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Estudo de associação entre anticorpos anticardiolipinas e fenômenos vasculares periféricos em pacientes com esclerodermia sistêmica

Resumos

Isquemia é comum em esclerodermia sistêmica e é causada por vasoespasmo e trombose. As autoras analisaram a associação de eventos vasculares periféricos e anticorpos anticardiolipinas (aCl) em 54 esclerodérmicos. Em 100% deles existia Raynaud; 59,2% apresentaram cicatrizes estelares; 43,3%, telangiectasias; 14,8%, fenômenos tromboembólicos periféricos. ACl IgG foram positivos em 9,2% dos casos e o IgM, em 7,4%. Fenômenos embólicos periféricos estão associados a aCl IgG (p=0,03), não se encontrando associação com demais manifestações.

Esclerodermia difusa; Esclerodermia limitada; Úlcera cutânea


Ischemia is common in systemic scleroderma and it is caused by vasospasm and thrombosis. In the present study we analyzed the association of peripheral vascular events and anticardiolipin (aCl) antibodies in 54 patients suffering from systemic scleroderma. The results showed that 100% of the patients presented Raynaud; 59.2% presented digital micro scars; 43.3%, presented teleangiectasies and 14.8%, presented peripheral thromboembolism. ACl IgG were positive in 9.2% and IgM, in 7.4%. Peripheral tromboembolic phenomena had a positive association with aCl IgG (p=0.03). No other associations were found.

Scleroderma, diffuse; Scleroderma, limited; Skin ulcer


COMUNICAÇÃO

Estudo de associação entre anticorpos anticardiolipinas e fenômenos vasculares periféricos em pacientes com esclerodermia sistêmica* * Trabalho realizado no Serviço de Reumatologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (Huec) - Curitiba (PR), Brasil

Ana Paula Torres LiberatiI; Camila Ferrari RibeiroII; Thelma SkareIII

IResidente do Serviço de Clínica Médica do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (Huec) - Curitiba (PR), Brasil

IIResidente do Serviço de Clínica Médica do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (Huec) - Curitiba (PR), Brasil

IIIChefe do Serviço de Reumatologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (Huec); professora titular da disciplina de Reumatologia do curso de Medicina da Faculdade Evangélica do Paraná (Fepar) - Curitiba (PR), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Thelma Skare Rua João Alencar Guimarães, 796 80310 420 Curitiba - PR E-mail: tskare@onda.com.br

RESUMO

Isquemia é comum em esclerodermia sistêmica e é causada por vasoespasmo e trombose. As autoras analisaram a associação de eventos vasculares periféricos e anticorpos anticardiolipinas (aCl) em 54 esclerodérmicos. Em 100% deles existia Raynaud; 59,2% apresentaram cicatrizes estelares; 43,3%, telangiectasias; 14,8%, fenômenos tromboembólicos periféricos. ACl IgG foram positivos em 9,2% dos casos e o IgM, em 7,4%. Fenômenos embólicos periféricos estão associados a aCl IgG (p=0,03), não se encontrando associação com demais manifestações.

Palavras-chave: Esclerodermia difusa; Esclerodermia limitada; Úlcera cutânea

A esclerodermia sistêmica (ES) é uma doença autoimune de etiologia desconhecida na qual a disfunção endotelial desempenha um papel etiopatogenético fundamental.1 Caracteriza-se por aumento na síntese e deposição de fibras do colágeno em pele e órgãos internos, dano estrutural e funcional de pequenas artérias e capilares, além de infiltração perivascular por células inflamatórias mononucleares. 2 O excesso de endotelina-1 (ET-1) está associado ao mecanismo fisiopatológico da vasculopatia esclerodérmica. A ET-1, um vasoconstritor endógeno potente, é mitógena para fibroblastos, células musculares lisas e endoteliais.3

Vários autoanticorpos têm sido encontrados na ES, entre eles, os antifosfolípides (AAF). Marie e col.,2 estudando 69 pacientes com ES, encontraram positividade para esses autoanticorpos em 19% deles. Já Assous e col.,4 numa coorte de 108 pacientes, encontraram anticorpos anticardiolipinas (aCl) em 14% dos casos.

Os AAF são responsáveis por fenômenos trombóticos de macrocirculação e microcirculação,5 os quais podem se superpor ao dano vascular da esclerodermia, agravando lesões isquêmicas.6 Em alguns estudos, a presença de aCls esteve associada ao aparecimento de cicatrizes estelares.2,3

O objetivo da presente análise foi verificar a prevalência de aCls na população local com ES; esses autoanticorpos estão associados a distúrbios vasculares periféricos como úlceras e necrose digitais, cicatrizes estelares, telangiectasias e tromboses periféricas.

