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Síntese e caracterização de compósito magnético nanoestruturado contendo óxido de manganês para remoção de íons Cd(II) do meio aquoso

Synthesis and characterization of a magnetic nanostructured composite containing manganese oxide for removal of Cd (II) from aqueous medium

Resumos

O tratamento de efluentes contendo cádmio é de grande interesse devido à persistência desse contaminante no meio ambiente e às graves doenças que pode causar ao homem. No presente trabalho, foi utilizado o compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 como adsorvente do íon cádmio (II) em meio aquoso. O material adsorvente foi sintetizado e caracterizado segundo as técnicas de difração de raios X (DRX), espectroscopia Raman, microscopia eletrônica de transmissão e sorção de N2 (BET). Ênfase foi dada à quantificação das fases do compósito pela análise de DRX combinada ao método Rietveld. O estudo de adsorção foi realizado variando o pH do meio e a concentração do íon cádmio em solução. A análise dos resultados possibilitou verificar que a remoção de Cd(II) utilizando compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 em meio aquoso é dependente do pH duplicando a medida que o pH varia de 3 para 7. O estudo de imobilização do íon contaminante em solução apresentou valores significativos de capacidade máxima de adsorção, de 12,3 mgCd/g no pH 6 e 13,6 mgCd/g no pH 7, indicando uma remoção de até 98% para concentrações baixas do íon, sugerindo que o adsorvente apresenta elevado potencial para remoção de Cd(II) em meio aquoso.

adsorção; compósito magnético; cádmio


The treatment of wastewater containing cadmium is of great interest because of its persistence in the environment and the serious diseases that it can cause to humans. In the present work, the magnetic composite Mn3O4/Fe3O4was used as adsorbent of cadmium ion in aqueous medium. The adsorbent material was synthesized and characterized according to the XRD, Raman, TEM and N2adsorption (BET) techniques. Emphasis was given to the quantification of the phases of the composite by XRD analysis combined with the Rietveld method. The adsorption study was carried out varying the aqueous medium pH and the concentration of cadmium ions in solution. The results show that the cadmium removal by the Mn3O4/Fe3O4magnetic composite in aqueous medium is pH-dependent duplicating as the pH varies from 3 to 7. The study of immobilization of the contaminant in solution showed significant amounts of adsorption, 12.3 mgCd/g at pH 6 and 13.6 mgCd/g at pH 7 indicating a removal of up to 98% for low ion concentrations, suggesting that the adsorbent has a high potential for removing Cd(II) in aqueous medium.

adsorption; magnetic composite; cadmium


Síntese e caracterização de compósito magnético nanoestruturado contendo óxido de manganês para remoção de íons Cd(II) do meio aquoso

Synthesis and characterization of a magnetic nanostructured composite containing manganese oxide for removal of Cd (II) from aqueous medium

A. P. HeitmannI, **angelamello@des.cefetmg.br; G. C. SilvaII; P. R. P. PaivaII; A. M. FerreiraI, II

ICEFET-MG-DEMAT, Av. Amazonas 5253, Nova Suíça, Belo Horizonte, MG 30421-169

IIInstituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Recursos Minerais, Água e Biodiversidade - INCT-CQUA, Av. Antônio Carlos 6627, Pampulha, Belo Horizonte, MG, 31270 901

RESUMO

O tratamento de efluentes contendo cádmio é de grande interesse devido à persistência desse contaminante no meio ambiente e às graves doenças que pode causar ao homem. No presente trabalho, foi utilizado o compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 como adsorvente do íon cádmio (II) em meio aquoso. O material adsorvente foi sintetizado e caracterizado segundo as técnicas de difração de raios X (DRX), espectroscopia Raman, microscopia eletrônica de transmissão e sorção de N2 (BET). Ênfase foi dada à quantificação das fases do compósito pela análise de DRX combinada ao método Rietveld. O estudo de adsorção foi realizado variando o pH do meio e a concentração do íon cádmio em solução. A análise dos resultados possibilitou verificar que a remoção de Cd(II) utilizando compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 em meio aquoso é dependente do pH duplicando a medida que o pH varia de 3 para 7. O estudo de imobilização do íon contaminante em solução apresentou valores significativos de capacidade máxima de adsorção, de 12,3 mgCd/g no pH 6 e 13,6 mgCd/g no pH 7, indicando uma remoção de até 98% para concentrações baixas do íon, sugerindo que o adsorvente apresenta elevado potencial para remoção de Cd(II) em meio aquoso.

