalidade profissional que costumavam se seguir à graduação em sociologia.
  • 2
    Como também não constava deles a realização do doutorado. Fui para me integrar durante um ano a um grande programa de pesquisas do Institut des Hautes Etudes de l'Amérique Latine, com um projeto próprio - "Implicações políticas do desenvolvimento do capitalismo no campo". Como inexistisse o tal programa e o curso de dois anos oferecido pelo IHEAL não me parecesse propriamente fascinante, deixei que Pierre Monbeig, então diretor do Instituto, me convencesse a inscrever-me no Doctorat de 3ème Cycle.
  • 3
    Os cursos que demos juntos foram momentos importantes desse diálogo, mas não os únicos. Conversas, seminários informais, orientação conjunta de alunos foram outros tantos.
  • 4
    Não me parece que tenha sido grande o número daqueles que decidiram trabalhar diretamente sobre produção intelectual. Sob uma espécie de orientação a quatro mãos, minha e de Castro Faria, Alfredo Wagner Berno de Almeida produziu uma excelente tese sobre a trajetória política e intelectual de Jorge Amado e fez, através de um número grande de artigos e papers, da análise da produção intelectual uma de suas linhas de trabalho (Almeida 1978).
  • 5
    Até praticamente a reta final um número mais restrito de pesquisadores - Amélia Sá Barreto Teixeira, Cristina Marin, Dóris Rinaldi, Leilah Landim, Neide Esterci e Regina Novaes - trabalhou junto conosco e deu uma contribuição efetiva ao equacionamento do trabalho.
  • 6
    E não me refiro apenas à literatura brasileira. Isso é verdade também para autores como Eric Wolf e Sidney Mintz (1957) escrevendo sobre a plantationnas Antilhas e na América Central.
  • 7
    Aqui vale a pena assinalar o "se tomássemos como", que indica a diferença nossa em relação a outros esforços da mesma época que simplesmente afirmavam a existência de um "modo de produção latifundiário", como o fez Carlos Romeo (1968), ou investiam no sentido da formalização do que seria um sistema econômico específico, sem outras qualificações, como o fizeram George Beckford (1968, 1969, 1972), George M. Best (1968), Jay Mandle (1972) e outros pesquisadores ligados aos Social and Economic Studies.
  • 8
    Estas, por acaso contempladas, com uma certa generosidade, pela literatura antropológica internacional. Até Malinowski se interessou pelas feiras mexicanas! E, menos remotamente, Sidney Mintz gastou boa parte de sua energia de pesquisador estudando-as no Haiti, no México e em outros países da América Central, sendo que, no caso da Jamaica, identificou nessas praças de mercado, que se foram formando ainda na vigência da escravidão, um elemento importante de desagregação da plantation escravista (Malinowski & De La Fuente1957; Mintz 1959).
  • 9
    Infelizmente, esses projetos não tiveram continuidade. No entanto, os temas continuaram na alça de mira da equipe e foram objeto de trabalhos feitos posteriormente por Lygia Sigaud (1979) e Moema Marques de Miranda (1991) e, ainda na época, de um artigo meu (Palmeira 1979a, 1979b).
  • 10
    Houve momentos em que essa equipe foi ampliada. Assim, em julho de 1974, para a realização de um survey dos barracões da zona da mata de Pernambuco, contamos, além das pessoas já mencionadas, com o concurso dos pesquisadores Regina Novaes, Silvana Araújo, Leila Barsted e Denis Barsted.
  • 11
    É importante assinalar que o projeto de pesquisa que então desenvolvia fazia parte do projeto maior "Estudo Comparativo do Desenvolvimento Regional" (1969-1972), dirigido por Roberto Cardoso de Oliveira e David Maybury-Lewis. Estando Maybury-Lewis empenhado numa pesquisa sobre as elites econômicas e políticas de Pernambuco e levando em conta as dificuldades de, num contexto de conflitos intensos entre proprietários rurais e trabalhadores, realizar trabalho de campo simultaneamente entre as duas categorias, concentrei minha atenção e os esforços da equipe que começava a formar sobre os últimos e sobre os processos sociais a que se vinculavam, tendo o cuidado, todavia, de em cada situação de campo procurar, minimamente que fosse, cobrir, através de entrevistas ou de documentos escritos, as posições socialmente significativas que, por questões estratégicas, estava sendo obrigado a deixar de lado
  • 12
    Esta, talvez, a única categoria social importante que deixamos de estudar na área canavieira de Pernambuco.
