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Síntese e caracterização das fases minerais C3S, C2S, C3A e C4AF para utilização em cimento tipo Portland

Synthesis and characterization of mineral phases C 3 S, C 2 S, C 3 A and C 4 AF for use in Portland cement

Resumo

As principais fases contidas no cimento Portland são 3CaO.SiO2 (C3S), 2CaO.SiO2 (C2S), 3CaO.Al2O3 (C3A) e 4CaO.Al2O3.Fe2O3 (C4AF). No processo industrial estas apresentam incorporações de outros elementos que dependem das matérias-primas e dos combustíveis utilizados na queima. O uso das fases puras auxilia na compreensão dos fenômenos envolvidos no estado fresco e endurecido, porém sua produção isolada exige condições específicas. O objetivo foi realizar a síntese das fases com o intuito de obter a menor quantidade de polimorfos e CaO. Na caracterização das fases químicas foram utilizadas as análises de granulometria a laser, fluorescência de raios X e difração de raios X com a quantificação das fases pelo método de Rietveld. Foi obtida elevada pureza para o C4AF e o C3A. O C3S e o C2S apresentaram apenas um polimorfo, porém elevados teores de CaO, 4,9 e 5,1%, respectivamente.

Palavras-chave:
síntese; cimento Portland; clínquer; polimorfismo

Abstract

The main phases contained in the Portland cement are 3CaO.SiO2 (C3S), 2CaO.SiO2 (C2S), 3CaO.Al2O3 (C3A), and 4CaO.Al2O3.Fe2O3 (C4AF). In the industrial process, these phases present incorporations of other elements that depend on the raw materials and the fuels used in the firing. The use of the pure phase helps in understanding the phenomena involved in the fresh and hardened state, however their isolated production requires specific conditions. The objective of this research was to perform the synthesis of the phases in order to obtain the minimum of polymorphs and CaO. In the characterization of the chemical phases obtained, the laser particle-size analysis, X-ray fluorescence and X-ray diffraction with the quantification by Rietveld method were used. High purity could be obtained for C4AF and C3A. The C3S and C2S phases had at most one polymorph, but high levels of CaO, 4.9 and 5.1%, respectively.

Keywords:
synthesis; Portland cement; clinker; polymorphism

INTRODUÇÃO

A matéria-prima utilizada na produção do cimento Portland e o combustível trazem consigo elementos em menores quantidades que são incorporados na estrutura cristalina das fases durante a sinterização, que podem influenciar na reatividade dos cimentos 11 H.M. Ludwig, W. Zhang, Cem. Concr. Res. 78 (2015) 24.. Assim, por muitas vezes são estudadas as fases puras na perspectiva de uma melhor compreensão dos fenômenos envolvidos, seja no processo de produção com substituição de outros elementos nas fases 22 A. de la Torre, R.N. Vera, A.J.M. Cuberos, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 38 (2008) 1261.)-(44 X. Li, W. Xu, S. Wang, M. Tang, X. Shen, Constr. Build. Mater. 58 (2014) 182. e suas consequências na reatividade do cimento 55 W. Mazouzi, L. Kacimi, M. Cyr, P. Clastres, Cem. Concr. Compos. 53 (2014) 170.)-(77 S.T. Bergold, F.G. Neunhoeffer, J. Neubauer, Cem. Concr. Res. 88 (2016) 73., ou na busca de novas alternativas 88 F.R. Perreira, R.J. Ball, J. Rocha, J.A. Labrincha, G.C. Allen, Cem. Concr. Res. 38 (2008) 511.)-(1010 R.I. Iacobescu, G.N. Angelopoulos, T.P. Jones, B. Blanpain, Y. Pontikes, J. Clean. Prod. 112 (2016) 872.. A maior dificuldade em relação à síntese das fases puras é a impossibilidade de um procedimento único que funcione para qualquer tipo de forno, mesmo fixando a quantidade de material, a temperatura e a rampa de aquecimento. Para analisar os materiais obtidos neste processo a técnica mais empregada atualmente é a difração de raios X (DRX), em virtude de ser conclusiva, em termos qualitativos e quantitativos quando utilizado o método matemático de Rietveld, porém, em relação aos polimorfos, a possibilidade de erros é elevada, podendo ser determinados polimorfos que não descrevem adequadamente a realidade, gerando assim uma modelagem inadequada 1111 V.K. Peterson, B.A. Hunter, A. Ray, J. Am. Ceram. Soc. 87 (2004) 1625.. Outras técnicas empregadas na caracterização são análise termodiferencial (ATD), microscopia óptica 11 H.M. Ludwig, W. Zhang, Cem. Concr. Res. 78 (2015) 24. e, mais recentemente, difração de raios X por radiação sincrotron 22 A. de la Torre, R.N. Vera, A.J.M. Cuberos, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 38 (2008) 1261.), (1111 V.K. Peterson, B.A. Hunter, A. Ray, J. Am. Ceram. Soc. 87 (2004) 1625.), (1212 A. de la Torre, S. Bruque, J. Campo, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 32 (2002) 1347..

