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Tetanorhynchus leonardosi (Mello-Leitão) (Orthoptera: Proscopiidae), nova praga em eucaliptos

Tetanorhynchus leonardosi (Mello-Leitão) (Orthoptera: Proscopiidae), a new eucalyptus pest

Resumo

We report for the first time the attack of the walking stick Tetanorhynchus leonardosi (Mello-Leitão) (Orthoptera: Proscopiidae) on young eucalyptus, Eucalyptus urophylla, in Brazil. The upper third of the trees was attacked (apical meristems and new leaves). During the hottest hours of the day the insects were found sheltered between leaves on the median third of the plants, and feeding when temperatures were milder. The attack was heterogeneous in the stand, being more concentrated when it was neighbouring an area of native 'Cerrado' vegetation. Mean defoliation was 5.8%, with an average of 5.2% of plants with apical meristems cut by the walking sticks. An application of Methyl Parathion was not effective against the pest. Apparently plants older than 6 months were less attacked by the insects, that preferred 3-month old trees. The reduction of native vegetation may explain the dispersion of T. leonardosi from its native host plants to the exotic eucalyptus.

Insecta; damage; dispersion; walking stick


Insecta; damage; dispersion; walking stick

COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

Tetanorhynchus leonardosi (Mello-Leitão) (Orthoptera: Proscopiidae), nova praga em eucaliptos

Tetanorhynchus leonardosi (Mello-Leitão) (Orthoptera: Proscopiidae), a new eucalyptus pest

Carlos A.H. FlechtmannI; Angelo L.T. OttatiI

IDepartamento de Biologia, FEIS/UNESP, Avenida Brasil 56, 15385-000, Ilha Solteira, SP

ABSTRACT

We report for the first time the attack of the walking stick Tetanorhynchus leonardosi (Mello-Leitão) (Orthoptera: Proscopiidae) on young eucalyptus, Eucalyptus urophylla, in Brazil. The upper third of the trees was attacked (apical meristems and new leaves). During the hottest hours of the day the insects were found sheltered between leaves on the median third of the plants, and feeding when temperatures were milder. The attack was heterogeneous in the stand, being more concentrated when it was neighbouring an area of native 'Cerrado' vegetation. Mean defoliation was 5.8%, with an average of 5.2% of plants with apical meristems cut by the walking sticks. An application of Methyl Parathion was not effective against the pest. Apparently plants older than 6 months were less attacked by the insects, that preferred 3-month old trees. The reduction of native vegetation may explain the dispersion of T. leonardosi from its native host plants to the exotic eucalyptus.

Key words: Insecta, damage, dispersion, walking stick.

Ao contrário do que ocorre em florestas de Pinus, a adaptação de espécies nativas de insetos ao exótico Eucalyptus tem ocorrido de maneira mais acelerada, em função da riqueza de nossa flora em representantes de Myrtaceae, família à qual pertencem os eucaliptos. Atualmente, existe no Brasil uma vasta gama de insetos nativos que causam danos de ordem econômica, sendo que estes danos vem aumentando em intensidade ano a ano (Anjos et al. 1986).

Um fator que pode influenciar no surgimento de novas pragas é a substituição de áreas de vegetação nativa por extensas áreas de monoculturas, como vem ocorrendo com o eucalipto na região central do Brasil. Uma vez privadas de suas plantas hospedeiras naturais, espécies de insetos nativos podem, por pressão de seleção, se adaptar a espécies plantadas em monoculturas, passando a se constituir em novas pragas (Valencia & Atkinson 1987). Insetos da família Proscopiidae, popularmente denominados de taquarinhas ou manés-magros, pertencem à super-família Proscopoidea, cujos representantes são originários e exclusivos da América do Sul (Ferreira 1978), onde são de ocorrência endêmica (Amédégnato 1985). No Brasil, a ocorrência de Proscopiidae pragas era conhecida somente nos gêneros Cephalocoema Serville (Silva et al. 1957, Launois 1984a, LeCoq 1986), Proscopia Klug (Silva 1962, 1966) e Stiphra Brunner (G.P. Arruda & E.P. Carvalho, não publicado, Moraes 1982, Souza et al. 1983), estes relatados basicamente no Nordeste, atacando plantas nativas e outras cultivadas, como árvores frutíferas. Tetanorhynchus ocorre na região central da América do Sul, com espécies conhecidas na Bolívia, Paraguai e Brasil, porém não se conhecendo nenhuma de importância econômica (Jago 1989).

