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Preparação de vidros sodo-cálcicos utilizando resíduo de lã de rocha

Preparation of soda-lime glass using rock wool waste

Resumo

Descartadas pela indústria de mineração durante as paradas de manutenção dos fornos de pelotização, a lã de rocha apresenta em sua composição teores de SiO2 (56%), Na2O (12%) e CaO (7%) propícios para obtenção de vidros do tipo sodo-cálcicos. Sob este foco, este trabalho desenvolveu formulações de vidros sodo-cálcicos, empregando como matéria-prima principal o resíduo de lã de rocha nas proporções de 50 a 100%, ajustando a composição química das formulações com areia, carbonatos de sódio e cálcio, como fontes de sílica, soda e cálcia, respectivamente. Em algumas formulações o carbonato de sódio foi substituído por sulfato de sódio, o qual atua como afinante, melhorando a homogeneização e diminuindo a formação de bolhas durante a fusão. Inicialmente as matérias-primas foram avaliadas pelas técnicas de fluorescência de raios X, difração de raios X, análise térmica diferencial e análise termogravimétrica. Os ensaios realizados mostraram que o resíduo de lã de rocha tem potencialidade para ser utilizado na produção de vidros sodo-cálcicos, no entanto, a composição química deve ser corrigida. Após conhecer o potencial do resíduo, foram elaboradas sete misturas, que foram fundidas a 1550 °C, por 1 e 2 h. Verificou-se que o percentual máximo de resíduo de lã de rocha possível de utilização se encontra entre 60 e 80% e que o tempo de permanência de 2 h resultou na obtenção de vidros mais homogêneos e com menor quantidade de bolhas em função da adição do sulfato de sódio, que se mostrou eficiente na remoção das bolhas.

Palavras-chave:
resíduo; lã de rocha; vidro sodo-cálcico

Abstract

Discarded by the mining industry during the maintenance stoppages of pelletizing furnaces, rock wool has in its composition SiO2 (56%), Na2O (12%) and CaO (7%) propitious for obtaining soda-lime glasses. Under this focus, this work developed soda-lime glasses formulations, using as main raw-material rock wool waste in proportions from 50 to 100% by adjusting the chemical composition of the formulations with sand, sodium and calcium carbonates, as silica, soda and lime sources, respectively. In some formulations the sodium carbonate was replaced by sodium sulfate, which acts as a refining agent, improving homogenization and reducing the bubble formation during the melting. Initially, the raw-materials were evaluated by X-ray fluorescence, X-ray diffraction, differential thermal analysis, and thermogravimetric analysis. The tests showed that the rock wool waste has potential to be used in soda-lime glasses production, however, the chemical composition must be corrected. After knowing the waste potential, seven mixtures were prepared and molten at 1550 °C for 1 to 2 h. It has been found that the maximum rock wool waste percentage that can be used is between 60 and 80%, and that the 2 h melting time resulted in more homogeneous glasses and fewer bubbles according to the addition of sodium sulfate which is efficient for bubbles removal.

Keywords:
waste; rock wool; soda-lime glass

INTRODUÇÃO

A revolução industrial trouxe consigo a aceleração do desenvolvimento e, consequentemente, maior geração de resíduos, onde a necessidade de crescimento econômico a curto prazo levou a uma intensa extração de matérias-primas, que até então eram consideradas ilimitadas. Antigamente, não havia preocupação com os resíduos gerados em função da sua abundância, e a natureza acabava aceitando de forma passiva os resíduos despejados. A partir da revolução industrial, com o aumento da geração de resíduos, começou a se pensar nos impactos ecológicos gerados com o descarte indiscriminado de resíduos no meio ambiente 11 R.F. Cavalcante, R.M. Nascimento, C.A. Paskocimas, R.P.S. Dutra, Cerâmica 58 (2012) 158.)-(44 R.R. Menezes, M.F. Oliveira, L.N.L. Santana, G.A. Neves, H.C. Ferreira, Cerâmica 53 (2007) 388.. Uma vez descartados de forma indiscriminada no meio ambiente, os resíduos podem causar prejuízos tanto ao meio ambiente, quanto ao próprio homem. Tendo em vista a possibilidade de agregar valor econômico aos resíduos, a reutilização e a reciclagem surgem como soluções mais atraentes para os problemas de tratamento e destinação final, pois reduzem o consumo de recursos naturais bem como a carga de poluentes lançados ao meio ambiente 44 R.R. Menezes, M.F. Oliveira, L.N.L. Santana, G.A. Neves, H.C. Ferreira, Cerâmica 53 (2007) 388.)-(77 A.C. Carvalho, F. Raupp-Pereira, J.B. Rodrigues Neto, A.P.N. de Oliveira, Cerâmica 61 (2015) 383..

