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Transplante de melanócitos no piebaldismo: relato de caso

Resumos

O piebaldismo é uma genodermatose rara onde as lesões acrômicas não respondem aos tratamentos tópico e fototerápico. Este artigo tem como objetivo demonstrar a importância do transplante de melanócitos, usando a técnica de minigrafting no tratamento do piebaldismo.

Melanócitos; Piebaldismo; Transplante


Piebaldism is a rare genodermatosis in which depigmented skin areas are unresponsive to topical or light treatment. This article describes the importance of transplant techniques using noncultured melanocytes (minigrafting) in the treatment of piebaldism.

Melanocytes; Piebaldism; Transplantation


CASO CLÍNICO

Transplante de melanócitos no piebaldismo - relato de caso* * Trabalho realizado no Centro de Pesquisa e Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (CPG-FCMMG) - Santa Casa de Belo Horizonte - Belo

Daniela Rezende NevesI; José Rogério Régis JúniorII; Patrícia Jannuzzi Vieira e OliveiraIII; Renata Indelicato ZacIV; Kleber de Sousa SilveiraV

IEspecialista em Dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) - Belo Horizonte (MG), Brasil

IIEspecialista em Dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) - Preceptor de Dermatologia Cirúrgica da Santa Casa de Belo Horizonte - Belo Horizonte (MG), Brasil

IIIEspecialista em Dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) - Belo Horizonte (MG), Brasil

IVEspecialista em Dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) - Belo Horizonte (MG), Brasil

VEspecialista em Dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) - Belo Horizonte (MG), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Daniela Rezende Neves Rua Rio Grande do Sul 1030 / apt.2002 Bairro Santo Agostinho, 30170 111 Belo Horizonte MG Tel.: 31 9427 77-44 E-mail: rezendeneves.daniela@gmail.com

RESUMO

O piebaldismo é uma genodermatose rara onde as lesões acrômicas não respondem aos tratamentos tópico e fototerápico. Este artigo tem como objetivo demonstrar a importância do transplante de melanócitos, usando a técnica de minigrafting no tratamento do piebaldismo.

Palavras-chave: Melanócitos; Piebaldismo; Transplante

INTRODUÇÃO

O piebaldismo ou albinismo parcial é uma genodermatose rara, autossômica dominante, sem preferência por cor ou raça.1

O quadro clínico clássico presente ao nascimento é constituído por mecha branca frontal nos cabelos (poliose), em cerca de 90% dos casos, e máculas despigmentadas simétricas na pele.1 Os cabelos despigmentados surgem em mácula leucodérmica de formato, geralmente triangular, cuja base penetra o couro cabeludo até o bregma (ponto de junção dos ossos parietais e frontais) e cujo vértice se estende até a linha dos supercílios e ponte nasal, produzindo, algumas vezes, encanecimento dos pelos da porção medial das sobrancelhas. A leucotriquia pode estender- se aos pêlos axilares e pubianos.

As despigmentações cutâneas também são bastante distintas. Sempre presentes ao nascimento, caracterizam-se por rigorosa simetria e afetam predominantemente face, porção anterior do tórax e abdome, braços, antebraços, pernas e coxas. As lesões permanecem estacionárias ou apresentam evolução discreta e limitada, havendo aumento proporcional da área com o crescimento do paciente.

Outro detalhe que merece destaque é a presença de pequenas máculas hiperpigmentadas nas lesões leucodérmicas, que auxiliam na diagnose diferencial com vitiligo, e também na pele normal.

O piebaldismo parece estar associado a uma expressão reduzida do receptor KIT, consequência de várias mutações, ocorridas no gene C-KIT, localizado no cromossomo 4, resultando em distribuição anormal e menor proliferação dos melanoblastos na vida embrionária.2-4 Sendo assim, há ausência de melanina na epiderme, em decorrência da falta de melanócitos.5 As áreas acrômicas exibem perda parcial da barreira à radiação ultravioleta e são irresponsivas ao tratamento tópico e fototerápico.6-9

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 31 anos, leucoderma, apresenta, desde o nascimento, mácula acrômica triangular acompanhada de poliose na região frontal (Figura 1) e lesão acrômica na região pré-tibial direita. Referia quadro clínico semelhante ao pai e avô paterno. Não apresentava outras lesões. O paciente estava incomodado apenas com a lesão do membro inferior direito, optando não tratar a lesão frontal.


