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Análise cinemática tridimensional do manuseio de carga na construção civil

Three-dimensional analysis of manual transportation of load in the civil construction

Resumos

O presente estudo aborda a simulação da atividade de descarga manual de sacos de cimento (m = 50kg) sob o enfoque biomecânico do movimento com o objetivo de identificar as alturas de descarregamento mais favoráveis para a preservação das estruturas musculoesqueléticas do trabalhador. Foram realizados estudos preliminares com fotos e filmagens da situação real para então efetuar a simulação em laboratório utilizando procedimentos de cinemetria tridimensional. Alguns pontos são discutidos no artigo, como o posicionamento vertical do cotovelo, situações que apresentam maiores valores quanto à aceleração do movimento, inclinação da coluna vertebral e movimentação corporal durante o instante de recebimento das sacas. A análise dos resultados permite concluir que, das diferentes alturas de descarga que foram simuladas, a que se mostrou mais favorável foi a de 1,2 metro a partir do solo, em que a extensão do braço não ultrapassa a linha dos ombros.

manuseio de carga; cinemetria 3D; postura corporal


The present study deals with the simulation of the activity of unloading cement bags (m=50kg) manually, under the biomechanical movement focus, aiming at protecting workers' muscle-skeletal structure by identifying the most favorable unloading height. A real situation was first photographed and filmed and then, by means of three-dimensional cinemetry, used as simulation in laboratory. Some body movements, such as the upright positioning of the elbow, inclination of the vertebral column and the way the sacs are caught, are discussed in the article as presenting the highest referring values concerning acceleration of the movement. Analysis of results led us to the conclusion that, from the different unloading heights that had been simulated, the most favorable one is 1.2 meters from the ground, when the arm does not go upper than the shoulders line.

dealing with load; cinemetry 3D; corporal position


Análise cinemática tridimensional do manuseio de carga na construção civil

Three-dimensional analysis of manual transportation of load in the civil construction

Diogo Cunha dos ReisI; Iseu Reichmann LossoII; Marisa Angela BiazusII; Antônio Renato Pereira MoroIII

IUniversidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Laboratório de Biomecânica - Centro de Desportos

IICentro Educacional de Educação Tecnológica do Paraná (Cefet - PR)

IIILaboratório de Biomecânica - CDS-UFSC

RESUMO

O presente estudo aborda a simulação da atividade de descarga manual de sacos de cimento (m = 50kg) sob o enfoque biomecânico do movimento com o objetivo de identificar as alturas de descarregamento mais favoráveis para a preservação das estruturas musculoesqueléticas do trabalhador. Foram realizados estudos preliminares com fotos e filmagens da situação real para então efetuar a simulação em laboratório utilizando procedimentos de cinemetria tridimensional. Alguns pontos são discutidos no artigo, como o posicionamento vertical do cotovelo, situações que apresentam maiores valores quanto à aceleração do movimento, inclinação da coluna vertebral e movimentação corporal durante o instante de recebimento das sacas. A análise dos resultados permite concluir que, das diferentes alturas de descarga que foram simuladas, a que se mostrou mais favorável foi a de 1,2 metro a partir do solo, em que a extensão do braço não ultrapassa a linha dos ombros.

Palavras-chaves: manuseio de carga, cinemetria 3D, postura corporal.

ABSTRACT

The present study deals with the simulation of the activity of unloading cement bags (m=50kg) manually, under the biomechanical movement focus, aiming at protecting workers' muscle-skeletal structure by identifying the most favorable unloading height. A real situation was first photographed and filmed and then, by means of three-dimensional cinemetry, used as simulation in laboratory. Some body movements, such as the upright positioning of the elbow, inclination of the vertebral column and the way the sacs are caught, are discussed in the article as presenting the highest referring values concerning acceleration of the movement. Analysis of results led us to the conclusion that, from the different unloading heights that had been simulated, the most favorable one is 1.2 meters from the ground, when the arm does not go upper than the shoulders line.

Keywords: dealing with load, cinemetry 3D, corporal position.

Introdução

Embora a evolução tecnológica tenha trazido consigo uma infinidade de possibilidades de equipamentos e dispositivos mecânicos para facilitar a vida do ser humano, o transporte manual de cargas ainda é uma atividade freqüentemente realizada durante as atividades da vida diária (HONG & LI, 2005), inclusive durante o trabalho, que compreende atividades que ainda dependem meramente do esforço físico do homem. Dentre as atividades laborais, a carga e a descarga de caminhões são situações clássicas e que não poupam o trabalhador do esforço físico intenso.

