Resumos
Paciente do sexo masculino, negro, 13 anos, apresenta há dois anos lesões pruriginosas, pápulonodulares nos antebraços, associadas a edema do lábio inferior, fotofobia, conjuntivite e pterígio. O exame histopatológico do lábio inferior revelou acantose, espongiose e infiltrado inflamatório perivascular superficial, composto por linfócitos, plasmócitos e eosinófilos, compatível com o diagnóstico de prurigo actínico. As lesões regrediram com o uso de talidomida 100 mg/dia.
Prurigo; Queilite; Raios ultravioleta; Talidomida; Transtornos de fotossensibilidade
A 13-year-old black boy had pruritic papular and nodular lesions on his forearms associated to edema of the lower lip, photophobia, conjunctivitis and pterygium. Skin biopsy of the lower lip revealed acanthosis, spongiosis with dermal perivascular mononuclear cell infiltration composed by lymphocytes, plasma cells and eosinophils consistent with actinic prurigo. Lesions improved considerably with the use of thalidomide 100mg/ day.
Cheilitis; Photosensitivity disorders; Prurigo; Thalidomide; Ultraviolet rays
QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?
Caso para diagnóstico
Patricia Erica Christofoletti DaldonI; Mirella PasciniII; Mariane CorreaIII
IDoutora em clínica médica pela Universidade Estadual de Campinas; especialista em dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia; docente da disciplina de dermatologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas - Campinas (SP), Brasil
IIAcadêmica do sexto ano de medicina da Pontifícia Universidade Católica de Campinas - Campinas (SP), Brasil
IIIEspecialista em dermatologia pela Sociedade Brasileira de Dermatologia - Tubarão (SC), Brasil
Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Patricia E C Daldon Pontifícia Universidade Católica de Campinas Centro de Ciências da Vida Campus II - Faculdade de Medicina Av. John Boyd Dunlop, s/n. Jd. Ipaussurama 13060 904 - Campinas (SP) Tel.: 19 3343-8496 E-mail: patdaldon@hotmail.com
RESUMO
Paciente do sexo masculino, negro, 13 anos, apresenta há dois anos lesões pruriginosas, pápulonodulares nos antebraços, associadas a edema do lábio inferior, fotofobia, conjuntivite e pterígio. O exame histopatológico do lábio inferior revelou acantose, espongiose e infiltrado inflamatório perivascular superficial, composto por linfócitos, plasmócitos e eosinófilos, compatível com o diagnóstico de prurigo actínico. As lesões regrediram com o uso de talidomida 100 mg/dia.
Palavras-chave: Prurigo; Queilite; Raios ultravioleta; Talidomida; Transtornos de fotossensibilidade
HISTÓRIA DA DOENÇA
Paciente do sexo masculino, negro, 13 anos, natural e procedente de Rio das Pedras, SP, referia há dois anos lesões pruriginosas recorrentes nos antebraços, edema do lábio inferior, fotofobia e olhos vermelhos. No exame físico, observou-se enantema conjuntival associado a pterígio (Figura 1). O lábio inferior apresentava-se evertido, edemaciado, exulcerado e com superfície vegetante em toda a extensão (Figura 2). Lesões eritêmato-escamo-crostosas no nariz (Figura 1), pápulas e nódulos escoriados nos antebraços foram observados entremeados a manchas hipercrômicas residuais (Figura 3). O paciente apresentava baixo desenvolvimento cognitivo, sem outras doenças prévias. Negava casos semelhantes em sua família.
O exame histopatológico do lábio inferior revelou acantose, espongiose, infiltrado perivascular superficial composto por linfócitos, plasmócitos e eosinófilos (Figura 4). A avaliação oftalmológica mostrou enantema, nódulos de Trantas e pterígio. Após três meses do emprego de talidomida 100 mg/dia, houve remissão das lesões, inclusive da queilite. O paciente interrompeu o uso da medicação, experimentando recrudescência do quadro. Reiniciou-se talidomida 100 mg/dia por seis meses, com melhora rápida do quadro; diminuiu-se a dose para 50 mg/dia, obtendo-se controle das lesões por mais dois anos. O baixo desenvolvimento cognitivo do paciente impediu a diminuição progressiva da medicação.
