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Avaliação da exposição ocupacional ao chumbo em uma metalúrgica um estudo transversal

Assessment of occupational exposure to lead in a metallurgy plant a cross-sectional study

Resumos

OBJETIVO: Avaliar o nível de exposição ocupacional em uma metalúrgica de chumbo, através da determinação dos indicadores biológicos de exposição e efeito, com o objetivo de estabelecer um mapeamento das áreas de risco dentro da planta industrial. METODOLOGIA: Estudo transversal incluindo 195 trabalhadores de uma metalúrgica primária de chumbo, localizada no Estado da Bahia-Brasil, e um grupo de referência de 65 indivíduos. Nos grupos de expostos e controle foram realizadas as dosagens dos indicadores biológicos de exposição e efeito (IBE's) ao chumbo inorgânico, incluindo Pb-S, ALA-U, ZnPP e Hb.

Chumbo Sangüíneo; Exposição Ocupacional; ALA; PB-S


OBJECTIVE: The aim of this study was the assessment of occupational exposure to lead in a metallurgy plant, by measuring biological exposure and effects indicators; and the mapping of risk areas throughout the industrial plant. METHODOLOGY: A cross-sectional study was performed involving 195 workers at a lead metallurgy plant and a reference group of 65 individuals, in the State of Bahia, Brazil. Both the exposed and control groups were tested for dosage levels for biological exposure and effects indicators for inorganic lead, including Pb-S, ALA-U, ZnPP and Hb - (blood lead level (BLL); d-aminolevulinic acid in urine (ALA-U); zinc-protoporphyrin (Zn-PP); and hemoglobin (Hb).

Lead in Blood; Occupational Exposure; BLL; ALA


Avaliação da exposição ocupacional ao chumbo em uma metalúrgica um estudo transversal

Assessment of occupational exposure to lead in a metallurgy plant a cross-sectional study

José Antonio Menezes FilhoI; Wilson Andrade de CarvalhoII; Ademário Galvão SpínolaIII

IFarmacêutico-Bioquímico, M.Sc. Professor de Toxicologia da Universidade Federal da Bahia e Coordenador do Laboratório de Patologia Clínica e Toxicologia do Hospital São Rafael

IIMédico da Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Farmácia e Chefe do Laboratório de Patologia Clínica e Toxicologia do Hospital São Rafael

IIIMédico da Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Medicina, Departamento de Medicina Preventiva e Chefe do Serviço de Medicina do Trabalho do Hospital São Rafael

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar o nível de exposição ocupacional em uma metalúrgica de chumbo, através da determinação dos indicadores biológicos de exposição e efeito, com o objetivo de estabelecer um mapeamento das áreas de risco dentro da planta industrial.

METODOLOGIA: Estudo transversal incluindo 195 trabalhadores de uma metalúrgica primária de chumbo, localizada no Estado da Bahia-Brasil, e um grupo de referência de 65 indivíduos. Nos grupos de expostos e controle foram realizadas as dosagens dos indicadores biológicos de exposição e efeito (IBE's) ao chumbo inorgânico, incluindo Pb-S, ALA-U, ZnPP e Hb.

Palavras-chaves: Chumbo Sangüíneo, Exposição Ocupacional, ALA, PB-S.

ABSTRACT

OBJECTIVE: The aim of this study was the assessment of occupational exposure to lead in a metallurgy plant, by measuring biological exposure and effects indicators; and the mapping of risk areas throughout the industrial plant.

METHODOLOGY: A cross-sectional study was performed involving 195 workers at a lead metallurgy plant and a reference group of 65 individuals, in the State of Bahia, Brazil. Both the exposed and control groups were tested for dosage levels for biological exposure and effects indicators for inorganic lead, including Pb-S, ALA-U, ZnPP and Hb - (blood lead level (BLL); d-aminolevulinic acid in urine (ALA-U); zinc-protoporphyrin (Zn-PP); and hemoglobin (Hb).

Keywords: Lead in Blood, Occupational Exposure, BLL, ALA.