Com o intuito de reduzir a poluição ambiental, a incorporação de resíduos na produção de vidros mostra-se como uma excelente forma de reaproveitar 88 P. Colombo, G. Brusatin, E. Bernardo, G. Scarinci, Curr. Opin. Solid State Mater. Sci. 7 (2004) 225. uma grande variedade de resíduos advindos de vários setores industriais, tais como cinzas de incineradores de lixo urbano 99 M. Aloisi, A. Karamanov, G. Taglieri, F. Ferrante, M. Pelino, J. Hazard. Mater. 137 (2006) 138.)-(1111 N.A. El-Alaily, E.M. Abou-Hussein, Y.K. Abdel-Monem, T.D. Abd Elaziz, F.M. Ezz-Eldin, J. Radioanal. Nucl. Chem. 299 (2014) 65., cinzas de termelétricas 1212 M. Erol, S. Küçükbayrak, A. Ersoy-Meriçboyu, Chem. Eng. J. 132 (2007) 335.), (1313 S. Yoon, J. Lee, J. Lee, Y. Yun, W. Yoon, J. Mater. Sci. Technol. 29 (2013) 149., cinzas de casca de arroz 1414 M.I. Martín, J. Ma. Rincón, F. Andreola, L. Barbieri, F. Bondioli, I. Lancellotti, M. Romero, Bol. Soc. Esp. Ceram. Vidrio 50, 4 (2011) 201.), (1515 T. Lee, R. Othman, F. Yeoh, Biomass Bioenergy 59 (2013) 380., cinzas de bagaço de cana de açúcar 1616 S.R. Teixeira, A.E. Souza, C.L. Carvalho, V.C.S. Reynoso, M. Romero, J. Ma. Rincón, Mater. Charact. 98 (2014) 209., cinzas de carne e ossos 1717 B. Cicek, A. Tucci, E. Bernardo, J. Will, A.R. Boccaccini, Ceram. Int. 40 (2014) 6045., escórias 1818 F. He, Y. Fang, J. Xie, J. Xie, Mater. Des. 42 (2012) 198.)-(2020 Z. Yang, Q. Lin, J. Xia, Y. He, G. Liao, Y. Ke, J. Alloys Compd. 574 (2013) 354., extração de minérios 2121 G.F.T. Lay, M.C. Rockwell, J.C. Wiltshire, C. Ketata, Ceram. Int. 35 (2009) 1961.), (2222 J.R.H. Arancibia, P. Alfonso, M. García-Valles, S. Martínez, D. Parcerisa, C. Canet, F.M. Romero, Bol. Soc. Esp. Ceram. Vidrio 52, 3 (2013) 143., galvanoplastia 2323 S. R. H. Mello-Castanho, A.C. Silva, A. Esteban-Cubillo, C. Pecharromán, J.S. Moya, Soc. Esp. Ceram. Vidrio 45 (2006) 52., rejeito de porcelana de lítio 2424 W. Zheng, H. Cao, J. Zhong, S. Qian, Z. Peng, C. Shen, J. Non-Cryst. Solids 409 (2015) 27., radioativo 2525 M. Zagrai, L. Rus, S. Rada, S. Stan, M. Rada, L. Bolundut, M.E. Pica, E. Culea, J. Non-Cryst. Solids 405 (2014) 129., restos de comida 2626 I.A. Cornejo, S. Ramalingam, J.S. Fish, I.E. Reimanis, Am. Ceram. Soc. Bull. 93 (2014) 24., carepa de aço 2727 O.R.K. Montedo, I.T. Alves, C.A. Faller, F.M. Bertan, D.H. Piva, R.H. Piva, Mater. Res. Bull. 72 (2015) 90.), (2828 T.J. Schmitt, M. Tomiyama, M.V. Folgueras, F.L. Bhar, Mater. Sci. Forum. 727-728 (2012) 1308., lã de vidro 2929 D.D. Neves, V.P. Della, C.T. Kniess, Anais do 57º Congresso Brasileiro de Cerâmica/5º Congresso Ibero-Americano de Cerâmica, Natal, RN (2013). e fibra de vidro 3030 H. Delatorre Jr., O.C. Ferrari, C.T. Kniess, V.P. Della, Anais do I Congresso Fluminense de Engenharia, Tecnologia e Meio Ambiente, Nitéroi, RJ (2013).. Um resíduo interessante para ser valorizado através da incorporação do mesmo na confecção de vidro é a lã de rocha. Estes materiais compostos por silicatos são produzidos por fibras amorfas de vários comprimentos, entrelaçadas e unidas por uma resina. As lãs de rocha são muito utilizadas como forramento dos fornos de pelotização em aciarias devido às suas propriedades como isolamento térmico e proteção contra incêndio. Dependendo da matéria-prima com que é fabricada, uma variedade de tipos de lã mineral pode surgir, destacando-se a lã de rocha, lã de vidro, lã de escória e lã cerâmica; estas lãs possuem como matérias-primas rochas, areia, escória, e mistura de sílica e alumina, respectivamente 3131 F. Trdič, B. Širok, P.R. Bullen, R. Philpott, Real-Time Imaging 5 (1999) 125.)-(3434 D. Dovžan, I. Škrjanc, Robot. Comput. Integr. Manuf. 28 (2012) 344..

