Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação de taxas de aquecimento em materiais refratários: comparação entre simulações físicas e cálculos computacionais

Effect of the heating rate on the thermomechanical behavior of refractory materials

Resumos

A correta determinação de curvas de aquecimento para materiais refratários é uma tarefa complexa, e a sua inadequação pode resultar até mesmo na destruição de um revestimento refratário. Este trabalho apresenta um estudo sobre o efeito de diferentes taxas de aquecimento no desempenho termomecânico de refratários utilizados em fornos de reaquecimento. O estudo considera desde curvas de aquecimento típicas indicadas por fornecedores, até velocidades de aquecimento de 180 ºC/h. É apresentada uma avaliação comparativa entre os resultados térmicos medidos em um forno simulador e resultados calculados pela técnica de elementos finitos. Os perfis térmicos medidos e calculados foram empregados para a determinação das tensões termomecânicas geradas dentro das peças, analisando a probabilidade de falha em função da velocidade de aquecimento. São destacadas as diferenças existentes nestas tensões quando se consideram propriedades medidas à quente e à temperatura ambiente.

curvas de aquecimento; refratários; simulações; tensões termomecânicas


The proper choice of the most suitable heating curves for refractory materials is a complex task and a badly designed curve may cause the failure and destruction of a refractory lining. This work presents an investigation of the effect of different heating curves on the thermomechanical performance of refractory materials used for the lining of reheating furnaces. The analysis considers heating curves ranging from ones supplied by refractory manufacturers up to heating rates of 180 ºC/h. A comparison among temperature measurements obtained from a simulation furnace and the results calculated by finite element technique is shown. The measured and calculated thermal profiles were used to forecast the thermomechanical stresses developed inside the pieces, which were used to analyze the failure probability, according to the heat up rate. The authors also point out the main differences at the developed stresses obtained when using temperature dependent properties or when measuring them at room temperature.

heating curves; refractory materials; simulations; thermomechanical stresses


Avaliação de taxas de aquecimento em materiais refratários: comparação entre simulações físicas e cálculos computacionais

(Effect of the heating rate on the thermomechanical behavior of refractory materials)

R. Pereira1, A. A. Tôrres1, M. M.Akiyoshi2, V. C. Pandolfelli2

1Grupo Saffran, R. Pará de Minas 631, Betim, MG, 32560-020

2Departamento de Engenharia de Materiais - DEMa

Universidade Federal de S. Carlos - UFSCar

Rod. Washington Luiz km 235, C.P. 676, S. Carlos, SP, 13565-905

rpereira@prime.com.br ou vicpando@power.ufscar.br

Resumo

A correta determinação de curvas de aquecimento para materiais refratários é uma tarefa complexa, e a sua inadequação pode resultar até mesmo na destruição de um revestimento refratário. Este trabalho apresenta um estudo sobre o efeito de diferentes taxas de aquecimento no desempenho termomecânico de refratários utilizados em fornos de reaquecimento. O estudo considera desde curvas de aquecimento típicas indicadas por fornecedores, até velocidades de aquecimento de 180 oC/h. É apresentada uma avaliação comparativa entre os resultados térmicos medidos em um forno simulador e resultados calculados pela técnica de elementos finitos. Os perfis térmicos medidos e calculados foram empregados para a determinação das tensões termomecânicas geradas dentro das peças, analisando a probabilidade de falha em função da velocidade de aquecimento. São destacadas as diferenças existentes nestas tensões quando se consideram propriedades medidas à quente e à temperatura ambiente.

Palavras-chave: curvas de aquecimento, refratários, simulações, tensões termomecânicas.

Abstract

The proper choice of the most suitable heating curves for refractory materials is a complex task and a badly designed curve may cause the failure and destruction of a refractory lining. This work presents an investigation of the effect of different heating curves on the thermomechanical performance of refractory materials used for the lining of reheating furnaces. The analysis considers heating curves ranging from ones supplied by refractory manufacturers up to heating rates of 180 oC/h. A comparison among temperature measurements obtained from a simulation furnace and the results calculated by finite element technique is shown. The measured and calculated thermal profiles were used to forecast the thermomechanical stresses developed inside the pieces, which were used to analyze the failure probability, according to the heat up rate. The authors also point out the main differences at the developed stresses obtained when using temperature dependent properties or when measuring them at room temperature.

