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Carcinoma triquilemal: relato de caso

Resumos

O carcinoma triquilemal é um tumor raro, que ocorre, geralmente, na pele exposta ao sol, principalmente face, couro cabeludo, pescoço e dorso das mãos, em indivíduos idosos, entre a 4ª e 9ª décadas de vida, sem predilação por sexo. O presente estudo mostra um caso de carcinoma triquilemal, recidivado, de difícil tratamento, em mesma topografia de um carcinoma basocelular tratado previamente com cirurgia e radioterapia.

Neoplasias cutâneas; Neoplasias induzidas por radiação; Neoplasias de anexos e de apêndices cutâneos


The trichilemmal carcinoma is a rare tumor that usually occurs on sun-exposed skin, especially on the face, scalp, neck and back of hands, mainly in elderly subjects but commonly between the 4th and 9th decades of life. It is not a gender-based illness. This study shows a difficult to treat case of recurrent trichilemmal carcinoma on the same location of a basal-cell carcinoma previously treated with surgery and radiotherapy.

Neoplasms; adnexal and skin appendage; Neoplasms; radiation-induced; Skin neoplasms


CASO CLÍNICO

Carcinoma triquilemal - relato de caso* * Trabalho realizado no: Hospital Erasto Gaertner - Liga Paranaense de Combate ao Câncer (HEG - LPCC) - Curitiba (PR), Brasil.

Miguel RoismannI; Rosyane Rena de FreitasI; Leandro Carvalho RibeiroII; Marcos Flávio MontenegroII; Luciano José BiasiII; Juliana Elizabeth JungIII

ICirurgiões Oncológicos - ex-residentes de Cirurgia Oncológica do Hospital Erasto Gaertner (HEG) - Curitiba (PR), Brasil

IICirurgião Oncológico do Serviço de Cirurgia de Pele e Melanoma do Hospital Erasto Gaertner (HEG) - Curitiba (PR), Brasil

IIIMédica Patologista do Hospital Erasto Gaertner (HEG) - Curitiba (PR), Brasil

Correspondência Endereço para Correspondência: Rosyane Rena de Freitas Rua Patativa 100 ap 154 Bloco B Condomíio Portal Victória. Vila Tatetuba Cep: 12220-140, São José dos Campos - SP, Brasil E-mail: rosyanerf@yahoo.com.br

RESUMO

O carcinoma triquilemal é um tumor raro, que ocorre, geralmente, na pele exposta ao sol, principalmente face, couro cabeludo, pescoço e dorso das mãos, em indivíduos idosos, entre a 4ª e 9ª décadas de vida, sem predilação por sexo. O presente estudo mostra um caso de carcinoma triquilemal, recidivado, de difícil tratamento, em mesma topografia de um carcinoma basocelular tratado previamente com cirurgia e radioterapia.

Palavras-chave: Neoplasias cutâneas; Neoplasias induzidas por radiação; Neoplasias de anexos e de apêndices cutâneos

INTRODUÇÃO

O termo carcinoma triquilemal (TLC) foi introduzido como entidade por Headington em 1976, porém, por muitos anos, não foi adotado pelos patologistas1. Atualmente, a publicação de algumas séries contribuiu para distinguir os TLC de outros grupos de tumores foliculares.1

É considerado um carcinoma de baixa malignidade, por apresentar baixa frequência e raras metátases1. Habitualmente, aparece como lesão solitária após a quinta década de vida.2

O diagnóstico é estabelecido através do exame histopatológico utilizando a coloração com hematoxilina-eosina e, quando necessário, complementado pela imuno-histoquímica da lesão. O tratamento pode ser realizado através de cirurgia de Mohs ou por excisão simples da lesão.

Relatamos o caso de um paciente tratado no Hospital Erasto Gaertner, com carcinoma triquilemal, recidivado, em topografia de carcinoma basocelular prévio, submetido à radioterapia.

RELATO DE CASO

Paciente NK, masculino, 35 anos, casado, branco, carpinteiro, proveniente de Palmital, no estado do Paraná, procurou o hospital Erasto Gaertner, apresentando lesão ulcerocrostosa, com bordos elevados, irregulares, medindo 3,5 por 1,5 cm, localizada em face anterior do tórax, junto ao terço superior do esterno. Foi realizada a exérese da lesão, com margens livres. Diagnóstico de carcinoma basocelular (CBC).

Após 1 ano, o paciente apresentava lesão nodular em união infraclavicular esquerda, com 3 por 2 cm de diâmetro. Realizada exérese da lesão. O anatomopatológico mostrou presença de carcinoma basocelular, com margem profunda comprometida, sendo indicada radioterapia adjuvante, dose de 6000 cGy.

O paciente perdeu o seguimento, retornando ao hospital após 5 anos, com lesões crostosas e ulceradas, em região de cicatriz esternal. A biópsia revelou CBC. Foi realizada a ressecção ampla da lesão e reconstrução com retalho cutâneo. O anátomo-patológico demonstrou presença de CBC esclerodermiforme, margens laterais livres e margem profunda comprometida. O paciente foi submetido à radioterapia adjuvante, com dose total de 5600cGy.

Após 1 ano, apresentava nódulo cervical, em músculo esternocleidomastoideo esquerdo. Foi realizado o esvaziamento linfonodal cervical, dos níveis II, III, IV à esquerda e exploração do espaço supraclavicular. O anatomopatológico evidenciou a neoplasia ulcerada, composta por blocos sólidos, de padrão de crescimento lobular, caracterizados por proliferação de células epiteliais com citoplasma claro, apresentando, por vezes, paliçada periférica, áreas de necrose central, queratinização, atipia citológica e figuras de mitoses, compatível com o diagnóstico de carcinoma triquilemal, com margem comprometida junto à clavícula. Ausência de metástase em linfonodos.