Na produção de vidros podem ser utilizadas matérias-primas naturais, produtos químicos, como também resíduos, tais como: lã de rocha, lã de vidro, areia de fundição, escória de alto forno, entre outros. A seleção dos materiais de partida deve levar em consideração a aplicação a que se destina o vidro, podendo em alguns casos ser necessário utilizar fontes diferentes de um mesmo componente. Os vidros possuem forma definida e propriedades mecânicas compatíveis com a de sólidos considerados frágeis. Estes apresentam propriedades comuns a materiais vítreos e de uma maneira geral são diferentes dos sólidos cristalinos, pois não apresentam ordenamento cristalino de longo alcance. Em geral são isotrópicos, não possuem temperatura de fusão definida e não apresentam planos de clivagem definidos, o que pode ocorrer com alguns materiais cristalinos, além de apresentarem rigidez mecânica à temperatura ambiente 3535 J.M.F. Navarro, El Vidrio: constitución, fabricación y propriedades, C.S.I.C, Madrid, Espanha (1985).. As matérias-primas utilizadas para a produção de vidros são agrupadas de acordo com suas funções em vitrificantes, fundentes, estabilizantes e afinantes, considerando a produção de vidros sodo-cálcicos estas matérias-primas são respectivamente SiO2, Na2O, CaO e Na2SO43636 J.E. Shelby, Introduction to Glass Science and Technology, 2nd Ed., Royal Society of Chemistry, New York, USA (2005).), (3737 J.M.F. Navarro, El Vidrio: textos universitários, 3rd Ed., Artegraf, Madrid, Espanha (2003).. Portanto, este trabalho teve como objetivo demonstrar a viabilidade de utilização do resíduo de lã de rocha na produção de vidros sodo-cálcicos, sendo que para este fim, foi indispensável a adição de areia (fonte de sílica), carbonato de sódio (fonte de sódio), carbonato de cálcio (fonte de cálcio) e sulfato de sódio (fonte secundária de sódio) para ajustar a composição química das formulações.

