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Resposta dos autores

The authors' reply

RESPOSTA DOS AUTORES

Resposta dos autores

The authors' reply

Danilo CostaI; Francisco Antonio de Castro LacazII; José Marçal Jackson FilhoIII; Rodolfo Andrade Gouveia VilelaIV

ISuperintendência Regional do Trabalho de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

IIDepartamento de Medicina Preventiva da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

IIICentro Estadual do Rio de Janeiro da Fundacentro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IVFaculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Os autores agradecem aos debatedores pelos comentários e críticas colocados.

A recente publicação da Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora - PNSTT (BRASIL, 2012) e seu processo de implementação tornam o debate muito oportuno. Entendemos que foi devido ao espírito de favorecer e viabilizar a atenção integral à saúde dos trabalhadores que os debatedores levantaram questões, fizeram críticas ou endossaram aspectos propostos no texto de debate. A objetividade e a clareza da redação contribuiram para o debate franco, servindo para a elaboração desta réplica.

Carlos Minayo Gomes sustenta a importância da promulgação das duas políticas, tanto a Política Nacional de Saúde e Segurança do Trabalhador - PNSST (BRASIL, 2011), quanto a PNSTT (BRASIL, 2012), a qual, segundo ele, "se integra ao conjunto de políticas de saúde do SUS, contemplando a transversalidade das ações de saúde e o trabalho como um dos determinantes do processo saúde-doença" (p. 22), mas cuja implementação se configura como grande desafio para profissionais e gestores dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerests), "particularmente quanto ao fortalecimento da Vigilância em Saúde do Trabalhador (Visat)" (p. 22).

Na sua exposição, Minayo Gomes nos oferece um claro e objetivo diagnóstico do funcionamento da rede de serviços em saúde do trabalhador e de suas necessidades para superação dos seus problemas, assim como das relações com outros atores institucionais. No centro de sua análise, estão os "problemas de gestão para implementação de ações efetivas" (p. 24) em suas diferentes dimensões, desde a falta de "planos operacionais nos diversos níveis que considerem a heterogeneidade dos Cerest" (p. 22), a falta de "diagnóstico preciso do quadro nacional" (p. 23), até "a ausência de critérios técnicos na indicação de gestores" (p. 24).

Concordamos com Minayo-Gomes quando diz que, para reorientar-se em direção à Visat, como preconiza a PNSTT, são necessários tanto a "mudança na cultura assistencial" de vários Cerest, quanto um "autêntico planejamento estratégico" para que se possa atender às diretrizes e estratégias propostas nas metas ministeriais, integrando-as às necessidades da Visat (p. 22; itálicos pelos autores da resposta).

Com relação aos recursos humanos, aponta para problemas em diversos "níveis da política de recursos humanos na Renast" em especial aponta para a carência de "quadro qualificado, suficiente e estável de profissionais de carreira" (p. 24), assim como discute a necessidade de aprimorar a formação, para capacitá-los a atuar "dentro de uma lógica de complexidade das ações requeridas pela Visat" (p. 23; itálicos pelos autores da resposta).

Dentro desta perspectiva, afirma ser importante uma maior articulação entre os diversos cursos de formação disponíveis, seus conteúdos e métodos pedagógicos, e as necessidades para a implementação da PNSTT.

No seu diagnóstico, Minayo Gomes sublinha ainda a pouca mobilização das organizações de classe cujo protagonismo é fundamental para melhorar o funcionamento das instâncias de controle social e, consequentemente, sua participação necessária na definição de ações visando à Atenção Integral da Saúde dos Trabalhadores. Ao analisar a articulação intersetorial, discorre sobre a importância do protagonismo do Ministério Público diante das limitações dos órgãos de fiscalização para a melhoria das condições de trabalho, assim como aponta para os avanços nas interações entre academia e serviços, sublinhando o papel do edital lançado em 2012 para financiar pesquisas e estudos atrelados a objetos voltados à implementação da PNSTT.

Como não concordar com Minayo Gomes, uma vez que alimenta o debate sobre a implementação da PNSTT colocando questões precisas, ao mesmo tempo em que sugere caminhos para a resolução dos problemas? Além disso, amplia o escopo de questões que havíamos levantado no texto de debate, o que se constitui em contribuição maior para a efetividade das ações da Visat, agora sustentadas pela PNSTT.