Após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa e assinatura de consentimento, realizou-se um estudo transversal do qual participaram 54 pacientes com ES (cinco homens e 49 mulheres) com idade média de 51,5±11,7 anos (máxima de 79, mínima de 26 anos) e tempo médio de duração de doença de 12,3±8,9 anos (máxima de 40 anos, mínimo de 2 anos). Todos preenchiam os critérios do Colégio Americano de Reumatologia para essa doença.7

Essa amostra foi formada pelos pacientes com ES que concordaram em participar do estudo e que frequentaram o serviço nos 12 meses da pesquisa. Todos tinham a forma sistêmica da doença, sendo divididos segundo as expressões cutâneas da doença em 11 (20,3%) com a forma difusa, um (1,8%) com a forma sine scleroderma e 33 (61,1%) com a limitada ou Crest. Nove (16,6%) tinham a forma de superposição com outra colagenose. Buscou-se presença de úlceras digitais, necrose digital, cicatrizes estelares, fenômeno de Raynaud, telangiectasias, tromboses periféricas, aCl IgG e IgM. Os dados clínicos elencados fazem parte de uma lista avaliada rotineiramente em pacientes com ES do serviço. Do ponto de vista imunológico, 50/54 (92,5%) pacientes eram FAN-positivos, 17/51 (33,3%) tinham anticentrômero e 6/50 (12%) tinham Scl-70 positivos. Cerca de 10/54 (18,5%) estavam em uso de ciclofosfamida e 5/54 (9,2%), de metotrexato. Para controle, incluíram-se 150 pacientes com osteoartrite e sem outras co-morbidades. Nenhum dos pacientes ou controles usava drogas implicadas em positividade para aCls, como propranolol, clorpromazina, γ interferon, amoxicilina, procainamida, anti-TNF-α e cocaína no momento da dosagem.8 ACls foram pesquisados pela técnica de Elisa (Euroimmun®, Lübeck, Germany), sendo considerados positivos valores acima de 15 UI/ml. Os dados foram coletados em tabelas de frequência e de contingência, calculando-se o teste de Fisher para as associações com auxílio do software Graph Pad Prism, versão 4.0. A significância adotada foi de 5%.

Encontrou-se Raynaud em 100% dos casos (n=54), cicatrizes estelares em 59,2% (n=32), telangiectasias em 44,4% (n=24), úlceras de polpas digitais em 18,5% (n=10), fenômenos tromboembólicos periféricos em 14,8% (n=8), necrose digital em 7,4% (n=4), outras úlceras digitais em 3,7% (n=2), úlceras de outros locais em 1,8% (n=1).

Os aCls em pacientes com ES foram positivos em cinco casos (9,25%) para IgG e em quatro (7,4%) para IgM. Nos controles, somente dois (1,3%) eram positivos para IgG. Comparando-se a prevalência de aCls entre pacientes e controles, encontrou-se p=0,05 para aCls IgG e p=0,01 para IgM (Fisher). O estudo da associação entre aCls e manifestações vasculares periféricas em ES encontra-se na Tabela 1. Os achados demonstram que os aCls não estão associados aos fenômenos vasculares em extremidades de pacientes com ES , exceto em casos de trombose.

Recebido em 17.12.2008.

Aprovado pelo Conselho Consultivo e aceito para publicação em 27.11.2009.

Conflito de interesse: Nenhum

Suporte financeiro: Nenhum

  • 1. Mayes M. Systemic sclerosis: clinical features. In: Klipel J, Stone J, Crofford L, White P, eds. Primer on rheumatic diseases. New York: Springer; 2008. p.343-58.
  • 2. Marie I, Jouen F, Hellot M, Levesque H. Anticardiolipin and anti-beta-2 glycoprotein 1 antibodies and lupus like anticoagulant: prevalence and significance in systemic sclerosis. Br J Dermatol. 2008;158:141-4.
  • 3. Xu S, Denton C, Holmes A, Dashwood M, Abraham D, Black C. Endothelins: effect on matrix biosynthesis and proliferation in normal and scleroderma fibroblasts. J Cardiovasc Pharmacol. 1998;31Suppl 1:S360-3.
  • 4. Assous N, Allanore Y, Batteux F, Meune C, Toulon P, Weill B, et al. Prevalence of antiphospholipid antibodies in systemic sclerosis and association with primitive pulmonary arterial hypertension and endothelial injury. Clin Exp Rheumatol. 2005;23:199-204.
  • 5. Santamaria JR, Badziak D, de Barros MF, Manderlli FL, Cavalin LC, Sato MS. Síndrome antifosfolipide. An Bras Dermatol 2005;80:225-39.
  • 6.  Petri M. Clinical and management aspects of antiphospholipid antibody syndrome. In: Wallace D, Hahn B, eds. Dubois' Lupus erythematosus. Philadelphia: Willians & Wilkins; 2007. p.1262-97.
  • 7. Preliminary criteria for the classification of systemic sclerosis (scleroderma). Subcommittee for scleroderma criteria of the American Rheumatism Association Diagnostic and Therapeutic Criteria Committee. Arthritis Rheum. 1980;23:281-90.
  • 8. Goldberg SN, Conti-Kelly AM, Greco TP. A family study of anticardiolipin antibodies and associated clinical conditions. Am J Med. 1995;98:473-9.
  • Endereço para correspondência:
    Thelma Skare
    Rua João Alencar Guimarães, 796
    80310 420 Curitiba - PR
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    Trabalho realizado no Serviço de Reumatologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (Huec) - Curitiba (PR), Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Set 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      27 Nov 2009
    • Recebido
      17 Dez 2008
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