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Reologia, cinética de polimerização e resistência mecânica de sistemas para a produção de espumas cerâmicas via "Gelcasting"

Rheology, kinetics of polymerization and strength of gelcasting systems for the production of ceramic foams

Resumos

A associação da aeração de suspensões cerâmicas contendo um agente espumante ao processo "gelcasting" possibilitou o desenvolvimento de uma nova classe de cerâmicas porosas com propriedades sem precedentes. Um dos pontos mais importantes deste processo é a polimerização de precursores orgânicos dissolvidos na fase líquida, resultando na formação in situ de um gel, o qual enrijece a suspensão imediatamente após a formação da espuma, impedindo o colapso desta. Recentemente, alguns sistemas de monômeros tais como acrilato de amônio, hidroximetilacrilamida, ácido metacrílico, metacrilamida e metileno-bisacrilamida foram descritos como agentes gelificantes adequados para a produção de corpos densos. Entretanto, estudos sobre sistemas gelificantes visando a produção de espumas cerâmicas não são conhecidos, apesar da enorme importância desta etapa no processo, e do maior número de restrições existentes na produção de corpos porosos. Neste trabalho, os sistemas supracitados foram avaliados considerando critérios exigidos no processamento de espumas cerâmicas, tais como tempo de reação para a solidificação da espuma, interferência sobre a dispersão e comportamento reológico da suspensão, resistência mecânica a verde antes e após a secagem. Combinações de diferentes tipos de monômeros foram também investigadas com relação aos parâmetros acima citados. Os resultados obtidos permitem uma maior compreensão dos fenômenos observados no processo, além de fornecer subsídios para a seleção de sistemas gelificantes adequados à produção de cerâmicas porosas através desta nova técnica.

cerâmica porosa; espuma; gelcasting; monômeros; polimerização; gel


The association of the gelcasting process with the aeration of ceramic suspensions containing a surfactant allowed the development of a new category of ceramic foams, which shows unprecedented properties. One of the key points of this process is the gelling reaction of organic monomers dissolved in the liquid phase, which sets the foamed suspension avoiding its collapse. Recently, a variety of monomeric systems were described as good gelling agents for ceramic suspensions, namely ammonium acrylate, hydroxymethil-acryalmide, methacrylic acid, methacrylamide and methylene-bysacrylamide. These systems were studied in this work considering the criteria required to produce ceramic foams, including the reaction kinetics, the effects of monomer type on dispersion mechanisms and rheological behavior of suspensions, and the green strength of wet and dried gelled bodies. The association of pairs of monomers were also evaluated considering the same criteria. The results allowed a better comprehension of the phenomena observed during the process, and lay fundaments for the selection of gelling systems for the production of porous ceramics through this novel route.

porous ceramics; foam; gelcasting; monomers; polymerization; gel


Reologia, cinética de polimerização e resistência mecânica de sistemas para a produção de espumas cerâmicas via "Gelcasting"

(Rheology, kinetics of polymerization and strength of gelcasting systems for the production of ceramic foams)

F. S.Ortega1, P. Sepulveda2, V. C.Pandolfelli1

1Departamento de Engenharia de Materiais - DEMa

Universidade Federal de S. Carlos - UFSCar

C. P. 676, S. Carlos, SP, 13565-670.

pfso@iris.ufscar.br ou vicpando@power.ufscar.br

2Imperial College of Science, Technology and Medicine, Londres, Inglaterra.

Resumo

A associação da aeração de suspensões cerâmicas contendo um agente espumante ao processo "gelcasting" possibilitou o desenvolvimento de uma nova classe de cerâmicas porosas com propriedades sem precedentes. Um dos pontos mais importantes deste processo é a polimerização de precursores orgânicos dissolvidos na fase líquida, resultando na formação in situ de um gel, o qual enrijece a suspensão imediatamente após a formação da espuma, impedindo o colapso desta. Recentemente, alguns sistemas de monômeros tais como acrilato de amônio, hidroximetilacrilamida, ácido metacrílico, metacrilamida e metileno-bisacrilamida foram descritos como agentes gelificantes adequados para a produção de corpos densos. Entretanto, estudos sobre sistemas gelificantes visando a produção de espumas cerâmicas não são conhecidos, apesar da enorme importância desta etapa no processo, e do maior número de restrições existentes na produção de corpos porosos. Neste trabalho, os sistemas supracitados foram avaliados considerando critérios exigidos no processamento de espumas cerâmicas, tais como tempo de reação para a solidificação da espuma, interferência sobre a dispersão e comportamento reológico da suspensão, resistência mecânica a verde antes e após a secagem. Combinações de diferentes tipos de monômeros foram também investigadas com relação aos parâmetros acima citados. Os resultados obtidos permitem uma maior compreensão dos fenômenos observados no processo, além de fornecer subsídios para a seleção de sistemas gelificantes adequados à produção de cerâmicas porosas através desta nova técnica.

