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Exigências térmicas de Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville (Heteroptera: Pyrrhocoridae), o percevejo manchador do algodoeiro

Thermal requirements of the cotton stainer Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville (Heteroptera: Pyrrhocoridae)

Resumos

Estudou-se a biologia de Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville, percevejo manchador do algodoeiro, em sete temperaturas (18, 20, 22, 25, 28, 30 e 32ºC), visando a determinação das suas exigências térmicas para programas de manejo de pragas do algodoeiro. O desenvolvimento embrionário de D. peruvianus não se completou a 32ºC. Nas demais temperaturas, embora tenha ocorrido uma variação do período ovo-adulto de 25,1 dias (30ºC) a 68,5 dias (18ºC), os insetos apresentaram sempre cinco ínstares. A maior mortalidade na fase ninfal foi registrada nas temperaturas mais altas, evidenciando a adaptação de D. peruvianus às baixas temperaturas, embora a mortalidade em todas as temperaturas tenha sido elevada nos dois primeiros ínstares. O limiar térmico inferior de desenvolvimento de D. peruvianus (temperatura base) foi de 12,86ºC para o ciclo total, com exigências térmicas de 419,66 graus dias. O limiar inferior de desenvolvimento foi de 10,46ºC para a fase de ovo, sendo crescente do 1º ao 4º ínstar ninfal (respectivamente, 9,98, 12,58, 13,73 e 13,93ºC), diminuindo no último ínstar (11,91ºC).

Insecta; previsão de ocorrência; temperatura; manejo integrado de pragas; técnicas de criação


The biology of the cotton stainer, Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville, was studied at seven temperatures (18, 20, 22, 25,28, 30 and 32ºC) in order to determine the thermal requirements. Bugs did not develop at 32ºC. On the other six temperatures they showed five instars. The life cycle ranged from 25.1 to 68.5 days when reared at 30ºC and 18ºC, respectively. Although the mortality during the two first nymphal instars at all temperatures did not differ, D. peruvianus showed higher mortality for the entire nymphal stage at higher temperatures. The lower threshold temperature for the development from egg to adult of D. peruvianus was 12.86ºC and its thermal requirements was 419.66 degree-days (DD). The lower threshold temperature for eggs of D. peruvianus was 10.46ºC and for nymphal stages 9.98ºC, 12.58ºC, 13.73ºC, 13.93ºC and 11.91°C (for the 1°, 2°, 3°, 4°and 5° instars, respectively).

Insecta; cotton stainer; thermal requirements; integrated pest management; rearing techniques


ECOLOGIA, COMPORTAMENTO E BIONOMIA

Exigências térmicas de Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville (Heteroptera: Pyrrhocoridae), o percevejo manchador do algodoeiro

Thermal requirements of the cotton stainer Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville (Heteroptera: Pyrrhocoridae)

Patrícia Milano; Fernando L. Cônsoli; Neide G. Zério; José R.P. Parra

Departamento de Entomologia, ESALQ/USP, Caixa postal 9, 13418-900, Piracicaba, SP

RESUMO

Estudou-se a biologia de Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville, percevejo manchador do algodoeiro, em sete temperaturas (18, 20, 22, 25, 28, 30 e 32ºC), visando a determinação das suas exigências térmicas para programas de manejo de pragas do algodoeiro. O desenvolvimento embrionário de D. peruvianus não se completou a 32ºC. Nas demais temperaturas, embora tenha ocorrido uma variação do período ovo-adulto de 25,1 dias (30ºC) a 68,5 dias (18ºC), os insetos apresentaram sempre cinco ínstares. A maior mortalidade na fase ninfal foi registrada nas temperaturas mais altas, evidenciando a adaptação de D. peruvianus às baixas temperaturas, embora a mortalidade em todas as temperaturas tenha sido elevada nos dois primeiros ínstares. O limiar térmico inferior de desenvolvimento de D. peruvianus (temperatura base) foi de 12,86ºC para o ciclo total, com exigências térmicas de 419,66 graus dias. O limiar inferior de desenvolvimento foi de 10,46ºC para a fase de ovo, sendo crescente do 1º ao 4º ínstar ninfal (respectivamente, 9,98, 12,58, 13,73 e 13,93ºC), diminuindo no último ínstar (11,91ºC).

