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Máculas hipopigmentadas vitiligóides e tumor do infundíbulo folicular

Resumo

Tumor do infundíbulo folicular é lesão cutânea incomum, com várias formas de apresentação clínica. Destacam-se as formas solitária e eruptiva/múltipla. A primeira apresenta-se como lesão papulonodular descamativa em região de cabeça e pescoço. A segunda, alvo deste relato, é mais rara, ocorrendo em face, pescoço e porção superior do tronco como lesões maculares pardas, avermelhadas ou, mais frequentemente, hipopigmentadas, podendo levar ao diagnóstico diferencial com lesões vitiligóides. A apresentação microscópica das diferentes formas clínicas é similar. Neste artigo, relatamos um caso de tumor do infundíbulo folicular múltiplo/eruptivo apresentando-se como máculas vitiligóides faciais em homem de 35 anos.

Hipopigmentação; Neoplasias de anexos e de apêndices cutâneos; Neoplasias cutâneas


DERMATOPATOLOGIA

Máculas hipopigmentadas vitiligóides e tumor do infundíbulo folicular* * Trabalho realizado no Laboratório Diagnose - Brasília (DF), Brasil.

Alesso Cervantes SartorelliI; Francisco Eduardo M. LeiteII; Isabel Violeta de Carvalho FriedmanIII; Horácio FriedmanIV

IMédico patologista do Laboratório Diagnose - Brasília (DF), Brasil

IIMédico dermatologista - Brasília (DF), Brasil

IIIMédica patologista do Laboratório Diagnose - Brasília (DF), Brasil

IVProfessor titular do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília - Brasília (DF), Brasil

Endereço para correspondência/Mailing Address Endereço para correspondência: Horácio Friedman SQSW 104 - Bloco J - Ap. 403 70670 410 - Brasília - DF Tel./fax: (61) 3344-2851 E-mail: friedman@unb.br

RESUMO

Tumor do infundíbulo folicular é lesão cutânea incomum, com várias formas de apresentação clínica. Destacam-se as formas solitária e eruptiva/múltipla. A primeira apresenta-se como lesão papulonodular descamativa em região de cabeça e pescoço. A segunda, alvo deste relato, é mais rara, ocorrendo em face, pescoço e porção superior do tronco como lesões maculares pardas, avermelhadas ou, mais frequentemente, hipopigmentadas, podendo levar ao diagnóstico diferencial com lesões vitiligóides. A apresentação microscópica das diferentes formas clínicas é similar. Neste artigo, relatamos um caso de tumor do infundíbulo folicular múltiplo/eruptivo apresentando-se como máculas vitiligóides faciais em homem de 35 anos.

Palavras-chave: Hipopigmentação; Neoplasias de anexos e de apêndices cutâneos; Neoplasias cutâneas

INTRODUÇÃO

O tumor de infundíbulo folicular (TFI) ou infundibuloma, descrito em 1961 por Mehregan e Butler, é incomum, encontrado em menos de 10/100. 000 biópsias cutâneas, mas com várias formas de apresentação clinicopatológica: 1) solitário; 2) múltiplo ou eruptivo; 3) associado a doença de Cowden, nevo sebáceo, síndrome de Schopf-Schulze-Passarge e 4) ligado a outros tumores cutâneos.1-7 A lesão solitária é a usual, acomete mulheres a partir da meia-idade, com localização em cabeça e pescoço, papulonodular descamativa, assintomática, com até 1-2cm, simulando carcinoma basocelular. Já a forma eruptiva/múltipla (infundibulomatose), descrita por Kossard, é mais rara e ocorre com múltiplas lesões em face, pescoço e porção superior do tronco, simetricamente, com aspecto de máculas ou pápulas hipopigmentadas, pardas ou avermelhadas.3,8,9 A exposição à luz solar acentua as lesões múltiplas hipopigmentadas, que assim permanecem, enquanto a pele circunjacente fica bronzeada. As variantes solitária e múltipla apresentam aspecto microscópico similar, com proliferação em placa fenestrada de queratinócitos pálidos dispostos em trabéculas anastomosadas e conectadas à epiderme. O presente caso ilustra lesões múltiplas, hipopigmentadas: a incomum forma vitiligóide do tumor.