Palavras-chave: cerâmica porosa, espuma, gelcasting, monômeros, polimerização, gel.

Abstract

The association of the gelcasting process with the aeration of ceramic suspensions containing a surfactant allowed the development of a new category of ceramic foams, which shows unprecedented properties. One of the key points of this process is the gelling reaction of organic monomers dissolved in the liquid phase, which sets the foamed suspension avoiding its collapse. Recently, a variety of monomeric systems were described as good gelling agents for ceramic suspensions, namely ammonium acrylate, hydroxymethil-acryalmide, methacrylic acid, methacrylamide and methylene-bysacrylamide. These systems were studied in this work considering the criteria required to produce ceramic foams, including the reaction kinetics, the effects of monomer type on dispersion mechanisms and rheological behavior of suspensions, and the green strength of wet and dried gelled bodies. The association of pairs of monomers were also evaluated considering the same criteria. The results allowed a better comprehension of the phenomena observed during the process, and lay fundaments for the selection of gelling systems for the production of porous ceramics through this novel route.

Keywords: porous ceramics, foam, gelcasting, monomers, polymerization, gel.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, técnicas inovadoras de processamento cerâmico vêm sendo intensamente estudadas, visando a obtenção de peças com geometria complexa, microestrutura refinada e a eliminação de etapas de acabamento. Estes avanços têm tido como resultado a diminuição de custos de produção e a obtenção de propriedades mecânicas superiores [1-3]. Dentre os novos métodos de processamento, destaca-se o gelcasting [4]. Este consiste basicamente na preparação de uma suspensão de pó cerâmico em solução aquosa contendo monômeros orgânicos, a qual, após vertida em um molde com a geometria desejada, sofre uma polimerização que resulta na formação de um gel a partir da fase líquida. Esta reação culmina com a solidificação da suspensão, permitindo que a peça possa ser imediatamente desmoldada e submetida às etapas de secagem e sinterização.

Características específicas deste processo, como a baixa viscosidade das suspensões e a cinética de reação, associadas à adição de um surfactante e a um processo de aeração, permitem que, seja possível produzir materiais cerâmicos porosos com características únicas, como poros esféricos com paredes altamente densificadas e níveis de porosidade que podem ultrapassar 90% [5, 6]. Estas características proporcionam propriedades sem precedentes entre as cerâmicas porosas, como alta resistência mecânica, alta permeabilidade [7], baixa condutividade térmica [8], além da possibilidade de se produzir materiais em uma ampla faixa de densidade, o que permite controlar as referidas propriedades [9].

O sistema utilizado para promover a gelificação da suspensão constitui um dos pontos mais importantes do processo, especialmente quando este é associado à etapa de aeração. Os precursores do gel não devem afetar a dispersão da suspensão, evitando que a microestrutura e a resistência mecânica sejam deterioradas. Tampouco devem aumentar a viscosidade da suspensão, já que isto dificulta a formação de espumas de baixa densidade. Após o processo de aeração, a suspensão deve gelificar rapidamente, evitando que fenômenos como a redução da espessura da parede e o colapso das células provoquem danos macroestruturais capazes de deteriorar as propriedades finais do material. Finalmente, após a gelificação, a espuma deve possuir resistência mecânica suficiente para ser desmoldada e manipulada até a etapa de sinterização [10].

Este trabalho tem por objetivo avaliar alguns sistemas gelificantes utilizados no processo gelcasting, considerando as restrições existentes na produção de cerâmicas porosas através da aeração de suspensões, como taxa de reação, influência sobre o comportamento reológico e resistência mecânica a verde, antes e após a secagem do material.