Palavras-chave: adsorção, compósito magnético, cádmio.

ABSTRACT

The treatment of wastewater containing cadmium is of great interest because of its persistence in the environment and the serious diseases that it can cause to humans. In the present work, the magnetic composite Mn3O4/Fe3O4was used as adsorbent of cadmium ion in aqueous medium. The adsorbent material was synthesized and characterized according to the XRD, Raman, TEM and N2adsorption (BET) techniques. Emphasis was given to the quantification of the phases of the composite by XRD analysis combined with the Rietveld method. The adsorption study was carried out varying the aqueous medium pH and the concentration of cadmium ions in solution. The results show that the cadmium removal by the Mn3O4/Fe3O4magnetic composite in aqueous medium is pH-dependent duplicating as the pH varies from 3 to 7. The study of immobilization of the contaminant in solution showed significant amounts of adsorption, 12.3 mgCd/g at pH 6 and 13.6 mgCd/g at pH 7 indicating a removal of up to 98% for low ion concentrations, suggesting that the adsorbent has a high potential for removing Cd(II) in aqueous medium.

Keywords: adsorption, magnetic composite, cadmium.

INTRODUÇÃO

A aplicação de compósitos nanoestruturados nos processos de adsorção visando à remediação ambiental é um campo de interesse crescente, uma vez que a dimensão reduzida desses sistemas sólidos confere a eles uma série de propriedades físico-químicas peculiares que os diferem dos demais materiais. A pequena dimensão das partículas do adsorvente pode oferecer uma elevada área de superfície específica e melhor eficiência de transferência de massa. Combinando essa eficiência de transferência de massa com a utilização do processo de separação magnética, os compósitos nanoestruturados magnéticos possuem elevado potencial para serem aplicadas no sistema de adsorção, sobretudo para grandes volumes de efluentes [1, 2].

Adsorventes nanoestruturados baseados em óxidos de manganês têm sido amplamente investigados para adsorção de íons tóxicos como chumbo, cádmio, níquel e zinco do meio aquoso [3, 4]. Esses adsorventes destacam-se por elevada remoção desses íons quando comparada aos outros adsorventes, devido a sua elevada área superficial, estrutura microporosa com tamanho e forma dos poros bem definidos e os grupos funcionais OH capazes de reagir com os metais e outros íons especificamente. Além disso, o óxido de manganês é considerado um material de baixo custo e abundante no meio ambiente. A dimensão nanométrica dificulta a separação do adsorvente da fase aquosa, sendo assim, torna-se necessário combiná-lo com outros materiais no intuito de melhorar a separação sólido/líquido e potencializar o efeito adsorvente [5]. Combinando-se as características magnéticas dos óxidos de ferro e adsortivas dos óxidos de manganês nanoestruturados, podem-se obter materiais eficientes e de baixo custo voltados para o tratamento de águas residuais [6]. O compósito nanoestruturado magnético de Mn3O4/ Fe3O4 é uma classe relativamente nova de material que está sendo investigado na remoção de ânions e compostos orgânicos do meio aquoso [2, 7, 8]. Além de possuir elevado potencial de oxidação, o compósito se destaca por se apresentar como nanopartículas com propriedades magnéticas que facilitam a sua separação do meio aquoso após adsorção.

