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Capacidade para o trabalho de cirurgiões-dentistas da atenção básica: prevalência e fatores associados

Work ability of primary care dentists: prevalence and associated factors

Resumo

Objetivo:

avaliar os fatores associados à capacidade para o trabalho de cirurgiões-dentistas.

Métodos:

a amostra foi constituída por 167 cirurgiões-dentistas vinculados à Estratégia Saúde da Família. Foram aplicados questionários sobre a capacidade para o trabalho, dados sociodemográficos, caraterísticas relacionadas ao trabalho, aspectos de saúde autorreferidos, estilo de vida e fadiga. Na análise univariada utilizou-se a estatística descritiva; na bivariada, o teste Qui-quadrado de Pearson, e, na multivariada, a regressão de Poisson.

Resultados:

46,7% da amostra mostrou capacidade inadequada para o trabalho, sendo as variáveis independentes associadas: sexo feminino (RP=1,12; IC95%: 1,01-1,23), limpeza não adequada (RP=1,14; IC95%: 1,01-1,29), ambiente úmido (RP=1,35; IC95%: 1,15-1,59), ambiente de trabalho com muito barulho (RP=1,10; IC95%: 1,01-1,30), tarefas repetitivas e monótonas (RP=1,36; IC95%: 1,20-1,55), insatisfação com sono (RP=1,15; IC95%: 1,05-1,25), estado de saúde regular (RP=1,25; IC95%: 1,10-1,41), apresentar de uma a quatro morbidades diagnosticadas (RP=1,14; IC95%: 1,04-1,26), cinco ou mais morbidades (RP=1,52; IC95%: 1,38-1,70) e níveis altos de percepção de fadiga (RP=1,15; IC95%: 1,04-1,26).

Conclusão:

A amostra estudada apresentou incapacidade para o trabalho, que foi associada a fatores sociodemográficos, características do trabalho, aspectos de saúde e altos níveis de fadiga.

Palavras-chave:
saúde do trabalhador; fadiga/epidemiologia; odontólogos; condições de trabalho; estudos transversais

Abstract

Objective:

to evaluate the factors associated with the dentists' ability to work.

Methods:

the sample consisted of 167 dentists' linked to the Estratégia Saúde da Família [Family Health Strategy]. We handed out questionnaires about work ability, sociodemographic data, work-related characteristics, self-reported health aspects, lifestyle, and fatigue. We used descriptive statistics in univariate analysis; Pearson's chi-squared test in the bivariate, and, Poisson regression in the multivariate.

Results:

46.7% of the sample showed inadequate work ability, with the following associated independent variables: women (PR = 1.12; 95%CI: 1.01-1.23), inadequate cleaning (PR= 1.14; 95%CI: 1.01-1.29), humid environment (PR = 1.35; 95%CI: 1.15-1.59), very noisy work environment (PR = 1.10; 95%CI: 1.01-1.30), repetitive and monotonous tasks (PR = 1.36; 95%CI: 1.20-1.55), dissatisfaction with sleeping (PR = 1.15; 95%CI: 1.05-1.25), regular health state (PR = 1.25; 95%CI: 1.10-1.41), having from one to four diagnosed morbidities (PR = 1.14; 95%CI: 1.04-1.26), five or more morbidities (PR = 1.52; 95%CI: 1.38-1.70), and high levels of fatigue perception (PR = 1.15; 95%CI: 1.04-1.26).

Conclusion:

The studied sample showed incapacity to work, which was associated with demographic factors, work characteristics, health aspects , and high levels of fatigue.

Keywords:
occupational health; fatigue/epidemiology; dentists; working conditions; cross-sectional studies

Introdução

Estudos têm demonstrado como diferentes tipos de ocupações podem afetar a saúde de trabalhadores11. Alexandre PC, Silva IC, Souza LM, Magalhães Câmara V, Palácios M, Meyer A. Musculoskeletal disorders among Brazilian dentists. Arch Environ Occup Health. 2011;66(4):231-5.), (22. Regis Filho GT, Michels G, Sell I. Lesões por esforços repetitivos/distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em cirurgiões-dentistas. Rev Bras Epidemiol. 2006;9(3):346-59.. O exercício da odontologia enquadra-se nas categorias profissionais que mais sujeitam os seus praticantes a se exporem a múltiplos fatores de risco para o desenvolvimento de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT). Dentre esses fatores, destaca-se a manutenção prolongada de posturas estáticas, atividades repetitivas, longas jornadas de trabalho, ambiente de trabalho mal projetado, estresse e manejo de materiais químico e biológico33. Shaik AR, Rao SB, Husain A, D'sa J. Work-related musculoskeletal disorders among dental surgeons: a pilot study. Contemp Clin Dent. 2011;2(4):308-12.), (44. Pozos Radillo BE, Tórrez López TM, Aguilera Velasco Mde L, Acosta Fernández M, González Perez GJ. Stress-associated factors in Mexican dentists. Braz Oral Res. 2008;22(3):223-8.), (55. Puriene A, Aleksejuniene J, Petrauskiene J, Balciuniene I, Janulyte V. Self-reported occupational health issues among Lithuanian dentists. Ind Health. 2008;46(4):369-74..