MATERIAIS E MÉTODOS

As matérias-primas utilizadas nas formulações dos vidros, juntamente com o resíduo de lã de rocha (RLR) foram: areia, carbonato de sódio, carbonato de cálcio e sulfato de sódio. O RLR foi cedido por uma mineradora, localizada em Vitória, ES, a qual gera em média 35 ton/ano de lãs minerais (de vidro e lã de rocha), quando o forro dos fornos de pelotização e o revestimento das tubulações de óleo combustível são substituídos durante as paradas para manutenção das usinas que ocorrem a cada 18 ou 24 meses. Não é feita uma separação precisa entre o volume gerado de cada resíduo [38]. A areia utilizada possui granulometria média, sendo adquirida em lojas de materiais de construção. Os carbonatos e o sulfato, por serem reagentes industriais, não foram caracterizados. A metodologia geral envolvida na formulação do vidro sodo-cálcico a partir do RLR está representada na Fig. 1, onde a abreviação "M" representa a massa vítrea das composições e "Ms" representa as massas vítreas com adição de sulfato de sódio.

Figura 1:
Diagrama representativo das etapas estabelecidas para a formulação dos vidros sodo-cálcicos.
Figure 1:
Representative diagram of the steps established for the formulation of soda-calcic glasses.

Para calcular as composições, os elementos majoritários foram fixados em função do vidro de referência (VR) que possui em sua composição SiO2 (72%), Na2O (14%) e CaO (9%). O primeiro componente calculado foi o SiO2, onde se buscou compensar a variação entre o percentual de SiO2 do VR e do RLR, tendo como fonte a areia. No caso do Na2O, a compensação levou em consideração as quantidades presentes no RLR e na areia, que foram somadas, para assim fornecer a quantidade a ser adicionada na formulação. O Na2O foi adicionado sob a forma de Na2CO3 e Na2SO4. O cálculo para a adição do CaO seguiu conforme o procedimento adotado para o Na2O, tendo apenas o CaCO3 como fonte de CaO. Os valores calculados dos óxidos presentes nas composições das misturas testadas estão apresentados na Tabela I.

Tabela I -
Composição química das misturas testadas (% em massa).
Table I -
Chemical composition of the tested mixtures (wt%).

Inicialmente foram considerados 100% de resíduo equivalente a 100,00 g, então foram elaboradas sete misturas: M1 com 100 g de RLR (sem adições); M2, M3 e M4 com 100, 80 e 60 g de RLR, respectivamente (com adições de Na2CO3 e CaCO3); e M2s, M3s e M4s com 100, 80 e 60 g de RLR, respectivamente (com adições de Na2CO3, CaCO3 e Na2SO4). O "s" na nomenclatura da mistura indica que parte do Na2CO3 foi substituída por Na2SO4, que atua como afinante, melhorando a homogeneização e removendo as bolhas geradas durante a fusão. Logo, as quantidades das matérias-primas foram calculadas considerando o percentual de óxidos presentes nas misturas, sendo apresentadas na Tabela II.

Tabela II -
Composição das misturas testadas (massas em grama de matérias-primas).
Table II -
Composition of the tested mixtures (masses in gram of raw materials).

O RLR que apresentava natureza fibrosa e a areia com tamanhos de grãos desuniformes foram moídos com o intuito de tornar o tamanho das partículas compatíveis com a granulometria dos reagentes industriais, Na2CO3, CaCO3 e Na2SO4, garantindo uma homogeneização adequada das composições a serem formuladas. Como não se conhecia o comportamento do RLR durante a moagem, o procedimento foi realizado com tempos menores (5, 15 e 30 min) em relação a areia (90 e 120 min), uma vez que Babisk 3939 M.P. Babisk, "Desenvolvimento de vidros sodo-cálcicos a partir de resíduos de rochas ornamentais", Diss. Mestrado, Instituto Militar de Engenharia, RJ (2009) 90. salienta a necessidade de moer a areia por 120 min para obter granulometria inferior a 100 µm, a qual considera ser suficiente para favorecer a homogeneização, sendo considerada também para o RLR. Testes iniciais de fusibilidade demonstraram a necessidade de utilização da temperatura de 1550 °C para que os vidros fossem obtidos, com taxa de aquecimento de 10 °C/min e tempos de permanência na temperatura máxima de 1 e 2 h.