O cádmio está entre os elementos mais tóxicos encontrados na natureza sendo de grande interesse em estudos ambientais. O metal em questão é muito utilizado em processos industriais como na galvanoplastia, na produção de pigmentos, inseticidas e equipamentos eletrônicos, sendo tóxico em baixas concentrações causando sérios problemas de saúde [9]. A intoxicação por esse elemento provoca sintomas específicos, uma vez que o cádmio forma complexos estáveis com os grupos funcionais das enzimas, prejudicando o perfeito funcionamento do organismo, impedindo o transporte de substâncias essenciais ao corpo humano [10]. Com a crescente produção de efluentes é de fundamental importância o estudo de alternativas e o desenvolvimento de novas tecnologias de tratamento que sejam economicamente viáveis e atendam aos limites das legislações existentes [11, 12].

Dentro desse contexto, o objetivo geral do presente trabalho é sintetizar e caracterizar o compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 e avaliar seu potencial de adsorção para o íon Cd(II). O processo de separação magnética sólido-líquido pode viabilizar a aplicação deste compósito em larga escala para tratamento de grandes volumes de águas residuárias. Dentre as diversas técnicas de caracterização utilizadas, ênfase foi dada à difração de raios X combinada ao refinamento Rietveld que forneceu informações importantes como uma estimativa quantitativa das fases presentes no compósito e a estrutura do adsorvente incluindo os parâmetros de rede do material sintetizado.

MATERIAIS E MÉTODOS

Preparação do compósito magnético

O compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 foi sintetizado segundo o procedimento descrito por [2]. Para a preparação desse compósito, 1000 mL de água deionizada foi aerada por 1 h e colocada em contato com 45 mL de uma solução 1 mol/L de MnCl2.4H2O e 0,6 g de magnetita (Fe3O4) comercial (Sigma Aldrich < 5 µm). O pH da solução foi ajustado para 12 utilizando solução de 0,5 mol/L de KOH em um béquer de 2000 mL, sob agitação mecânica e aeração constantes por 30 min. Após a reação, a solução foi deixada em repouso por 10 min sobre uma placa imantada para garantir a total precipitação do compósito. O compósito foi lavado com água deionizada, seco em temperatura ambiente e macerado utilizando gral e pistilo de ágata.

Caracterização do compósito magnético

A caracterização do sólido foi feita por meio das técnicas de difração de raios X (DRX) e refinamento Rietveld, espectroscopia Raman, microscopia eletrônica de transmissão e sorção de nitrogênio para determinação da área superficial pelo método BET. A análise de DRX foi feita no equipamento Shimadzu SSX-550 Superscan. As análises foram conduzidas utilizando anodo de cobre (radiação Cukα, 35 kV/40 mA), velocidade do goniômetro 0,02° por passo em 2θ, com tempo de contagem de 5 s por passo e coletados de 10° a 90° em 2θ. A interpretação do difratograma foi efetuada por comparação com padrões do banco de dados PDF02 (ICDD 2003). Para o refinamento Rietveld foi utilizado o programa GSAS e a interface EXPGUI com a função de perfil pseudo-Voigt de Thompson-Cox-Hastings e a radiação de fundo ajustada pelo polinômio de Chebyschev. Foram refinados fator de escala, célula unitária, radiação de fundo, assimetria do perfil, parâmetros da largura total à meia-altura a partir dos parâmetros de alargamento instrumental obtidos com um padrão, posição atômica, deslocamentos atômicos isotrópicos e fatores de ocupação dos cátions.

Os espectros Raman foram coletados em equipamento Jobin Yvon Horiba LABRAN-HR800 equipado com um laser de hélio-neônio de 632,8 nm, 0,06 mW de potência, acoplado a um microscópio Olympus BX-41 equipado com lentes de aumento de 10, 50 e 100 vezes. Os espectros foram adquiridos em uma gama de freqüência 100-1100 cm-1 no tempo de aquisição de 60 s, e para aumentar a razão sinal/ruído, o número de aquisições foi 10.

A medida da área superficial específica do compósito magnético foi realizada pelo método BET através da adsorção de N2, em equipamento Nova 1000 Quantachrome. As amostras foram maceradas e degaseificadas, colocando-as em um tubo de vidro sob vácuo durante 24 h a 100 ºC. Após o resfriamento o tubo foi imerso em nitrogênio líquido, a amostra foi colocada sob vácuo novamente e submetida a valores crescentes de pressão de nitrogênio e, em cada etapa, foram registrados os valores de pressões iniciais e de equilíbrio e a temperatura.

