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Tumor de Bednar (dermatofibrossarcoma protuberante pigmentado): relato de um caso

Resumos

O tumor de Bednar é uma rara neoplasia da pele, considerada variante pigmentada do dermatofibrossarcoma protuberans. O diagnóstico é confirmado pelo exame histopatológico e estudo imuno-histoquímico. O tumor de Bednar é agressivo localmente, recidivando com freqüência, mas raramente ocorrem metástases. O procedimento terapêutico mais adequado é a cirurgia micrográfica de Mohs. Relata-se o caso de uma paciente de 35 anos, portadora dessa rara neoplasia, cujo diagnóstico foi estabelecido por exame histopatológico e estudo imuno-histoquímico. Ressalta-se a importância de o dermatologista estar atento para suspeitar do diagnóstico e dispor dos meios necessários para confirmá-lo, adotando a melhor conduta.

Dermatofibrossarcoma; Dermatofibrossarcoma; Fibrossarcoma; Imuno-histoquímica; Neoplasias cutâneas; Neoplasias cutâneas


Bednar tumor is a rare skin neoplasm, considered to be a pigmented variant of dermatofibrosarcoma protuberans. Diagnosis is confirmed through histopathologic examination and immunohistochemical evaluation. Bednar tumor is aggressive locally and recurrences are frequent, but metastases are rare. The most appropriate therapeutic procedure is Mohs' micrographic surgery. The case report presents a 35-year-old patient with this rare neoplasm in which the diagnosis was established through histopathologic examination and immunohistochemical study. The importance is emphasized for dermatologists to be attentive for diagnostic suspicion and have available the necessary means to confirm the diagnosis in order to adopt the best procedure.

Dermatofibrosarcoma; Dermatofibrosarcoma; Fibrosarcoma; Immunohistochemistry; Skin neoplasms; Skin neoplasms; Skin neoplasms


CASO CLÍNICO

Tumor de Bednar (dermatofibrossarcoma protuberante pigmentado): relato de um caso*

Patrícia Motta de MoraisI; Antônio Pedro Mendes SchettiniII; Carlos Alberto ChiranoIII; Greicianne NakamuraIV

IMédica Dermatologista, Sócia Efetiva da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), Médica da Fundação Alfredo da Matta - Fuam (AM)

IIMédico Dermatologista, Sócio Efetivo da SBD e Mestre em Patologia Tropical pela UFAM (Universidade Federal do Amazonas), Médico da Fundação Alfredo da Matta - Fuam (AM)

IIIMédico Dermatologista da Fundação Alfredo da Matta - Fuam (AM)

IVMédica Dermatologista, Sócia Efetiva da SBD

Endereço para correspondência

RESUMO

O tumor de Bednar é uma rara neoplasia da pele, considerada variante pigmentada do dermatofibrossarcoma protuberans. O diagnóstico é confirmado pelo exame histopatológico e estudo imuno-histoquímico. O tumor de Bednar é agressivo localmente, recidivando com freqüência, mas raramente ocorrem metástases. O procedimento terapêutico mais adequado é a cirurgia micrográfica de Mohs. Relata-se o caso de uma paciente de 35 anos, portadora dessa rara neoplasia, cujo diagnóstico foi estabelecido por exame histopatológico e estudo imuno-histoquímico. Ressalta-se a importância de o dermatologista estar atento para suspeitar do diagnóstico e dispor dos meios necessários para confirmá-lo, adotando a melhor conduta.

Palavras-chave: Dermatofibrossarcoma/cirurgia; Dermatofibrossarcoma/diagnóstico; Fibrossarcoma/diagnóstico; Imuno-histoquímica; Neoplasias cutâneas/cirurgia/diagnóstico.