Foram realizadas 3 sessões de transplante de melanócitos, com 4 meses de intervalo entre elas, e ,aproximadamente, 60 enxertos em cada sessão, usando a técnica por punch ou minigrafting. Foram usados punchs de 1,25 mm de diâmetro, na região suprapúbica (área doadora) e punchs de 1 mm de diâmetro, com intervalo médio entre eles de 5mm, na região pré-tibial direita (área receptora) (Figura 2). Não foram realizados nenhum outro tipo de tratamento prévio ou associado. Aproximadamente 2 meses após a primeira sessão, observamos um halo de repigmentação, com um diâmetro 5 vezes maior que o tamanho original (Figuras 3A e 3B). A pigmentação evoluiu progressivamente com melhora de mais de 90% da lesão pré-tibial direita (Figuras 4 e 5). Não observamos cicatrizes inestéticas na área doadora, onde as microcicatrizes foram encobertas pelos pelos pubianos, e na área receptora.






DISCUSSÃO

Vários métodos de transplante de melanócitos autólogos foram desenvolvidos para tratamento de lesões leucodérmicas não responsivas ao tratamento clínico.7 Tipos estáveis de leucodermia, por exemplo, vitiligo segmentar e piebaldismo, respondem, na maioria dos casos com 100% de repigmentação, independentemente da técnica usada.8 Para estes tipos de leucodermia, a cirurgia parece ser o método de escolha, mas os pacientes selecionados não podem ter tendência à formação de cicatrizes hipertróficas ou queloides. 9 As técnicas incluem transferência de melanócitos por enxerto de pele total ou parcial, por punch (minigrafting) ou bolhas de sucção. Os melanócitos autólogos também podem ser obtidos através da cultura de melanócitos ou de melanócitos e queratinócitos. 4 Em um estudo, o minigrafting apresentou os níveis mais altos de efeitos adversos, entretanto, foi o método mais fácil e menos oneroso, uma vez que não requer equipamento especial ou laboratório e sua duração é de, aproximadamente, 45 minutos para 50 cm2 .5 Nas áreas receptoras, a aparência em cobblestone, ou pedra de calçamento, é um efeito adverso considerável na técnica de transplante por minigrafting, quando são usados punchs maiores que 1,25 mm de diâmetro, e pode ser evitada por punch mais superficial na área doadora e mais profundo no local receptor, além de poder resolver-se espontaneamente. 10 Entretanto, a formação de cicatrizes no local doador ainda permanece como a principal limitação desta técnica mas, na nossa experiência, observamos excelentes resultados cosméticos, quando áreas pilosas (por exemplo, região pubiana) são selecionadas como áreas doadoras e quando são usados punchs com o limite máximo de 1,25mm de diâmetro. Falabella et al mostrou que o método de minigrafting pode ser usado como um procedimento adicional efetivo para restaurar a completa repigmentação (aproximadamente 100%), quando, após enxerto de pele realizada por outras técnicas, ainda existirem áreas de acromia.5

A técnica de transplante por micropunchs de 1 a 1,25 mm, além de método fácil e pouco oneroso,5 apresenta, na nossa experiência, excelente resultado estético e praticamente nenhuma complicação. Este caso demonstra a importância do transplante de melanócitos no tratamento de lesões do piebaldismo que, até então, não tinham outras opções terapêuticas, além da dermopigmentação. Nas lesões de piebaldismo, já está estabelecido que o transplante de melanócitos é o tratamento de escolha, por ser uma técnica segura e eficaz.11

Recebido em 08.12.2008.

Aprovado pelo Conselho Consultivo e aceito para publicação em 21.09.09.

Horizonte (MG), Brasil.

Conflito de interesse: Nenhum

Suporte financeiro: Nenhum

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  • Endereço para correspondência:
    Daniela Rezende Neves
    Rua Rio Grande do Sul 1030 / apt.2002 Bairro
    Santo Agostinho,
    30170 111 Belo Horizonte MG
    Tel.: 31 9427 77-44
    E-mail:
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    Trabalho realizado no Centro de Pesquisa e Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (CPG-FCMMG) - Santa Casa de Belo Horizonte - Belo
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Set 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      21 Set 2009
    • Recebido
      08 Dez 2008
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