Silicato de cálcio 3, 3CaO.SiO2, C3S e alita: na síntese do C3S é difícil obter uma fase com apenas um polimorfo 1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129., sendo sete os polimorfos possíveis para os três sistemas cristalinos: triclínico, monoclínico e romboédrico 1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990).. Na Fig. 1 estão apresentados dois gráficos resultantes de dados da literatura 1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990)., em função das faixas de temperatura para a estabilização dos polimorfos tanto do C3S quanto do C2S, sendo para o C3S a estrutura romboédrica obtida nas maiores temperaturas, acima de 1070 ºC, e a triclínica nas menores (até 980 ºC). Os picos principais para as amostras de C3S analisadas por DRX encontram-se entre os ângulos 32° a 33° e 51,5° a 52° (2θ). Também podem ser analisados os picos de difração para o intervalo angular entre 29 e 31,5° 22 A. de la Torre, R.N. Vera, A.J.M. Cuberos, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 38 (2008) 1261.), (1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129.. Nos clínqueres, o C3S apresenta a incorporação de outros elementos, sendo então denominados como alita. Distintos processos de síntese são adotados por diferentes autores 22 A. de la Torre, R.N. Vera, A.J.M. Cuberos, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 38 (2008) 1261.), (1212 A. de la Torre, S. Bruque, J. Campo, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 32 (2002) 1347.), (1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129.), (1515 E. Woermann, T. Hahn, W. Eysel, Cem. Concr. Res. 9 (1979) 701.)-(2525 J. Song, D.W. Lee, Y.H. Cho, K.M. Ok, Bull. Korean Chem. Soc. 33 (2012) 2423. na produção da alita e do C3S em uma faixa de temperatura que varia entre 1430 e 1600 °C, tempos de queima de até 18 h com um, dois ou mais ciclos de queima, assim como pela execução de moagem intermediária a fim de obter estruturas polimórficas específicas ou apenas com o intuito de reduzir a quantidade de CaO livre. Contudo, existem informações no processo de síntese que não são divulgadas, alguns ainda informam o processo de resfriamento utilizado 22 A. de la Torre, R.N. Vera, A.J.M. Cuberos, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 38 (2008) 1261.), (1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129.), (1515 E. Woermann, T. Hahn, W. Eysel, Cem. Concr. Res. 9 (1979) 701.), (1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.), (2020 F. Bellmann, T. Sowoidnchi, H.M. Ludwig, D. Damidont, Cem. Concr. Res. 72 (2015) 108.), (2525 J. Song, D.W. Lee, Y.H. Cho, K.M. Ok, Bull. Korean Chem. Soc. 33 (2012) 2423., entretanto em nenhum dos trabalhos citados foi relatada a quantidade de nódulos por queima ou mesmo o volume da cápsula utilizada.

Figura 1
Gráficos plotados a partir de resultados analíticos de processos de síntese 1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990)., sendo considerada a faixa de temperatura para cada polimorfismo das fases, C3S (a) e C2S (b), na obtenção do clínquer de cimento Portland.
Figure 1
Graphs plotted using analytical results of synthesis processes (1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990)., considering the temperature range for each polymorphism of the phases, C3S (a) and C2S (b), to obtain Portland cement clinker.