A intervenção de Claudia Vasques Chiavegatto e Eduardo Algranti segue por outro caminho: defendem que "a atenção integral aos trabalhadores deva ter como carro chefe ações desenvolvidas pela atenção primária" (p. 26), ou seja, acreditam que ações de vigilância e intervenção possam ocorrer a partir das ações da rede básica.

A estratégia defendida por Chiavegatto e Algranti é respaldada por membros da Coordenação Nacional de Saúde do Trabalhador (CGST)1 1 Pertencente ao Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador (DSAST) da Secretaria de Vigilância à Saúde (SVS) doMinistério da Saúde. e por outros pesquisadores do nosso campo (ver, por exemplo, entrevista com a professora Elisabeth Dias, da Universidade Federal de Minas Gerais)2 2 O desafio de implantar ações de Saúde do Trabalhador na Atenção Primária em Saúde. Disponível em: < http://pisast.saude.gov.br:8080/pisast/saude-do-trabalhador/saude-do-trabalhador-em-acoes/desenvolvimento-de-acoes-de-saude-do-trabalhador-na-atencao-primaria-em-saude/Entrevista_maio_2011.pdf/view>. Acesso em: 28 de junho de 2013. que acreditam que a atenção básica deve ser o centro propulsor das ações de Visat. Esta não é, entretanto, nossa posição. Para nós, esta diretriz incorre em grave equívoco teórico e prático. Por isso, explicitaremos a seguir as razões que nos levam a defender outro caminho para o desenvolvimento da estratégia de vigilância, ancorado na própria PNSTT que elegeu a Visat como o centro de afirmação da Saúde do Trabalhador no SUS.

Há amplo consenso de que é correta a estratégia da descentralização para fins assistenciais desde que suprida por ações sistemáticas de capacitação, supervisão e matriciamento, uma vez que não se advoga a atenção especializada de trabalhadores, portas de entrada específicas e apartadas da rede assistencial. No entanto, este raciocínio não se aplica de forma linear para a Visat simplesmente por se tratar de objetos distintos em sua natureza e complexidade.

Esta distinção não deixa de reconhecer que ambos, vigilância e atenção, reportam-se a aspectos de um processo único, que começa enquanto antecedentes situados no trabalho que adoece, e resulta nos agravos que se manifestam enquanto desgaste no corpo adoecido, lesado e mutilado psíquica ou fisicamente. Se os objetos, embora vinculados, são distintos, profissionais com formações e competências distintas, outras estruturas e instrumentos se fazem necessários em cada uma destas esferas.

Lidar com a vigilância e a intervenção, como preconizam a Portaria nº 3.120/98 (BRASIL, 1998) e a recente PNSTT (BRASIL, 2012), conforme mostram as experiências bem-sucedidas, implica reconhecer sua complexidade, isto é, a capacidade de identificar, detectar, analisar, compreender, pesquisar, intervir sobre os determinantes do trabalho a fim de transformar o trabalho nocivo e perigoso em trabalho decente e saudável, compatível com o ser humano. Como pode ser observado nos casos de sucesso, para enfrentar e sobreviver aos poderios econômicos e políticos e poder questionar a lógica de acumulação de capital vigente e os modos de gestão e de organização das empresas e seus fornecedores, que impactam negativamente a saúde dos trabalhadores, os serviços desenvolvem mecanismos de articulação política que, combinados a amplo conhecimento técnico sobre os diversos problemas que afetam a relação trabalho saúde, garantem a efetividade das ações de vigilância (não apenas). Alcançar tais objetivos exige dos serviços um conjunto complexo de atributos humanos e de instrumentalidades materiais e conceituais de monta.

Para agir de forma efetiva e colocar o trabalho como centro das atenções da vigilância, é preciso não apenas agir sobre seus fatores de risco conforme sugerem as disciplinas clássicas da higiene e segurança do trabalho, mas manter atualizado amplo ferramental teórico e conceitual de modo a compatibilizá-lo nas situações de intervenção (VILELA et al., 2012). Pode-se observar que as equipes dos Cerests mais atuantes possuem composição multidisciplinar, o que lhes permite analisar e conhecer em profundidade o trabalho real, dominar metodologias qualitativas e quantitativas, valer-se de ferramentas teóricas e conceituais da ergonomia da atividade, da sociologia, das engenharias, da fisiologia, da epidemiologia, da toxicologia etc. Tal arsenal teórico e conceitual é requisito essencial para disputar e ganhar dos representantes do capital no nível argumentativo.