Palavras-chave: Insecta, previsão de ocorrência, temperatura, manejo integrado de pragas, técnicas de criação

ABSTRACT

The biology of the cotton stainer, Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville, was studied at seven temperatures (18, 20, 22, 25,28, 30 and 32ºC) in order to determine the thermal requirements. Bugs did not develop at 32ºC. On the other six temperatures they showed five instars. The life cycle ranged from 25.1 to 68.5 days when reared at 30ºC and 18ºC, respectively. Although the mortality during the two first nymphal instars at all temperatures did not differ, D. peruvianus showed higher mortality for the entire nymphal stage at higher temperatures. The lower threshold temperature for the development from egg to adult of D. peruvianus was 12.86ºC and its thermal requirements was 419.66 degree-days (DD). The lower threshold temperature for eggs of D. peruvianus was 10.46ºC and for nymphal stages 9.98ºC, 12.58ºC, 13.73ºC, 13.93ºC and 11.91°C (for the 1°, 2°, 3°, 4°and 5° instars, respectively).

Key words: Insecta, cotton stainer, thermal requirements, integrated pest management, rearing techniques

Os percevejos do algodoeiro passaram despercebidos por muito tempo, pois eram controlados simultaneamente com a aplicação de inseticidas para eliminar as principais lagartas dessa cultura (curuquerê-do-algodoeiro, lagarta-da-maçã e lagarta rosada) (Gallo et al 1988).

Com a adoção de técnicas de Manejo de Pragas no algodoeiro, reduzindo-se a aplicação de agroquímicos, os percevejos manchador e rajado passaram a ocorrer com freqüência, causando, algumas vezes, prejuízos consideráveis, especialmente pelo desconhecimento de sua bioecologia. No caso de Dysdercus, tais prejuízos relacionam-se à perda de peso da semente e redução do teor de óleo, além dos danos indiretos, pela inoculação de microorganismos e, principalmente, por mancharem as fibras do algodão, o que lhes deu o nome vulgar de percevejos manchadores (Brisolla et al. 1992).

Nesta pesquisa estudou-se a biologia de Dysdercus peruvianus Guérin-Méneville, o percevejo manchador do algodoeiro em sete temperaturas (18, 20, 22, 25, 28, 30 e 32ºC), visando a determinação das suas exigências térmicas.

Material e Métodos

A criação estoque de D. peruvianus do laboratório de Biologia de Insetos do Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola da ESALQ/USP é mantida baseando-se na metodologia de Mendes (1964) e Parra (1998).

Os ovos de D. peruvianus obtidos desta criação estoque, foram mantidos em caixas circulares de material plástico transparente, de 6 cm de diâmetro e 2 cm de altura. Após a eclosão, as ninfas de primeiro ínstar receberam apenas água, trocada diariamente, fornecida por capilaridade, através de rolo dental colocado na parte central de recipientes de vidro. A partir do segundo ínstar, as ninfas foram alimentadas com sementes de algodão `IAC 22' (com línter), mantidas previamente em água durante 24 h. No quarto ínstar, as ninfas foram transferidas para copos plásticos de 12,8 cm de altura, com base menor de 6 cm de diâmetro e base maior de 8 cm, a qual foi vedada por tecido "voil" contendo algodão umedecido, sobre o mesmo, renovado diariamente, visando o fornecimento de água para as ninfas. Neste local ocorreu a emergência de D. peruvianus.

A biologia foi estudada nas temperaturas de 18, 20, 22, 25, 28, 30 e 32ºC mantidas em câmaras climatizadas com UR de 60±10% e fotofase de 14 h. Em todas elas, observaram-se: duração dos períodos de incubação e ninfal e respectivas viabilidades, num total de 180 ovos do dia por tratamento, em delineamento experimental inteiramente casualizado. Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade. O número de gerações da praga foi estimado baseando-se nas suas exigências térmicas, calculadas segundo Haddad & Parra (1984); tal número, foi estimado para o período de abertura de capulhos, nas regiões de isotermas de 17 a 23ºC do Estado de São Paulo, baseando-se em Parra (1985).

Resultados e Discussão

Não ocorreu desenvolvimento embrionário de D. peruvianus a 32ºC (Tabela 1), sendo, nas demais temperaturas, decrescente com o aumento térmico. A mortalidade no primeiro ínstar ninfal foi maior a 28 e 30ºC (Tabela 2), sendo, portanto, para todas as temperaturas, o período crítico para o percevejo, em laboratório; na natureza, provavelmente os ovos não ficam expostos a altas temperaturas, desde que são colocados no solo (Mendes, 1964). As viabilidades foram, no geral, elevadas no segundo, terceiro, quarto e quinto ínstares de D. peruvianus (Tabela 2), discordando dos resultados de Brisolla et al. (1992) que, trabalhando com temperaturas flutuantes, encontraram maior mortalidade para ninfas no 2º ínstar, seguida do 1º e 5º ínstares.