As imagens de microscopia eletrônica de transmissão foram obtidas em equipamento Tecnai-G2-20-FEI 2006. O espectrômetro com energia dispersiva de raios X (EDS) ThermoNoram (Quest) foi utilizado para detecção elementar.

Avaliação da propriedade de separação magnética

Os ensaios de turbidez foram realizados com o intuito de verificar a turbidez do material em meio aquoso relacionando-a com a capacidade de separação magnética do compósito. Para isso, 1 g do compósito foi disperso em água, sob agitação constante durante 5 min. Em seguida, uma amostra sedimentou sob influência do campo magnético utilizando o ímã de neodímio e outra amostra sedimentou naturalmente por ação da gravidade. O turbidímetro digital portátil Digimed DM-TU foi utilizado para realizar leituras diretas da turbidez em NTU de ambas as dispersões no intervalo de tempo de 1 a 15 min durante a sedimentação.

Imobilização do cádmio

Nos experimentos de adsorção foi avaliado primeiramente, o efeito do pH na sorção dos íons cádmio. Os ensaios foram realizados com 0,1 g do compósito magnético em 50 mL de solução de Cd(NO3)2.4H2O com concentração de 20 mg/L e os valores de pH avaliados no ensaio foram 3, 4, 5, 6 e 7 ajustados com soluções de 0,5 mol/L HCl e 1 mol/L KOH. Os ensaios foram conduzidos sob agitação constante de 200 rpm a 25 °C em um agitador (New Brunswick Scientific Edison, EUA) durante 24 h. Após a reação, os sólidos foram separados das soluções por uma placa imantada. As soluções foram filtradas sob vácuo para garantir que não houvesse partículas suspensas nas amostras para análise química.

Para obtenção das isotermas de adsorção dos íons cádmio, os experimentos de adsorção foram realizados seguindo as condições dos ensaios de pH, em concentrações de 5 a 60 mg/L na faixa de pH 6 e 7. As concentrações de cádmio inicial e final foram determinadas por espectroscopia de absorção atômica.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização do compósito magnético

O difratograma de raios X obtido para a amostra do com-pósito Mn3O4/Fe3O4 está representado na Fig. 1, juntamente com os padrões de hausmanita, Mn3O4 (ICDD 240734) e de magnetita, Fe3O4 (ICDD 890691) para comparação. A estrutura do compósito magnético foi refinada utilizando o refinamento Rietveld, cujo gráfico está representado na Fig. 2, considerando o grupo espacial da hausmanita I41/amd e o grupo espacial da magnetita Fd3m. Com o refinamento Rietveld foi possível obter a proporção de Mn3O4 (83,69%) e Fe3O4 (16,31%) no compósito magnético. Além disso, os parâmetros de rede foram determinados sendo a=b=g= 90°, a=b=5,764Å e c=9,462 Å para hausmanita e,a=b=g= 90° e a=b=c=8,391 Å para magnetita. Os valores calculados são similares aos valores determinados pelo ICDD 240734 para a fase Mn3O4 e o ICDD 890691 para a fase Fe3O4. O tamanho médio de cristalito de Mn3O4 no compósito, obtido pela equação de Scherrer, foi 33 nm. Não é possível estimar o valor médio do cristalito de Fe3O4 no compósito, uma vez que o material apresenta uma maior distribuição de tamanho (< 5 µm), e a equação de Scherrer não é válida para cristalitos muito grandes [13]. O compósito magnético apresentou elevada cristalinidade (91,44%) obtida pelo software XRD - Crystallite Size & Lattice Strain. Os resultados indicam que a síntese na presença da magnetita favorece a formação de uma fase ordenada e única de Mn3O4.



A área superficial específica obtida para o compósito magnético foi (44 ± 9) m2/g, que se encontra mais próximo ao valor estimado do Mn3O4 (54 m2/g) quando comparado ao valor estimado para Fe3O4 (3 a 6 m2/g) [2, 14]. Esse fato pode ser atribuído à presença em maior quantidade de Mn3O4 (83,69%) e a menor quantidade de Fe3O4 (16,31%) no compósito magnético e sugere o recobrimento das partículas de Fe3O4 pelas partículas de Mn3O4.

