Acessibilidade / Reportar erro

Evolução microestrutural da cerâmica KSr2Nb5O15 dopada com CuO:B2O3

Microstructural development of KSr2Nb5O15 doped with CuO:B2O3

Resumos

A evolução microestrutural da cerâmica KSr2Nb5O15 dopada com CuO:B2O3 foi investigada. Os materiais cerâmicos foram sinterizados em duas etapas: aquecimento até 550 °C por 3 h e, em seguida, aquecimento até 1200 °C por 5 h. A microestrutura das cerâmicas foi investigada por microscopia eletrônica de varredura (MEV). As micrografias da cerâmica, na ausência de dopantes, revelaram uma microestrutura porosa constituída de grãos pequenos com diâmetro médio 1,09 μm e grãos maiores com diâmetro médio 2,33 μm, enquanto os sistemas cerâmicos dopados com CuO:B2O3 apresentaram uma microestrutura com grãos maiores, que estão circundados por grãos menores de formas irregulares. O sistema cerâmico dopado com 0,5% CuO + 0,5% B2O3 apresenta evidências de formação de fase secundária segregada nos contornos de grão. Contudo, em função do aumento do teor de óxido de boro, não é mais perceptível fase secundária nas micrografias. Defeitos de contorno do tipo maclas são também evidenciados nas micrografias dos sistemas dopados com CuO:B2O3. A distribuição de tamanho de grãos também foi avaliada, apresentando uma distribuição do tipo bimodal. Os valores médios de diâmetros de grão foram obtidos a partir das micrografias e, com esses dados foram construídos os histogramas da distribuição de tamanho de grãos em função da freqüência. A análise de distribuição de tamanho de grão mostrou um aumento no tamanho médio dos grãos em função dos dopantes e uma distribuição mais uniforme em relação às demais composições para a cerâmica KSr2N b5O15 dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3.

KSr2Nb5O15; óxido de cobre; óxido de boro; sinterização por fase líquida; evolução microestrutural


The effect of CuO:B2O3 on the microstructural development of KSr2Nb5O15 was investigated. The materials were sintered in two stages: heating to 550 °C for 2 h and soon afterwards heating to 1200 °C for 5 h. The microstructure of the ceramics was investigated by scanning electron microscopy (SEM). The SEM micrographs of the ceramic without dopants revealed a porous microstructure with small grains with 2.33 μm average size and larger grains of 1.09 μm average size. The doped materials presented a porous microstructure with larger grains, which are surrounded by smaller grains of irregular shapes. There is evidence of secondary phase formation in the ceramic system doped with 0.5wt.%t CuO + 0.5wt.% B2O3. However, as the amount of boron oxide increased, there are no secondary phases. Twin boundaries are also evidenced in the ceramic systems doped with CuO:B2O3. The grain size distribution was also evaluated, presenting a distribution of the bimodal type. The values of the average grain diameter of grains were obtained. The analysis of grain size distribution showed that there was an increase in the mean grain size as a function of dopants and a more uniform grain size distribution relative to the other compositions for the KSN ceramic doped with 0.5 wt.% CuO + 2.0 wt.% B2O3.

KSr2Nb5O15; copper oxide; boron oxide; liquid phase sintering; microstructural evolution


Evolução microestrutural da cerâmica KSr2Nb5O15 dopada com CuO:B2O3

Microstructural development of KSr2Nb5O15 doped with CuO:B2O3

D. C. VieiraI; A. M. O. A. Balan; R. M. DuranII

IDepartamento de Física, Química e Biologia - DFQB, Faculdade de Ciências e Tecnologia - FCT, Universidade Estadual Paulista - UNESP, R. Roberto Simonsen 305, C.P. 467, Presidente Prudente, SP 19060-900. dcvieirafct.unesp.br

IIUniversidad de Oriente, Facultad de Ingeniería Química, Av. las Americas, Santiago de Cuba, Cuba