Segundo Chaffin et al. (2001), a automação é de difícil implantação em trabalhos não estruturados, especialmente na indústria de serviços, como é o caso da construção civil. Para cada metro quadrado de construção, é transportada em média 1,8 tonelada de materiais e, posteriormente, deve ser transportada em média mais 0,6 tonelada de entulhos para o mesmo metro quadrado de referência, totalizando cerca de 2,4 toneladas de materiais para cada metro quadrado de construção (PICCHI, 1993).

Apesar dos diversos meios de transporte mecanizados (gruas, guinchos, elevadores etc.) existentes em algumas obras, um grande número de insumos ainda necessitam de algum tipo de transporte manual para chegar ao seu local de aplicação, o que ainda é mais acentuado em obras verticais sem os devidos equipamentos de transporte mecanizados.

A maior parte dos materiais de construção, embalados ou não, apresentam pesos acima do que seria recomendado para o transporte manual. Segundo a CLT, art. 198:

É de 60 (sessenta) quilogramas o peso máximo que um empregado pode remover individualmente, ressalvadas as disposições especiais relativas ao trabalho do menor e da mulher.

De acordo com a NR 17, item 17.2.2:

Não deverá ser exigido nem admitido o transporte manual de cargas, por um trabalhador cujo peso seja suscetível de comprometer sua saúde ou sua segurança.

Diversos autores afirmam que o transporte manual de cargas traz conseqüências para a saúde dos trabalhadores. Carneiro (1997) assinala que a Previdência Social brasileira reconhece que as lesões do sistema musculoesquelético constituem-se como as mais importantes causas das doenças ocupacionais, sendo responsáveis por 70% dos afastamentos do trabalho. Segundo Chaffin et al. (2001), pesquisas indicam que ocorre um aumento significativo de lesões musculoesqueléticas e aparecimento de fadiga com a variação dos seguintes fatores: carga, volume, posição, freqüência e duração da atividade. Iida (2002) relata que o manuseio manual de cargas pesadas tem sido uma das causas freqüentes de traumas dos trabalhadores. Kramer apud Grandjean (1998) assinala que 20% dos afastamentos do trabalho e 50% das solicitações de aposentadorias precoces têm como origem lesões nos discos intervertebrais. LaFiandra et al. (2002) enfatizam que o transporte de cargas é responsável pelo aumento da probabilidade de ocorrência de lesões em membros inferiores. Fowler et al. (2006) afirmam que a inclinação lateral do tronco, visando a contrapor o transporte assimétrico de carga, tem sido relacionada como um importante fator de risco de doenças na região lombar. Hong & Cheung (2003) destacam que o habitual e prolongado transporte de cargas excessivas podem resultar em dores lombares e doenças musculoesqueléticas.

Saad & Menezes (2004) descrevem as limitações de peso estabelecidas para a execução de trabalho em diferentes países, especificando condições relativas a trabalhadores adultos dos sexos masculino e feminino. Há uma variação evidente entre os índices indicativa da complexidade do dimensionamento da carga máxima para transporte manual individual. Este cálculo necessita incluir dados relativos à variabilidade das características físicas dos indivíduos e às condições físicas de carga e descarga dos materiais manuseados (altura, empunhadura, tamanho e forma da carga etc.), o que pode dificultar ou facilitar o manuseio, alterando o limite de carga admissível. Aspectos relativos à dimensão de carga, alturas, posicionamento da pega, fator de assimetria, entre outros, são considerados na avaliação de manipulação de cargas no trabalho utilizando a equação do Instituto de Saúde Ocupacional do EUA - National Institute for Occupational Safety and Health-NIOSH (WATERS et al., 1994; NIOSH, 1997) e, embora a situação analisada neste artigo não preencha as características para emprego desta ferramenta, deve-se tê-las em conta nas análises efetuadas.

Objetivo

O presente estudo tem como objetivo analisar, sob o enfoque biomecânico do movimento, as ações gestuais e posturais do trabalhador durante a execução da atividade de descarregamento de sacos de cimento a partir de quatro alturas diferenciadas simuladas em laboratório.