As composições químicas do RLR e da areia foram caracterizadas por espectroscopia de fluorescência de raios X (FRX) em equipamento Philips, PW 2400, com tubo de 3 kW e alvo de ródio. O perfil mineralógico destas matérias-primas e dos vidros experimentais foram obtidos, em amostras na forma de pó, por difração de raios X (DRX) em difratômetro Bruker, D2 Phaser, radiação cobre Kα, potência de 300 W e corrente de 10 mA, intervalo de medida em 2q entre 10 e 80º e passo de 0,02°. Os ensaios de análise térmica diferencial (ATD) e análise termogravimétrica (ATG) foram realizados somente no RLR, na forma de pó, utilizando o equipamento Netzsch, STA 449 F3 Jupiter, com ar sintético (fluxo de 10 cm3/min), taxa de aquecimento de 10 °C/min na faixa de 0 a 1300 °C. O processo de moagem foi realizado a seco em moinho de bolas Marconi, MA 590, para que fosse analisada a distribuição de tamanho de partículas (DTP) por difração a laser em equipamento Malvern, Master Sizer 2000.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Fig. 2 apresenta o aspecto visual do RLR e da areia. Na Fig. 2a pode-se observar que o RLR apresenta aspecto irregular decorrente dos procedimentos de desfibragem manual utilizados durante o procedimento de descarte; já a Fig. 2b mostra o aspecto visual do RLR moído, sem controle da granulometria. A coloração amarelada apresentada pelo RLR é devido ao baixo teor de Fe2O3 presente. Na Fig. 2c está apresentado o aspecto visual da areia in natura, a qual possui granulometria média, com tamanho de partículas desuniformes, que conforme menciona a Norma NBR 6502/95 4040 Associação Brasileira de Normas Técnicas, NBR 6502: Rochas e solos, Rio de Janeiro, RJ (1995) 18. se encontra na faixa entre 0,20 e 0,60 mm, e na Fig. 2d, após moagem, a sua cor se tornou homogênea e mais clara em relação a areia in natura.

Figura 2:
Imagens do resíduo de lã de rocha (a) desfibrado manualmente e (b) após moagem, e da areia (c) in natura e (d) após moagem.
Figure 2:
Images of rock wool waste (a) fibered manually and (b) after grinding, and sand (c) "in nature" and (d) after grinding.

A formulação do vidro teve como matéria-prima principal o RLR e para corrigir a composição foram adicionados areia, Na2CO3, CaCO3 e Na2SO4. Para definir a formulação foi realizado o ensaio de FRX no RLR e na areia, cujos resultados são apresentados na Tabela III. A composição química do RLR apresenta 75,04% em massa dos óxidos majoritários SiO2 (56,07%), Na2O (12,24%) e CaO (6,73%), considerando a formulação dos vidros sodo-cálcicos. Os outros óxidos presentes se encontram em quantidades inferiores, sendo considerados como óxidos minoritários. A areia apresenta elevado teor de SiO2 (95,32%) e baixo teor de Na2O (0,29%) e CaO (0,17%), tornando-a propícia a ser adicionada na formulação com o intuito de corrigir a deficiência em sílica do RLR.

Tabela III -
Resultados da análise química do resíduo de lã de rocha e da areia (% em massa de óxidos).
Table III -
Results of chemical analysis of rock wool waste and sand (wt% of oxides).

Os resultados de DRX do RLR e da areia, utilizados na formulação, podem ser visualizados na Fig. 3. O difratograma do RLR, Fig. 3a, é formado por uma banda larga sem picos marcantes associados à presença de fases cristalinas; a ausência de picos cristalinos é a principal característica de materiais vítreos e a banda amorfa formada entre 15 e 40° (2θ) é uma particularidade dos vidros a base de sílica. A forma e a posição da banda tende para um valor angular próximo ao pico principal da sílica, mostrando tendência à organização nesta fase cristalina caso haja condições. Esta tendência de organização na região da sílica ocorre devido ao elevado conteúdo deste óxido como mostrou a análise química presente na Tabela I. A areia, Fig. 3b, apresentou um difratograma com picos bem definidos, referentes à presença de quartzo, que é a fase mais estável da sílica à temperatura ambiente e pressão constante.

Figura 3:
Difratogramas de raios X de: (a) resíduo de lã de rocha e (b) areia.
Figure 3:
X-ray diffraction patterns of: (a) rock wool waste and (b) sand.