Keywords: heating curves, refractory materials, simulations, thermomechanical stresses

INTRODUÇÃO

Determinar corretamente as curvas mais adequadas para o aquecimento ou reaquecimento de fornos siderúrgicos, requer tanto o conhecimento dos materiais empregados no revestimento refratário, como as condições térmicas pertinentes durante o processo. A técnica, aliada à experiência, determina que as condições de aquecimento destes equipamentos sejam escolhidas de forma empírica, tendo como objetivo, na maioria das vezes, a disponibilidade do forno conforme as necessidades de produção. Desta forma, o equipamento torna-se susceptível a falhas devido à não observação de condições necessárias para um bom desempenho dos materiais refratários empregados, como a imposição de velocidades de aquecimento altas o suficiente para resultar em tensões termomecânicas em níveis críticos. Ainda que uma única operação nestas condições possa não resultar em ruptura do material, ela determina um dano ao produto, que será sempre crescente com a manutenção das condições empregadas. O impacto deste dano será sempre uma questão de tempo, reduzindo a médio ou longo prazo a disponibilidade do equipamento. Uma discussão mais detalhada pode ser obtida junto às referências [1, 2].

Tendo em vista os procedimentos empíricos existentes para a escolha de curvas de aquecimento, assim como a reduzida literatura técnica sobre o tema, definiu-se pelo desenvolvimento de técnicas para simular curvas de aquecimento, aplicadas em materiais refratários. O objetivo final foi determinar qual é a técnica mais adequada para prever tanto os perfis de temperatura como as tensões termomecânicas geradas dentro da peça refratária. A partir da comparação das tensões geradas (previstas) com as tensões de ruptura a quente do material (medidas em laboratório), através de mapas de fratura, obtém-se a identificação de fratura ou não do material refratário, e sua posição de ocorrência, em função da curva de aquecimento imposta. Todos os perfis de temperatura obtidos durante as simulações numéricas foram comparados com perfis térmicos medidos dentro das âncoras, em um forno simulador construído para este fim.

Em uma análise de simulações numéricas, a correta utilização das propriedades do material é um item crítico, uma vez que informações incorretas levarão à determinação de comportamentos não existentes. A escolha de propriedades medidas nas temperaturas de trabalho, ou medidas à temperatura ambiente, pode acarretar resultados diversos. A opção de avaliação das propriedades a serem informadas deve ser aquela que resulte em comportamentos próximos aos verificados nos fornos siderúrgicos. Desta forma, deve-se realizar uma comparação entre os resultados obtidos com propriedades medidas em diversas situações, identificando as diferenças existentes e propondo uma alternativa coerente com o real desempenho dos materiais.

MATERIAIS E MÉTODOS

Dentre os vários métodos empregados para as simulações numéricas, destaca-se a análise por elementos finitos. Conforme [3, 4], ela é uma poderosa ferramenta numérica para se obter soluções aproximadas de equações diferenciais parciais obtidas em problemas complexos. Esta técnica não aproxima equações diferenciais diretamente, como no cálculo diferencial, mas elabora uma rotina que permite a solução através de integrais.

Em um problema contínuo, as variáveis (normalmente temperatura, tensão e deformação) possuem um número infinito de valores, porque são funções de um número infinito de pontos. Na análise de elementos finitos, o problema é dividido em seções discretas, chamados elementos, que não são entidades físicas, mas meramente sub-domínios dentro do material contínuo. Cada um dos elementos é conectado aos outros através dos chamados nós. Aos nós e elementos são atribuídas propriedades e quantidades físicas (carregamentos térmicos, mecânicos, elétricos, etc.) correspondentes ao problema. Essas quantidades físicas são parâmetros desconhecidos a serem obtidos quando forças externas são aplicadas (fluxo de calor, deformação térmica, forças, etc.). Assim, uma vez que a malha sobre o domínio tenha sido determinada, o comportamento de uma variável desconhecida é aproximado em cada elemento por funções contínuas expressas em termos dos valores nodais da variável (valores atribuídos aos nós permitem o cálculo dos valores nos elementos). Dessa maneira, pode-se focar um determinado ponto dentro do domínio e observar o comportamento das variáveis ao longo do tempo.