Introdução

O chumbo é um metal com uma longa história de uso industrial e com importantes efeitos tóxicos sobre a saúde humana. Estudos epidemiológicos realizados em diversos países do mundo revelam inúmeros casos de intoxicação, notadamente em exposições ocupacionais e ambientais. Apesar do extraordinário conhecimento adquirido nas últimas décadas sobre o mecanismo de toxicidade do metal, das recentes medidas de prevenção e de supervisão médica e principalmente da aplicação de eficientes medidas de higiene industrial, concorrendo para uma considerável redução nos níveis de exposição ocupacional, lamentavelmente ainda continua ocorrendo casos de intoxicação1,2,3,4. Elevada exposição ao chumbo e casos de intoxicação têm sido encontrados, notadamente em crianças filhas de trabalhadores de fundição de chumbo e em crianças residentes próximo às fundições primárias de chumbo5,6. Mesmo em áreas sem fonte pontual de emissão de chumbo no meio ambiente, pode haver a contaminação dos seres vivos. Alguns estudos demonstraram a contaminação, principalmente de crianças, através do material particulado em casario antigo pintado com tinta a base de chumbo, proximidade de autoestrada e do contato direto com o solo7,-9.

As principais fontes de exposição ocupacional ao chumbo são representadas principalmente pelas minerações, fundições e refinarias de chumbo, fábricas de baterias (acumuladores), indústria cerâmica e fundições de metais não ferrosos10-13, encontradas com grande freqüência em diversos estados brasileiros, inclusive na Bahia.

Os processos de fundição e refinaria, são provavelmente, entre todas as modalidades de exposição ocupacional, as que apresentam maior risco de exposição ao metal, provavelmente porque envolvem operações nas quais o chumbo fundido e as ligas são aquecidas a temperaturas elevadas com desprendimento de vapores de chumbo10,12, 14.

No ambiente laboral a absorção do chumbo resulta principalmente da inalação de pequenas partículas de tamanho respirável ou dos fumos do metal. Secundariamente, pode ocorrer absorção através da ingestão de alimentos contaminados, água e por hábitos do trabalho, como o de fumar10,12 e por contaminação dérmica e do vestuário.

Diversos estudos epidemiológicos e toxicológicos têm sido realizados recentemente em populações com exposição ocupacional ao chumbo com o objetivo de desenvolver marcadores biológicos de toxicidade subclínica adequados para a aplicação em programas de saúde ocupacional, particularmente para baixos níveis de exposição3,12,15. Os Indicadores Biológicos de Exposição (IBE) mais comumente empregados e recomendados para a monitorização biológica da exposição ocupacional ao chumbo são representados principalmente pelo chumbo no sangue (Pb-S), zinco-protoporfirina (ZnPP) e ácido d-aminolevulínico na urina (ALA-U). Outros indicadores como ácido d-aminolevulínico desidratase (ALA-D) e a coproporfirina urinária (CP-U), não são comumente empregados em saúde ocupacional, principalmente por apresentarem pouca especificidade11,14,16-22.

O objetivo deste estudo foi avaliar o nível de exposição em uma metalúrgica de chumbo, através da determinação dos indicadores biológicos de exposição e efeito do chumbo, a fim de estabelecer um mapeamento das áreas de risco na planta industrial.

Material e métodos

Caracterização dos Grupos

Foram investigados cento e noventa e cinco trabalhadores adultos do sexo masculino de uma refinaria primária de chumbo localizada no Estado da Bahia, Brasil no ano de 1993. De acordo com o fluxograma do processo de produção da planta industrial e de organização e distribuição de cargos e funções da empresa, os trabalhadores foram distribuídos nos seguintes grupos de atividade laboral: sinterização (n = 23), fusão (n = 41), refinaria (n = 49), laboratório (n = 8), serviços gerais (n=17), manutenção (n = 26) e administração (n = 31). Os grupos de sinterização, fusão e refinaria exerciam suas atividades laborais nos respectivos setores industriais, os indivíduos do grupo de serviços gerais, com atividades de limpeza; e os da manutenção, com atividades de manutenção dentro da planta. O pessoal de laboratório participava da execução, coleta e determinação analítica das amostras destinadas ao controle de qualidade de produção e da monitorização ambiental nos programas de higiene industrial da empresa. O grupo controle foi constituído por 65 indivíduos pareados por sexo, idade, raça, hábitos alimentares, tabagismo e alcoolismo com o grupo de trabalhadores expostos na planta industrial, diferindo apenas quanto ao aspecto de não se referirem a exposição atual ou no passado aos compostos de chumbo.

Metodologia

Foi realizado um estudo de corte transversal incluindo os grupos de expostos e controle nos quais foram realizadas as determinações de chumbo no sangue (Pb-S), ácido d-aminolevulínico na urina (ALA-U), zinco-protoporfirina (ZnPP) e hemoglobina (Hb) no sangue total.