MATERIAIS E MÉTODOS

Tendo como ponto de partida alguns sistemas gelificantes estudados recentemente [11], os reagentes relacionados na Tabela I foram selecionados para a realização dos ensaios. O acrilato de amônio (AA) foi usado como base de comparação com os demais sistemas, já que este foi bastante estudado em trabalhos publicados anteriormente sobre produção de espumas cerâmicas através de gelcasting [5, 6, 8-10]

Foram preparadas soluções aquosas contendo 25% em peso de cada monômero, puros, ou combinados aos pares, em uma proporção molar de 1:1. O ácido metacrílico (AM) foi neutralizado com NaOH antes de ser usado. A metacrilamida (MAM), por possuir um baixo limite de solubilidade em água, foi utilizada apenas em combinação com outros monômeros, os quais atuam como co-solventes, juntamente com a água. A essas soluções foi adicionado 1% em mol de MBAM, com exceção das soluções contendo HMAM, o qual não necessita de agente reticulante para formar o gel. Por fim, adicionou-se gradativamente alumina calcinada (A-1000 SG, Alcoa, área superficial de 8,4 m2/g) às soluções aquosas de monômeros, sob agitação, até atingir-se uma concentração de 40% em volume de pó, e ajustou-se o pH para 8,5.

O comportamento reológico de suspensões foi estudado em um viscosímetro Brookfield LV-DV III, equipado com adaptador para amostras pequenas. Para isso, as suspensões foram dispersas com quantidades variadas de poliacrilato de sódio (Dispex A-40, Mw @10.000 g/mol, Ciba), o qual foi dissolvido na solução de monômero antes da adição de alumina. O comportamento reológico em função da quantidade de dispersante de uma suspensão com 40% em volume de alumina dispersa em água foi tomado como referência para comparação com os demais sistemas. A avaliação reológica foi efetuada aplicando-se um ciclo no qual a taxa de cisalhamento foi variada entre 0,2 e 330 s-1. Antes de cada ciclo, as suspensões foram desaglomeradas com a aplicação de ultra-som durante 2 minutos. Com as curvas de tensão contra taxa de cisalhamento obtidas calculou-se a viscosidade e a tensão de escoamento, utilizando-se o modelo de Casson, dado por:

onde: t é a tensão de cisalhamento (Pa), t0 é a tensão de escoamento (Pa), h é a viscosidade de Casson (Pa×s) e g é a taxa de cisalhamento (s-1).

Uma vez determinado o teor ótimo de defloculante para cada sistema, foram preparados corpos-de-prova para a realização de ensaios mecânicos visando avaliar a resistência mecânica a verde após a formação do gel. Simultaneamente, monitorou-se a variação da temperatura no decorrer da polimerização, fornecendo informações a respeito da cinética desta reação. Para isso, as suspensões preparadas com cada tipo ou par de monômero, conforme descrição anterior, foram desaglomeradas em moinho de bolas durante 30 minutos, e em seguida divididas em alíquotas de 45 g. A cada alíquota foram adicionadas quantidades variadas de iniciador e de catalisador, em uma proporção molar de 1:1, sob vigorosa agitação. Após a homogeneização, estas foram rapidamente introduzidas em moldes de PVC cilíndricos (20 mm de diâmetro x 50 mm de altura) aos quais foi acoplado um termômetro em contato com a suspensão, permitindo o registro da temperatura no decorrer da polimerização. Finda a reação, os corpos foram acondicionados em sacos plásticos com atmosfera saturada de umidade, até o momento do ensaio mecânico, evitando assim a evaporação da água.

A resistência mecânica a úmido foi inferida a partir da carga aplicada para fazer penetrar uma haste cilíndrica com 3 mm de diâmetro no corpo-de-prova, a uma velocidade de 5 mm/min, em um teste adaptado da indústria de gomas, já que este tipo de ensaio não é normatizado [12]. Para isso, os corpos-de-prova foram seccionados em cilindros com 12 mm de altura, e a penetração da haste foi limitada até uma profundidade de 8 mm. Este ensaio foi conduzido em uma máquina universal de ensaios MTS-810.

