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Sinterização a laser do aluminato de estrôncio dopado via sol-gel modificado para aplicação como pigmento cerâmico

Laser sintering of doped strontium aluminate via modified sol-gel for use as a ceramic pigment

Resumo

Pó cerâmico de SrAl2O4:Eu3+,Dy3+ foi produzido pelo método sol-gel proteico, uma rota de sol-gel modificada que permite a formação do óxido em temperaturas mais baixas comparativamente a outros métodos. A sinterização a laser de CO2 foi utilizada como método para tratamento térmico, eficiente na redução dos íons trivalentes de európio das amostras dopadas. A análise térmica dos precursores, realizada por meio de análise térmica diferencial (DTA) e termogravimetria (TG), revelou que a cristalização da fase SrAl2O4 aconteceu em aproximadamente 1060 °C. Por difratometria de raios X verificou-se a formação de fases monoclínica e hexagonal nas amostras caracterizadas antes e após a sinterização. A técnica de espalhamento dinâmico de luz revelou a presença de partículas nanométricas, micrométricas e aglomerados de partículas, resultado este que foi confirmado por imagens de microscopia eletrônica de varredura. Micrografias da superfície de fratura de uma pastilha sinterizada a laser revelaram o alto grau de densificação possibilitado pelo tratamento térmico. Medidas de fotoluminescência revelaram que as amostras após a síntese e antes do tratamento térmico a laser apresentaram emissão com coloração avermelhada, composta de picos estreitos de emissão característicos do Eu3+ e com emissão mais intensa quando as amostras foram excitadas em 265 nm. O tratamento a laser promoveu a redução do Eu3+ para Eu2+ e este efeito foi confirmado pela presença de uma banda larga de emissão na região verde do espectro, com máximo de emissão obtido após excitação em 350 nm. O tempo de decaimento luminescente da amostra tratada termicamente chegou a alcançar aproximadamente 100 min. Por meio de medidas de fluorescência de raios X da frita adquirida e de DTA e TG da frita, do pigmento e de misturas entre os dois, foi possível observar boa compatibilidade em termos dos processos térmicos, o que apontou para um potencial uso do pigmento em placas de revestimento cerâmico.

Palavras-chave:
aluminato de estrôncio; sol-gel proteico; sinterização a laser

Abstract

Powder of Dy3+ co-doped SrAl2O4:Eu3+ was produced via proteic sol-gel method, a modified sol-gel route which allows the formation of oxides at lower temperatures than other methods. CO2 laser sintering was used as a method for heat treatment, effective in reducing trivalent europium ions in doped samples. Thermal analysis of the precursors, performed by TG and DTA, revealed that the crystallization of SrAl2O4 phase occurred at approximately 1060 °C. X-ray diffraction showed that the samples, before and after sintering, had monoclinic and hexagonal phases formation. DLS technique revealed the presence of nanosized and micrometric particles, and particle agglomerates, confirmed by SEM images. Micrographs of the fracture surface of a sintered pellet revealed a high degree of densification caused by heat treatment. Photoluminescence measurements showed that the samples after synthesis and before heat treatment with laser had reddish emission, composed of characteristic narrow emission lines from Eu3+ and more intense emission when the samples were excited at 265 nm. The laser treatment promoted the reduction of Eu3+ to Eu2+ and this effect was confirmed by the presence of a wide emission band in the green region of the spectrum with a maximum emission obtained after excitation at 350 nm. The luminescent decay time of the thermally treated sample was approximately 100 min. Via XRF measurements of acquired frit and DTA and TG of the frit, pigment and mixtures of both, it was noticed good compatibility in terms of thermal processes, that indicated that the pigment has a potential to be used in ceramic tiles.