O sangue foi coletado por punção venosa em veia cubital, através de sistema a vácuo, em dois tubos de vidro com EDTA livre de resíduo de chumbo. O tubo de sangue destinado à determinação de chumbo foi armazenado em geladeira a 2-8°C até o momento da análise e o tubo coletado para a determinação de Hb foi imediatamente processado. A urina foi coletada em coletores de polietileno descontaminado com ácido nítrico a 2% em água pura Tipo I (Sistema Milli-RX45 acoplado a um Milli-Q, Millipore). A concentração de chumbo no sangue foi determinada em duplicata por espectroscopia de absorção atômica, usando o método eletrotémico de digestão da amostra em forno de grafite, segundo o método de Fernadez modificado23, utilizando o equipamento Perkin-Elmer 5000 equipado com forno de grafite P.E. HGA-500. A dosagem do ALA-U foi realizada pelo método espectrofotométrico 24, usando o espectrofotômetro Perkin-Elmer Lambda I. O resultado foi corrigido pelo valor da creatinina urinária, que foi dosada pelo método cinético de Jaffé no analisador bioquímico MEGA da Merck Diagnósticos. A determinação da ZnPP foi executada por fluorimetria direta em sangue total, utilizando-se o hematofluorômetro Protofluor-Z da Helena Laboratories, seguindo o protocolo do fabricante. A hemoglobina foi determinada imediatamente após a coleta do sangue, usando-se o sistema automatizado STKS da Coulter.

O controle de qualidade analítica para a determinação do Pb-S foi realizado usando o sangue controle fornecido pela Bio-Rad®, Liphocheck Nível I e II, além do controle externo de qualidade do Programa de Intercalibração de Controle de Qualidade do Instituto Nacional de Seguridad y Higiene del Trabajo (Espanha). O controle de qualidade das determinações bioquímicas foi realizado através do programa de Controle Externo de Qualidade da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e SEGULAB (Itália).

Após extratificação por grupos de atividade, as médias de cada foram comparadas através do teste não paramétrico de Wilcoxon para médias não-pareadas, análise de variância one-way (ANOVA) e estudo de correlação, utilizando-se o programa estatístico Epinfo 6.0.

Resultados

Os resultados das determinações de PbS, ALA-U, ZnPP e Hb, do grupo controle e dos trabalhadores da metalúrgica, estão resumidos na Tabela 1.

Comparando-se os valores de Pb-S do grupo controle (5,4±3,9 μg/dL) com o grupo de indivíduos da área administrativa (13,1±8,4 μg/dL), constatou-se uma diferença estatisticamente significativa (p<0,001) entre eles, demonstrando que embora os trabalhadores administrativos não exerçam atividade na área de produção da planta, possuíam uma fonte adicional de exposição, oriunda provavelmente, da contaminação ambiental da metalúrgica. Não foi observada diferença significativa (p>0,05) entre os indicadores de efeito (ALA, ZnPP e HB) deste grupo quando comparado com o grupo controle. Diferença ainda mais significativa (p<0,0001) foi constatada comparando-se o Pb-S do grupo controle com o Pb-S do grupo dos trabalhadores de Serviços Gerais (25,1±9,1μg/dL ), da Manutenção (28,5±9,8 μg/dL), do Laboratório (23,1±7,6 μg/dL) e da Sinterização (36,7±9,8 μg/dL). Entretanto, não foi observada diferença significativa (p>0,05) entre o Pb-S dos grupos de Refinaria, Fusão e Sinterização, sugerindo níveis semelhantes de exposição, bem como entre os grupos de Laboratório, Manutenção e Serviços Gerais.Em relação ao ALA-U foi constatada uma diferença altamente significativa (p<0,0001) quando comparado o controle (1,9±0,9 mg/g creat.) com os grupos da Manutenção (6,9±3,8 mg/g creat.), Sinterização (11,9±9,3 mg/g creat.), Fusão (11,1±6,9 mg/g creat.) e Refinaria (10,3±9,5 mg/g creat.), não sendo, porém, observada diferença estatística entre as médias destes grupos de trabalhadores.Considerando a ZnPP, constatou-se uma diferença altamente significativa (p<0,0001) entre o grupo controle (13,5±0,9 μg/dL) e os grupos de Fusão (65,5±45,5 μg/dL), Sinterização (87,5±107,0 μg/dL) e Refinaria (65,5±61,5 μg/dL). Esta diferença foi menos significativa (p<0,001) para o grupo da Manutenção (33,0±38,0 μg/dL) e para o grupo de Serviços Gerais (25,5±20,0 μg/dL). Não sendo observada, porém, diferença significativa (p>0,05) entre os grupos controle (25,5±20,0 μg/ dL) e o da Administração (21,0±28,0 μg/dL).