ABSTRACT

Bednar tumor is a rare skin neoplasm, considered to be a pigmented variant of dermatofibrosarcoma protuberans. Diagnosis is confirmed through histopathologic examination and immunohistochemical evaluation. Bednar tumor is aggressive locally and recurrences are frequent, but metastases are rare. The most appropriate therapeutic procedure is Mohs' micrographic surgery. The case report presents a 35-year-old patient with this rare neoplasm in which the diagnosis was established through histopathologic examination and immunohistochemical study. The importance is emphasized for dermatologists to be attentive for diagnostic suspicion and have available the necessary means to confirm the diagnosis in order to adopt the best procedure.

Keywords: Dermatofibrosarcoma/surgery; Dermatofibrosarcoma/diagnosis; Fibrosarcoma/diagnosis; Immunohistochemistry; Skin neoplasms/surgery; Skin neoplasms/surgery/diagnosis.

INTRODUÇÃO

O tumor de Bednar é raro e foi descrito por Bednar em 1957.1 É considerado uma variante pigmentada do dermatofibrossarcoma protuberans (DFSP) e dele difere pela presença, no exame histopatológico, de células dendríticas contendo melanina, dispersas de permeio às células fusiformes características do DFSP. Acomete predominantemente indivíduos na terceira e quarta décadas de vida, porém também pode ocorrer na infância.2 Tem sido descrito em todas as etnias, com predominância em negros.3 Estima-se que corresponda a proporção variável de um a 5% do total de todos os DFSPs, que, por sua vez, representam 0,1% dos cânceres da pele.4,5 O quadro clínico é constituído de lesões em placa, acastanhadas ou eritêmato-azuladas, de superfície lisa, contornos irregulares e consistência firme, aderidas a planos profundos.6-8 Por ser raro, o diagnóstico é estabelecido pelo exame histopatológico e estudo imuno-histoquímico. O tratamento recomendado é a cirurgia micrográfica de Mohs, mas, por ser um tumor agressivo com potencial para metástases, deve ser acompanhado por período prolongado, havendo relatos de recorrências até 23 anos após a retirada da lesão inicial.9

RELATO DE CASO

Paciente do sexo feminino, 35 anos, parda, procedente de Manaus, procurou o serviço de dermatologia da Fundação Alfredo da Matta (Manaus, AM), com história de "tumor nas costas" há um ano. A lesão era assintomática, tendo procurado atendimento médico por orientação de familiares. Ao exame dermatológico observava-se uma lesão em placa de limites bem definidos, de coloração azul-escura, superfície lisa e levemente deprimida na porção central. localizada na região médio-dorsal (Figuras 1 e 2). A paciente apresentava bom estado geral e, à palpação, não se evidenciaram linfoadenomegalias ou visceromegalias. Foi realizada biópsia da lesão com punch de 4mm para estudo histopatológico e imuno-histoquímico. O exame histopatológico revelou neoplasia ocupando a derme e o tecido celular subcutâneo, composta por células de grandes núcleos, fusiformes, dispostas em feixes irregulares que se interconectam e, de permeio a essas, células fusiformes contendo pigmento melânico (Figuras 3 e 4). O painel de anticorpos utilizado no estudo imuno-histoquímico pela técnica avidina-biotina peroxidase (ABC) mostrou positividade para o CD 34 e foi negativo para HHF 35, actina muscular, desmina e proteína S-100 (Figuras 5 e 6). Foi realizada exérese cirúrgica total da lesão com margens laterais de 3cm estando as margens do material obtido histologicamente livres de células tumorais. A paciente vem sendo acompanhada há um ano.







DISCUSSÃO

Inicialmente designado "storiform neurofibroma" por Bednar em 1957 essa variante do dermatofibrossarcoma protuberans contém abundante pigmento melânico.1 O tumor de Bednar é raro e, em séries de casos publicados, corresponde a proporção que varia de um a 5% dos casos de dermatofibrossarcoma protuberans.10 Alguns relatos sugerem ligeira predominância do sexo masculino, outros demonstram distribuição igual em ambos os sexos. Tem sido descrito em todas as etnias, porém há predominância em negros.11 Em geral ocorre na terceira e quarta décadas de vida, mas têm sido descritos casos em crianças e neonatos, incluindo a ocorrência de tumor de Bednar congênito.2 Devido a sua raridade, a avaliação quanto a seu comportamento local, prognóstico, tratamento e potencial metastático é baseada nas características de seu correspondente, o dermatofibrossarcoma protuberans. Embora o tratamento seja cirúrgico, com margem de segurança, recorrências são esperadas, assim como metástases.