Keywords:
strontium aluminate; proteic sol-gel; laser sintering

INTRODUÇÃO

Materiais que apresentam a propriedade de emissão de luz por um longo período de tempo, mesmo após cessada a excitação com quaisquer tipos de radiação, atraem a curiosidade de cientistas há bastante tempo, desde a descoberta de Matsuzawa em 1996 11 T. Matsuzawa, J. Electrochem. Soc. 143, 8 (1996) 2670.. Ao longo dos últimos anos o avanço científico e tecnológico relacionado a novos materiais que apresentam a propriedade de persistência luminescente tem acontecido de maneira grandiosa, já que o interesse por eles gira em torno de suas propriedades e aplicações, que incluem interruptores e aparelhos utilizados para iluminação de ambientes, sinalização de emergência, placas sinalizadoras, fibras têxteis, displays eletrônicos, memórias ópticas, detectores de radiações de alta energia, mostradores de relógio, aplicações militares, entre outras 22 J. Wang, Q. Su, S., Wang, J. Phys. Chem. Solids. 66 (2005) 1171.)-(44 M. Kowatari, D. Koyama, Y. Satoh, K. Iinuma, S. Uchida, J. Nucl. Sci. Technol. 39, 12(2002) 1251.. Dentro do grupo dos materiais que apresentam tal característica, os mais estudados atualmente são os aluminatos de estrôncio, de cálcio e de bário dopados com íons de terras raras, sendo que uma das terras raras mais utilizadas na dopagem de aluminatos é o európio, pois apresenta-se como centro de luminescência nessas matrizes. A propriedade de luminescência persistente é notada quando os íons de európio estão no seu estado reduzido Eu2+, o que indica a necessidade de um processo de redução do íon de Eu3+ para Eu2+, sendo que este pode ocorrer in situ ou depois do processo de síntese do óxido 55 T. Ishigaki, H. Mizushina, K. Uematsu, N. Matsushita, M. Yoshimura, K. Toda, M. Sato, Mater. Sci. Eng. B 173,(2010) 109.), (66 F. Clabau, X. Rocquefelte, S. Jobic, P. Deniard, M.-H. Whangbo, A. Garcia, T. Le Mercier, Chem. Mater. 17, 15 (2005) 3904.. Alguns outros íons de terras raras, como disprósio e neodímio, também são utilizados, mas como prolongadores da luminescência.

Dentre os aluminatos, o aluminato de estrôncio com estequiometria SrAl2O4 quando dopado com Eu e Dy destaca-se potencialmente em aplicações tecnológicas por conta de suas propriedades ópticas. Numerosos métodos de síntese têm sido utilizados para preparar o SrAl2O4 e outros compostos correlatos, incluindo reação de estado sólido 77 Y. Karabulut, A. Canimoglu, Z. Kotan, O. Akyuz, E. Ekdal, J. Alloys Comp. 583 (2014) 91., microemulsão reversa 88 C.-H. Lu, S.-Y. Chen, C.-H. Hsu, Mater. Sci. Eng. B 140, 3 (2007) 218., sol-gel99 L. Xiao, Q. Xiao, and Y. Liu, J. Rare Earths 29, 1 (2011) 39., micro-ondas55 T. Ishigaki, H. Mizushina, K. Uematsu, N. Matsushita, M. Yoshimura, K. Toda, M. Sato, Mater. Sci. Eng. B 173,(2010) 109., métodos de combustão 1010 A.K. Choubey, N. Brahme, D.P. Bisen, Phys. Procedia 29 (2012) 104., vaporização a laser 1111 C. Zollfrank, S. Gruber, M. Batentschuk, A. Osvet, F. Goetz-Neunhoeffer, S. Dittrich, J. Grabow, H.-D. Kurland, F.A. Müller, Acta Mater. 61, 19 (2013) 7133., entre outros. Diferentes técnicas de síntese podem produzir diferenças nas propriedades luminescentes, como mudanças na emissão fotoluminescente, na sensibilidade, no tempo de vida da emissão e nas suas características do tempo de decaimento 1212 K. Van den Eeckhout, P.F. Smet, D. Poelman, Materials 3, 4 (2010) 2536.. Diante das limitações e desvantagens de muitos métodos tradicionais, o método alternativo sol-gel proteico, que utiliza água de coco como solvente de sais metálicos, se mostra como promissor na síntese de aluminatos 1313 M.A. Macedo, J.M. Sasaki, “Processo de fabricação de pós nanoparticulados”, Patente No. INPI 0203876-5 (1998). )-(1616 V.C. Teixeira, P.J.R. Montes, M.E.G. Valerio, Opt. Mater. 36 (2014) 1580..