A Figura 1 apresenta uma distribuição gráfica dos valores médios de Pb-S, ZnPP e ALA-U dos grupos controle e dos grupos de trabalhadores expostos da metalúrgica.


Discussão

Os níveis de chumbo no sangue na população geral têm diminuído ao longo do tempo em diversos países do mundo, provavelmente resultante de ações de controle de determinadas fontes de emissão de chumbo, como as de origem industrial e de derivados do petróleo. O uso do álcool adicionado à gasolina reduziu a utilização de antidetonante a base de chumbo, contribuindo substancialmente para a redução da emissão atmosférica de chumbo pelos automóveis, como acontece no Brasil25-27. Na maioria dos países a concentração média de chumbo no sangue em pessoas não expostas ocupacionalmente está situada entre 10 e 15 ìg/dL e em algumas situações é inferior a 10 ìg/dL. Na Suécia a média de Pb-S é de 8 ìg/dL no sexo masculino e de 6 ìg/dL para o sexo feminino 25. Na Itália o nível de Pb-S encontrado na população geral é de 12-15 ìg/dL para o sexo masculino e de 8-10 ìg/dL para o sexo feminino4, na Espanha de 7,8 ìg/dL e nos Estados Unidos da América do Norte de 16,1 ìg/dL para o sexo masculino e de 11,0 ìg/dL para o sexo feminino28. Níveis mais elevados em indivíduos da população geral têm sido observados em outros países, como na Cidade do México onde foram encontrados 25,5 ìg/dL de Pb-S no sexo masculino e 19,3 ìg/dL no sexo feminino29.

Os resultados obtidos do grupo controle, formado por indivíduos adultos do sexo masculino, revelam que a média do Pb-S foi de 5,4 ìg/dL (Tabela 1), inferior ao valor de 12,4 ìg/dL encontrado para a Cidade de São Paulo - Brasil30 e dos reportados para a maioria dos países25. Os valores de ALA-U, ZNPP e Hb encontrados no grupo controle são semelhantes aos valores de referência destes indicadores observados em populações de indivíduos não ocupacionalmente expostos31,32.

O grupo da Administração apresentou Pb-S de 13,1 ìg/dL, significativamente mais elevado que o grupo controle (p<0,001), demonstrando que a proximidade do escritório administrativo da área de produção da planta industrial e o uso do mesmo refeitório e de outras instalações da empresa, podem ter contribuído para uma maior exposição ambiental deste grupo, passando a apresentar níveis sangüíneos de chumbo semelhantes aos de indivíduos que convivem próximo a áreas industriais de produção de chumbo reportados por outros pesquisadores 6, 10, 25,30.

Embora tenha ocorrido considerável aumento na produção e consumo dos compostos de chumbo na década de 1970, observou-se paralelamente uma redução substancial nos níveis de Pb-S de indivíduos ocupacionalmente expostos, refletindo uma melhoria e maior atenção aos programas de vigilância epidemiológica, de medidas mais eficazes de higiene industrial e de monitorização biológica dos trabalhadores expostos3,25,29. Apesar disso, ainda continua ocorrendo em alguns países situações consideradas de elevado risco, como a constatada em 1987 nos Estados Unidos da América do Norte, em que mais de 1.000 trabalhadores tinham Pb-S acima de 40 ìg/dL e aproximadamente 200 deles possuíam níveis de chumbo no sangue acima de 50 ìg/dL. Verificou-se neste e em outros estudos que a maioria dos trabalhadores com concentração mais elevada exerciam atividade em mineração, refinaria, fundições e em indústrias de acumuladores. Os processos de fundição e refinaria do chumbo são provavelmente os que representam maior risco de exposição, confirmando os resultados obtidos neste estudo no qual os trabalhadores das áreas de refinaria, fusão e sinterização apresentaram as concentrações mais elevadas de chumbo no sangue1,310,25,33,34.