Além dos aspectos teóricos, os coletivos colocam em prática seu saber-fazer prático e suas habilidades para a ampliação da comunidade de cooperação intra e extra SUS, o que tem favorecido o estabelecimento de pontes com os trabalhadores e seus representantes, bem como com a própria rede de atenção, como outras instituições públicas, imprensa etc. [ver, por exemplo, Minayo-Gomes (2011)]. Redes e laços de confiança essenciais ao estabelecimento de programas e alianças de longa duração podem ser observados, tendo inclusive repercussão favorável na mídia.

Não obstante a efetividade das ações e dos programas depender de mecanismos de proteção jurídica, estabilidade e renda compatíveis com o exercício de função essencial do Estado (como também argumentou Minayo-Gomes em seu texto de debate), as experiências bem-sucedidas mostram que a evolução da Visat é um processo de desenvolvimento e construção, ou seja, ao ser movida pelo objeto da transformação dos ambientes e processos de trabalho, a equipe e os serviços são desafiados a transformar-se e a ampliar-se. Ao obter êxito, os serviços ampliam também seu poder e sua capacidade de agir. Novos objetos são almejados, suscitando novas evoluções (JACKSON FILHO; BARREIRA, 2010).

Dentro deste quadro, segundo nossa experiência nos serviços e na pesquisa, temos convicção de que a atenção básica não reúne as condições mínimas necessárias para tal desenvolvimento. Como mudar a "cultura assistencial" intrínseca à atenção básica, condição fundamental para atender as diretrizes e estratégias em vigor com a PNSTT, como também nos diz Minayo Gomes no seu texto?

Não se estaria, mais uma vez, procurando soluções simplificadoras, de menor custo, típicas dos contextos de carência dos recursos, marcas da precarização e da intensificação do trabalho nas áreas das políticas sociais e que, de modo geral, são fadadas ao fracasso?

Certos de que o debate não se encerra aqui, esperamos que mais profissionais e pesquisadores se posicionem a fim de favorecer a implementação da PNSTT dentro deste espírito de defesa da Atenção Integral à Saúde dos Trabalhadores.

Recebido: 24/06/2013

Aprovado: 26/06/2013

  • ______. Ministério da Saúde. Portaria nş 3.120, de 01 de julho de 1998. Instrução normativa sobre ações de vigilância em saúde do trabalhador no SUS. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 2 jul. 1998. Seção I, p. 36. Disponível em: <http://www.cerest.rn.gov.br/contentproducao/aplicacao/sesap_cerest/legislacao/gerados/portaria%203.120.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2013.
  • ______. ______. Portaria nş 1.823/GM, de 23 de agosto de 2012. Institui a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 24 ago. 2012. n. 165, Seção I, p. 46-51. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt1823_23_08_2012.html>. Acesso em: 30 junho 2013.
  • ______. Presidência da República. Casa Civil. Decreto nş 7.602, de 07 de novembro de 2011. Dispõe sobre a Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho - PNSST. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 8 nov. 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7602.htm>. Acesso em: 30 jun. 2013.
  • JACKSON FILHO, J. M.; BARREIRA, T. H. C. Ação pública no campo da saúde do trabalhador: o caso do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador de Piracicaba. São Paulo: Fundacentro, 2010. (Relatório de pesquisa).
  • MINAYO-GOMES; C. Produção de conhecimentos e intersetorialidade em prol das condições de vida e de saúde dos trabalhadores do setor sucroalcoleiro. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.16, n. 8, p. 3363-3368, 2011.
  • VILELA, R. A. G.; ALMEIDA, I. M.; MENDES, R. W. B. Da vigilância para prevenção de acidentes de trabalho: contribuição da ergonomia da atividade. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 10, p. 2817-2830, 2012.
  • 1
    Pertencente ao Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador (DSAST) da Secretaria de Vigilância à Saúde (SVS) doMinistério da Saúde.
  • 2
    O desafio de implantar ações de Saúde do Trabalhador na Atenção Primária em Saúde. Disponível em: <
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013
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