Material e Métodos

Devido ao fato de que nos depósitos e nas indústrias o transporte do cimento é paletizado e mecanizado e o transporte manual ocorre essencialmente em obras, este estudo se limitou à análise da simulação de descarregamento de caminhões de cimento em obras.

Para a realização deste estudo, foram executadas as seguintes etapas:

• Observações armadas, com registros, utilizando máquina fotográfica e filmadora digital, das atividades de carregamento de cimento no depósito e descarregamento dos caminhões nos locais de entrega (obras);

• Análise qualitativa da postura e da técnica utilizada na atividade de descarga através da análise das imagens fotografadas e filmadas;

• Simulação da descarga de sacos de cimento de 50kg, variando-se a altura de pega entre 0 a 2 metros, utilizando procedimento de cinemetria tridimensional digital;

• Identificação e análise das ações gestuais e posturais utilizando imagens digitais e recursos de computação gráfica.

Este estudo de caso foi realizado no laboratório de Biomecânica da Universidade Federal de Santa Catarina. Teve como participante um indivíduo do sexo masculino, com 21 anos de idade, 1,7m de estatura e 73kg de massa corporal, com prática nessa atividade. As alturas utilizadas para o posicionamento do saco de cimento nas simulações foram de 2, 1,2, 0,8 e 0 metros a partir do solo (conforme Figura 1). Essas alturas foram estabelecidas com base nas observações de campo: a altura de 2 metros, a qual será denominada simulação 1, corresponde à altura máxima de descarregamento de um caminhão com lotação total; a de 1,2 metros (simulação 2) corresponde ao descarregamento diretamente da altura da carroceria do caminhão; a de 0,8 metro (simulação 3) corresponde à altura de descarga da caçamba de uma caminhonete; e a de 0 metros (simulação 4) corresponde ao levantamento do cimento diretamente a partir do solo para o início do transporte.


Os equipamentos utilizados para a análise cinemática tridimensional incluíram:

• Três câmeras de vídeo digitais da marca Dalsa®, com resolução de 1024x1024 pixels e freqüência de 40 hertz (quadros por segundo), com controle do tempo de abertura, com possibilidade de fixação do foco, previamente calibradas utilizando-se o calibrador do sistema Peak Motus®, este composto por 25 pontos (não-coplanares) distribuídos no espaço determinado para a realização dos movimentos de interesse;

• DMAS 5.0 (Digital Motion Analysis System) da Spica Technology Corporation, tecnologia de captação de imagens utilizando câmeras filmadoras e software específico para digitalização e processamento de dados. Esse sistema permite também a geração de gráficos e tabelas de valores angulares a partir das coordenadas 3D dos pontos de interesse demarcados (esferas de isopor revestidas com fita reflexiva) previamente no corpo do participante e distribuídos conforme esquema da Figura 2.


Neste estudo, simulou-se a atividade do tra­balhador que recebe e transporta o saco de cimento no descarregamento de caminhões em obras, não sendo avaliada a atividade do trabalhador que fica sobre o caminhão posicionando estes sacos na borda da carroceria.

Apresentação dos Resultados e Discussão

Comportamento angular (flexão/extensão) da coluna vertebral

Conforme é possível observar na Figura 3, na simulação 1, o ângulo desta região no início e no fim do descarregamento registra valores inferiores ao natural da coluna, indicando que, para pega e recepção da carga, o trabalhador apresenta um aumento da lordose na região lombar devido à hiperextensão do tronco. Pode-se observar que, na simulação 2, o ângulo da região lombar permanece sempre muito próximo do ângulo natural desta região, não sendo registradas grandes alterações angulares durante a descarga. Na simulação 3, observa-se uma retificação da coluna lombar devido à flexão do tronco para a pega do saco de cimento. Já na quarta simulação, observa-se um pico no fim do gráfico que demonstra uma retificação momentânea da região lombar, resultante do balanço do tronco (movimento balístico) utilizado para erguer a carga até o ombro.


Na Figura 4, observa-se um comportamento angular muito heterogêneo na região torácica entre as quatro simulações, porém se destaca que praticamente não houve exigência (movimentação) desta região na simulação 2.