O cálculo de temperaturas conforme o método de elementos finitos emprega a equação (A) para este fim, em conjunto com condições de contorno para os casos onde há o estabelecimento de temperaturas fixas em determinadas regiões, condições específicas de transferência de calor por convecção e / ou radiação.

onde r é a densidade do material, C o calor específico e k é a sua condutividade térmica. Q é o fluxo de calor existente no corpo.

Uma vez calculado o perfil térmico existente dentro da peça, e assim obtendo um perfil de deformações térmicas iniciais, a equação (B) é empregada para o cálculo das tensões geradas dentro do corpo, em cada um dos elementos. Esta equação apresenta o caso bidimensional, e pode ser estendida para as demais situações.

A equação (B) é a equação de Hooke expandida [5], sob a notação matricial, considerando-se as componentes térmicas e mecânicas sobre um corpo triaxialmente engastado, com diferentes componentes para sx, sy e sz e diferentes deformações ex, ey e gxy.

O material empregado na fabricação das âncoras e utilizado durante as análises consiste de um produto aluminoso, produzido por socagem ou prensagem, posteriormente queimado ou somente curado (dependendo da sua utilização final). A Tabela I apresenta as principais características do produto.

O software empregado permite a implantação de curvas de propriedades em função do tempo ou da temperatura. Desta maneira, uma primeira análise empregou as propriedades do material LICOTON 39CH medidas em função da temperatura. As propriedades exigidas (E, k, a, e C) foram informadas desde a temperatura ambiente até a temperatura máxima de medição, com incrementos de 50 °C. Os seguintes métodos foram empregados para obtenção das curvas de propriedades em função da temperatura:

(a) Módulo elástico

O método de Hübner [7] foi utilizado para a obtenção dos valores do módulo elástico. Os valores de módulo elástico para o produto LICOTON 39CH, produzido nas condições anteriormente apresentadas, foram obtidos através de corpos de prova de 160 mm x 40 mm x 40 mm extraídos de âncoras e em seguida retificados. Os ensaios foram realizados em máquina Netzsch, modelo MOR 422, no intervalo de temperaturas entre ambiente e 1200 oC, a cada 200 oC. Durante a realização dos ensaios, uma taxa de deformação constante de 1.000 mm/minuto foi empregada. A equação (C) expressa a dependência do módulo elástico com a temperatura.

(b) Condutividade térmica

Os ensaios de condutividade térmica foram realizados em corpos de prova nas dimensões de 229 mm x 114 mm x 63 mm, em equipamento Netzsch, modelo TCP 426, na faixa de 25 oC a 1200 oC, a cada 200 oC. Este equipamento emprega o método do fio quente paralelo e os ensaios foram realizados a uma taxa de aquecimento de 2 oC/min. A equação (D) apresenta a expressão para a dependência de k com a temperatura.

(c) Coeficiente de expansão térmica

Os valores para o coeficiente de expansão térmica foram medidos em dilatômetro modelo RB-3000, a uma taxa de aquecimento de 5 oC/min. O ensaio foi realizado com corpo de prova nas dimensões de 50 mm x 10 mm x 10 mm, obtido por extração a partir de tijolos prensados e queimados a 1430 oC do produto LICOTON 39CH. A expressão (E) apresenta os valores de a em função da temperatura.

(d) Capacidade calorífica

A partir dos ensaios de condutividade térmica conforme apresentado anteriormente, também são obtidos os valores de capacidade calorífica em função da temperatura. A equação (F) mostra a dependência de C com a temperatura.

As demais propriedades (densidade e módulo de Poisson) foram informadas conforme valores à temperatura ambiente, empregando-se valores de 2500 kg/m3 para densidade e módulo de Poisson de 0,18. Todos os valores de propriedades medidas foram utilizados para a obtenção de equações expressando as propriedades em função da temperatura. Estas equações foram introduzidas no método de elementos finitos, permitindo a inferência dos valores das propriedades em qualquer temperatura desejada ou calculada pela técnica. Como comparação, o módulo de ruptura a quente (HMOR) do material foi avaliado. A Tabela II apresenta alguns valores de HMOR, que foram comparados aos valores de tensão obtidos pela análise de elementos finitos, corrigidos pelo módulo de Weibull.

A adequação do método de elementos finitos foi determinada pela comparação das temperaturas calculadas com as temperaturas medidas em forno simulador construído para este fim. Ele consiste de equipamento com teto móvel, onde as âncoras e blocos de teto podem ser instalados e posteriormente removidos para ensaios mecânicos. O forno opera com GLP e possui um controlador de temperaturas Eurotherm, para uma correta execução das curvas de aquecimento.