As curvas mostradas na Fig. 4 apresentam o comportamento térmico do resíduo de lã de rocha quando submetido a aquecimento até 1300 °C, durante a execução dos ensaios de ATD e ATG. De acordo com o ensaio de ATD, realizado para investigar o comportamento térmico do RLR, foi possível observar dois eventos endotérmicos. No primeiro evento, a 684 °C, observou-se uma alteração da linha base correspondendo à temperatura de transição vítrea (Tv); já o evento endotérmico a 978 °C foi referente a temperatura de fusão (Tf). Além destes dois eventos endotérmicos também foi possível visualizar um pico exotérmico a 952 °C, que corresponde à temperatura de cristalização (Tc) do resíduo, ou seja, nesta temperatura, caso fosse dada as condições necessárias, o material iniciaria a cristalização de alguma fase. Os resultados observados estão próximos aos encontrados por Moesgaard et al.4141 M. Moesgaard, H.H. Pedersen, E.R. Yue, J. Non-Cryst. Solids 353 (2007) 1101. ao estudarem a cristalização de fibras de lã de rocha. Considerando o gráfico da ATG, na Fig. 4, foram verificadas três perdas de massa. A primeira perda, 0,4%, ocorreu até a temperatura de 120 °C, sendo atribuída à remoção de água livre. Após 200 °C o material volta a perder massa, 3,2%, até a temperatura de 720 °C. A última perda de massa, 1,1%, ocorre até a temperatura 1300 °C. Acredita-se que as perdas de massa iniciadas a partir dos 200 °C sejam em função das reações que ocorrem durante a eliminação da resina. De acordo com 4242 M.P. Krasnovskih, N.G. Maksimovich, Ya. I. Vaisman, A.A. Ketov, Russ. J. Appl. Chem. 87, 10 (2014) 1430., de 200 a 400 °C ocorre a decomposição da resina e a formação de compostos orgânicos oxigenados, fazendo com que a perda de massa da lã de rocha seja observada em temperaturas mais altas que a da eliminação da resina.

Figura 4:
Resultados de ATD e ATG do resíduo de lã de rocha.
Figure 4:
Results of DTA and TGA of rock wool waste.

A Tabela IV apresenta os resultados dos ensaios que determinaram o tamanho de partícula do RLR e da areia. Considerando os resultados obtidos com a moagem do RLR, todos os tempos empregados (5, 15 e 30 min) poderiam ser utilizados para preparação das misturas, pois apresentaram 100% das partículas inferiores a 100 µm. Contudo, apesar das moagens de 5 e 15 min serem suficientes para reduzir a granulometria a um tamanho de partícula aceitável para a homogeneização da mistura, o RLR aglomerava facilmente formando grumos, o que não ocorria com o mesmo ao ser moído por 30 min. Além disso, o maior tempo resultou em 50% das partículas com tamanho inferior a 6,99 µm, logo, o tempo utilizado para a moagem deste resíduo foi estabelecido em 30 min. Enquanto que para a areia moída por 90 e 120 min, foram obtidas 100% das partículas com tamanho inferior a 240 e 90 µm, respectivamente, mostrando que o tempo de 120 min foi o ideal para a moagem da areia, uma vez que este tempo de moagem resultou em 100% das partículas abaixo de 100 µm.

Tabela IV -
Resultados de determinação do tamanho de partícula do resíduo de lã de rocha e da areia.
Table IV -
Results of particle size measurements of the rock wool waste and sand.

A Fig. 5 apresenta a aparência dos melhores vidros obtidos experimentalmente, sendo sua nomenclatura derivada das misturas, onde o "M" de mistura foi substituído por "V" de vidro e acrescido o tempo de permanência na temperatura máxima de fusão, 1550 °C. Os vidros V1-1h, V1-2h, V2-1h e V2s-1h apresentaram elevada viscosidade não sendo possível obter quantidade suficiente de material para verter. Já a viscosidade dos vidros V2-2h, V2s-2h, V3-1h, V3-2h, V3s-1h e V4-1h, permitiu moldar amostras, porém apresentaram, visualmente, muitas bolhas, como também fragilidade, uma vez que estilhaçavam ao serem desmoldadas. Somente os vidros V3s-2h, V4-2h, V4s-1h e V4s-2h, Fig. 5, se mantiveram íntegros após a desmoldagem. Os vidros V3s-2h e V4-2h apresentaram coloração âmbar e elevada opacidade, não sendo possível observar a presença de bolhas. Os vidros V4s apresentaram coloração verde-água e elevada transparência o que permitiu observar a presença de mínima quantidade de bolhas. Com base nos resultados obtidos com a análise visual, apenas quatro formulações com resíduos apresentaram condições para confecção comercial de vidros: V3s-2h (80% de RLR, com sulfato), V4-2h (60% de RLR, sem sulfato), e V4s-1h e V4s-2h (60% de RLR, com sulfato).