O espectro Raman obtido para o compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 está representado na Fig. 3, na qual se observam três bandas localizadas em 658, 375 e 320 cm-1, que estão de acordo com a literatura de referência para o espectro Raman de Mn3O4 [15]. O pico mais fino e de maior intensidade em 658 cm-1 é característico da espécie Mn3O4 [16]. Essa banda relaciona-se à vibração Mn-O dos íons divalentes do manganês em coordenação tetraédrica, sendo típico de uma estrutura em espinélio [7]. As bandas menores que estão localizadas em 320 e 375 cm-1 correspondem a vibração de deformação de Mn3O4 e o sinal fraco em 480 cm-1 é referente ao estiramento assimétrico Mn-O-Mn atribuída a essa estrutura. Não é possível identificar no compósito as bandas de Fe3O4 em torno de 660-680 cm-1, 550-570 cm-1 e 300-320 cm-1 [17-19]. Essas bandas não são observadas, pois o Raman é uma técnica de superfície e, no compósito, as partículas de Fe3O4 são revestidas pelas partículas de Mn3O4.


A Fig. 4 mostra partículas de Mn3O4 presentes no compósito. As partículas de Fe3O4 não foram identificadas nessa imagem de microscopia eletrônica de transmissão, provavelmente devido à forma como foi realizada a preparação da amostra. Na preparação, foi produzida uma suspensão com o compósito que foi gotejada sobre um substrato. Devido à diferença de densidade entre os seus minerais constituintes, Fe3O4 (d=5,15 g/cm3) e Mn3O4 (d=4,84 g/cm3) é provável que apenas as partículas menos densas foram amostradas e analisadas no MET. Pode-se observar um agregado de nanopartículas de Mn3O4 sem orientação específica e com a predominância da morfologia octaédrica. Estima-se o tamanho das nanopartículas em torno de 25-30 nm (Fig. 4) próximo ao valor de 33 nm calculado pelo difratograma de raios X para a fase Mn3O4 no compósito magnético.


Com o intuito de verificar a morfologia de Fe3O4 no compósito, outras preparações foram preparadas para análise no MET. No canto direito da Fig. 5a (destacado por uma seta), pode-se observar um cristal de morfologia octaédrica com tamanho superior, em torno de 100 nm. A análise de EDS desse cristal, apresentada na Fig. 5b, confirma a presença de ferro e manganês, mostrando que a partícula maior de Fe3O4 é revestida por partículas menores de Mn3O4.


Avaliação da propriedade de separação magnética

Na Tabela I são apresentados os valores de turbidez do compósito magnético disperso em água submetido à sedimentação natural e à sedimentação magnética em um intervalo de tempo de 15 min.

Na Fig. 6 estão representadas as imagens do ensaio de turbidez nos tempos de 1 a 15 min para ambas as condições de sedimentação.


Com os resultados apresentados acima, pode-se observar que a sedimentação natural ocorre mais lentamente do que a sedimentação magnética, uma vez que durante o intervalo de 15 min a primeira apresenta valores de turbidez que são aproximadamente o dobro da segunda. Esse resultado pode ser confirmado pelas imagens apresentadas na Fig. 6, onde para 1 min já é possível observar uma diferença significativa de turbidez entre as amostras. Portanto, pode-se afirmar que o compósito magnético quando disperso em água se apresenta na forma de partículas muito finas, dificultando o processo de sedimentação natural. Dessa forma, a sedimentação magnética tornou-se uma alternativa promissora, uma vez que apresentou maior eficiência na separação das partículas do compósito do meio aquoso.