Silicato de cálcio 2, 2CaO.SiO2, C2S (belita): no clínquer, o C2S é denominado como belita e, assim como o C3S, também apresenta polimorfos apresentados na Fig. 1b, sendo eles C2S-γ, C2S-β, α’L, α’H e α [14). O polimorfo encontrado com maior frequência nos clínqueres é o C2S-β. O C2S-α é formado em temperaturas da ordem de 1425 ºC, mas, devido à sua baixa estabilidade, no processo de resfriamento retorna à estrutura C2S-β 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.. Caso o C2S-β não seja estabilizado durante o resfriamento, os C2S-α e C2S-α’ são estabilizados com o polimorfo C2S-γ 2626 L.A. Gobbo, “Os compostos do clínquer Portland: sua caracterização por difração de raios-X e quantificação por refinamento de Rietveld”, Diss. Mestr., Un. S. Paulo, S. Paulo (2003).. Existe uma particularidade para C2S-γ e quando ocorre o seu aquecimento entre 780 e 860 °C não há sua conversão estrutural para C2S-β, transformando-se diretamente em C2S-α’L. Contudo, C2S-β pode ser convertido em C2S-γ. Essa conversão promove a quebra dos nódulos, devido à diferença nas estruturas atômicas para os dois polimorfos, resultando em um material pulverulento e de distintas densidades 1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990).. Com a necessidade crescente de redução na emissão de CO2, o cimento belita tem sido estudado como uma alternativa na produção de cimentos de menor impacto ao meio ambiente, tendo em vista que a fase C2S é formada em menor temperatura, bem como necessita de menor quantidade de CaCO3 e, por conseguinte, menor liberação de CO2 no processo de descarbonatação 11 H.M. Ludwig, W. Zhang, Cem. Concr. Res. 78 (2015) 24.. Neste caso, em alguns trabalhos prioriza-se o aumento da reatividade hidráulica da belita 66 L. Kriskova, Y. Pontikes, F. Zhang, Ö. Cizer, P.T. Jones, K.V. Balen, B. Blanpain, Cem. Concr. Res. 55 (2014) 59.), (2727 L. Kacimi, A. Simon-Masseron, S. Salem, A. Ghomari, Z. Derriche, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 559.), (2828 T. Link, F. Bellmann, H.M. Ludwig, M.B. Haha, Cem. Concr. Res. 67 (2015) 131., enquanto que em outros usam-se adições a fim de aumentar a sua estabilidade, tais como boro 66 L. Kriskova, Y. Pontikes, F. Zhang, Ö. Cizer, P.T. Jones, K.V. Balen, B. Blanpain, Cem. Concr. Res. 55 (2014) 59., potássio 2929 M. Fridrichová, K. Dvorák, D. Gazdic, Ceramics - Silikáty 57 (2013) 336. e mesmo a argila mineral com alto teor de óxido de alumínio 3030 D. Kurokawa, H. Yoshida, K. Fukuda, Cem. Concr. Res. 60 (2014) 63.. Também tem sido estudada a utilização de outros insumos na produção do cimento belita, como a nanossílica proveniente da casca do arroz 3131 S. Sinyoung, K. Kunchariyakun, S. Asavapisit, K.J.D. MacKenzie, J. Environ. Manag. 190 (2017) 53. e o resíduo de lodo de anodização de alumínio não calcinado 3232 E. Costa, E.D. Rodríguez, S.A. Bernal, J.L. Provis, L.A. Gobbo, A.P. Kirchheim, Constr. Build. Mater. 122 (2016) 373.. A faixa de temperatura utilizada para a síntese do C2S é ampla; por exemplo, 1000 °C em 3333 S. Sahu, J. Mailing, Cem. Concr. Res. 23 (1993) 1331., enquanto em 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973. foi realizada a síntese a 1450 °C.

Aluminato de cálcio 3, 3CaO.Al2O3, C3A: o C3A, quando puro, não apresenta polimorfismo como observado para o C2S e o C3S, sendo possível apenas o sistema cristalino cúbico. Entretanto, na produção dos clínqueres, os íons de Na+ podem ser incorporados no lugar do Ca2+ alterando a estrutura para ortorrômbica ou monoclínica 1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990).. A influência do teor de Na2O na estrutura cristalina do C3A foi verificada experimentalmente em 3434 C. Ostrowski, J. Zelazny, J. Therm. Anal. Calorim. 75 (2004) 867., cuja concentração de até 2,5% de Na2O manteve a estrutura cúbica; entre 2,5 a 3,7% apresentou-se cúbica e ortorrômbica; somente ortorrômbica para os teores de 3,7 a 4,2%; e monoclínica entre 4,2 e 5,2%. Outras substituições do íon Ca2+, tais como com o Fe3+, Mg2+, Si4+ e K+, foram avaliadas 2626 L.A. Gobbo, “Os compostos do clínquer Portland: sua caracterização por difração de raios-X e quantificação por refinamento de Rietveld”, Diss. Mestr., Un. S. Paulo, S. Paulo (2003).. A faixa de temperatura aplicada na síntese do C3A cúbico encontrada na literatura 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.), (3535 A. Quennoz, K.L. Scrivener, Cem. Concr. Res. 44 (2013) 46.)-(3939 R.J. Myers, G. Geng, E.D. Rodriguez, P. Rosa, A.P. Kirchheim, P.J.M. Monteiro, Cem. Concr. Res. 100 (2017) 176. foi mais estreita, entre 1350 e 1450 °C, e o tempo de queima variou entre 2 e 5 h, com ou sem moagem intermediária.