De histogênese controversa, pode estar relacionado a remanescentes de tecido mamário embrionário ou a traumas locais diversos, como queimaduras prévias, cicatrizes vacinais, picadas de insetos e vacinação (BCG).12

As lesões apresentam crescimento lento, de meses ou anos, sendo mais freqüente a localização no tronco. Outras áreas envolvidas são: membros superiores e inferiores, cabeça e pescoço.3 Os casos publicados mostram, em geral, lesões em placa, de cor eritêmato-azulada ou acastanhada, com superfície lisa ou irregular. Em alguns casos ocorrem lesões exofíticas, nodulares, multilobulares, de consistência firme, crescimento infiltrativo na derme, podendo atingir subcutâneo, fáscia e musculatura profunda, de modo similar ao do dermatofibrossarcoma protuberans.6

Por ser raro, o tumor de Bednar representa um desafio ao dermatologista quanto a seu reconhecimento. O aspecto clínico sugere mais comumente o diagnóstico de melanoma ou lesão inflamatória residual, sendo os exames histopatológico e imuno-histoquímico fundamentais para o diagnóstico correto.

Três populações de células foram identificadas por estudos de microscopia eletrônica no tumor de Bednar. A maioria das células é representada por fibroblastos. A segunda população celular exibe prolongamentos alongados finos parcial ou completamente envolvidos por membrana basal. A terceira população é constituída por células dendríticas contendo melanossomos e pré-melanossomos. A histogênese permanece controversa.13

Nos estudos de imuno-histoquímica a maioria das células tumorais exibe positividade para CD 34 e vimentina, sendo negativa para enolase neurônio-específica, HMB-45 e proteína S-100. No entanto, as células que contêm melanina podem reagir positivamente para a proteína S-100 e vimentina.13

O tumor de Bednar é agressivo e localmente invasivo, possuindo tendência pronunciada a recorrências locais. Metástases são raras e tardias, e a disseminação pode ocorrer preferencialmente por via hematogênica e raramente por via linfática. O principal sítio das metástases é o pulmão, porém ossos, fígado, pâncreas, estômago, intestino, tireóide e cérebro podem ser envolvidos. Em casos de lesões disseminadas, pode ocorrer transformação fibrossarcomatosa do tumor.14,15

O tratamento de escolha é a cirurgia micrográfica de Mohs, pois a fonte principal de recorrência do tumor parece ser grupos celulares localizados profundamente no tecido celular subcutâneo, fáscia e feixes musculares, que podem não ter sido excisados pelas técnicas cirúrgicas convencionais.

No caso relatado, o diagnóstico não foi pensado a princípio, tendo sido determinado pelos exames histopatológico e imuno-histoquímico. Como a técnica de Mohs não é disponível rotineiramente no Brasil, optou-se por uma ampla retirada da lesão, com margens de 3cm e incluindo a fáscia muscular. Apesar da extensão da ferida cirúrgica, o resultado estético da cicatriz cirúrgica era aceitável (Figura 5), tendo a análise da peça demonstrado margens laterais e profundas livres da neoplasia. Há um ano vem sendo realizado acompanhamento ambulatorial da paciente.

Concluindo, ressalta-se a necessidade de o dermatologista estar atento para reconhecer neoplasias raras. No caso do tumor de Bednar, o exame histopatológico complementado pelo estudo imuno-histoquímico é fundamental para o diagnóstico, sendo o tratamento recomendado a cirurgia micrográfica de Mohs, havendo, portanto, necessidade de se disponibilizarem esses recursos em ambulatórios especializados. q

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Jun 2005

Histórico

  • Recebido
    05 Maio 2003
  • Aceito
    28 Nov 2003
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