Uma das possíveis aplicações do aluminato de estrôncio dopado com terras raras é a sua utilização como pigmento em placas cerâmicas utilizadas para revestimento de fachadas e pavimentos. A aplicabilidade do pigmento produzido a partir do método sol-gel modificado em placas cerâmicas é, no entanto, ainda pouco explorado, sendo importante a realização de experimentos que permitam avaliar a interação do material com os componentes de pisos e revestimentos, sendo as fritas o principal deles. O presente trabalho reporta a síntese de SrAl2O4:Eu,Dy por meio do método sol-gel proteico e posterior sinterização a laser de CO2, utilizada como tratamento térmico para a redução dos íons de európio trivalente. O material produzido foi caracterizado e analisado do ponto de vista estrutural, morfológico, óptico e térmico.

MATERIAIS E MÉTODOS

O aluminato de estrôncio, SrAl2O4, foi sintetizado por meio do método sol-gel proteico 1313 M.A. Macedo, J.M. Sasaki, “Processo de fabricação de pós nanoparticulados”, Patente No. INPI 0203876-5 (1998). , no qual a água de coco foi utilizada para substituir os alcóxidos e o solvente do processo sol-gel convencional. Os cloretos de estrôncio e de alumínio hexa-hidratados (SrCl2.6H2O e AlCl3.6H2O) P.A., ambos da Vetec, e os nitratos de disprósio e de európio penta-hidratados [Dy(NO3)3.5H2O e Eu(NO3)3.5H2O 99,9%], ambos da Aldrich, foram adicionados à agua de coco e a mistura foi agitada a fim de se obter um sol uniforme e homogêneo. A solução foi preparada com o intuito de obter as amostras com a estequiometria (Sr0,97Eu0,02Dy0,01)Al2O4. O xerogel, formado a partir da secagem do sol em estufa a 100 °C por 24 h, foi calcinado a 1100 °C durante 4 h 1717 P.J.R. Montes, M.E.G. Valerio, G. de M. Azevedo, Nucl. Instrum. Methods Phys. Res. B 266 (2008) 2923.. Parte do pó foi, então, prensada uniaxialmente, formando pastilhas com espessuras de 1 a 2 mm e 6 mm de diâmetro. As pastilhas foram sinterizadas a laser de CO2, com o intuito de reduzir o Eu3+ para Eu2+1818 R. Aroz, V. Lennikov, R. Cases, M.L. Sanjuán, G.F. de la Fuente, E. Muñoz, J. Eur. Ceram. Soc. 32, 16 (2012) 4363., processo no qual um feixe de laser é posicionado no centro da amostra, fixado no modo contínuo e a densidade de potência incidente é variada de forma linear. O laser utilizado foi da Coherent, GEM-100L. Todas as pastilhas sinterizadas a laser foram produzidas a partir de um mesmo lote do pó calcinado previamente. Após a sinterização as pastilhas foram maceradas para realização dos ensaios de caracterização.

Análises térmicas foram realizadas por meio das técnicas de análise térmica diferencial (DTA) e termogravimetria (TG), com utilização de um equipamento da TA Instruments, SDT 2960, sob atmosfera de ar sintético com fluxo de 100 mL/min, taxa de aquecimento de 10 °C/min e patamar de 1100 °C. Às análises térmicas foram submetidos o xerogel inicial, o pigmento calcinado, fritas e a mistura entre fritas e o pigmento. A difração de raios X das amostras antes e após a sinterização foi realizada utilizando um difratômetro da Rigaku, Ultima Plus Rint 2000/PC, à temperatura ambiente, no modo de varredura contínua, usando radiação CoKα. Medidas de tamanho de partícula por espalhamento dinâmico de luz (EDL) foram realizadas com a utilização do equipamento ZetaSizer Nano ZS, da Malvern Instruments, UK, que possui laser de He-Ne operando em 633 nm e detector fixo no ângulo de 173°. Para a medida, 1 mg dos pós antes e após a sinterização a laser foi dispersado em 50 mL de etileno glicol. Um ultrassom de ponta da Cole Parmer Instruments com 500 W, Ultrasonic Processor CP 505, com amplitude a 25%, foi utilizado durante 4 repetições de 5 min, com intervalo de 2 min entre cada repetição, a fim de desaglomerar as partículas e homogeneizar cada suspensão. Após isso, 5 mL das suspensões foram coletados à meia altura e depositados em cubeta de quartzo para análise. Imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV) das amostras foram adquiridas a partir de um microscópio JEOL JSM-7500F. Para aquisição das imagens, os pós de aluminato de estrôncio antes e após a sinterização foram dispersados em etileno glicol P.A. (Synth), com o auxílio do ultrassom de ponta. Uma porcentagem das amostras dispersadas foi coletada à meia altura da dispersão e, em seguida, depositada em substratos de grafite. A superfície de fratura de uma pastilha sinterizada também foi analisada por microscopia eletrônica.