Imobilização do cádmio

A influência do valor do pH na capacidade de sorção do cádmio em meio aquoso pode ser verificado na Fig. 7.O efeito do pH da solução contendo o íon metálico tem sido considerado uma variável importante que afeta mais significativamente a adsorção do metal no material adsorvente. Na Fig. 7 é mostrada a eficiência de remoção do Cd(II) em relação ao valor do pH da solução de equilíbrio na faixa de 3-7, revelando que a adsorção do cádmio no compósito Mn3O4/Fe3O4 é influenciada pelas condições de pH do meio, cuja remoção do íon com a variação do pH 3 para 7 foi de 3,2 mg/g para 7,0 mg/g, ou seja, de 35% para 70%. A maior capacidade de sorção dos íons cádmio ocorreu no valor de pH em torno de 7, pois em baixos valores de pH, a remoção de íons Cd(II) foi inibida possivelmente como resultado da competição entre os íons H+ e Cd(II) sobre os sítios ativos, com uma predominância de íons H+. Com o aumento do pH, a densidade de carga negativa sobre a superfície do compósito aumenta devido a desprotonação da superfície, e assim, a adsorção dos íons Cd(II) é elevada [20].


O estudo de adsorção do Cd(II) foi realizado com o intuito de avaliar o efeito da concentração do contaminante no meio aquoso e a capacidade de remoção desse íon utilizando o compósito magnético. Para tal, foram determinadas isotermas de adsorção em pH 6 e 7, ajustadas ao modelo de Langmuir-Freundlich (eq. A) [21].

na qual q é a quantidade adsorvida do adsorvato no equilíbrio (mg/g), Ce a concentração do adsorvato no equilíbrio (mg/L), b a constante de adsorção de Langmuir-Freundlich (L/mg), Qm a capacidade máxima de adsorção (mg/g) e 1/n o parâmetro de heterogeneidade. A capacidade máxima de adsorção (Qm) e a afinidade dos íons cádmio com o adsorvente foram obtidas do ajuste dos dados. O c2(goodness-of-fit) é um parâmetro estatístico utilizado para avaliar a qualidade do ajuste. O valor desse parâmetro deve ser o menor possível (menor que 1%, ou seja, 0,01). Os valores de c2 obtidos no presente trabalho indicam (Fig. 8) uma boa qualidade do ajuste. Em relação à isoterma de Langmuir-Freundlich, o parâmetro b representa afinidade do íon pelos sítios do material adsorvente e a energia livre no processo de adsorção [22]. O valor de b obtido para a adsorção de Cd(II) no compósito é de 0,34 L/mg quando ocorre em pH 6 e 0,62 L/mg para o pH 7, mostrando que apesar da capacidade de adsorção do íon cádmio, no pH 6, apresentar valor próximo a adsorção no pH 7, o íon cádmio apresenta maior afinidade pelo compósito quando a adsorção ocorre no pH 7, apresentando uma maior energia de ligação entre as espécies.


A capacidade máxima de sorção do íon metálico, Qm, obtida pela isoterma de Langmuir-Freundlich apresentou valor 12,3 mgCd/g (0,11 mmolCd/g) para adsorção no pH 6 e 13,6 mgCd/g (0,12 mmolCd/g) para adsorção no pH 7, não havendo evidências de precipitação (Fig. 8). Os valores obtidos são muito próximos em ambos os valores de pH. Comparando esses valores com valores encontrados na literatura para adsorção de Cd(II), observamos que são maiores do que a capacidade máxima de adsorção do metal em hausmanita no pH 6,3 (4,34 mgCd/g) [23], em goethita e boemita sintética em pH 6 (5,18 mgCd/g e 3,55 mgCd/g, respectivamente) [24] e em nanopartículas de magnetita-maghemita na faixa de pH 7-8 (2,70 mgCd/g) [25].