Basicamente somente duas espécies de taquarinhas foram registradas na literatura atacando eucaliptos. S. robusta Mello-Leitão pode causar sérios danos a eucaliptos no Nordeste (Moraes et al. 1983, Launois 1984a, Haji et al. 1985), enquanto que C. borellii (Giglio-Tos) (muito provavelmente Bolido rhynchus borellii) foi registrado atacando eucaliptos no eixo Campo Grande (MT) - Três Lagoas (MS) (Berti Fº 1981). Entretanto, dados que expressam quantitativamente os danos causados em situação de floresta implantada, não são disponíveis na literatura. Este trabalho visa a documentar uma nova espécie de praga ao eucalipto, do gênero Tetanorhynchus Brunner (Proscopiidae), e apresentar dados de danos causados a uma essência exótica.

O local de ataque da taquarinha foi um talhão de 86,6 ha composto por plantas de Eucalyptus urophylla, localizado em Três Lagoas/MS (Champion Papel e Celulose). Os eucaliptos apresentavam idade aproximada de três meses, e o espaçamento entre plantas de 2,75 m x 2,75 m. O talhão estava circundado por outros talhões de E. urophylla em três de suas faces, enquanto que uma quarta face era vizinha a uma área de reserva legal, composta por vegetação nativa de cerrado. Foram realizadas amostragens em seis áreas distintas no talhão, sendo quatro destas localizadas nos vértices do talhão, e as demais na região intermediária dos lados de maior compri mento da área atacada. Para cada área amostrada, foram amostradas sequencialmente 450 plantas, totalizando 2700 eucaliptos vistoriados. Em 01/02/1996 foram feitos registros do número de taquarinhas (adultos e ninfas maduras) encontradas por árvore, número de meristemas apicais cortados e estimativa de desfolha por planta.

A espécie foi identificada como T. leonardosi (Mello-Leitão, 1939), e os ataques foram observados iniciando-se na parte superior dos eucaliptos (idade de três meses), em folhas novas, sendo estas consumidas a partir de sua borda até o pecíolo. A alimentação ocorreu nas horas de temperatura mais amena do dia, sendo que nas horas mais quentes, as taquarinhas ficavam abrigadas entre as folhas dos eucaliptos, em seu terço médio. Comportamento de alimentação semelhante foi observado também para as espécies C. protopeirae e S. robusta (Launois 1984b).

Valores médios de quantidade de taquarinhas, % de desfolha e % de meristemas cortados foram, respectivamente, de 21,2; 5,8% e 5,2%. Os danos observados (desfolha e meristemas atacados) foram baixos; entretanto, a distribuição das taquarinhas no talhão foi heterogênea. Enquanto que as áreas do talhão atacado cujas faces faziam fronteira com outros talhões de eucalipto apresentaram poucos indivíduos e danos, a área vizinha à vegetação de cerrado apresentava danos significativamente maiores. Berti Fº (1981) observou comportamento semelhante, onde o ataque da espécie de taquarinha C. borellii (= B. borellii) a talhões de eucaliptos iniciou-se nos limites com vegetação nativa de cerrado.

Limitando-se somente à área mais atacada, a desfolha (11,7%) foi considerada como teoricamente de nível tolerável pelas plantas; entretanto, os danos atribuídos a corte de meristema (10,3% cortados) foram considerados como de maior importância. O corte de meristema apical geralmente resulta num bifurcamento, o que ocasiona um atraso no crescimento da planta, e se o destino do plantio for madeira para serraria, há a necessidade de poda de ramos, aumentando o custo final da madeira (Zanúncio & Lima 1975). Um fato curioso foi observado em relação aos demais talhões reflorestados com eucaliptos, estes também fronteiriços à vegetação de cerrado. Em todos estes demais talhões os eucaliptos apresentavam idade superior a seis meses, e nestes observou-se praticamente uma ausência de representantes da taquarinha em estudo. Levando-se em conta que todas as outras variáveis eram semelhantes nestes talhões, talvez o fator idade da planta fosse o responsável por tornar plantas de eucalipto mais ou menos susceptíveis a um ataque de T. leonardosi.