No intuito de mapear espectros de emissão das amostras antes e após a sinterização a laser, medidas de fotoluminescência (PL) foram realizadas com a utilização de um espectrofluorímetro ISS PC1, com lâmpada de xenônio de 300 W e um monocromador com resolução de 0,25 nm para a excitação. A emissão foi coletada em um espectrômetro HR2000 da OceanOptics com fenda de 1 mm e resolução de 0,1 nm. O comprimento de onda de excitação foi variado de 5 em 5 nm, em um intervalo de 200 a 300 nm para a amostra antes da sinterização e de 255 a 400 nm para a amostra após a sinterização. Para melhor observação dos resultados, os gráficos são apresentados em três dimensões. As intensidades dos espectros de emissão coletados com diferentes comprimentos de onda de excitação foram corrigidas levando-se em consideração a intensidade da luz de excitação em cada comprimento de onda. O mesmo equipamento foi utilizado para medição do tempo de vida de emissão luminescente da amostra após a sinterização a laser, porém com utilização de uma fotomultiplicadora. Para isto, utilizou-se o comprimento de onda de excitação que gerou a maior intensidade de emissão, de acordo com o espectro 3D apresentado. A excitação foi mantida durante 120 s e, cessada a excitação, a emissão foi registrada em função do tempo. Destes resultados foi possível extrair os valores dos tempos de decaimento típicos dos processos luminescentes. Medidas de fluorescência de raios X (FRX) da frita adquirida foram realizadas em um S4 Pioneer, da Bruker, com tensão de 60 kV e corrente de 10 mA. Para a análise, foram utilizados aproximadamente 10 g do material conformado em forma de pastilha. Na câmara do equipamento foi feito vácuo e, logo após, uma mistura de 90% de argônio e 10% de metano foi introduzida para detecção de comprimentos de ondas maiores.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

DTA/TG dos precursores de SrAl2O4 : na Fig. 1 são apresentadas as curvas de DTA (análise térmica diferencial) e de TG (análise termogravimétrica) do xerogel de partida produzido para o sistema estrôncio-alumínio. Foi possível identificar a perda de aproximadamente 25% de massa em cerca de 120 °C por meio da curva de TG, associada a eventos endotérmicos, observados em torno de 60 e 120 °C na curva de DTA. A eliminação da água residual absorvida pelo xerogel higroscópico foi o fenômeno responsável por tal perda de massa da amostra. Outro evento endotérmico ocorreu próximo de 180 °C e se referiu, provavelmente, à combustão de precursores orgânicos contidos da água de coco. Na região em torno de 500 °C, ampliada no inserto do gráfico, e em torno de 850 °C, eventos exotérmicos são visualizados e estes podem estar relacionados à cristalização de precursores, em um processo que também pode envolver perda de massa. No processo de cristalização do óxido, a perda total de massa foi de cerca de 37%.

Figura 1:
Curvas de DTA e TG do xerogel do sistema estrôncio-alumínio.
Figure 1:
DTA and TG curves of xerogel of the strontium-aluminum system.