  • 13
    De volta ao Brasil, na segunda metade de l969, para trabalhar no PPGAS, por indicação de Otávio Velho, tive oportunidade, inicialmente acompanhando o seminário "Sociedades Campesinas" ministrado por Roberto Cardoso de Oliveira e, posteriormente, dando o seminário "Sociedades Camponesas", de entrar em contato com a bibliografia propriamente antropológica sobre campesinato, extremamente extensa e diversificada, naquele momento de crise de objeto da antropologia (uma das várias) e de glória dos chamados "estudos camponeses" que se desenvolvem numa espécie de fronteira entre antropologia, sociologia, correntes da história social, certas tradições da economia e a vertente marxista de estudo da questão agrária, a que poderíamos somar os estudos latino-americanos sobre estrutura agrária, marcando uma certa oposição com a sociologia e a economia rurais convencionais. Ofereci esse curso inúmeras vezes, sozinho ou em parceria com professores como Otávio Velho, Afrânio Garcia, Beatriz Heredia, Lygia Sigaud e Giralda Seyferth.
  • 14
    Esse não foi um movimento limitado ao círculo dos meus orientados. Primeiro, porque outros professores passavam por experiência semelhante. Depois, porque o curso Sociedades Camponesas tinha um alcance bem mais amplo. O fato é que dessa dinâmica acabou resultando uma sequência volumosa de trabalhos sobre camponeses, conduzidos sob a orientação de diferentes professores, cujas qualidade e originalidade acabaram se constituindo em uma das marcas do PPGAS.
  • 15
    Montado num diálogo com um grupo de economistas ligados ao IPEA, o projeto se dispunha também a contribuir para se responder a algumas questões que eram objeto de preocupação de alguns setores da sociedade, como as migrações e o emprego. Por isso, tivemos que desviar um pouco a rota e realizar um amplo levantamento bibliográfico sobre esses temas e investir certo esforço na leitura e na análise de parte da bibliografia identificada.
  • 16
    José Sérgio Leite Lopes, além de coordenar, com Machado, as pesquisas em áreas urbanas, deu sequência a seu trabalho anterior nas usinas, estudando, ao lado de Rosilene Alvim, uma espécie de situação-limite de fábrica com vila operária, em que estava em jogo toda uma cidade.
  • 17
    Para não me alongar, lembraria que dessas pesquisas resultaram, dentre outros trabalhos, as teses de mestrado e doutorado de Afrânio Raul Garcia Junior (1976, 1983); Beatriz Heredia (1977, 1986); José Sergio Leite Lopes (1975, 1986); Lygia Sigaud (1979) e Marie-France Garcia (1977, 1984); e as de mestrado de Doris Rinaldi Meyer (1978), Leilah Landim Assumpção (1978), Regina Novaes (1982) e Roberto Ringuelet (1977).
  • 18
    Digo "parece" porque a destituição dos engenhos da condição de unidades de produção das usinas foi, por assim dizer, a última das surpresas de campo de que só uma nova pesquisa - e esta não foi feita - poderia dar conta.
  • 19
    À medida que a pesquisa avançava, as limitações do modelo explicativo adotado iam sendo explicitadas. A pergunta ingênua, mas pertinente, sobre o que acontecia com os moradores de engenho durante o tempo em que permaneciam sem morada indicava que uma maior atenção deveria ser dada às redes de sociabilidade que não passavam pela mediação dos proprietários (e que a monografia escrita por Allen Johnson sobre uma fazenda do Ceará indicava serem extensas e densas) e abria espaço para se pensar em algo como uma "cultura camponesa". Dentro dessa linha de preocupações, estimulei Margarita Gaviria a estudar a família camponesa numa área já pesquisada da zona canavieira de Pernambuco, não como unidade econômica, mas como "grupo" no sentido de Znaniecki (Thomas & Znaniecki 1919), do que resultou sua dissertação de mestrado. É nessa mesma frente que se insere a investigação em curso de Louis Herns Marcelin sobre a família negra no Recôncavo baiano, com vistas à sua tese de doutoramento (1996).
  • 20
    Foi em grande parte dentro desse grupo de pesquisas que se geraram a dissertação de mestrado de Mário Grynszpan, "Mobilização camponesa e competição política no estado do Rio de Janeiro (1950-1964)" (1987) e a tese de doutorado de Odaci Coradini (1988), "Representações sociais e conflitos nas políticas de saúde e previdência social rural", além de artigos e relatórios destes e de outros pesquisadores, como Jorge Romano, Lígia Dabul, Nina Almeida Braga e Mirian Nutti.
  • 21
    Essa pesquisa gerou, além dos artigos e dos relatórios dos coordenadores, uma série de trabalhos de alunos sobre temas como a patronagem e as relações pessoais na política, o faccionalismo ou eleições - com os de Cláudia Guebel, Carlos Kuz e Margarita Gaviria - e deu lugar a duas excelentes dissertações de mestrado: a de Marcos Otávio Bezerra, sobre corrupção, e a de Gabriela Scotto, sobre uma campanha eleitoral no Rio de Janeiro. Também no bojo daquelas preocupações mais amplas sobre a política, inscreve-se o projeto de pesquisa de Renata Castro Menezes, sobre festa e política (em fase de elaboração de dissertação), o de John Cunha Comerford, sobre reuniões sindicais, e o de Adriana Barreto Vianna (sob orientação do professor Antonio Carlos Souza Lima), sobre menoridade.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2014
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