S. robusta é facilmente controlado com inseticidas, em especial os fosforados (Bastos & Alves 1979, Haji et al. 1985). Entretanto, uma pulverização do talhão com Parathion Metílico (200 ml ia/ha) não foi eficiente, contrastando com resultados obtidos por Bastos (1975a), que verificou ter sido este o melhor dos inseticidas testados contra S. robusta. Resultados semelhantes aos aqui obtidos foram relatados por Berti Fº (1981) para C. borellii (= B. borellii), que relatou a queima de aceiro do cerrado como a forma mais eficiente de controle, sendo o controle químico insatisfatório.

Embora consideradas como polífagas (Launois 1984a), as taquarinhas podem apresentar preferência por planta hospedeira. Bastos (1975b) constatou preferência de S. robusta por folhas de cajueiro (Anacardium occidentale) e mangueira (Mangifera indica), enquanto que Haji et al. (1985) listaram E. citriodora como uma das essências florestais mais atacadas por esta espécie no Nordeste. Observações de Launois (1984a) concordam com os últimos autores, ao considerar eucaliptos como as plantas mais susceptíveis a S. robusta. Mesmo limitando-se somente ao gênero Eucalyptus, existe uma preferência por espécies, como evidenciado por Moraes et al. (1983), cujos testes mostraram E. urophylla e E. grandis como as que mais sofreram danos por Stiphra sp..

No Nordeste, considera-se alguns fatores como os contribuintes para a dispersão de determinados insetos cujo hábito natural é a caatinga, a áreas cultivadas, quer sejam estas agrícolas ou florestais. Nesta região, está ocorrendo um contínuo recuo da caatinga, com sua área sendo tomada por espécies exóticas à região, como Eucalyptus, sendo ainda que várias destas culturas são, em maior ou menor grau, irrigadas. Deste modo, o aumento na área irrigada, a introdução de novas espécies de plantas e a diminuição de área de vegetação nativa são considerados como os principais fatores para que representantes de taquarinhas tenham-se tornado pragas, à semelhança do que vem também acontecendo com algumas espécies de gafanhotos, migradores ou não (Launois 1983, 1984a).

Taquarinhas são univoltinas, sendo a biologia destas espécies ajustada ao ciclo das plantas (Launois 1984a). Ovos são depositados no final da estação chuvosa, com as ninfas eclodindo no início da próxima estação chuvosa, quando as plantas hospedeiras emitem novas brotações, propiciando o alimento às ninfas e adultos (Launois 1983, 1984a, Souza et al. 1983). Com a introdução de novas culturas, propicia-se às taquarinhas ter alimento (folhas) disponível o ano todo, o que poderia ainda selecionar indivíduos com um ciclo biológico distinto, com duas ou mais gerações por ano. Ainda, principalmente em sistemas de cultivos de florestas de eucaliptos, onde muitas vezes o sub-bosque é mantido ralo, favorece-se a seleção de indivíduos com maiores tendências à monofagia, por falta de chance de escolha por planta hospedeira, que poderia estar presente no sub-bosque (Launois 1984a). Deste modo, aparentemente a expansão de florestas implantadas de eucaliptos na região de Três Lagoas pode ter sido o fator principal para que T. leonardosi passasse a atacar esta essência exótica. Os danos constatados foram de modo geral ainda relativamente baixos, porém se considerada a experiência nordestina, as possibilidades destes aumentarem e se tornarem mais frequentes, existe. Os danos foram consideravelmente maiores na região vizinha ao cerrado, habitat nativo da taquarinha. Aparentemente, os resultados observados sugerem que eucaliptos são mais susceptíveis ou preferidos pela taquarinha até uma idade inferior a seis meses, a partir da qual ataques tornam-se mais raros.

Agradecimentos

À Dra. Christiane Amédégnato (Muséum National d'Histoire Naturelle, Paris) e Dr. Nicolas D. Jago (Overseas Development, Natural Resources Institute, Londres) pela identificação da espécie de Proscopiidae.

Literatura Citada

Recebido em 29/08/96. Aceito em 10/10/97.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Out 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 1997

Histórico

  • Aceito
    10 Out 1997
  • Recebido
    29 Ago 1996
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