Difratometria de raios X: na Fig. 2 são apresentados os difratogramas das amostras antes e após a sinterização a laser de CO2, em comparação com os padrões de difração das fases monoclínica e hexagonal do SrAl2O4, obtidos do banco de dados cristalográficos ICSD (Inorganic Crystallography Structure Database), com números 26466 e 153164, respectivamente. Foi possível afirmar por meio do difratograma da amostra antes da sinterização que a fase desejada, SrAl2O4, foi formada com sucesso, porém com a presença de dois picos pouco intensos da fase Sr4Al2O7. Além disso, notou-se uma inversão na intensidade relativa do pico em 2θ de 33,08°, associado ao plano (IMG11) da fase monoclínica do SrAl2O4, e o pico em 2θ de 34,15°, que seria o pico associado ao plano (220) da fase monoclínica. Esta inversão de intensidade foi devida à presença da fase hexagonal do SrAl2O4, como pode ser visto na Fig. 2, que apresentou o pico de difração de maior intensidade associado ao plano (102) em 2θ de 33,8°. A coexistência das fases monoclínica e hexagonal foi relatada diversas vezes na literatura, ocorrendo por meio de diferentes métodos de síntese e em variadas temperaturas e composições 1717 P.J.R. Montes, M.E.G. Valerio, G. de M. Azevedo, Nucl. Instrum. Methods Phys. Res. B 266 (2008) 2923.), (1919 P. Escribano, M. Marchal, M.L. Sanjuán, P. Alonso-Gutiérrez, B. Julián, E. Cordoncillo, J. Solid State Chem. 178, 6 (2005) 1978.. Foi possível notar ainda que os picos de difração são largos, que podem indicar que o material tem dimensões nanométricas. O difratograma da amostra sinterizada a laser revelou, por sua vez, a formação da fase SrAl2O4 unicamente, o que pode ser explicado pela alta temperatura do feixe de laser incidente sobre a amostra. Ademais, foi possível notar que os picos tiveram melhor relação sinal-ruído e foram mais estreitos, o que pode indicar maior tamanho dos cristalitos e aumento da cristalinidade do material. Nenhum pico de fases relacionadas ao dopante e ao codopante puderam ser vistos, o que mostrou que seus íons foram dissolvidos com sucesso na matriz do SrAl2O4, como almejado.

Figura 2:
Difratogramas de raios X de SrAl2O4 calcinado a 1100 °C/4 h e após sinterização a laser de CO2.
Figure 2:
X-ray diffraction patterns of the SrAl2O4 calcined at 1100 °C/4 h and after CO2 laser sintering.

Espalhamento dinâmico de luz (EDL): a Fig. 3 apresenta gráficos de EDL, nos quais a distribuição do tamanho das partículas é apresentada em função da intensidade e do número de partículas contidas nas amostras de SrAl2O4:Eu,Dy antes e após a sinterização a laser. As Figs. 3a e 3c apresentam os gráficos típicos do número de partículas e da intensidade em função do diâmetro para amostras antes da aplicação do laser e as Figs. 3b e 3d gráficos equivalentes para amostras após a aplicação do laser. Os dois gráficos, de número e de intensidade, são mostrados para evidenciar diferentes regiões de tamanho, já que a intensidade do espalhamento é proporcional à sexta potência do raio enquanto que o número não depende do raio. Vale a pena mencionar ainda que o diâmetro ou raio obtido em experimentos de EDL, via de regra, não representam diretamente o tamanho das partículas e sim o raio ou diâmetro hidrodinâmico, chamado também de raio ou diâmetro de giro, que depende de como as partículas executam o movimento Browniano no fluido no qual estão suspensas 2020 J. Lim, S.P. Yeap, H.X. Che, S.C. Low, Nanoscale Res. Lett. 8, 1 (2013) 381.. Se, por exemplo, as partículas são esféricas, o tamanho obtido por EDL representa o raio ou diâmetro das partículas adicionado da camada de solvatação do fluido que se move junto com as partículas. Se as partículas estão aglomeradas e o aglomerado se desloca no fluido como uma entidade única, o tamanho será representativo do raio de giro do aglomerado 2121 F. Babick, S. Gropp, U. Kätzel, M. Vorbau, Powder Technol. 217 (2012) 39.. Estas características, no entanto, não impedem que a técnica de EDL possa ser usada para analisar partículas nanométricas. Ela serve como uma técnica para estimar o tamanho de um conjunto de partículas em suspensão num fluido servindo, em particular, para determinar se existem aglomerados ou não. Em medidas comparativas entre amostras de mesma natureza a EDL é útil porque a variação do tamanho das partículas pode ser identificada facilmente. Neste contexto, então, foi possível ver nas amostras antes de serem submetidas ao tratamento com laser (Figs. 3a e 3c) que as partículas se dividiram em dois grupos com diâmetros hidrodinâmicos médios de cerca de 68 e 79 nm, respectivamente, e larguras de distribuição à meia altura de cerca de 24 e 29 nm. Para as amostras após o tratamento com laser (Figs. 3b e 3d), por sua vez, foi possível perceber que as partículas nanométricas continuaram a existir, representadas pelos picos com diâmetros médios em aproximadamente 59 nm em ambos e larguras de distribuição à meia altura de cerca de 17 nm, na distribuição por número de partículas, e 10 nm, na distribuição por intensidade. Notou-se adicionalmente o aparecimento de uma banda larga, evidente apenas na distribuição por intensidade, associada a partículas maiores ou aglomerados de partículas com diâmetro médio de 769 nm e largura de 272 nm. Esta banda é nítida na Fig. 3d exatamente porque a intensidade de espalhamento é muito maior para partículas maiores do que para as menores, como discutido anteriormente. Tais resultados foram confirmados com as imagens de microscopia eletrônica de varredura e outras conclusões são apresentadas.