Sendo o teto constituído de três conjuntos de âncoras e blocos, termopares tipo S foram instalados na âncora central, ao longo de seu comprimento, de maneira a obter um acompanhamento das temperaturas durante as diferentes condições de aquecimento. As duas âncoras laterais restantes foram empregadas para obtenção de corpos de prova. A Fig. 1 apresenta um croqui do forno simulador construído.


Para as simulações dos perfis térmicos e mecânicos, os modelos empregados foram âncoras utilizadas em tetos de fornos de reaquecimento, em conjunto com blocos de teto. As âncoras foram divididas em 2.140 nós e 1.552 elementos. Foi empregado somente o meio modelo (modelagem somente da metade anterior da peça, sem prejuízo do conjunto pela implementação de considerações de simetria do modelo e das cargas térmicas e mecânicas aplicadas).

As condições de simulação são apresentadas na Fig. 2, destacando-se:


i) face quente

Imposição da curva de aquecimento desejada: cada curva de aquecimento foi informada como uma série de pontos (T, t), com intervalos determinados de maneira a defini-las corretamente. As diferentes curvas de aquecimento empregadas são apresentadas na Fig. 3, e variam desde 17 °C/h (curva padrão) até 180 °C/h.


ii) face fria

Imposição de um coeficiente de transferência de calor hc que proporcionasse um ajuste adequado dos dados de temperatura calculados em relação aos valores medidos. Os valores de hc foram informados como uma curva hc x T, de acordo com a equação (G), adaptada de [8]:

onde hc é o coeficiente de transferência de calor por convecção (W/mK), T é a temperatura instantânea e To a temperatura ambiente (oC).

iii) dentes

Sob os nós localizados sobre os dentes foram aplicadas cargas referentes ao peso dos blocos e dos concretos isolantes.

iv) cabeça das âncoras

Foram impostos deslocamentos uy nulos nos nós existentes na linha de centro da cabeça da âncora, como simulação da garra metálica que sustenta a peça. Além disso, para simular o grau de liberdade dado pela possibilidade de movimentação da garra metálica (dado o superior coeficiente de expansão térmica do material metálico), adotou-se ux também nulo em uma das laterais da peça. Desta forma, obteve-se um apoio fixo em um dos lados e um apoio móvel no lado oposto.

v) simetria

Uma vez que foi empregado somente meio modelo para a realização das análises de simulação, foi necessária a imposição de uma condição de simetria de todas as superfícies localizadas no plano central da peça (superfícies do plano XZ para o meio modelo). Para tanto, uz foi imposto como nulo em toda esta região.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Resultados térmicos

As Figs. 4 e 5 apresentam os perfis térmicos para as curvas de aquecimento padrão e de 100 °C/h. Elas apresentam a distribuição de temperaturas prevista para a face quente e o seu monitoramento ao longo de diversas posições dentro da âncora refratária, a saber 0 mm, 50 mm, 100 mm e 300 mm da face de aquecimento.



A técnica de elementos finitos mostrou-se bastante apropriada para simular as condições térmicas desenvolvidas nas peças refratárias para taxas de aquecimento mais baixas (curva de aquecimento padrão, 30 °C/h e 40 °C/h), com alto coeficiente de correlação entre as temperaturas previstas e as temperaturas monitoradas. Esta particularidade pode ser observada na Fig. 4.

No entanto, para taxas de aquecimento mais altas (100 °C/h e 180 °C/h), o método de elementos finitos não permite uma correta previsão das temperaturas próximas à face fria da peça, ainda que o comportamento para regiões mais quentes seja satisfatório, conforme mostrado na Fig. 5.

A inadequação do método de elementos finitos para prever as temperaturas da região fria das âncoras pode ser atribuída às condições de contorno empregadas na análise. A avaliação das curvas de aquecimento foi desenvolvida considerando-se somente um coeficiente de transferência de calor por convecção, distribuído pela superfície superior da cabeça da âncora. As demais regiões da cabeça da peça expostas ao ambiente não possuem condições de transferência de calor discriminadas como a parte superior da peça. Além disso, ainda que o efeito de transferência de calor por radiação seja reduzido para baixas temperaturas, não foi considerado este efeito no cálculo.