RELATO DE CASO

Paciente de 35 anos, masculino, apresentava máculas hipopigmentadas faciais de três anos de evolução, simétricas, assintomáticas. A luz de Wood destacou as lesões (Figura 1) , uma das quais foi biopsiada; o exame microscópico evidenciou placa fenestrada conectada à base da epiderme e constituída por trabéculas anastomosadas de queratinócitos pálidos (Figura 2A) , contendo glicogênio no citoplasma (Figura 2B) . A coloração de Fontana-Masson demonstrou ausência de pigmentação melânica na lesão (Figura 3A) . A epiderme adjacente apresentava pigmentação preservada (Figura 3B) . O tratamento com laser de CO2 propiciou repigmentação e melhora da textura das lesões. Posteriormente, recebemos biópsia cutânea com aspecto microscópico muito similar, que constatamos provir de irmão do paciente. O dermatologista obteve a informação de que outros membros da família apresentavam lesões clinicamente similares. Contudo, o paciente e seus familiares não quiseram se submeter a tratamento ou acompanhamento.






DISCUSSÃO

A presente discussão foca a forma múltipla do TFI. O aspecto clínico, geralmente, é distinto, permitindo a suspeita diagnóstica4. Entretanto, alguns casos apresentam poucas e pequenas lesões, de difícil visualização, causa de subdiagnóstico.4 O TFI tem aspecto microscópico usualmente típico, sendo a lesão bem circunscrita, constituída por queratinócitos pálidos, contendo glicogênio e proliferando a partir da base epidérmica, de modo a formar placa fenestrada de trabéculas anastomosadas. Variante desmoplásica e diferenciação sebácea ou écrina têm sido raramente descritas.2,10,11 Há riqueza em fibras elásticas na derme subjacente. Folículos pilosos presentes na área são envolvidos pela lesão, mas esta não produz estruturas foliculares. Tanto os casos múltiplos como os solitários são considerados benignos3. Membrana basal evidente, amplo citoplasma pálido e ausência de mitoses, atipias e apoptose, em geral, facilitam o diagnóstico diferencial com carcinoma basocelular. A reação imunoistoquímica para BerEp4, positiva no carcinoma basocelular, é negativa no TFI2,6,12,13. Contudo, rara transformação de TFI em carcinoma basocelular tem sido descrita2,3,4,14. No presente caso, a apresentação clínica dirigiu o diagnóstico diferencial para lesões maculares hipopigmentadas, incluindo vitiligo. O aspecto histopatológico foi típico de TFI, podendo a hipopigmentação ser explicada pela falta de melanina na lesão, conforme evidenciado pela coloração de Fontana-Masson e descrito previamente por Cribier e Grosshans4. Conciliar suspeita clínica de lesões vitiligóides com diagnóstico histopatológico de lesão tumoral é uma situação rara, porém característica do TFI. Embora uma base genética não tenha sido estabelecida, a presença de mais de um membro da família com lesão histologicamente idêntica e a associação fortuita a outras síndromes com base genética reconhecida favorecem a hipótese de um possível defeito genético subjacente2,3,15. É recomendável o acompanhamento regular do paciente, mesmo diante da impraticabilidade de um tratamento completo, que apresenta implicações cosméticas, e da remota possibilidade de transformação em carcinoma basocelular.

Aprovado pelo Conselho Editorial e aceito para publicação em 30.01.09

Conflito de interesse: Nenhum

Suporte financeiro: Nenhum

Como citar este artigo/How to cite this article: Sartorelli AC, Leite FEM, Friedman IVC, Friedman H. Máculas hipopigmentadas vitiligóides e tumor do infundíbulo folicular. An Bras Dermatol. 2008;84(1):68-70.

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  • Endereço para correspondência:
    Horácio Friedman
    SQSW 104 - Bloco J - Ap. 403
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    Trabalho realizado no Laboratório Diagnose - Brasília (DF), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      Fev 2009

    Histórico

    • Aceito
      30 Jan 2009
    • Recebido
      30 Jan 2009
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