A prevalência de distúrbios musculoesquelético em cirurgiões-dentistas (CDs) varia de 61% a 96,9%66. Gupta D, Bhaskar DJ, Gupta KR, Karim B, Kanwar A, Jain A, et al. Use of complementary and alternative medicine for work related musculoskeletal disorders associated with job contentment in dental professionals: Indian outlook. Ethiop J Health Sci. 2014;24(2):117-24.), (77. Sustová Z, Hodacová L, Kapitán M. The prevalence of musculoskeletal disorders among dentists in the Czech Republic. Acta Medica (Hradec Kralove). 2013;56(4):150-6.), (88. Leggat PA, Kedjarune U, Smith DR. Occupational health problems in modern dentistry: a review. Ind Health. 2007;45(5):611-21., fato que provoca elevados índices de absentismo, incapacidade temporária ou permanente para o trabalho com reflexos negativos na qualidade dos serviços prestados à população e na capacidade para o trabalho desses profissionais11. Alexandre PC, Silva IC, Souza LM, Magalhães Câmara V, Palácios M, Meyer A. Musculoskeletal disorders among Brazilian dentists. Arch Environ Occup Health. 2011;66(4):231-5.), (55. Puriene A, Aleksejuniene J, Petrauskiene J, Balciuniene I, Janulyte V. Self-reported occupational health issues among Lithuanian dentists. Ind Health. 2008;46(4):369-74.), (88. Leggat PA, Kedjarune U, Smith DR. Occupational health problems in modern dentistry: a review. Ind Health. 2007;45(5):611-21..

A Capacidade para o trabalho é a resultante das condições de saúde do trabalhador - inclusive suas capacidades físicas e mentais - em relação às demandas físicas, mentais e sociais que o trabalho apresenta, podendo ser mantida ou restaurada, se medidas preventivas e terapêuticas forem tomadas em relação ao trabalhador99. Tuomi K, Ilmarinen J, Jahkola A, Katajarinne L, Tulkki A. Índice de capacidade para o trabalho. Tradução: Fischer FM (coord). São Carlos: Edufscar; 2005.), (1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97.. Dessa forma, diferentes categorias profissionais têm sido pesquisadas quanto à sua capacidade para o trabalho no decorrer dos anos, por exemplo, trabalhadores de indústrias têxteis com diferentes turnos1111. Metzner RJ, Fischer FM. Fadiga e capacidade para o trabalho em turnos fixos de doze horas. Rev Saúde Pública. 2001;35(6):548-553., trabalhadores de enfermagem1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97.), (1212. Schmidt SG, Dichter MN, Bartholomeyczik S, Hasselhorn HM. The satisfaction with the quality of dementia care and the health, burnout and work ability of nurses: a longitudinal analysis of 50 German nursing homes. Geriatr Nurs. 2014;35(1):42-6., trabalhadores da área administrativa1313. Martinez MC; Latorre MRDO. Saúde e capacidade para o trabalho em trabalhadores da área administrativa. Rev Saúde Pública. 2006;40(5):851-8., eletricitários1414. Martinez MC, Latorre MRDO. Fatores associados a capacidade para trabalho de trabalhadores do setor elétrico. Cad Saúde Pública. 2009;25(4):761-72., motoristas de ônibus1515. Sampaio RF, Coelho CM, Barbosa FB, Mancini MC, Parreira VF. Work ability and stress in a bus transportation company in Belo Horizonte, Brazil. Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(1):287-96., bombeiros1616. Airila A, Hakanen J, Punakallio A, Lusa S, Luukkonen R. Is work engagement related to work ability beyond working conditions and lifestyle factors? Int Arch Occup Environ Health. 2012;85:915-25., professores1717. Vedovato TG, Monteiro I. Health conditions and factors related to the work ability of teachers. Industrial Health. 2014;52:121-128. e trabalhadores em geral1818. Gustafsson K, Marklund S. Associations between health and combinations of sickness presence and absence. Occup Med. 2014;64:49-55..