Figura 3:
Medidas da distribuição do tamanho de partículas de SrAl2O4:Eu,Dy por EDL: (a, c) antes da sinterização a laser; (b, d) após a sinterização a laser; (a, b) tamanho em função do número; (c, d) tamanho em função da intensidade.
Figure 3:
Particle size distributions of SrAl2O4:Eu,Dy by DLS: (a, c) before laser sintering; (b, d) after laser sintering; (a, b) size versus number; (c, d) size versus intensity.

Microscopia eletrônica de varredura (MEV): na Fig. 4 são apresentadas imagens de MEV de SrAl2O4:Eu,Dy antes da sinterização a laser. Foi possível observar a formação do pigmento nanoestrurado na forma de nanofolhas com espessuras menores que 100 nm, que chegaram a se sobrepor umas sobre as outras, formando grandes placas, e também como nanopartículas de formas irregulares aglomeradas em blocos micrométricos do material. Resultados um pouco diferentes podem ser visualizados na Fig. 5, que apresenta micrografias de MEV da amostra após a sinterização a laser. Por meio dela foi possível observar o crescimento das partículas vistas antes da sinterização, justificado pela utilização de alta temperatura no processo. Contudo, ainda foram encontradas partículas com pelo menos uma de suas dimensões em escala nanométrica, além de serem vistas também placas formadas pela sobreposição de nanofolhas do material e blocos micrométricos que pareceram ser um pouco maiores do que os anteriormente observados, visto que a sinterização causou a coalescência e, consequentemente, o crescimento de partículas.

Figura 4:
Micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura da amostra de SrAl2O4:Eu,Dy antes da sinterização a laser de CO2.
Figure 4:
SEM images of the SrAl2O4:Eu,Dy before CO2 laser sintering.

Figura 5:
Micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura da amostra de SrAl2O4:Eu,Dy após sinterização a laser de CO2.
Figure 5:
SEM images of the SrAl2O4:Eu,Dy after CO2 laser sintering.

Na Fig. 6 são apresentadas micrografias da superfície de fratura das pastilhas sinterizadas a laser. Por meio delas foi possível perceber que a fratura ocorrida foi do tipo transgranular, ou seja, com propagação da trinca através dos grãos e não na região dos contornos. Este tipo de fratura foi consequência, possivelmente, da alta temperatura alcançada pelo laser de CO2 no processo de sinterização, que propiciou crescimento dos grãos e maior coesão dos contornos dos grãos formados. Observou-se, além disso, alta eficiência da sinterização no que se refere à densificação do corpo sinterizado, o que pode ser explicado pela alta temperatura decorrente do processo e pelo alto grau de empacotamento das nanofolhas formadas por meio do método de síntese utilizado no momento em que o pó calcinado foi prensado uniaxialmente. A presença de poros não foi percebida nas micrografias.