RESUMO

A evolução microestrutural da cerâmica KSr2Nb5O15 dopada com CuO:B2O3 foi investigada. Os materiais cerâmicos foram sinterizados em duas etapas: aquecimento até 550 °C por 3 h e, em seguida, aquecimento até 1200 °C por 5 h. A microestrutura das cerâmicas foi investigada por microscopia eletrônica de varredura (MEV). As micrografias da cerâmica, na ausência de dopantes, revelaram uma microestrutura porosa constituída de grãos pequenos com diâmetro médio 1,09 μm e grãos maiores com diâmetro médio 2,33 μm, enquanto os sistemas cerâmicos dopados com CuO:B2O3 apresentaram uma microestrutura com grãos maiores, que estão circundados por grãos menores de formas irregulares. O sistema cerâmico dopado com 0,5% CuO + 0,5% B2O3 apresenta evidências de formação de fase secundária segregada nos contornos de grão. Contudo, em função do aumento do teor de óxido de boro, não é mais perceptível fase secundária nas micrografias. Defeitos de contorno do tipo maclas são também evidenciados nas micrografias dos sistemas dopados com CuO:B2O3. A distribuição de tamanho de grãos também foi avaliada, apresentando uma distribuição do tipo bimodal. Os valores médios de diâmetros de grão foram obtidos a partir das micrografias e, com esses dados foram construídos os histogramas da distribuição de tamanho de grãos em função da freqüência. A análise de distribuição de tamanho de grão mostrou um aumento no tamanho médio dos grãos em função dos dopantes e uma distribuição mais uniforme em relação às demais composições para a cerâmica KSr2N b5O15 dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3.

Palavras-chave: KSr2Nb5O15, óxido de cobre, óxido de boro, sinterização por fase líquida, evolução microestrutural.

ABSTRACT

The effect of CuO:B2O3 on the microstructural development of KSr2Nb5O15 was investigated. The materials were sintered in two stages: heating to 550 °C for 2 h and soon afterwards heating to 1200 °C for 5 h. The microstructure of the ceramics was investigated by scanning electron microscopy (SEM). The SEM micrographs of the ceramic without dopants revealed a porous microstructure with small grains with 2.33 μm average size and larger grains of 1.09 μm average size. The doped materials presented a porous microstructure with larger grains, which are surrounded by smaller grains of irregular shapes. There is evidence of secondary phase formation in the ceramic system doped with 0.5wt.%t CuO + 0.5wt.% B2O3. However, as the amount of boron oxide increased, there are no secondary phases. Twin boundaries are also evidenced in the ceramic systems doped with CuO:B2O3. The grain size distribution was also evaluated, presenting a distribution of the bimodal type. The values of the average grain diameter of grains were obtained. The analysis of grain size distribution showed that there was an increase in the mean grain size as a function of dopants and a more uniform grain size distribution relative to the other compositions for the KSN ceramic doped with 0.5 wt.% CuO + 2.0 wt.% B2O3.

Keywords: KSr2Nb5O15, copper oxide, boron oxide, liquid phase sintering, microstructural evolution.

INTRODUÇÃO

Óxidos com estrutura tungstênio bronze (TTB) são, nos dias de hoje, muito investigados devido aos altos valores de constante dielétrica, uma polarização alta e propriedades piezelétricas [1-4]. Um óxido pertencente a esta classe que tem atraído bastante atenção é o niobato de estrôncio e potássio (KSr2Nb5O15, denominado KSN). No entanto, esses materiais requerem em geral uma alta temperatura de sinterização ou tecnologias novas de processamento [2, 3]. A temperatura comum de sinterização do óxido KSN está entre 1300 e 1550 °C [2]. Dentro deste contexto, um dos objetivos da pesquisa envolvida neste trabalho foi o desenvolvimento de tecnologia de processamento simples para obtenção de cerâmicas KSN densas em temperaturas inferiores à temperatura de sinterização reportada. Além de uma temperatura inferior de processamento, busca-se também manter as propriedades específicas deste óxido ou, de preferência, melhorá-las. Desta forma, a sinterização via fase líquida pode ser vantajosa, pois é um método bastante utilizado na densificação de diversos materiais metálicos ou cerâmicos [5, 6].