Mesmo sabendo-se que a inclinação lateral do tronco não fez parte do conjunto de variáveis aqui analisadas, vale destacar que, devido ao fato deste tipo de atividade ser assimétrica, pois o transporte da carga se dá apenas sobre um ombro, a coluna sempre está realizando compensações no lado oposto ao da carga, o que tem sido relacionado como um importante fator de risco de doenças na região lombar (FOWLER et al., 2006).

Exigência física

Segundo os princípios da segunda lei de Newton, em que F = m.a, ao serem identificados os pontos de maior aceleração do movimento, considerando-se uma mesma carga deslocada, são identificadas as situações de maior força resultante, ou seja, aquelas em que há um maior esforço muscular despendido para realizar o trabalho. Na avaliação da aceleração de pontos da coluna vertebral, buscou-se identificar as situações que apresentaram maiores valores de aceleração do respectivo movimento. Foram considerados dois pontos, o da vértebra C7 (ponto 11) e o da vértebra L1 (ponto 8), que se referem à aceleração das regiões cervical e lombar, respectivamente.

Conforme é possível observar nas Figuras 5 e 6, as simulações 1 e 4 apresentaram os maiores valores de aceleração, tanto positivos quanto negativos, em ambas as regiões. Este fato pode estar relacionado à utilização da técnica do sujeito em amortecer, através das diversas cadeias musculares, o impacto advindo do peso do saco de cimento em função de sua altura inicial (situação 1, grande altura inicial da carga - 2m). Já na simulação 4, atribui-se os grandes valores observados à necessidade de romper o estado de repouso da carga (levantada a partir do solo), em que o sujeito utiliza-se de movimentos bruscos, visando a reduzir o esforço realizado.



O levantamento de cargas bem como a flexão e a rotação do tronco e os movimentos forçados feitos durante a realização do trabalho constituem-se em risco para lombalgias (PUNNETT et al. apudVIEIRA & KUMAR, 2004).

Análise da sobrecarga da articulação do ombro através da relação entre a altura do cotovelo direito e do ombro direito

A comparação entre as alturas destas duas estruturas visa a detectar posturas mecanicamente desfavoráveis (cotovelo acima do ombro) no momento em que o sujeito recebe o saco de cimento para ser carregado. Segundo Chaffin et al. (2001), o posicionamento dos braços acima dos ombros pode ser considerado prejudicial por dois fatores principais: a redução da irrigação sangüínea na musculatura desse membro e a solicitação biomecânica nas estruturas envolvidas nesta postura.

Evidências biomecânicas da relação entre postura do ombro e risco de desordens nesta articulação incluem aumento da pressão intramuscular (NIOSH, 1997), tendinites do manguito rotador e/ou do bíceps (BROX et al., 1997; NIOSH, 1997) e pinçamento da inserção do supra-espinhoso (MICHENER et al., 2003).

A Figura 7 mostra gráficos de como o posicionamento vertical do cotovelo direito varia em relação ao ombro, em cada simulação, ao longo do descarregamento do cimento.


Na simulação 1, observam-se nitidamente três etapas no gráfico de posicionamento do cotovelo em relação ao ombro: a primeira, quando o trabalhador levanta os braços acima dos ombros para a recepção do saco de cimento; a segunda, quando o trabalhador posiciona o saco de cimento no seu ombro direito (cotovelo fica abaixo do ombro) e a terceira, quando o cotovelo se posiciona acima do nível do ombro, representando a fase em que o trabalhador já se encontra em movimento, transportando o saco de cimento.

Na simulação 2, observa-se que a altura do cotovelo do trabalhador permanece sempre próxima da altura do ombro (pouco abaixo durante todo o processo de descarregamento), pois o saco de cimento posiciona-se a 1,2m do solo, altura próxima à altura do ombro do trabalhador ereto (1,41m).

Na simulação 3, verifica-se que o braço permanece abaixo do ombro até próximo ao final do posicionamento da carga, momento em que ele ultrapassa a altura do ombro em poucos centímetros.

Na simulação 4, observa-se um fenômeno muito parecido com o comportamento na simulação 3, em que o cotovelo ultrapassa a altura do ombro apenas ao final do procedimento.