Em 1980 a Organização Mundial de Saúde25 recomendou como limite de tolerância biológico (LTB) para exposição ocupacional ao chumbo o Pb-S de 40 ìg/ dL para trabalhadores masculinos e 30 ìg/ dL para mulheres. A American Conference of Governmental Industrial Hygienists35 dos Estados Unidos da América do Norte adotou um LTB de 50 ìg/dL de chumbo no sangue e no guideline de 2001 o indicador de dose interna atualizado é de 30 íg/dL25, fazendo a ressalva que mulheres em idade fértil com plumbemia superior a 10 ìg/ dL podem gerar crianças com chumbo sangüíneo de 100 ìg/dL, as quais podem desenvolver sérias lesões no desenvolvimento cognitivo. No Brasil o Ministério do Trabalho36 adota como valor de referência o Pb-S de até 40 ìg/dL epara exposição ocupacional o IBMP (índice Biológico Máximo Permitido) de 60 ìg/dL. Neste estudo constatamos que 43,5% dos trabalhadores do grupo de sinterização, 36,6% da fusão, 32,6% da refinaria e 23% da manutenção possuíam Pb-S superior a 40 ìg/dL, considerado como normal pela legislação brasileira e igual ou superior ao LTB estabelecido em diversos países, enquanto 12,2% dos trabalhadores da área de fusão, 10,2% da de refinaria e 7% da de sinterização, totalizando 12 trabalhadores nos três grupos, revelaram Pb-S superior a 50 ìg/dL, valor de chumbo sangüíneo mais elevado do que o estabelecido como LTB pela Organização Mundial da Saúde25 e a ACGIH dos Estados Unidos da América do Norte.

No que concerne ao bioindicador de efeito, concentração urinária de ALA, observamos que 85,4% dos trabalhadores da área de Sinterização e 81,6% da Refinaria, possuíam ALA-U superior a 4,5 mg/g creat. estabelecido como valor de referência pela legislação brasileira36, enquanto que 36,6% dos indivíduos da de sinterização, 48,8% da de fusão e 30,6% da de refinaria apresentaram ALA-U superior a 10 mg/ g creat., adotado pela legislação brasileira como índice biológico Máximo Permitido (IBMP).

A Figura 2 apresenta a corrrelação entre a plumbemia e a concentração urinária de ALA nos grupos controle e nos diversos grupos de trabalhadores da metalúrgica. O modelo matemático que melhor descreve esta correlação é equação quadrática [ALA = 0,007*(Pb-S)2 -0,111*(Pb-S)+4,51] com coeficiente de correlação (r2) de 0,249. O teste t para significância do índice de correlação demonstrou que esta é uma correlação positiva e significativa (p<0,05) entre os indicadores de exposição e de efeito. Esses dados estão de acordo com os resultados de outros estudos2,17,19,22, havendo uma inflexão nas concentrações de Pb-S superiores a 40 ìg/dL. Utilizando este modelo para prever a concentração de ALA-U a partir do Pb-S de 40 ìg/dL, por exemplo, seria 11,3 mg/g creat.; concentração esta acima do IBMP para o chumbo inorgânico (10 mg/g creatinina).


Para a ZnPP os resultados mais elevados foram obtidos para os grupos da sinterização, fusão e refinaria; corroborando os achados a partir dos dados do ALA-U.

É possível concluir, portanto, que os trabalhadores com maior risco de exposição ocupacional ao chumbo na planta da metalúrgica estudada são representados pelos grupos da Fusão, Sinterização e Refinaria, alguns deles com elevadas concentrações de chumbo no sangue e importantes alterações na concentração de ZnPP sangüíneo e ALA urinário.

Apesar da constatação de considerável redução nos níveis de Pb-S nos trabalhadores expostos em todo o mundo, motivando inclusive a revisão dos LTB's estabelecidos na legislação de saúde ocupacional de diversos países, mais recentemente tem sido enfatizada a importância da toxicidade subclínica do chumbo, demonstrando que concentrações de chumbo no sangue mesmo abaixo dos LTB's adotados atualmente, podem desencadear importante toxicidade como nefropatia, neurotoxicidade central e periférica, efeitos sobre a reprodução, câncer renal e hipertensão arterial. Por outro lado, a associação de outros metais, como arsênico, cádmio e zinco, presentes em determinados tipos de minério, como a galena, utilizada pela metalúrgica avaliada neste estudo, pode aumentar o risco de toxicidade do metal, como também influenciar na cinética de produção de determinados indicadores biológicos utilizados na monitorização dos trabalhadores expostos3,15,29,34,37. Desse modo, o zinco pode ativar a ácido delta-aminolevulínico desidratase (ALA-D), influenciando na produção de ALA-U22, o cádmio pode aumentar a nefrotoxicidade do chumbo, bem como outros fatores, como o consumo de álcool, que influencia na produção de alguns destes indicadores38.

Atualmente esta metalúrgica encontra-se desativada, mas deixou um passivo ambiental de mais de 50.000 toneladas de escória com contaminação superior a 3% de chumbo, ocasionando a contaminação ambiental e a consequüente contaminação da população da região6,30, merecendo estudos de monitorização ambiental e avaliação da população circunvizinha por longo período.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Out 2013
  • Data do Fascículo
    2003
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