Entretanto, no que concerne aos cirurgiões-dentistas, os estudos atuais têm sido focados principalmente em disfunções ergonômicas ou de biossegurança11. Alexandre PC, Silva IC, Souza LM, Magalhães Câmara V, Palácios M, Meyer A. Musculoskeletal disorders among Brazilian dentists. Arch Environ Occup Health. 2011;66(4):231-5.), (88. Leggat PA, Kedjarune U, Smith DR. Occupational health problems in modern dentistry: a review. Ind Health. 2007;45(5):611-21.), (1919. Garcia LP, Blanck VLG. Prevalência de exposições ocupacionais de cirurgiões-dentistas e auxiliares de consultório dentário a material biológico. Cad Saúde Pública 2006;22(1):97-108., não sendo detectadas - seja na literatura nacional ou internacional - pesquisas que analisem a capacidade para o trabalho e sua associação com aspectos organizacionais nessa categoria profissional. Assim, esta pesquisa tem por objetivo avaliar os fatores associados à capacidade para o trabalho de CDs que trabalham na Estratégia Saúde da Família (ESF).

Métodos

Foi realizado um estudo epidemiológico de corte transversal. Fizeram parte da pesquisa cirurgiões-dentistas vinculados à ESF no município de Teresina, Piauí, no período de janeiro a março de 2014.

Como critério de inclusão no estudo, os CDs participantes deveriam estar em exercício profissional no período da coleta de dados e aceitar participar da pesquisa. Os CDs que não estivessem realizando atividades assistenciais diretas (trabalhando em atividade administrativa ou afastados do trabalho por qualquer motivo) foram excluídos da pesquisa.

A amostra foi do tipo probabilística aleatória simples, considerando um total de 220 CDs na ESF trabalhando no período pesquisado. O cálculo da amostra foi estimado mediante uma prevalência de 50% para as variáveis relacionadas ao desfecho, margem de erro de 5% para um intervalo de confiança de 95%, efeito do desenho de 1,02020. Rao PSRS. Sampling methodologies: with applications. New York: Chapman & Hall/CRC; 2000., totalizando uma amostra ideal para o desenvolvimento do estudo de 140 CDs. A amostra foi aumentada em 20%, pressupondo uma taxa de não resposta de 10% e mais 10% para controlar fatores de confusão, resultando em uma amostra final de 167 cirurgiões-dentistas.

Antes da aplicação dos instrumentos de coleta, foi realizado um estudo piloto com 10 CDs não pertencentes à ESF para testar e avaliar o método proposto para o estudo; os participantes envolvidos no estudo piloto não foram incluídos como sujeitos da pesquisa no estudo principal.

O levantamento dos dados é apresentado a seguir:

A capacidade para o trabalho foi avaliada por meio do Índice de Capacidade para o trabalho (ICT)99. Tuomi K, Ilmarinen J, Jahkola A, Katajarinne L, Tulkki A. Índice de capacidade para o trabalho. Tradução: Fischer FM (coord). São Carlos: Edufscar; 2005., traduzido e validado para o Brasil2121. Martinez MC, Latorre MRDO, Fischer FM. Validade e confiabilidade da versão brasileira do Índice de Capacidade para o Trabalho. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):523-32., que permite avaliar a capacidade para o trabalho a partir da percepção do próprio trabalhador, obtido a partir de dez questões sintetizadas em sete dimensões. A pontuação varia de 7 a 49 pontos.

Para a construção da variável desfecho capacidade inadequada para o trabalho, foi usado o ponto de corte sugerido por Kujala et al.2222. Kujala V, Remes J, Ek E, Tammelin T, Laitinen J. Classification of work ability index among young employees. Occup Med (Lond). 2005;55:399-401. de acordo com a idade do trabalhador. Para indivíduos com idade entre 18 e 34 anos (valor inferior a 40 pontos) e a partir de 35 anos (valor inferior a 37 pontos). O coeficiente de confiabilidade interna (alfa de Cronbach) dos itens foi 0,79.

As variáveis independentes para o estudo foram agrupadas em cinco blocos de informações:

  1. Sociodemográfico: sexo; faixa etária; estado civil e renda familiar mensal.

  2. Ocupacionais: local, regime e tempo de trabalho, jornada diária e semanal. No que se refere à organização do trabalho, foi aplicado um questionário autorizado e adaptado de Vasconcelos et al.1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97. referente à estrutura organizacional e ambiente físico do trabalho com respostas que variam de: sempre ou muito frequente, às vezes pouco frequente ou pouquíssimo frequente ou nunca.

  3. Estilo de vida: prática de atividade física; consumo de álcool; fumo e estado nutricional segundo o índice de massa corporal.

  4. Aspectos de saúde autorreferidos: satisfação com sono, estresse, estado de saúde, além da quantidade de morbidades referidas com diagnóstico médico obtida através do ICT.