Os dopantes selecionados para o processo de sinterização da cerâmica KSN foram o óxido de cobre II (CuO) e óxido de boro (B2O3). A adição de íons cobre aumenta a sinterabilidade de diversos materiais cerâmicos e ainda as propriedades elétricas também são otimizadas [7-9]. A cerâmica MgTiO3 - SrTiO3 dopada com CuO tem um aumento na densidade em função do aumento do teor do dopante, enquanto que o fator de qualidade (Qf) decresce para as composições com teor de CuO acima de 4% (relação massa) [9]. O B2O3 é um excelente formador de cadeia vítrea e também está sendo utilizado como promotor de sinterização de materiais cerâmicos via formação de fase líquida ou fase líquida transiente [8, 10]. Resultados preliminares do efeito dos dopantes no processo de sinterização da cerâmica KSN mostraram que o CuO é eficiente no processo de sinterização da cerâmica KSN, porém introduz a fases secundárias, enquanto que o B2O3 é ineficiente em diversas condições investigadas [11]. Como CuO é efetivo no processo de densificação da cerâmica KSN e o óxido de boro é um excelente formador de cadeia vítrea, visando então a obtenção de cerâmicas KSN com alta densidade, CuO:B2O3 foi investigado como promotor de sinterização.

O crescimento de grãos é o processo no qual o tamanho do grão de um material policristalino aumenta com tempo, devido à redução na energia total por unidade de volume [12, 13]. Por outro lado, "Ostwald ripening" é definido como o processo em que as partículas grandes crescem, enquanto que as partículas menores reduzem o seu tamanho e desaparecem. Átomos das partículas menores devem difundir e aderir às partículas maiores e, portanto, grãos maiores crescem em detrimento dos grãos menores [12]. Na maioria dos materiais cerâmicos o crescimento de grãos pode afetar tanto as propriedades mecânicas quanto as propriedades elétricas. Buscando uma informação quantitativa, a análise de distribuição de tamanho de grãos para as diversas composições investigadas também foi realizada, pois o tamanho de grão médio é um parâmetro que fornece uma informação fundamental sobre a evolução microestrutural [14]. Além disso, o crescimento de grãos heterogêneo pode afetar as propriedades dielétricas de alguns materiais cerâmicos [15-17]. Desta forma, os objetivos específicos deste trabalho foram avaliar o efeito dos dopantes (CuO:B2O3) no processo de densificação da cerâmica KSN e avaliar a evolução microestrutural da cerâmica KSN em função da concentração dos dopantes.

MATERIAIS E MÉTODOS

A fase cerâmica foi processada por mistura mecânica de óxido em moinho de alta eficiência. A CBMM, Araxá, MG, forneceu o óxido de nióbio (Nb2O5.5H2O); os outros percussores (carbonatos de estrôncio e de potássio) e os aditivos de sinterização (CuO e B2O3) são reagentes de grau analítico. Os precursores foram pesados de acordo com a estequiometria do óxido KSr2Nb5O15 e moídos em moinho de alta eficiência a 1200 rpm por 5 h em álcool isopropílico. Após moagem, os pós foram secos a 105 °C e desaglomerados em almofariz. A calcinação do pó da fase KSN foi realizada em duas etapas: ciclo térmico desde a temperatura ambiente até 350 °C, com uma taxa de aquecimento de 15 °C/min e patamar de 120 min; taxa de aquecimento de 20 °C/min até 1250 °C com patamar de 10 h. O ciclo completo da calcinação foi feito sob atmosfera de oxigênio e os pós foram resfriados no forno até a temperatura ambiente.