Estas duas condições podem ser implementadas de maneira a permitir a identificação desta inércia térmica verificada nas regiões mais distantes da face quente para taxas de aquecimento superiores a 100 °C/h.

Resultados mecânicos

As tensões termomecânicas geradas em cada uma das posições de interesse foram calculadas a partir dos perfis térmicos obtidos em cada uma das curvas de aquecimento realizadas. Para tanto, o perfil térmico calculado para a peça foi informado como o carregamento térmico para a análise termomecânica. Os dados ao qual estas tensões foram comparadas foram as tensões de fratura da peça, calculadas nas temperaturas específicas de cada uma das posições, a partir da equação para a resistência à flexão a quente (ensaio de três pontos), com correção através do módulo de Weibull, dada pela equação (H):

onde st é a tensão de ruptura, s3-P são os valores de resistência à flexão em três pontos e m o módulo de Weibull, que foi determinado como 14,3 e foi considerado constante com a temperatura.

Foram estabelecidos mapas de fratura, onde a interseção dos perfis de tensões previstos com as tensões de fratura identifica os instantes de ocorrência de fratura e sua localização (pontos onde a tensão gerada dentro das peças é igual ou superior à tensão de ruptura por flexão em três pontos).

A Fig. 6 apresenta o mapa de fratura para a curva de aquecimento padrão (17 °C/h). Neste mapa, observa-se que não existe interseção das curvas previstas para as tensões geradas e para os valores de fratura obtidos a partir da equação para a resistência à flexão a quente. Isto indica que esta curva de aquecimento não resulta em fratura em nenhum instante ao longo de todo o aquecimento e constitui uma curva segura para trabalho, segundo as hipóteses de engastamento assumidas.


A Fig. 7 refere-se ao mapa de fratura para a curva de aquecimento a 100 °C/h. Já neste caso, existe interseção e superposição das curvas de tensões geradas e de tensões de fratura para a posição a 100 mm da face quente. Entre os instantes de 3 h até 7 h existe praticamente uma completa superposição destas curvas, indicando que a tensão gerada dentro da peça ao longo destes instantes é no mínimo igual à tensão de ruptura do material, e em alguns casos, até mesmo é superior. Quando isso ocorre, há o desenvolvimento de trincas de aquecimento na posição indicada, que pode levar à fratura da peça. Para as demais posições dentro da âncora não há fratura nesta taxa de aquecimento.


A ocorrência de fratura nesta posição confere com os estudos práticos desenvolvidos [9]para análises de casos específicos de usuários de materiais refratários em fornos de reaquecimento, para casos de choques térmicos de aquecimento severos. No entanto, as âncoras retiradas do forno de simulações não apresentaram fratura, indicando que há mecanismos de alívio de tensões em atuação no equipamento que permitiram a continuidade da operação das peças sem que o dano fosse observado de imediato.

Efeito da temperatura nas propriedades do material

Uma das incertezas mais freqüentes na avaliação de desempenho de materiais refratários é em qual temperatura considerar as propriedades do material em análise, quando sua utilização se dá em temperaturas elevadas. Esta incerteza levou ao uso de propriedades medidas à temperatura ambiente e às temperaturas de trabalho. A técnica de elementos finitos foi empregada para simulações de tensões termomecânicas decorrentes de curvas de aquecimento com duas abordagens: (I) propriedades dependentes da temperatura e (II) propriedades constantes com a temperatura, medidas à temperatura ambiente.

A Fig. 8 apresenta os resultados calculados para as condições I e II, para a curva de aquecimento de 30 °C/h, e a Fig. 9 apresenta os dados para a curva de aquecimento de 180 °C/h.



A partir dos gráficos das Figs. 8 e 9, observa-se que o formato das curvas para as condições (I) e (II) são similares. As curvas também apresentam os mesmos pontos de máximos, ocorrendo em mesmos instantes. No entanto, o valor absoluto das tensões geradas quando se consideram propriedades dependentes da temperatura é superior ao valor absoluto para propriedades constantes à temperatura ambiente.