Figura 6:
Micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura da superfície de fratura de amostra de pastilha de SrAl2O4:Eu,Dy após sinterização a laser de CO2.
Figure 6:
SEM images of the fracture surface of a SrAl2O4:Eu,Dy laser sintered pellet.

Fotoluminescência: na Fig. 7a é exibido o espectro de emissão da amostra de SrAl2O4 codopada com Eu e Dy antes do tratamento térmico em laser de CO2. As medidas, após terem sido devidamente corrigidas pela intensidade de excitação, como descrito no procedimento experimental, foram organizadas na forma de um gráfico em 3 dimensões, com os eixos X e Y sendo os comprimentos de emissão e excitação, respectivamente, e o eixo Z a intensidade de emissão. Por meio do espectro foi possível notar picos de emissão estreitos e característicos do Eu3+, com emissão principal em aproximadamente 625 nm, região na qual a cor vermelha é característica 2222 P.J.R. Montes, M.E.G. Valerio, J. Lumin. 130, 8 (2010) 1525.. Estas emissões foram associadas às transições 5D07FJ (J= 0 a 7) dos íons de Eu3+2323 K. Binnemans, Coord. Chem. Rev. 295 (2015) 1.. Esta figura indicou ainda que a máxima emissão foi obtida com comprimento de onda de excitação próximo de 265 nm (4,7 eV). O espectro 3D da amostra após o tratamento térmico em laser de CO2 é exibido na Fig. 7b. Nele observam-se bandas de emissão características do Eu2+, em que a mais intensa localiza-se em torno de 520 nm e se refere à transição 4f65d1→4f7 do Eu2+2424 H. Terraschke, M. Suta, M. Adlung, S. Mammadova, N. Musayeva, R. Jabbarov, M. Nazarov, C. Wickleder, J. Spectrosc. 2015 (2015) 1.. O resultado confirmou a redução da maior parte do európio, inicialmente trivalente, para o estado bivalente após a sinterização a laser. O máximo da emissão do Eu2+ foi obtido com comprimentos de onda de excitação em torno de 350 nm (3,5 eV). A cor característica da emissão nessa região é o verde.

Figura 7:
Espectros de emissão de SrAl2O4:Eu,Dy em três dimensões antes (a) e após (b) a sinterização a laser de CO2.
Figure 7:
3D emission spectra of SrAl2O4:Eu,Dy before (a) and after (b) CO2 laser sintering.

Decaimento da luminescência do pigmento após sinterização a laser: na Fig. 8 é apresentada a curva de decaimento de luminescência da amostra de SrAl2O4:Eu,Dy após a sinterização a laser. A linha tracejada no gráfico indica a contagem de fundo média obtida antes de iniciar a excitação da amostra. Notou-se que a luminescência do material cessou totalmente cerca de 100 min depois de retirada a excitação. O rápido decaimento inicial se deveu principalmente à emissão dos íons de Eu2+, já que a transição é permitida pelas regras de seleção espectroscópicas. O prolongamento da emissão, que pode ser visto por meio da curva, se deu devido ao armadilhamento de elétrons e buracos nos novos níveis de energia criados com a introdução dos íons de Dy3+ , responsáveis pelo aumento do número de armadilhas e pela profundidade das armadilhas 2525 Z. Qiu, Y. Zhou, M. Lü, A. Zhang, Q. Ma, Acta Mater. 55, 8 (2007) 2615..

Figura 8:
Curva de decaimento de luminescência do SrAl2O4:Eu2+,Dy3+ preparado pelo método sol-gel proteico.
Figure 8:
Luminescence decay curve for SrAl2O4:Eu2+,Dy3+ produced via proteic sol-gel method.