  5. Fadiga: foi utilizado o questionário de percepção de fadiga2323. Yoshitake H. Relations between the symptoms and the feeling of fatigue. In: Hashimoto K. et al. Methodology in human fatigue assessment. London: Taylor & Francis; 1975., adaptado e validado para o português1111. Metzner RJ, Fischer FM. Fadiga e capacidade para o trabalho em turnos fixos de doze horas. Rev Saúde Pública. 2001;35(6):548-553., composto por 30 questões de múltipla escolha com escore variando de 30 até 150 pontos, correspondendo a menor e maior fadiga respectivamente. Os escores compreendidos entre 30 e 72 foram considerados baixa fadiga, e acima de 72, alta fadiga (corte pelo terceiro quartil). O coeficiente alfa de Cronbach foi de 0,93.

Os dados foram organizados e tabulados utilizando o Microsoft Excel versão 2010 para Windows e as análises estatísticas foram feitas por meio do SPSS versão 18.0 para Windows (SPSS Inc. Chicago, IL 60606, EUA).

Na análise univariada foram aplicados os procedimentos de estatística descritiva. Na análise bivariada para associar a capacidade inadequada para o trabalho e as variáveis sociodemográficas relacionadas ao trabalho, aspectos de saúde autorreferidos, estilo de vida e fadiga, foi utilizado o teste Qui-quadrado de Pearson (χ²).

Para a construção do modelo final foi realizada uma análise multivariada por meio da regressão de Poisson com variância robusta dos erros-padrão2424. Barros AJD, Hirakata VN. Alternatives for logistic regression in cross sectional studies: an empirical comparison of models that directly estimate the prevalence ratio. BMC Med Res Methodol; 2003. com todas as covariáveis de interesse que apresentaram p<0,20 na análise bivariada. Calcularam-se as razões de prevalência brutas e ajustadas com seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%), utilizando-se um modelo hierárquico no qual as variáveis de interesse foram ordenadas segundo sua precedência sobre o desfecho de interesse2525. Victora CG, Huttly SR, Fuchs SC, Olinto MTA. The role of conceptual frameworks in epidemiological analysis: a hierarchical approach. Int J Epidemiol. 1997;26:224-7. e significância obtida pelo teste de Wald para heterogeneidade. Em todas as análises realizadas foi utilizado um nível de significância de 5%.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Piauí (UFPI) com o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 22135013.8.0000.5214. Todos os participantes da pesquisa assinaram um termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), conforme o que preconiza a resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

Observou-se na amostra uma amplitude de variação etária de 23,0 a 68,0 anos e que nesta a maioria dos cirurgiões-dentistas era do sexo feminino, na faixa etária de 23-39 anos, com idade média 40,3 anos (dp=10,7), predominantemente casado (a)/união estável; e com renda familiar maior que 10 salários mínimos (47%). Quanto ao estilo de vida dos CDs, a maioria praticava algum tipo de atividade física, não era tabagista, não consumia bebida alcoólica e possuía estado nutricional eutrófico, com índice de massa corporal médio de 24,0 kg/m² (dp=3,0) (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição das variáveis sociodemográficas, estilo de vida e ocupacionais dos cirurgiões-dentistas da ESF de Teresina, Piauí, 2014

A Tabela 1 mostra que maioria dos CDs possuía mais de um vínculo empregatício e tempo de trabalho nas Unidades Básicas de Saúde menor que 10 anos, com média de 8,9 anos (9,0). A jornada de trabalho prevalente no estudo situou-se entre 8 e 9,9 horas diárias, porém a média da amostra foi de 7,8 horas (dp=2,4).

A Tabela 2 apresenta aspectos relacionados ao ambiente físico e à organização do trabalho relatados pelos CDs.

Tabela 2
Distribuição das características relacionadas ao ambiente físico e à organização de trabalho dos cirurgiões-dentistas da ESF de Teresina, Piauí, 2014

Uma parte expressiva dos CDs relatou estar insatisfeita com o sono e considerou seu estado de saúde como regular, a maioria se sente estressada às vezes. A média do escore de percepção de fadiga foi de 60,8 pontos (dp=16,1), variando entre 32,0 e 103,0 pontos e 26,3% tiveram alto nível de fadiga (Tabela 3).

Tabela 3
Distribuição relativa aos aspectos de saúde e percepção de fadiga dos cirurgiões-dentistas da ESF de Teresina, Piauí, 2014

O ICT, na amostra pesquisada, teve média de 38,1 pontos (dp=6,3), variando de 18,0 a 49,0 pontos. Após a categorização proposta por Kujala et al.2222. Kujala V, Remes J, Ek E, Tammelin T, Laitinen J. Classification of work ability index among young employees. Occup Med (Lond). 2005;55:399-401., observou-se que 53,3% dos indivíduos foram considerados como tendo capacidade para o trabalho adequada e 46,7% inadequada. Foram observados altos valores do ICT nas sete dimensões aferidas pelo instrumento, em proporções expressivas da amostra (Tabela 4).