COMENTÁRIOS
O caso foi diagnosticado como prurigo actínico (PA), fotodermatose adquirida rara, caracterizada por pápulas e nódulos pruriginosos, escoriados, nas áreas fotoexpostas.1 Acredita-se que ocorra reação de hipersensibilidade tardia contra autoantígenos induzidos pela radiação ultravioleta em pessoas geneticamente suscetíveis.2 No entanto, esses cromóforos não foram identificados.1-3 Os raios ultravioleta A e B estão envolvidos no processo.3
A enfermidade foi descrita entre os índios da América do Norte e entre os mestiços da América Central e do Sul, com poucos relatos na população caucasiana e asiática.3 Há forte associação do PA com o HLA DR-4, especificamente o subtipo DRB1*0407.3 A pesquisa eletrônica dos Anais Brasileiros de Dermatologia não apontou outros relatos; um único trabalho de revisão de 1984 foi acessado.4
Os sintomas iniciam-se aproximadamente aos dez anos de idade, com predileção pelo sexo feminino e curso crônico com exacerbações e remissões.5 Nos climas temperados, a enfermidade melhora no inverno, enquanto nos climas tropicais permanece durante todo o ano.6 As lesões cutâneas acometem as regiões fotoexpostas dos antebraços e mãos, a região do decote, a face, as orelhas, as pernas e os pés.1-3 As áreas cobertas, como a região glútea, podem ser afetadas.3 As mucosas são frequentemente acometidas, especialmente lábios (30-60%) e conjuntivas (aproximadamente 30%).7 As alterações oftalmológicas mais relevantes são fotofobia, pterígio, pinguécula, enantema, nódulos de Trantas, exsudatos hialinos e folículos, ou seja, alterações predominantemente conjuntivais.7
A histopatologia revela acantose discreta, espongiose e infiltrado linfocítico perivascular.5 Eosinófilos também são encontrados.6,7
O tratamento do PA inclui fotoproteção, corticosteroides tópicos e sistêmicos, anti-histamínicos, antimaláricos, baixas doses de fototerapia (Puva e UVB) e talidomida, sendo que estas duas últimas parecem ter efeito profilático.1,5,6 Os efeitos da talidomida compreendem a diminuição da fagocitose pelos leucócitos polimorfonucleares, a diminuição da produção de fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa), a diminuição da produção de linfócitos, a inibição da angiogênese e a conversão da resposta T helper 1 para T helper 2.5 Desconhece-se como esses efeitos modulam a atividade do PA.5 O emprego da talidomida (50 a 100 mg/dia) resulta em clareamento rápido das lesões cutâneas com resposta mais lenta das lesões mucosas.1,5,6 Refere-se reinstalação da doença após suspensão do medicamento, estando recomendadas doses baixas de manutenção, monitorando-se os efeitos adversos.3,6 Há relato de caso de controle da doença com o uso de talidomida por 23 anos.1
Aprovado pelo Conselho Editorial e aceito para publicação em 23.11.2009.
Suporte Financeiro: Nenhum / Conflict of interest: None
Conflito de Interesses: Nenhum / Financial funding: None
* Trabalho realizado em Campinas (SP) - Brasil
- 1. Yong-Gee SA, Muir JB. Long-term thalidomide for actinic prurigo. Australas J Dermatol. 2001;42:281-3.
- 2. Suárez A, Valbuena MC, Rey M, de Porras Quintana L. Association of HLA subtype DRB1*0407 in Colombian patients with actinic prurigo. Photodermatol Photoimmunol Photomed. 2006;22:55-8.
- 3. Crouch R, Foley P, Baker C. Actinic prurigo: a retrospective analysis of 21 cases referred to an Australian photobiology clinic. Australas J Dermatol. 2002;43:128-32.
- 4. Londono F. Prurigo actínico. An Bras Dermatol. 1984;59:137-41.
- 5. Ng JCH, Foley PA, Crouch RB, Baker CS. A case of severe actinic prurigo successfully treated with thalidomide. Australas J Dermatol. 2001;42:192-5.
- 6. Ross G, Foley P, Baker C. Actinic prurigo. Photodermatol Photoimunol Photomed. 2008;24:272-5.
- 7. Magaña M, Mendez Y, Rodriguez A, Mascott M. The conjunctivitis of solar (actinic) prurigo. Pediatric Dermatol. 2000;17:432-5.
Endereço para correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
02 Dez 2010 -
Data do Fascículo
Out 2010
Histórico
-
Recebido
23 Nov 2009