As composições das pastilhas dos experimentos de sinterização foram preparadas da seguinte forma: após pesagem dos materiais nas respectivas proporções, adicionou-se álcool isopropílico PA e as misturas dos materiais foram colocadas em um banho ultra-sônico por 25 min. Posteriormente, as suspensões dos pós foram vertidas em placas de Petri e secadas em estufa a 105 °C. Os pós foram desaglomerados em almofariz e foram conformadas pastilhas (10,0 mm x 1,91 mm) com as seguintes composições em massa: KSN sem dopante, KSN dopada com 0,5% CuO + 0,5% B2O3 (relação 1:1); KSN dopada com 0,5% CuO + 1,0% B2O3 (1:2); e KSN dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3 (1:4). As pastilhas foram prensadas a 62 MPa. Os materiais foram sinterizados nas seguintes condições: aquecimento até 550 °C a 3 °C/min e patamar de 3 h; em seguida, aquecimento até 1200 °C a 5 °C/min durante 5 h ao ar.

A densidade aparente (ρa) e a porosidade aparente (εa) dos materiais sinterizados foram determinadas de acordo com o princípio de Archimedes, utilizando água como fluido. A densidade aparente é definida como a massa do sólido por unidade de volume, descontando assim o volume dos poros abertos existentes nos materiais. A porosidade aparente considera os poros abertos. Secções transversais das pastilhas após polimento e tratamento térmico (1150 °C/5 min, 10°C/min) foram analisadas em um microscópio eletrônico de varredura Zeiss DSM 940A. Os dados de tamanho de grãos foram obtidos a partir das micrografias MEV com aumento de 500x com uma ferramenta "medir ou contar objetos" do programa Image-Pro Plus 4.0. O número de grãos contados foi 500 em todas as amostras e como os grãos são irregulares no seu formato, foi tomado como base o comprimento entre as extremidades de cada grão, conhecido como diâmetro de Ferret [18]. A partir desses dados foram construídos os histogramas de distribuição de tamanhos de grãos, os quais foram ajustados a uma distribuição de erro normal ou gaussiana. Essa é a distribuição mais importante de probabilidade para análises estatísticas de dados [19]. A variação dos grãos dos materiais dopados em relação à cerâmica KSN foi determinada a partir da seguinte equação:

na qual Dg é o diâmetro do grão.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Sinterização da cerâmica KSN dopada com CuO e B2O3

Os resultados de sinterização mostraram que a cerâmica KSN sem dopante tem uma densidade aparente de 3,79 g/cm3, ou seja, 76% em relação à densidade teórica (densidade teórica 4,98 g/cm3) e uma porosidade aparente de 27%. As cerâmicas dopadas têm uma retração linear superior e uma baixa porosidade aparente em relação à cerâmica KSN pura. Porém, a densidade aparente aumentou apenas quando a KSN foi dopada com 0,5% CuO + 0,5% B2O3 (4,25 g/cm3) e, para as demais composições houve uma diminuição no valor da densidade aparente em relação ao material dopado com 0,5% CuO + 0,5% B2O3. Na cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 1,0% B2O3 a densidade aparente obtida foi 4,13g/cm3. O material dopado com 0,5% CuO + 2,0% B2O3 tem uma densidade aparente 3,41 g/cm3, apenas 68,5% em relação à densidade teórica da KSN.

A diminuição da densidade desses materiais dopados é um comportamento anômalo. Pode-se postular que este comportamento é devido à presença de fases secundárias com valores de densidade inferiores ao da KSN. Outra explicação pode ser fundamentada em erros experimentais, por exemplo, o tamanho das amostras, presença de poros fechados. Contudo, as densidades dos materiais foram determinadas também através dos parâmetros geométricos das amostras e, em ambas as metodologias, as curvas mostraram a mesma tendência. É intrigante que se observa uma diminuição notável na densidade da cerâmica dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3 e nesta composição não é perceptível a formação de fases secundárias, conforme a Fig. 1d. Ainda, é pertinente colocar que a estrutura cristalina da KSN (TTB) permite a inserção de diversos íons em seus sítios cristalográficos [20]. Pode-se especular então que o cobre, mais provável como Cu2+, esteja ocupando um desses sítios, justificando assim valores diferentes de densidade encontrados nos materiais dopados.