Para avaliar a resistência mecânica após a secagem, procedeu-se à preparação dos corpos-de-prova de modo análogo, porém adicionando-se uma concentração fixa de 0,8 mL de iniciador por grama de suspensão já contendo catalisador. Os cilindros obtidos foram secos a 40°C e 10% de umidade relativa por 72 horas, sendo a seguir seccionados transversalmente em cilindros menores, obedecendo a relação entre altura e diâmetro tal que 0,3£h/D£1,5, onde h é a altura e D é o diâmetro do cilindro. Estes foram submetidos a um ensaio de compressão diametral na máquina universal de ensaios, a uma velocidade de carregamento de 0,5 mm/min e demais condições segundo a norma ASTM C496-90 [13]. Neste tipo de ensaio mecânico a fratura ocorre por tração a partir do centro da amostra, o que gera uma boa caracterização tanto da resistência mecânica do polímero quanto da adesão entre gel e partículas cerâmicas, além de minimizar efeitos devidos ao acabamento superficial da amostra. A tensão de ruptura foi calculada através da seguinte equação:

onde: s é a tensão de fratura (Pa), F a carga no momento da ruptura (N), h a altura (m) e D o diâmetro do corpo-de-prova (m).

Após o ensaio de compressão diametral, a densidade aparente dos corpos foi medida pelo método de Arquimedes, e comparada aos valores de resistência mecânica obtidos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os valores de viscosidade de Casson das suspensões, calculados pela equação (A), são apresentados na Fig. 1 para cada sistema, em função do teor de defloculante utilizado. O ajuste dos parâmetros calculados aos dados experimentais foi, em geral, muito bom (r2³0,9).


Verifica-se que a influência dos monômeros sobre a viscosidade da suspensão caracteriza dois grupos de comportamento. Em um deles as suspensões apresentam viscosidade próxima à da suspensão de alumina em água, evidenciando uma influência mínima do monômero sobre o comportamento reológico da suspensão. Em outro grupo, observam-se viscosidades mais elevadas, além de um maior consumo de defloculante para se dispersar o pó. Esta diferença de comportamentos está associada aos grupos funcionais presentes em cada tipo de monômero. A hidroximetilacrilamida (HMAM) e a metacrilamida (MAM) apresentam grupos amida associados à cadeia carbônica, enquanto que o acrilato (AA) e o metacrilato (AM) apresentam grupos carboxilato, também presentes no poliacrilato usado como defloculante, e que possui alta afinidade com a superfície da alumina. Assim, durante a adição de alumina à suspensão, ocorre a adsorção simultânea das cadeias de poliacrilato e de monômeros contendo grupos carboxilato, presentes na solução. Entretanto, apenas o defloculante gera cargas elétricas na superfície das partículas. Comparativamente às suspensões contendo monômeros com grupos amida (MAM e HMAM), há evidência de que os sistemas contendo grupos carboxilato (AA e AM) apresentam uma diminuição na densidade de cargas elétricas na superfície das partículas, e consequentemente da energia de repulsão entre elas, com prejuízo à dispersão do sistema e aumento da viscosidade. Acredita-se que o aumento na concentração de defloculante na solução aumenta a fração de área superficial por ele recoberta, possibilitando assim a dispersão do sistema.

Tendo em vista a produção de espuma a partir das suspensões contendo monômeros, cabem aqui algumas considerações: a viscosidade mais elevada das suspensões contendo monômeros à base de grupos carboxilato prejudica a formação de espuma, conforme verificado em trabalho anterior [14]. Por outro lado, associada à maior viscosidade tem-se uma alta tensão de escoamento, o que resulta em maior estabilidade das espumas ao longo do tempo. Assim, a produção de espumas com baixa densidade a partir de suspensões com viscosidade e tensão de escoamento elevadas requer equipamentos mais potentes. No entanto, acredita-se que a maior estabilidade da espuma limita a redução na espessura dos filamentos, bem como a coalescência das células que a constituem, no período que precede a formação do gel, resultando em maior resistência mecânica. Entretanto, ainda são necessários estudos específicos para investigar a relação entre a viscosidade da suspensão e a resistência mecânica da espuma cerâmica.

O estudo da cinética de polimerização a partir da variação da temperatura ao longo do tempo resultou em dois tipos de comportamento, exemplificados na Fig. 2.