Tabela 4
Pontuação do Índice de Capacidade para o Trabalho (ICT) segundo suas dimensões

Os resultados das análises bivariadas mostraram que houve associação significativa entre a incapacidade para o trabalho com o sexo dos participantes (p=0,038), ambiente úmido (p=0,044), tarefas repetitivas e monótonas (p<0,001), satisfação com o sono (p<0,001), estresse autorreferido (p=0,029), estado de saúde autorreferido (p=0,005), morbidades por diagnóstico médico (p<0,001) e percepção da fadiga (p<0,001).

As variáveis que não obtiveram significância estatística na análise bivariada, mas que obtiveram um p<0,20 e foram inseridas na análise múltipla, foram: tempo de trabalho (p=0,080), limpeza adequada (p=0,181), sistema de refrigeração adequado (p=0,111), muito barulho no ambiente de trabalho (p=0,172), ambiente de trabalho com odor desagradável (p=0,081), ritmo de trabalho excessivo (p=0,076), número de auxiliar de saúde bucal suficiente (p=0,105), praticar atividade física (p=0,056), consumo de bebida alcoólica (p=0,116). Gênero, faixa etária e tempo de trabalho foram tomados como variáveis de controle no modelo.

A Tabela 5 apresenta o modelo final da análise múltipla hierarquizada, onde se observa que dentre as variáveis sociodemográficas relacionadas à capacidade inadequada para o trabalho; apenas a variável gênero mostrou-se associada: RP=1,12.

Tabela 5
Modelo final para os fatores associados à capacidade inadequada para o trabalho dos cirurgiões-dentistas da ESF de Teresina, Piauí, 2014 - estimativas de razão de prevalências obtidas mediante regressão de Poisson

Em relação às variáveis relacionadas ao trabalho (Tabela 5), os fatores independentes associados foram: limpeza não adequada (RP=1,14), ambiente úmido (RP=1,35), ambiente de trabalho com muito barulho (RP=1,10), tarefas repetitivas e monótonas (RP=1,36) e às vezes repetitivas e monótonas (RP=1,17).

As variáveis relativas aos aspectos de saúde (Tabela 5) que se mostraram associadas no modelo final foram: não está insatisfeito nem satisfeito com seu sono (RP=1,13), está insatisfeito ou muito insatisfeito com sono (RP=1,15) e considera seu estado de saúde regular (RP=1,25). Em relação às morbidades referidas, relatar uma a quatro doenças (RP=1,14) e cinco ou mais (RP=1,52) estiveram associados à capacidade inadequada para o trabalho.

O modelo final (obtido por meio dos desvios residual e de Pearson) mostrou aderência à curva normal com variação de −2 a 2, presença de poucos outliers e grau de liberdade próximo ao desvio de Pearson. Esses aspectos indicam bom ajuste do modelo na análise final.

Discussão

Os resultados da pesquisa mostraram que houve uma alta prevalência de capacidade inadequada para o trabalho entre a amostra estudada (46,7%), corroborando outros estudos realizados no Brasil e no mundo com diferentes categorias profissionais1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97.), (1212. Schmidt SG, Dichter MN, Bartholomeyczik S, Hasselhorn HM. The satisfaction with the quality of dementia care and the health, burnout and work ability of nurses: a longitudinal analysis of 50 German nursing homes. Geriatr Nurs. 2014;35(1):42-6.), (1717. Vedovato TG, Monteiro I. Health conditions and factors related to the work ability of teachers. Industrial Health. 2014;52:121-128.), (1818. Gustafsson K, Marklund S. Associations between health and combinations of sickness presence and absence. Occup Med. 2014;64:49-55.), (2626. Monteiro I, Chillida MS, Moreno LC. Work ability among nursing personnel in public hospitals and health centers in Campinas - Brazil. Work. 2012;41:316-19.), (2727. Costa AF, Puga-Leal R, Nunes IL. An exploratory study of the Work Ability Index (WAI) and its components in a group of computer workers. Work. 2011;39:357-67..

Na presente pesquisa, apenas a variável sociodemográfica sexo apresentou associação com a capacidade inadequada para o trabalho. A perda de capacidade para o trabalho em mulheres foi 12% mais prevalente que em homens. Esses resultados foram concordantes com pesquisas de outros autores1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97.), (2828. Costa G, Sartori S. Ageing, working hours and work ability. Ergonomics. 2007;50(11):1914-30.), (2929. Costa CSN, Freitas EG, Mendonça LCS, Alem MER, Coury HJCG. Capacidade para o trabalho e qualidade de vida de trabalhadores industriais. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(6):1635-42.. Uma das explicações possíveis dessa relação é que, mesmo com todas as mudanças advindas da inserção das mulheres no mercado de trabalho, elas não deixaram de exercer a responsabilidade tradicional do cuidado das tarefas domésticas e filhos, acumulando múltiplos papéis e aumentando a sobrecarga de trabalho3030. Johansson G, Huang Q, Lindfors P. A life-span perspective on women's careers, health, and well-being. 2007;65(4):685-97.), (3131. Rotenberg L, Griep RH, Fischer FM, Fonseca MJM, Landsbergis P. Working at night and work ability among nursing personnel: when precarious employment makes the difference. Int Arch Occup Environ Health. 2009;82:877-85..