Outros pesquisadores que estudaram outra cerâmica piezelétrica com a estequiometria [Lix(Na0,5K0,5)1-x]NbO 3 também constataram que houve um aumento na densidade até uma certa composição. A densidade da cerâmica aumentou conforme o aumento do teor de Li e depois houve uma diminuição nos valores de densidade. Esses pesquisadores atribuíram a presença de uma nova fase no sistema com uma densidade inferior ao material cerâmico puro [21].

Outra característica dos materiais obtidos neste trabalho são as suas cores. A cerâmica KSN pura é branca e o pó da fase KSN tem uma cor amarelo pálido. Já os materiais dopados apresentam uma cor esverdeada. Os resultados discutidos acima estão apresentados na Tabela I.

A Fig. 1 ilustra-se as micrografias obtidas por MEV da cerâmica KSN sem dopante e dos materiais dopados. A microestrutura da cerâmica KSN (Fig. 1a) é constituída de grãos de tamanhos irregulares (grandes, médios e pequenos) e poros, e não há poros fechados. Ocorreu o crescimento de grãos sem atingir uma alta densidade, talvez o processo denominado "Ostwald ripening" também tenha ocorrido, pois estes mecanismos podem ocorrer de forma simultânea, em especial nos materiais policristalinos multifásicos [12]. A Fig. 1b ilustra a micrografia MEV da cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 0,5% B2O3. Há o desenvolvimento de uma microestrutura com grãos maiores, que estão circundados por grãos menores de formas irregulares. Observa-se ainda a formação de um tipo de grão muito grande (~ 79 μm destacado com uma flecha na micrografia inserida à direita na parte superior) e esse tipo de grão contém poros fechados. No entanto, a maior parte da porosidade está localizada entre ou nas junções dos grãos. Nesta composição observa-se a formação de fase (s) secundária (s) nos contornos de grão. A Fig. 1c ilustra a micrografia da cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 1,0% B2O3. A microestrutura desenvolvida é similar à do material dopado com 0,5% CuO + 0,5% B2O3 e também apresenta os grãos grandes na ordem de 80 μm. Porém, não se observa mais a formação de fase secundária nos contornos de grão. A mesma constatação é feita para a cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3 (Fig. 1d).

Defeitos do tipo contornos de macla são observados em cristais supercondutores, ferroelásticos, ferroelétricos. Esse defeito pode ser considerado como um tipo especial de contorno de grãos, no qual existe uma simetria na forma de espelho. Ou seja, os átomos de um lado do contorno estão localizados em uma posição que é a posição refletida do outro lado [22]. Esse tipo de defeito pode ser resultado de deslocamento atômico produzido por tensões de cisalhamento ou tratamento térmico. Grãos maclados e ângulos retos observados nas micrografias dos sistemas cerâmicos dopados com CuO:B2O3 evidenciam a formação de defeito do tipo contornos de macla. Este tópico está sendo investigado via microscopia de força atômica (MFA) e será abordados em trabalhos posteriores.

O óxido de boro tem um baixo ponto de fusão (300-700 °C) [23] e o óxido de cobre II também deve fundir nesta faixa, pois a literatura reporta que a fusão do CuO ocorre em torno de 1148 °C [24, 25]. Assim, pode-se inferir que há formação de fase líquida que assiste ao processo de sinterização da cerâmica KSN. Contudo, para as composições que não se observa a formação de fase secundária devem ocorrer outros fatores além de formação de fase líquida que influenciam o mecanismo de densificação.