Figura 5:
Principais vidros obtidos experimentalmente: (a) V3s-2h, (b) V4-2h, (c) V4s-1h e (d) V4s-2h.
Figure 5:
Main glasses obtained experimentally: (a) V3s-2h, (b) V4-2h, (c) V4s-1h, and (d) V4s-2h.

Foram realizados ensaios de difração de raios X nos vidros experimentais para comprovar que as fusões das misturas elaboradas formaram materiais vítreos, sendo apresentados na Fig. 6. Os difratogramas são similares e indicam que são formados por bandas sem picos marcantes associados à presença de fases cristalinas, revelando assim o caráter amorfo dos vidros. Enquanto que a banda de baixa intensidade observado entre 15 e 40º (2θ), o qual possui forma e posição tendendo para um valor angular próximo ao pico principal da sílica, mostra propensão à organização nesta fase cristalina caso haja condições. Esta tendência de organização na região da sílica ocorre devido ao elevado teor deste óxido. Já o método utilizado para o resfriamento dos vidros, ao ar (fora do forno), se mostrou eficiente, uma vez que os óxidos minoritários (presentes no RLR e na areia) e a adição do Na2SO4 não induziram a cristalização de fases nos vidros experimentais.

Figura 6:
Difratogramas de raios X dos vidros experimentais: V4-2h, V3s-2h, V4s-1h e V4s-2h.
Figure 6:
X-ray diffraction patterns of the experimental glasses: V4-2h, V3s-2h, V4s-1h and V4s-2h.

CONCLUSÕES

O resíduo de lã de rocha pode ser utilizado para produção de vidros sodo-cálcicos baseados nos resultados obtidos. As análises química e mineralógica do resíduo de lã de rocha mostraram que o mesmo é composto majoritariamente por SiO2 (56%), Na2O (12%) e CaO (7%) no estado amorfo, tornando-o propício para formulação de vidros, no caso o sodo-cálcico. Apesar da composição ser propícia, a mesma sozinha não é ideal para formar vidros sodo-cálcicos com interesse industrial, desta forma, a composição química foi corrigida com adição de areia e carbonatos de sódio e cálcio, com substituição parcial do carbonato de sódio por sulfato de sódio (em algumas formulações), para auxiliar na remoção de bolhas. Observou-se que a permanência por 2 h na temperatura de fusão previamente estabelecida, 1550 °C, resultou na obtenção de vidros mais homogêneos e com menor quantidade de bolhas em comparação com o tempo de permanência de 1 h. O uso do sulfato auxiliou na remoção das bolhas, principalmente nas amostras fundidas durante 2 h. Verificou-se que o percentual máximo de resíduo de lã de rocha possível de utilização na obtenção do vidro se encontra entre 60 e 80%. Os vidros com aproveitamento de 60% de resíduo apresentaram características semelhantes a alguns vidros comerciais, como transparência, tonalidade verde-água e boa homogeneidade. No entanto ao aproveitar quantidades acima de 80% de resíduo os vidros geraram tonalidade verde marmorizada e âmbar escuro com muitas bolhas, falta de homogeneidade, viscosidade elevada e fragilidade.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao IFES pela disponibilidade dos laboratórios, à CAPES pela concessão da bolsa de Mestrado, à mineradora VALE pelo resíduo de lã de rocha, à FINEP pelo financiamento de alguns equipamentos e à UDESC pela fusão dos vidros.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    29 Dez 2015
  • Revisado
    03 Mar 2016
  • Aceito
    05 Maio 2016
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