Vale ressaltar que as cargas de trabalho impostas aos CDs, o desconforto físico, um posto de trabalho mal projetado sob o ponto de vista ergonômico e a má postura são fatores determinantes para o surgimento de doenças de origem ocupacional nesses profissionais, incomodando, e, algumas vezes, até incapacitando o seu desempenho profissional11. Alexandre PC, Silva IC, Souza LM, Magalhães Câmara V, Palácios M, Meyer A. Musculoskeletal disorders among Brazilian dentists. Arch Environ Occup Health. 2011;66(4):231-5.), (33. Shaik AR, Rao SB, Husain A, D'sa J. Work-related musculoskeletal disorders among dental surgeons: a pilot study. Contemp Clin Dent. 2011;2(4):308-12.), (44. Pozos Radillo BE, Tórrez López TM, Aguilera Velasco Mde L, Acosta Fernández M, González Perez GJ. Stress-associated factors in Mexican dentists. Braz Oral Res. 2008;22(3):223-8.), (3232. Reis WG, Scherer MDA, Carcereri DL. O trabalho do cirurgião-dentista na atenção primária à saúde: entre o prescrito e o real. Saude debate. 2015; 39(104):56-64..

A limpeza não adequada do ambiente de trabalho na presente pesquisa esteve associada a um aumento de 14% na prevalência de capacidade inadequada para o trabalho. Esse achado está supostamente relacionado às inúmeras evidências de que um ambiente de trabalho limpo é essencial tanto para a prática odontológica segura para os pacientes quanto para a sanidade da equipe de saúde bucal. É notório que diversos procedimentos clínicos e cirúrgicos rotineiros dessa atividade favorecem a exposição de seus trabalhadores a uma grande variedade de micro-organismos potencialmente patogênicos presentes em fluidos corporais dos pacientes (sangue, saliva e secreções do trato respiratório alto)3333. Silva ICM, Asmus CIRF, Campos RC, Davis RH, Meyer A, Camara VM. Variação diária da exposição de mercúrio entre assistentes e estagiários em um consultório dentário. Rev Bras Odontol. 2014; 71(1):17-21.), (3434. Singh TS, Bello B, Mabe OD, Renton K, Jeebhay ME. Workplace determinants of endotoxin exposure in dental healthcare facilities in South Africa. Ann Occup Hyg. 2010;54(3):299-308..

Estudo de Bernardo et al.3535. Bernardo WlC, Boriollo MFG, Gonçalves RB, Höfling JF. Staphylococcus aureus ampicillinresistant from the odontological clinic environment. Rev Inst Med Trop S Paulo. 2005;47(1):19-24. mostrou uma alta prevalência de estafilococos patogênicos no ambiente odontológico, sendo que algumas dessas bactérias se encontravam resistentes à maioria dos antibióticos utilizados. Barreto et al.3636. Barreto ACB, Vasconcelos CPP, Girão CMS, Rocha MMNP, Mota OML, Pereira SLS. Contaminação do ambiente odontológico por aerossóis durante atendimento clínico com uso de ultrassom. Braz J Periodontol. 2011;21(2):79-84. afirmam, ainda, que aerossóis contaminados por bactérias podem transpor as barreiras fixas do ambiente odontológico, e que esses aerossóis são rotineiramente gerados pelos instrumentos de alta rotação e aparelhos ultrassônicos utilizados pelos CDs.

Um ambiente de trabalho com muito barulho foi responsável por um aumento de 10% na prevalência de perda da capacidade para o trabalho dos CDs. Essa é outra característica da organização de trabalho desses profissionais, que geralmente trabalham em um ambiente com alta tendência a ruídos, tais como os provenientes de motor de alta rotação, compressor, sugadores de saliva, além de ar condicionado - fontes emissoras que, somadas, podem levar o profissional a um comprometimento da audição e de suas atividades ocupacionais3737. Choosong T1, Kaimook W, Tantisarasart R, Sooksamear P, Chayaphum S, Kongkamol C, et al. Noise exposure assessment in a dental school. Saf Health Work. 2011;2(4):348-54.), (3838. Willershausen B. Hearing assessment in dental practitioners and other academic professionals from an urban setting. Head Face Med. 2014;10:1-7..