Para o sistema cerâmico KSN dopada com 0,5% CuO + 0,5% B2O3, o mais provável que ocorra a inserção de íons cobre e boro na estrutura cristalográfica, formando então uma nova estrutura no sistema. Para as composições com um teor maior de óxido de boro deve ocorrer uma reação química entre o óxido de cobre e o óxido de boro. A reação entre os compostos fundamenta-se em dois princípios: B2O3 é um formador de cadeia vítrea enquanto que CuO é considerado um modificador de cadeia; nas propriedades específicas de cada elemento, pois o cobre e o boro possuem estrutura cristalina e raio iônico diferentes; o cobre (Cu) tem raio iônico de 0,73 Å e tem uma estrutura cúbica de face centrada, enquanto que o boro (B) tem um raio iônico de 0,25 Å e uma estrutura romboédrica. Assim, para as composições que não é perceptível formação de fase secundária nas micrografias, a fase líquida formada a partir da reação CuO e B2O3 deve ter uma molhabilidade melhor e ainda uma viscosidade menor. Algumas hipóteses são colocadas: a fase vítrea formada pode estar contida nos contornos e/ou nas junções dos grãos como um filme fino; a formação de uma fase vítrea líquida transiente em temperatura inferior que beneficia o processo de densificação, mas que ocorre a vaporização desta fase durante o aquecimento até 1200 °C.

Outra característica dos materiais dopados com CuO:B2O3 é a formação de grãos muito grande na ordem de 80 μm como mostrado na Fig. 1b. Outros estudos devem ser realizados visando à compreensão dos fenômenos envolvidos no processo de densificação da cerâmica KSN dopada com óxido de cobre II e óxido de boro.

Evolução microestrutural da cerâmica KSN dopada com CuO e B2O3

Os dados de tamanho de grãos foram obtidos a partir das micrografias com aumento 500x e a partir desses dados foram construídos os histogramas da distribuição de tamanho de grãos em função da freqüência para todas as composições investigadas. Os sistemas cerâmicos investigados ajustam-se à resultante de duas gaussianas, pois os grãos apresentam duas faixas de tamanhos com uma distribuição uniforme (pico P1 e pico P2).

A Fig. 2 mostra o histograma da cerâmica KSN. A primeira faixa corresponde a 25% dos grãos (pico P1), com um diâmetro promédio de 1,09 μm e uma variância (σ2) de 0,098. A segunda faixa corresponde a 75% dos grãos (pico P2), com um diâmetro promédio de 2,33 μm e uma variância de 0,452. Em ambos os casos a dispersão (variância) é pequena, indicando que os tamanhos de grãos para cada intervalo são homogêneos seguindo uma distribuição do tipo bimodal.


A Fig. 3 mostra o histograma da distribuição de tamanhos de grãos da cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 0,5% B2O3. A primeira faixa contém 29,5% das partículas (pico P1) com distribuição de tamanhos com valor promédio de 2,01 μm e uma variância de 0,124. Enquanto que a segunda faixa contém 70,5% das partículas (pico P2), apresenta uma distribuição de tamanhos com valor promédio de 4,00 μm e uma variância de 5,80. Os grãos compreendidos na faixa de tamanhos menores apresentam uma variância baixa, indicando que seus tamanhos são homogêneos. Os grãos com tamanhos maiores apresentam uma dispersão elevada, portanto, são menos homogêneos. Os grãos pequenos aumentam seu diâmetro promédio em relação à cerâmica KSN pura em 85,16% e a dispersão no tamanho dos grãos ainda é homogênea (σ2 = 0,124). Já os grãos na faixa de tamanhos maiores apresentam um aumento no diâmetro promédio em relação à cerâmica KSN sem aditivo de 71,95% e, há um aumento considerável na dispersão dos tamanhos de grãos, pois a variância é alta (σ2 = 5,80). Portanto, houve crescimento de grão descontínuo, ou seja, os grãos maiores têm uma taxa de crescimento muito mais rápida em relação aos grãos menores presente na matriz.


O histograma da distribuição de tamanho de grãos em função da freqüência da cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 1,0% B2O3 está mostrado na Fig. 4. A primeira faixa contém 29,35% das partículas (pico P1) com uma distribuição de tamanhos com valor promédio de 1,98 μm e variância de 0,356. A segunda faixa contém 70,65% das partículas (pico P2) com uma distribuição de tamanhos com valor promédio de 4,35 μm e variância de 10,93. Comparando com o material anterior, ou seja, KSN dopada com 0,5% CuO + 0,5% B2O3 quase não se observa uma variação nos tamanhos de grãos promédios dos grãos menores; em relação aos grãos maiores é menos homogênea, pois apresenta uma dispersão maior nos tamanhos de grãos. Indicando que a taxa de crescimento dos grãos maiores são ainda mais alta em relação à taxa de crescimento do sistema cerâmico discutido na Fig. 3.