O trabalho com a elevação dos braços acima da linha dos ombros, especialmente sustentando uma carga, deve ser minimizado para evitar fadiga muscular associada a tendinites (CHAFFIN et al.,2001). Esse mesmo autor afirma que, nessa posição, com os braços em abdução ou flexão, acarretaria num aumento do estresse nas várias estruturas articulares, tendões, ligamentos e cápsulas. Westgaard (2000) cita estudos que demonstram que a carga muscular é um fator crítico na determinação de desordens musculoesqueléticas na região do ombro.

Considerando que a jornada de trabalho possui uma duração média de oito horas diárias e que os trabalhadores responsáveis pelo descarregamento de caminhões costumam realizar apenas este tipo de atividade, pode-se afirmar que estes indivíduos estão susceptíveis à constrangimentos musculoesqueléticos. É estabelecido, na literatura, que a exposição duradoura a cargas pode produzir respostas adaptáveis de componentes musculoesqueléticos, predispor a problemas posturais e dor e ainda conduzir a várias inaptidões (FOWLER et al., 2006). O habitual e prolongado transporte de cargas excessivas pode resultar em dores lombares e doenças musculoesqueléticas (HONG & CHEUNG, 2003).

Diante das informações obtidas na literatura, evidenciou-se que, das situações apresentadas, as que propiciam maior risco de lesões musculoesqueléticas são as simulações 1 e 4, pois, na primeira simulação, são realizados esforços para desaceleração da carga acima do ombro e, na quarta, apesar do cotovelo estar abaixo do nível do ombro, são realizados esforços de maior intensidade (caracterizados pelos movimentos bruscos) contra a força gravitacional visando a erguer a carga para seu posicionamento no ombro do trabalhador. É importante considerar que, na situação 4, é necessária uma maior aplicação de força para a pega do saco de cimento, que precisa ser erguido a partir do chão, enquanto nas outras situações a pega exige força apenas para direcionar o posicionamento da carga até o ombro.

Considerações Finais

Mesmo sabendo-se que o transporte de cargas é uma condição anormal para o ser humano (GHORI & LUCKWILL, 1985), a sua realização é inevitável, pois muitas atividades da vida diária e laborais ainda dependem substancialmente da manipulação ou do transporte de cargas em curtas distâncias.

Apesar da atividade de trabalho humano com manuseio de cargas acima de 23 kg, seja no carregamento, ou no descarregamento, ou transporte, não ser recomendada pelos institutos de pesquisa na área da saúde ocupacional e de ergonomia, a legislação brasileira permite que esse tipo de atividade continue existindo. Nesse sentido, no Brasil, acredita-se que essa atividade seja perpetuada por um bom tempo, até que a legislação trabalhista estabeleça limites baseados em critérios biomecânicos mais objetivos. Além desta mudança de legislação, seria necessária uma mudança na cultura empresarial, bem como na dos próprios trabalhadores, no sentido da valorização da sua saúde e da sua segurança.

A partir da análise dos resultados pode-se concluir que a atividade de descarregamento de saco de cimento foi otimizada na simulação 2, por esta ter apresentado a melhor condição biomecânica para a recepção e o posicionamento da carga ao ombro do sujeito. Observa-se também que a situação 2 mostrou-se a de menor movimentação corporal e, conseqüentemente, menor exigência da coluna vertebral, podendo ser considerada como de maior eficácia dinâmica, proporcionando economia de energia.

Considerando que o participante desta pesquisa já possuía prática nessa atividade, foi possível observar que o impacto da carga foi absorvido pela flexão dos joelhos e que o posicionamento da coluna vertebral foi mantido o mais ereto possível em todas as situações. Essa prática (técnica) nem sempre é adotada pelos trabalhadores na execução da atividade no seu dia-a-dia. Associando esse fato ao volume de trabalho, à idade e ao biótipo do sujeito, acabar-se-á por trazer prejuízos consideráveis à saúde musculoesquelética, principalmente dos discos intervertebrais, desses trabalhadores. Esses efeitos nocivos podem aparecer por trauma na ocasião de um esforço extremo e/ou por resultado de traumas cumulativos.

Portanto, recomenda-se para este tipo de atividade que os trabalhadores façam a adequação do posicionamento da carga utilizando a sobreposição dos próprios sacos de cimento na carroceria do caminhão para aumentar a altura de descarga até uma altura que seja mais favorável ao trabalhador que está recebendo a carga, ou seja, uma altura próxima a do ombro do trabalhador que irá transportar a carga.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Dez 2012
  • Data do Fascículo
    Dez 2005
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