Nas curvas do tipo A, a temperatura permanece praticamente constante, até um determinado momento em que passa a aumentar rapidamente. O tempo necessário para que a temperatura comece a aumentar diminui à medida que se aumenta a quantidade de iniciador. Este fenômeno é conhecido como auto-aceleração, e é típico de polimerizações em que se formam ligações cruzadas [15]. Observou-se que neste tipo de curva ocorre um rápido aumento na viscosidade da suspensão, assim que a temperatura começa a aumentar, caracterizando a gelificação. A partir deste momento, são praticamente interrompidas alterações macroestruturais na espuma, tais como a coalescência de células e a diminuição da espessura dos filamentos que compõem as paredes das células devido ao escoamento da suspensão sob ação da gravidade. Entretanto, a máxima rigidez se desenvolverá apenas após o final da reação. Já as curvas do tipo B apresentam um aumento linear e constante de temperatura, até que a reação termine. Aumentando-se a quantidade de iniciador para promover a reação, nota-se um ligeiro aumento na inclinação do trecho linear da curva temperatura x tempo. No entanto, este tipo de curva não apresenta particularidades que evidenciem a gelificação.

A cinética de reação em função da quantidade de iniciador usada na polimerização é apresentada na Fig. 3, levando em consideração as particularidades de cada tipo de curva. Para as curvas do tipo A é apresentado o tempo necessário para que a reação se inicie em função da quantidade de iniciador. Para as curvas do tipo B é apresentada a taxa de variação da temperatura com o tempo em função da quantidade de iniciador.


Ressalta-se que as curvas do tipo A e B não são comparativas umas com as outras, mas apenas dentro do mesmo grupo. Considerando-se esta observação, verifica-se que as maiores taxas de reação para uma dada concentração de iniciador ocorreram com as suspensões contendo AA e AM, nos grupos A e B, respectivamente. Esta característica pode estar relacionada à semelhança química entre os dois reagentes. Observa-se ainda que todos os sistemas apresentaram uma cinética de reação bastante sensível à adição de iniciador, o que permite um bom controle do tempo necessário para ocorrer a gelificação. Deve-se lembrar ainda que outros fatores afetam a cinética de polimerização, como o pH da suspensão, a temperatura inicial, e principalmente a concentração de oxigênio, o qual inibe a polimerização [10].

Os ensaios de penetração da haste metálica nos corpos-de-prova úmidos resultaram em comportamentos variados. Em alguns materiais registrou-se uma tensão de ruptura, caracterizando o rompimento do gel. Outros não romperam até o limite em que a haste penetrou na amostra, equivalente a dois terços de sua altura. Entretanto, todos apresentaram uma larga região de comportamento linear na parte inicial da curva de carga em função da penetração. A inclinação desta região foi calculada para cada material através de uma regressão linear, obtendo-se coeficientes de ajuste superiores a pelo menos 0,97. Os valores obtidos foram diretamente relacionados à rigidez dos materiais, a qual foi representativa da resistência oferecida à penetração da haste, nas condições de ensaio, permitindo comparar a resistência mecânica a úmido dos diferentes sistemas. Os valores de rigidez são apresentados na Fig. 4, em função da quantidade de iniciador utilizada para promover a gelificação.


Destaca-se a elevada resistência alcançada pelo HMAM, a qual manifestou-se também na combinação deste com outros monômeros, embora com valores inferiores. Em geral, os valores de resistência à penetração da haste apresentados pelos sistemas contendo HMAM foram iguais ou superiores aos obtidos com o AA, utilizado como parâmetro de comparação. No extremo oposto, observam-se os baixos valores de resistência apresentados pelo AM e pela combinação AM-MAM, os quais foram inferiores aos apresentados pelo AA. Observou-se, especificamente, que os corpos produzidos com o sistema AM-MAM deformam-se facilmente ao serem manipulados, retornando à sua forma original após aliviar-se a pressão. Este sistema apresentou ainda uma tendência de adesão às superfícies com as quais entrou em contato.

Ainda com relação à Fig. 4, verifica-se que em geral há uma queda na resistência do gel a úmido com o aumento da concentração de iniciador utilizado na polimerização. Esta tendência está provavelmente relacionada à estrutura das cadeias poliméricas produzidas nas diferentes condições, a qual é diretamente afetada pela cinética de reação [15].