A Fig. 5 mostra o histograma da distribuição de tamanho de grãos em função da freqüência da cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3. Quando se aumenta o teor de B2O3 para 2%, os dados de distribuição de tamanhos se ajustam de forma satisfatória à resultante de duas gaussianas e nesta composição as partículas apresentam também tamanhos grãos maiores do que a cerâmica KSN. A primeira faixa contém 49,09% das partículas (pico P1) com uma distribuição de tamanhos com valor promédio de 1,93 μm e variância de 0,887. A segunda faixa contém 50,90% das partículas (pico P2) com uma distribuição de tamanhos com valor promédio de 3,72 μm e variância de 3,08. Os grãos de tamanhos menores aumentaram seu diâmetro promédio em 77,75% e os de tamanhos maiores em 59,90% em relação à cerâmica KSN pura. Os grãos apresentam uma boa homogeneidade nos seus tamanhos e a relação entre o número de grãos pequeno em relação ao número de grãos maiores é a maior em todos os materiais investigados. Como se observa na Fig. 5, o pico resultante apresenta uma ligeira assimetria e uma largura não muito grande, indicando assim que tamanhos de grãos mais homogêneos foram obtidos. Este material apresenta também uma distribuição do tipo bimodal.


A Tabela II mostra os principais parâmetros da análise da distribuição de grãos dos materiais investigados que foram discutidos acima. Em geral, houve um aumento no tamanho dos grãos em função dos dopantes e esta análise mostrou que a cerâmica KSN dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3 (KSN 1:4) tem uma distribuição mais uniforme em relação as demais composições. Pois, tanto os grãos de tamanhos menores (Pico1) têm uma variância baixa (0,89), assim como os grãos maiores (Pico2) apresentam também uma variância baixa (3,08). Assim, esta composição apresenta duas características desejáveis: (i) não se observa fase secundária na microestrutura e (ii) apresenta uma distribuição de tamanhos de grãos mais uniforme em relação aos demais materiais.

CONCLUSÕES

Os materiais dopados com razões CuO:B2O3 apresentaram maior grau de sinterabilidade, pois apresentam maior retração linear, e ainda o valor de porosidade aparente é muito menor em relação à cerâmica KSN pura. As fotomicrografias MEV confirmam esta conclusão. A cerâmica KSN sem dopante revelou uma microestrutura composta de grãos coalescidos e pequenos, a cerâmica KSN pura é um material de alta porosidade. Os materiais dopados apresentaram microestrutura com grãos de diâmetro médio maior, circundados por grãos menores com formas e tamanhos irregulares. A análise de distribuição de tamanhos de grãos dos materiais dopados ajustam-se a uma distribuição bimodal típica de crescimento de grãos descontínuos. E houve um aumento no tamanho dos grãos em função dos dopantes e quando a cerâmica KSN foi dopada com 0,5% CuO + 2,0% B2O3 uma distribuição mais uniforme em relação as demais composições foi obtida.

AGRADECIMENTOS

Às agências de fomento FAPESP (Proc. 03/05827-9), CAPES e CNPq e à Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, Araxá, MG. Aos coordenadores: Prof. Dr. M. A. L. Nobre e Profa. Dra. S. Lanfredi pelo uso da infra-estrutura. Ao Prof. Dr. E. R. Leite, Departamento de Química, LIEC, Universidade Federal de S. Carlos. Ao técnico Rorivaldo, LIEC, pelas imagens de microscopia eletrônica de varredura.