Os valores calculados conforme a condição (I) são de 37% a 41% superiores àqueles calculados conforme a condição (II)

Estas características permitem determinar que a utilização de propriedades medidas à temperatura ambiente é suficiente para a identificação de posições críticas para o acúmulo de tensões, e os instantes onde as máximas tensões ocorrem, e neste sentido, não é necessária uma vasta caracterização de propriedades quando se deseja apenas a identificação destes parâmetros. No entanto, quando é necessário que se identifique o valor absoluto das tensões geradas dentro das peças, para a determinação da ocorrência ou não de fratura, por exemplo, torna-se imperativo a utilização de propriedades medidas em função da temperatura. Deve-se ressaltar que esta análise considerou todas as propriedades utilizadas pela técnica de elementos finitos em função da temperatura (E, a, k, C, s). Uma avaliação mais criteriosa deve ser desenvolvida, determinando-se quais dentre estas propriedades tem um maior impacto no cálculo das tensões, focando a medição em laboratório somente para as propriedades mais pertinentes.

CONCLUSÕES

Destacam-se as seguintes conclusões:

i. O método de elementos finitos é uma técnica adequada para a simulação de perfis termomecânicos devido a curvas de aquecimento, permitindo a identificação de regiões de concentração de tensões ao longo do período de aquecimento;

ii. O cálculo de perfis térmicos através da técnica de elementos finitos deve ainda ser aprimorado considerando-se condições mais reais de transferência de calor, de maneira a proporcionar um melhor ajuste para as temperaturas em posições mais distantes da face quente;

iii. A utilização de propriedades medidas em função da temperatura só é necessária nos casos onde se pretende conhecer os reais esforços de fratura dentro do corpo em análise, já que a identificação de regiões críticas é possível somente com as propriedades medidas à temperatura ambiente;

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a SAFFRAN-linco LTDA e ao Grupo de Engenharia de Microestrutura de Materiais ¾ GEMM e à FAPESP, pelo apoio dado ao desenvolvimento deste trabalho, e ainda ao Engo Maurício Gomes da Silva, pela realização dos ensaios de propriedades em função da temperatura.

REFERÊNCIAS

(Rec. 14/06/01, Ac. 15/06/01)

Artigo premiado no 45o Congresso Brasileiro de Cerâmica,Florianópolis, SC (2001)

  • [1] S. N. Silva, P. A. Peixoto, P. R. S. Delgado, V. C. Pandolfelli, "Análise do Acidente da Abóbada do Forno #4 da STQ-II ž Caracterização das Âncoras Refratárias", Relatório Interno CSN SGPD-0004/93, 26p, Volta Redonda, RJ, Brasil, 1993.
  • [2] The Energy Technology Support Unit. Continuous Steel Reheating Furnaces: Specification, Design and Equipment. Good Practice Guide Series, v. 76, Energy Efficiency Office, Oxfordshire, Inglaterra, 1994.
  • [3] Y. Kanki, The Basic Theory of Finite Element Method, Taikabutsu Overseas 12, 4 (1992),3-13.
  • [4] C. E. Knight, "Heat Transfer and Thermal Stresses", in The Finite Element Method in Mechanical Design, PWS Publishing Co. (12992) 280-308.
  • [5] COSMOS/M 1.70A Guide, Vol. II (Basic Theory for the Finite Element Method), 1993.
  • [6] SAFFRAN-linco LTDA, Catálogos e Folhas de Dados Técnicos, 1997.
  • [7] H. Hübner, H. Schuhbauer, Experimental Determination of Fracture Mechanics Stress Intensity Calibration in Four-Point Bending, Engineering Fracture Mechanics, Pergamon Press, 9 (1977) 403-410.
  • [8] A. Nishikawa, Technology of Monolithic Refractories, Plibrico Japan Co Ltd., (1984).295.
  • [9] R. Pereira, "Avaliação termomecânica de cerâmicas refratárias utilizando simulações computacional e laboratorial", Diss. Mestrado, PPG-CEM, UFSCar (2001).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Ago 2002
  • Data do Fascículo
    Jun 2002

Histórico

  • Aceito
    15 Jun 2001
  • Recebido
    14 Jun 2001
Associação Brasileira de Cerâmica Av. Prof. Almeida Prado, 532 - IPT - Prédio 36 - 2º Andar - Sala 03 , Cidade Universitária - 05508-901 - São Paulo/SP -Brazil, Tel./Fax: +55 (11) 3768-7101 / +55 (11) 3768-4284 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: ceram.abc@gmail.com