A Fig. 5 apresenta a resistência mecânica a verde após a secagem de corpos-de-prova produzidos com a adição de 0,8 mL de iniciador por grama de suspensão, medida por compressão diametral. Mostra também a densidade aparente das amostras que não apresentaram trincas, para comparação.


Com exceção do AM e da combinação AM+MAM, foram registrados valores de resistência mecânica excepcionalmente elevados, em se tratando de materiais cerâmicos não-sinterizados. Esta característica é especialmente importante no caso da produção de espumas a partir da suspensão, pois a elevada porosidade destas causa uma inevitável queda na resistência mecânica do material, tornando-o suscetível a danos durante algum eventual manuseio dos corpos no período que precede a sinterização. Quanto aos sistemas contendo AM e a combinação AM+MAM, os baixos valores de resistência mecânica foram, na verdade, uma conseqüência da baixa resistência mecânica a úmido do material. Esta foi insuficiente para resistir às tensões mecânicas originadas durante a etapa de secagem, o que provocou o surgimento de trincas no interior dos corpos-de-prova, resultando em uma drástica redução em sua resistência mecânica. Este fenômeno, que pode ser contornado reduzindo-se a taxa de secagem, enfatiza a importância da obtenção de uma elevada resistência mecânica a úmido. A densidade aparente das amostras teve uma variação muito pequena, e não apresentou correlação com a resistência mecânica medida. Isto indica que a resistência mecânica dos corpos-de-prova foi determinada pela resistência do gel, e não por variações na porosidade, decorrentes de variações na dispersão das partículas durante o processamento.

CONCLUSÕES

Neste trabalho foram avaliados monômeros capazes de formar gel através de uma polimerização, tendo em vista a produção de espumas cerâmicas através da associação da técnica "gelcasting" com um processo de aeração de suspensões. Verificou-se que monômeros contendo grupos carboxilato aumentam a viscosidade de suspensões de alumina devido à alta afinidade destes grupos funcionais, também presentes no defloculante utilizado, com a superfície das partículas de alumina. Monômeros contendo grupos amida provocam alterações mínimas no comportamento reológico das suspensões. A cinética de polimerização dos sistemas avaliados apresentou dois tipos característicos de comportamento: em um deles, observou-se o fenômeno de auto-aceleração, o qual pôde ser associado a um rápido aumento na viscosidade da suspensão, caracterizando a gelificação do sistema; em outro, houve um aumento gradativo linear da temperatura ao longo do tempo, proporcionando curvas sem evidência do momento em que se forma o gel. A resistência mecânica a úmido dos corpos produzidos foi dependente da cinética de reação, tendo sido tanto maior quanto menor a quantidade de iniciador utilizada para desencadear a polimerização. Destacaram-se a elevada resistência mecânica a úmido alcançada pelos sistemas contendo HMAM, e a baixa resistência apresentada pelos sistemas AM e AM+MAM. A resistência mecânica após a secagem foi em geral elevada. A baixa resistência mecânica a seco dos sistemas AM e AM+MAM foi decorrente da existência de trincas originadas durante a secagem, devido à baixa resistência a úmido do gel, que não suportou as tensões geradas nesta etapa. A densidade aparente dos corpos secos apresentou variações mínimas, e não se correlacionou com a resistência mecânica a seco. Isso indica que a resistência mecânica a seco foi determinada pela resistência do gel, e não por variações de porosidade decorrentes de uma má dispersão durante o processamento. Os resultados apontam novos sistemas gelificantes capazes de substituir o acrilato de amônio (AA), até então o único produto utilizado na produção de espumas cerâmicas. Algumas características, como a dispersão e a resistência mecânica, foram superiores em sistemas contendo hidroximetilacrilamida (HMAM).

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Ciba do Brasil pelo fornecimento do dispersante, à Hi Pore Ceramics pelo fornecimento dos monômeros acrílicos, à Alcoa Alumínio S.A pelo fornecimento de alumina, à CAPES e à FAPESP pelo apoio financeiro.

(Rec. 24/10/2000, Ac. 21/04/2001)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jul 2001
  • Data do Fascículo
    Jun 2001

Histórico

  • Aceito
    21 Abr 2001
  • Recebido
    24 Out 2000
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