(Rec. 27/11/2007, Rev. 10/07/2008, Ac. 02/02/2009)

  • [1] S. Lanfredi, L. R. Trindade, A. R. Barros, N. R. Feitosa, M. A. L. Nobre, Cerâmica 51, 318 (2005) 151.
  • [2] B. Tribotté, G. Desgardin, Mater. Sci. Eng. B 40 (1996) 127.
  • [3] R. Wang, R. Xie, T. Sekiya, Y. Shimojo, Mater. Res. Bull. 39 (2004) 1709.
  • [4] F. L. Zabotto, M. Venet, J. A. Eiras, D. Garcia, Cerâmica 52, 321 (2006) 76.
  • [5] V. A. Izhevskyi, L. A. Genova, J. C. Bressiani, A. H. A Bressiani, Cerâmica 50, 315 (2004) 261.
  • [6] R. M. German, I. Smid, L. G. Campbell, J. Keane, R. Toth, Int. J. Refract. Hard Mater. 23 (2005) 267.
  • [7] D. Kim, W. K. H. Ko, K. S. Hong, J. Am. Ceram. Soc. 84, 6 (2001) 1286.
  • [8] B. Li, Z. Yue, L. Li, J. Zhou, Z. Gui, J. Mater. Sci. : Mater. Electronics 13 (2002) 415.
  • [9] W. W.Cho, K. Kakimoto, H. Ohsato, Mater. Sci. Eng. B 121 (2005) 48.
  • [10] S. F. Wang, C. C. Chung, C. H. Wang, J. Am. Ceram. Soc. 85, 6 (2002) 1619.
  • [11] D. C. Vieira, Rel. FAPESP Proc. 03/05827-9, 11-2005/12 2006.
  • [12] Y. M. Chiang, D. P. Birnie, W. D. Kingery, Physical Ceramics: Principles for Ceramic Science and Engineering, 2nd Ed., John Wiley & Sons, New York, EUA (1997) p.522.
  • [13] M. N. Rahaman, Ceramic processing and sintering, 2nd Ed., Taylor & Francis, New York, USA (2003) p. 875.
  • [14] I. Nettleship, R. J. Mcafee, W. S. Slaughter, J. Am. Ceram. Soc. 85, 8 (2002) 1954.
  • [15] N. Ichinose, T. Shimada, J. Eur. Ceram. Soc. 26 (2006) 1755.
  • [16] C. L. Huang, & K. H. Chiang, Mater. Res. Bull. 39 (2004) 1701.
  • [17] H. Y. Lee, R. Freer, J. Appl. Phys. 81, 1 (1997) 1.
  • [18] R. H. Perry, Perry´s Chemical Engineer´s Handbook, 7th Ed., McGraw-Hill (1997).
  • [19] P. R. Bevington, Data Reduction and Error Analysis for the Physical Sciences, McGraw-Hill Book Co., New York, USA (1969).
  • [20] A. Simon, J. Ravez, C. R. Chimie 9 (2006) 1268.
  • [21] Y. Guo, K. Kakimoto, H. Ohsato, Appl. Phys. Lett. 85 (2004) 4121.
  • [22] D. R. Askeland, The Science and Engineering of Materials, PWS Publ. Co., Boston, USA (1994) p. 812.
  • [23] H. Lee, R. F. Speyer, J. Am. Ceram. Soc. 86 (2003) 1468.
  • [24] O. Scarlat, M. Zaharescu, J. Thermal Analysis Calorimetry 68 (2002) 851.
  • [25] R. S. Nasar, M. Cerqueira, E. Longo, J. A. Varela, Ceram. Int. 30 (2004) 571.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Ago 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2009

Histórico

  • Aceito
    10 Jul 2008
  • Recebido
    27 Nov 2007
Associação Brasileira de Cerâmica Av. Prof. Almeida Prado, 532 - IPT - Prédio 36 - 2º Andar - Sala 03 , Cidade Universitária - 05508-901 - São Paulo/SP -Brazil, Tel./Fax: +55 (11) 3768-7101 / +55 (11) 3768-4284 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: ceram.abc@gmail.com