A umidade, nesta pesquisa, esteve associada a uma perda de 35% na capacidade para o trabalho, fato que corrobora os estudos de Karvala et al.3939. Karvala K, Uitti J, Luukkonen R, Nordman H. Quality of life of patients with asthma related to damp and moldy work environments. Scand J Work Environ Health. 2013;39(1):96-105.), (4040. Karvala K, Nordman H, Luukkonen R, Uitti J. Asthma related to workplace dampness and impaired work ability. Int Arch Occup Environ Health. 2014;87(1):1-11.. Os autores demonstraram que a presença de umidade no ambiente de trabalho esteve diretamente associada a uma capacidade pobre para o trabalho, e como consequência, 13% dos participantes relataram mudança de emprego e diminuição na qualidade de vida.

Tarefas repetitivas e monótonas estiveram associadas a um aumento de 36% na prevalência de capacidade inadequada, e tarefas às vezes repetitivas e monótonas, a um aumento de 17% na mesma capacidade. A literatura sobre a relação entre tarefas repetitivas e monótonas com comprometimento da saúde dos trabalhadores é vasta, principalmente porque são fatores de risco para o desenvolvimento de doenças ocupacionais. Logo, os resultados obtidos neste estudo mostram congruência com evidências apontadas nos demais11. Alexandre PC, Silva IC, Souza LM, Magalhães Câmara V, Palácios M, Meyer A. Musculoskeletal disorders among Brazilian dentists. Arch Environ Occup Health. 2011;66(4):231-5.), (22. Regis Filho GT, Michels G, Sell I. Lesões por esforços repetitivos/distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em cirurgiões-dentistas. Rev Bras Epidemiol. 2006;9(3):346-59.), (33. Shaik AR, Rao SB, Husain A, D'sa J. Work-related musculoskeletal disorders among dental surgeons: a pilot study. Contemp Clin Dent. 2011;2(4):308-12.), (44. Pozos Radillo BE, Tórrez López TM, Aguilera Velasco Mde L, Acosta Fernández M, González Perez GJ. Stress-associated factors in Mexican dentists. Braz Oral Res. 2008;22(3):223-8.), (55. Puriene A, Aleksejuniene J, Petrauskiene J, Balciuniene I, Janulyte V. Self-reported occupational health issues among Lithuanian dentists. Ind Health. 2008;46(4):369-74.), (66. Gupta D, Bhaskar DJ, Gupta KR, Karim B, Kanwar A, Jain A, et al. Use of complementary and alternative medicine for work related musculoskeletal disorders associated with job contentment in dental professionals: Indian outlook. Ethiop J Health Sci. 2014;24(2):117-24..

Quanto às variáveis relativas aos aspectos de saúde, não estar insatisfeito nem satisfeito com seu sono foi responsável por um aumento de 13% na prevalência de capacidade inadequada, enquanto estar muito insatisfeito ou insatisfeito com o sono foi responsável por 15% de aumento, resultados que se assemelham a outras pesquisas1616. Airila A, Hakanen J, Punakallio A, Lusa S, Luukkonen R. Is work engagement related to work ability beyond working conditions and lifestyle factors? Int Arch Occup Environ Health. 2012;85:915-25.), (1717. Vedovato TG, Monteiro I. Health conditions and factors related to the work ability of teachers. Industrial Health. 2014;52:121-128.), (2626. Monteiro I, Chillida MS, Moreno LC. Work ability among nursing personnel in public hospitals and health centers in Campinas - Brazil. Work. 2012;41:316-19.), (4141. Camerino D, Conway PM, Sartori S, Campanini P, Estryn-Béhar M, van der Heijden BI, Costa G. Factors affecting work ability in day and shift-working nurses. Chronobiol Int. 2008;25(2):425-42..

Cirurgiões-dentistas que consideraram o seu estado de saúde regular tiveram capacidade para o trabalho diminuída em 25% quando comparados aos que relataram estado de saúde bom/muito bom. Os resultados da presente pesquisa são compatíveis com estudos de Vedovato e Monteiro1717. Vedovato TG, Monteiro I. Health conditions and factors related to the work ability of teachers. Industrial Health. 2014;52:121-128. e Vries et al.4242. Vries HJ, Reneman MF, Groothoff JW, Geertzen JH, Brouwer S. Self-reported work ability and work performance in workers with chronic nonspecific musculoskeletal pain. J Occup Rehabil. 2013;23(1):1-10., os quais relatam que a percepção geral de saúde está diretamente associada à capacidade para o trabalho.

No que tange à relação entre a presença de morbidades e capacidade para o trabalho, Gustafsson e Marklund1818. Gustafsson K, Marklund S. Associations between health and combinations of sickness presence and absence. Occup Med. 2014;64:49-55. verificaram que a presença de doenças está intimamente relacionada a uma baixa capacidade para o trabalho.