Em um trabalho prévio, o compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 foi sintetizado e aplicado para imobilização da espécie As(III) em meio aquoso obtendo uma capacidade de adsorção de 14 mgAs/g (0,0048 mmolAs/g) em pH 5, apresentando elevada afinidade pelo material que é desejado para remoção de concentrações traços de contaminantes [2]. Além disso, observou-se que a hausmanita (Mn3O4) favorece a oxidação do As(III) para o As(V) e, conseqüentemente, Mn(III) é reduzido a Mn(II) e a espécie As(V) é adsorvida no material. Entretanto, a adsorção do Cd(II) não afeta o estado de oxidação do íon Mn nos minerais de manganês, sendo assim é improvável que o cádmio esteja sofrendo oxidação ou redução durante o processo [26]. A adsorção do cádmio no compósito magnético ocorre acima do ponto de carga zero (6,2), ou seja, a superfície do adsorvente se encontra desprotonada favorecendo a atração eletrostática do íon Cd(II) no material nos sítios livres para adsorção, embora não se pode afirmar que este seja o mecanismo predominante de adsorção do íon no adsorvente.

A porcentagem de remoção do íon cádmio no compósito magnético em meio aquoso está representada na Fig. 9, onde se observa que a remoção de Cd(II) em compósito magnético é elevada para concentrações baixas do íon em solução. As concentrações de até 20 mg/L apresentam uma taxa de remoção bastante significativa em torno de 80% para ambos os valores de pH. Em concentração de aproximadamente 5 mg/L de Cd(II) a remoção do íon atinge o máximo de 98% em pH 7 e 90% em pH 6 e a medida que aumenta a concentração do íon Cd(II) em solução essa porcentagem diminui para em torno de 30% no pH 6 e 7. Esse comportamento é esperado, uma vez que em concentrações mais baixas do íon, o compósito magnético apresenta sítios ativos livres para adsorção e quando essa concentração aumenta os sítios ativos já se encontram ocupados, em sua maioria, ocasionando uma menor eficiência de remoção. Dessa maneira, sugere-se que o compósito magnético pode ser considerado um adsorvente eficiente para remoção de concentrações traços do contaminante no meio aquoso tornando-o bastante atrativo para ser aplicado em processos de adsorção em escala industrial.


CONCLUSÃO

O compósito magnético foi sintetizado e a sua caracterização mostrou que há predominância da hausmanita (Mn3O4) em relação à magnetita (Fe3O4) e que ocorre o recobrimento dessas partículas de Fe3O4 pelas partículas de Mn3O4. A difração de raios X associada ao Rietveld mostrou ser uma ferramenta de caracterização muito importante na quantificação das fases, bem como na determinação dos parâmetros de rede dos componentes do compósito, confirmando ser a hausmanita o único óxido de manganês formado. A adsorção do cádmio no compósito magnético revela que a capacidade de adsorção do íon aumenta à medida que se eleva o valor do pH de 3 para 7. As isotermas de adsorção do Cd(II) foram obtidas em pH 6 e 7, sendo melhor ajustadas pelo modelo Langmuir-Freundlich. A capacidade máxima de adsorção foi similar para pH 6 e pH 7, sendo os valores correspondentes a Qm=12,3 mg/g e Qm=13,6 mg/g, respectivamente. Em concentrações baixas, a remoção foi mais eficiente no pH 7, chegando a 98% de remoção de Cd(II) em solução indicando que o compósito magnético apresenta potencial para ser utilizado na remoção de concentrações traços em meio aquoso. Os ensaios de turbidez mostraram que a sedimentação magnética tornou-se uma alternativa promissora, uma vez que apresentou maior eficiência na separação das partículas do compósito do meio aquoso. Conclui-se que o compósito magnético Mn3O4/Fe3O4 é promissor para aplicação em larga escala para tratamento de águas residuais devido à facilidade de sua separação do meio aquoso pela simples aplicação de um campo magnético, dispensando assim, a difícil etapa de separação por filtração de partículas nanoestruturadas.

AGRADECIMENTOS

Ao CNPq e CAPES pelo suporte financeiro, ao Departamento de Engenharia de Materiais do CEFET MG, ao Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da UFMG e ao INCT-Acqua pela infraestrutura disponibilizada para realização deste trabalho.

Rec. 08/01/2014

Rev. 19/03/2014, 17/04/2014

Ac. 17/06/2014

corresponding author:

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Out 2014
    • Data do Fascículo
      Set 2014

    Histórico

    • Recebido
      08 Jan 2014
    • Aceito
      17 Jun 2014
    • Revisado
      17 Abr 2014
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