Fluorescência de raios X: na Tabela I é possível visualizar o resultado da análise química das fritas por fluorescência de raios X. O resultado indicou quantidades expressivas de silício, alumínio, cálcio, zinco e potássio, e quantidades menores de outros elementos. Estas concentrações estão de acordo com os resultados de análise química de fritas disponíveis na literatura 2424 H. Terraschke, M. Suta, M. Adlung, S. Mammadova, N. Musayeva, R. Jabbarov, M. Nazarov, C. Wickleder, J. Spectrosc. 2015 (2015) 1.)-(2626 S.F. Santos, M.C. Andrade, S.C.A. França, T. Ogasawara, Cerâmica 56, 337 (2010) 9.. A quantidade relativa de seus óxidos varia de frita para frita a depender do que se deseja na indústria, sendo que a introdução de um óxido ou retirada de outro implica em variação do ponto de fusão, diferentes temperaturas de transição vítrea (Tg) e, consequentemente, curvas de análise térmica diversas. A análise química permitiu afirmar que a introdução do pigmento de aluminato de estrôncio SrAl2O4:Eu,Dy nesse tipo de frita não deve causar muitas alterações no comportamento térmico desta mistura, já que o pigmento é um óxido e os principais metais que o constituem já estão presentes em concentrações razoáveis na própria frita.

Tabela I
Análise química (% em massa) das fritas adquiridas, realizada por fluorescência de raios X.
Table I
Chemical analysis (wt%) of acquired frits, obtained by X-ray fluorescence.

DTA/TG de fritas e pigmento: as curvas de DTA e TG da frita, do pigmento final e da mistura entre fritas e pigmento em várias razões em massa são apresentadas nas Figs. 9a e 9b, respectivamente. Foi possível perceber que não ocorreram novas reações químicas com a adição do pigmento à frita, assim como não foram observadas diferenças significativas na perda de massa. Os eventos térmicos que apareceram nas curvas de DTA foram aproximadamente nas mesmas regiões de temperatura, variando apenas de intensidade, dependendo da concentração do pigmento em relação à frita. Estes resultados indicaram que a adição do pigmento à frita se comporta como uma mistura física e as reações que ocorrem durante o aquecimento se processam quase que da mesma forma com ou sem a adição do pigmento.

Figura 9:
Curvas de DTA (a) e TG (b) da frita, do pigmento de aluminato de estrôncio e de misturas entre ambos em diferentes razões em massa.
Figure 9:
DTA (a) and TG (b) curves of frit, strontium aluminate pigment and mixtures of both in different mass ratios.

CONCLUSÕES

O método alternativo sol-gel proteico foi eficiente na produção de SrAl2O4:Eu,Dy, uma vez que a estequiometria desejada foi obtida, embora com uma pequena concentração de fase indesejada de Sr4Al2O7 e uma concentração razoável da fase hexagonal do SrAl2O4 antes da sinterização a laser. A sinterização a laser de CO2 mostrou-se uma etapa eficiente, eliminando tanto a fase hexagonal quanto a fase Sr4Al2O7, além de atuar na redução do európio do estado trivalente para o divalente e ocasionar boa densificação de pastilhas prensadas previamente. A amostra antes da sinterização apresentou linhas de emissão luminescente características do Eu3+, com emissão mais intensa quando excitada em 265 nm, e após o tratamento a laser apresentou bandas de emissão características do Eu2+, com máxima emissão quando a amostra foi excitada em 350 nm. A rota alternativa possibilitou a cristalização do SrAl2O4 em aproximadamente 1060 °C, o que é uma vantagem do método, já que emprega menores temperaturas de síntese quando comparado à síntese de estado sólido, que emprega temperaturas de até 1600 °C. Foi possível constatar a formação de material nanométrico, com evidente presença de partículas maiores e aglomerados de partículas. A amostra sinterizada apresentou tempo de decaimento da luminescência de aproximadamente 100 min após ser excitada. Verificou-se, por fim, que houve uma boa compatibilidade do pigmento com a frita, indicando o potencial do mesmo ser aplicado em placas cerâmicas utilizadas para revestimento de fachadas e pavimentos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    18 Jan 2016
  • Revisado
    06 Jun 2016
  • Aceito
    02 Jul 2016
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