Um mês após a ressecção cirúrgica, o paciente apresentou recidiva do carcinoma triquilemal, com exposição óssea, em topografia de terço superior do esterno, sendo submetido novamente à cirurgia. Foi indicado o tratamento quimioterápico com 4 ciclos (1000g/m2 de 5FU (5 fluouracil) associado a 75mg/m2 de CDDP (cisplatina)).

O paciente apresentou fratura patológica de clavícula esquerda e exposição óssea, 4 meses após o tratamento quimioterápico. Ao exame, extenso tumor de parede anterior do tórax, com infiltração da veia jugular interna e da veia subclávia esquerda, com extensa fibrose pós-radioterapia, invadindo manúbrio e articulação esternoclavicular direita, com infiltração do mediastino anterior, sem aparente plano de clivagem para dissecção (Figura 1). Realizada a exérese do tumor, a ressecção R2 (persistência de doença macroscópica local) (Figura 2). O exame anatomopatológico revelou carcinoma triquilemal, com margens comprometidas (Figuras 3, 4 e 5) .






Novamente, indicada a radioterapia adjuvante com dose total de 4320cGy.

Dois anos após o tratamento radioterápico, observava-se lesão vegetante, sangrante, medindo 4 cm em seu maior diâmetro na cicatriz cirúrgica, cuja biópsia revelou carcinoma triquilemal. O paciente apresentava-se, então, fora de possibilidade terapêutica, cirúrgica ou radioterápica, sendo apenas acompanhado no ambulatório. Após esta data, abandonou o seguimento.

DISCUSÃO

É um tumor raro, que ocorre, geralmente, na pele exposta ao sol, principalmente, na face, no couro cabeludo, no pescoço e no dorso das mãos, em indivíduos idosos, entre as 4ª e 9ª décadas de vida, sem predilação por sexo.1,3-8 Também foi relatado em pacientes expostos à radioterapia para tratamento de doenças benignas de cabeça e pescoço, com longos períodos de latência, e relacionado à dose de irradiação à que o paciente foi submetido. Durante as décadas de 1920 até 1960, era comum a radioterapia do timo (glândula que fica aumentada em crianças e regride espontaneamente), a radioterapia de amígdalas para acne e outras indicações. Naquela época, os médicos acreditavam que esta forma de tratamento era segura.7

Clinicamente, as lesões podem se apresentar como: pápulas, nódulos ou placas, frequentemente, ulceradas ou com crostas.1,2,3,5-10 É necessário fazer o diagnóstico diferencial, com carcinoma de células escamosas, carcinoma basocelular, queratoacantoma e melanoma nodular maligno.1,7 Entretanto, tais lesões são papulonodulares, geralmente, estendem-se à derme reticular, são propensas à recorrência local e, frequentemente, ocorrem metástases. Ao contrário, o carcinoma triquilemal apresenta um curso lento, dificilmente, ressurge após sua excisão ou desenvolve metástases em outros órgãos.1

Histologicamente, o tumor se apresenta puramente intraepitelial ou, mais comumente, associado a um componente invasivo, centrado na unidade pilosebácea , que pode se estender desde a epiderme até a gordura subcutânea.2 Comumente, mostram-se contínuos com a epiderme e o epitélio folicular.4 Quando grandes, apresentam focos de hemorragia e/ou necrose. A imuno-histoquímica do carcinoma triquilemal, usualmente, é negativa para CEA e EMA, entretanto, sua positividade tardia é ocasionalmente documentada.1,11

O tratamento é, exclusivamente, cirúrgico.1,11 A excisão simples, com margens adequadas é segura, barata e efetiva para o tratamento do carcinoma triquilemal.5,10

O tratamento recomendado pela literatura é a cirurgia micrográfica de Mohs, pois esta não apresenta sinais de recorrência após muitos anos do tratamento.2,3,4,6

O carcinoma triquilemal apresenta, geralmente, um bom prognóstico, sendo incomuns os relatos de casos com invasão profunda e recorrência local.4,5

Ko T et al. relatam o caso de 2 pacientes com carcinoma triquilemal, em cicatrizes de queimadura. Histologicamente, esses tumores se apresentaram como a proliferação de células lobulares contínuas com a epiderme, compostos por células grandes atípicas com citoplasma claro e PAS-positivo.12

O presente estudo mostra um caso de carcinoma triquilemal, recidivado, de difícil tratamento, em mesma topografia de um carcinoma basocelular, tratado previamente com cirurgia e radioterapia.

Recebido em 06.12.2009.

Aprovado pelo Conselho Consultivo e aceito para publicação em 03.07.2010.

Conflito de interesse: Nenhum

Suporte financeiro: Nenhum

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  • Endereço para Correspondência:
    Rosyane Rena de Freitas
    Rua Patativa 100 ap 154 Bloco B Condomíio Portal Victória. Vila Tatetuba
    Cep: 12220-140, São José dos Campos - SP, Brasil
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    Trabalho realizado no: Hospital Erasto Gaertner - Liga Paranaense de Combate ao Câncer (HEG - LPCC) - Curitiba (PR), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Dez 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2011

    Histórico

    • Recebido
      06 Dez 2009
    • Aceito
      03 Jul 2010
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