A duração média da fase ninfal foi decrescente com a temperatura, sendo o último ínstar o mais longo. Em todas as temperaturas ocorreram cinco ínstares (Tabela 3), coincidindo com os resultados de Brisolla et al. (1992), não havendo, portanto, efeito da temperatura sobre este parâmetro biológico.

A duração do ciclo variou de 25,1 a 68,5 dias conforme a temperatura, sendo a maior viabilidade observada na faixa de 18 a 25ºC. A maior mortalidade causada no primeiro ínstar, quando o percevejo manchador foi criado nas temperaturas de 28 e 30ºC, acabou refletindo em menor viabilidade do ciclo total (Fig. 1).


As exigências térmicas para o período de ovo a adulto foram de 419,66 graus dias, sendo a temperatura base (Tb) de 12,86ºC. Para a fase de ovo, a Tb foi de 10,46ºC, sendo crescente do primeiro ao quarto ínstar (respectivamente, 9,98, 12,58, 13,73 e 13,93ºC), diminuindo no último ínstar (11,91ºC) (Fig. 2).


Embora o método adotado tenha sido adequado para a criação de D. peruvianus, observou-se, na criação estoque, a ocorrência de canibalismo de ninfas maiores sobre as de menor tamanho, fato já observado para a espécie por Jurberg et al. (1982) e Brisolla et al., (1992) e que provavelmente, deve ser um caráter genético. Observou-se nos recipientes plásticos que abrigavam as ninfas de primeiro ínstar, que as mesmas quando mortas, serviram de alimento para outras de igual tamanho, caracterizando a saprofagia na espécie. Estes fenômenos, assim como a presença do protozoário Nosema sp., que ocorreu nos ínstares mais avançados, independeram da temperatura.

Assim, como condição mais adequada para criação de D. peruvianus, recomenda-se a faixa térmica entre 22 e 25ºC. Levando-se em conta as exigências térmicas, é possível prever que no período de aparecimento da praga (abertura dos capulhos), que corresponde a 55 dias (Zucchi et al.,1993), deve ocorrer uma geração (variável de 0,54 a 1,33 gerações), em regiões com isotermas de 17 a 23ºC, sendo, portanto, os prejuízos à cultura, dependentes da infestação inicial da praga. Estes dados poderão facilitar a previsão de ocorrência de D. peruvianus e, conseqüentemente facilitar o seu controle.

Literatura Citada

Recebido em 16/02/98. Aceito em 15/03/99.

  • Brisolla, A.D., E.C. Bergmann & S.D.L. Imenes. 1992. Aspectos biológicos de Dysdercus peruvianus Guérin-Menéville, 1831, em condições de laboratório. Arq. Inst. Biol. , São Paulo, 59(1/2): 19-22.
  • Gallo, D., O. Nakano, S. Silveira Neto, R.P.L. Carvalho, G.C. Batista, E. Berti F, J.R.P Parra, R.A. Zucchi, S.B. Alves & J.D. Vendramim. 1988. Manual de Entomologia Agrícola. Ed. Agronômica. Ceres, 649 p.
  • Haddad, M.L. & J.R.P. Parra. 1984. Métodos para estimar os limites térmicos e a faixa ótima de desenvolvimento das diferentes fases do ciclo evolutivo de insetos. Piracicaba, Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz. 12p.
  • Jurberg, J., E.F. Rangel & T.C.M. Gonçalves. 1982. Estudos morfológico comparativo da genitália de três espécies do gênero Dysdercus Guérin Méneville, 1831- (Hemiptera: Pyrrohocoridae). Rev. Bras. Biol. 42(2): 387-407.
  • Mendes, L.O.T. 1964. Técnica de laboratório para a criação de insetos do gênero Dysdercus (Hemiptera: Pyrrhocoridae), manchadores do algodão. Bragantia 23: 9-14.
  • Parra, J.R.P. 1985. Biologia comparada de Perileucoptera coffeella (Guérin-Menèville, 1842) (Lepidoptera: Lyonetiidae) visando ao seu zoneamento ecológico no estado de São Paulo. Rev. Bras. Entomol. 29(1): 45-76.
  • Parra, J.R.P. 1998. Criação de insetos para estudos com patógenos, p. 1015-1038. In: S.B. Alves (ed.) Controle microbiano de insetos, Piracicaba, FEALQ, 1163p.
  • Zucchi, R.A., S. Silveira Neto & O . Nakano. 1993. Guia de identificação de pragas agrícolas. Piracicaba, FEALQ, 139p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2006
  • Data do Fascículo
    Jun 1999

Histórico

  • Aceito
    15 Mar 1999
  • Recebido
    16 Fev 1998
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