Observou-se, no estudo, que o relato de cinco ou mais doenças pelos CDs aumentou em 52% a prevalência de capacidade inadequada para o trabalho em relação aos que referiram não ter nenhuma doença. Vasconcelos et al.1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97. também encontraram essa relação, constatando que a capacidade para o trabalho foi 48% menor nos profissionais da enfermagem que relataram três ou mais doenças, quando comparados aos trabalhadores que não referiram nenhuma doença.

Outro resultado importante encontrado no estudo foi que 26,3% dos CDs possuíam níveis de fadiga elevados, e que a perda de capacidade para o trabalho foi 15% mais prevalente nesses indivíduos quando comparados aos que apresentaram níveis mais baixos; esse resultado está em consonância com estudos de Vasconcelos et al.1010. Vasconcelos SP, Fischer FM, Reis AOA, Moreno CRC. Fatores associados à capacidade para o trabalho e percepção de fadiga em trabalhadores de enfermagem da Amazônia Ocidental. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(4):688-97., que encontraram um aumento de 2,37 vezes na prevalência, e de Fisher et al.4343. Fischer FM. Borges NS, Rotenberg L, Latorre MRDO, Soares NS, Rosa PLFS, et al. A (in) capacidade para o trabalho em trabalhadores de enfermagem. Rev Bras Med Trab. 2005;3(2):97-103., que também relataram essa associação com profissionais da enfermagem.

Esses resultados podem ser explicados pelo fato de a fadiga diminuir a habilidade dos indivíduos de realizar suas tarefas habituais, pois ela altera o estado de alerta e vigilância, causando danos sociais e psicológicos e comprometendo a capacidade para o trabalho4343. Fischer FM. Borges NS, Rotenberg L, Latorre MRDO, Soares NS, Rosa PLFS, et al. A (in) capacidade para o trabalho em trabalhadores de enfermagem. Rev Bras Med Trab. 2005;3(2):97-103.), (4444. Rosa PLFS, Fischer FM, Borges FNS, Soares NS, Rotenberg L, Landsbergis P. Percepção da duração do sono e da fadiga entre trabalhadores de enfermagem. R Enferm UERJ. 2007;15:100-6.), (4545. Medeiros Neto CF, Almeida GA, Ramos BC, Costa SKP, Silva HPA, Sousa MBC. Análise da percepção da fadiga, estresse e ansiedade em trabalhadores de uma indústria de calçados. J Bras Psiquiatr. 2012;61(3):133-8..

Esse é um fato que merece destaque, pois profissionais com níveis elevados de fadiga se tornam mais propensos a não realizarem suas atividades profissionais de maneira adequada, o que pode comprometer a saúde bucal da população por eles assistida. Em se tratando de um estudo transversal, os resultados aqui encontrados dizem respeito apenas ao período analisado, não sendo possível estabelecer relação de causa e efeito.

Outras duas potenciais limitações em estudos deste tipo devem ser consideradas: o chamado "efeito do trabalhador sadio" e a possibilidade de viés introduzido pelo autorrelato de algumas variáveis. Entretanto, quanto a essa última, opõe-se o argumento de que instrumentos de autoavaliação de aspectos de saúde têm sido utilizados em inquéritos populacionais por sua praticidade, alta validade e confiabilidade1212. Schmidt SG, Dichter MN, Bartholomeyczik S, Hasselhorn HM. The satisfaction with the quality of dementia care and the health, burnout and work ability of nurses: a longitudinal analysis of 50 German nursing homes. Geriatr Nurs. 2014;35(1):42-6.), (1717. Vedovato TG, Monteiro I. Health conditions and factors related to the work ability of teachers. Industrial Health. 2014;52:121-128..

Deve ser considerada, também, a utilização do ICT como um indicador de avaliação e acompanhamento da capacidade para o trabalho desses profissionais, permitindo, assim, a identificação oportuna dos fatores que a afetam e subsidiando as medidas corretivas pertinentes.

Conclusão

A pesquisa demonstrou que grande parte da população estudada apresentou capacidade inadequada para o trabalho, sendo os fatores independentes associados: sexo, limpeza não adequada, ambiente úmido, muito barulho no ambiente de trabalho, tarefas repetitivas e monótonas, a não satisfação com o sono, estado de saúde regular, presença de morbidade e níveis elevados de fadiga.

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    Este trabalho é baseado na dissertação de mestrado de José Mário Nunes da Silva intitulada "Capacidade para o trabalho de cirurgiões-dentistas da Estratégia Saúde da Família", defendida em 2014 no Centro de Ciências e Saúde da Universidade Federal do Piauí.
  • O trabalho não foi apresentado em reunião científica.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2015
  • Revisado
    18 Jul 2016
  • Aceito
    18 Jul 2016
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