Ferro-aluminato de cálcio 4, 4CaO.Al2O3.Fe2O3, C4AF: a fase ferrita pode ser obtida a partir de CaCO3, Al2O3 e Fe2O3 e, entre as fases presentes no clínquer, é a de maior complexidade devido ao alto grau de substituição do íon Fe3+ por íons como Mg2+, Si4+, Ti4+ e Mn3+ (1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.. O sistema cristalino do C4AF é ortorrômbico e as substituições em óxidos podem chegar a atingir até aproximadamente 10% 4040 V. Maringolo, “Clínquer co-processado: produto de tecnologia integrada para sustentabilidade e competitividade da indústria de cimento”, Tese Dr., Un. S. Paulo, S. Paulo (2003).. Da mesma forma que o C3A, a temperatura de síntese encontrada para o C4AF apresenta pequena variação, em torno de 100 °C (1200 a 1300 °C), porém os tempos de síntese variaram entre 3 a 16 h 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.), (4141 D.E. Rogers, L.P. Aldredge, Cem. Concr. Res. 7 (1977) 399.)-(4343 K. Fukuda, H. Ando, J. Am. Ceram. Soc. 85 (2002) 1300..

De um modo geral, as pesquisas relacionadas à síntese das fases do clínquer foram na maioria dos casos direcionadas para uma ou duas das quatro principais fases. Poucos foram os trabalhos que realizaram a síntese das 4 fases separadamente, como em 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973., devido à dificuldade em se obter os parâmetros de síntese que resultam na estrutura cristalina desejada para as 4 fases (C3S, C2S, C3A e C4AF). Desta forma, o objetivo desta pesquisa foi realizar a síntese das principais fases do clínquer de cimento Portland, com maior grau de pureza e menor número de polimorfos, com intuito de produzir dados relativos em testes de avaliação de suas propriedades e poder contribuir para a compreensão dos fenômenos envolvidos no estado fresco e endurecido do concreto, pasta ou argamassa dosada.

MATERIAIS E MÉTODOS

Os materiais empregados CaCO3, SiO2, Al2O3, Fe2O3 e MgO foram de pureza elevada, grau pró-análise (PA). Na Tabela I está apresentada a proporção dos materiais para a obtenção de cada fase, assim como a relação da água destilada/material sólido para a produção dos nódulos e a quantidade destes utilizada em função do tamanho da cápsula de platina. As composições foram homogeneizadas de forma manual, com agitação por 5 min. Os nódulos foram moldados com aproximadamente 1 g cada e todas as amostras foram colocadas na estufa a 100 °C por 24 h, antes da queima, com intuito de realizar a secagem. Na síntese do C3S foi utilizado um forno tipo mufla com temperatura de operação de 950 °C para a descarbonatação por 2 h. Posteriormente, a sinterização foi realizada em um forno EDG, F 1800. Foram empregadas duas taxas de aquecimento: até 1250 °C foi aquecido a 10,41 °C/min; a partir disto, foi utilizada a taxa de 5,83 °C/min até 1600 °C, permanecendo nesta temperatura por 4 h. O material foi retirado ao término deste patamar e resfriado com fluxo de ar comprimido por 5 min e posteriormente por 40 min em um dessecador. Na sequência foram moídos 30 g de material em um moinho pulverizador (Herzog, HTP-40) por 20 s.

Tabela I
Composição das fases utilizadas na síntese, relação de água destilada/material sólido (água/sólidos) para a produção dos nódulos e a quantidade de nódulos para cada cápsula de platina.
Table I
Phase compositions used in the synthesis, water/solids ratio for pellets production and pellet number for each platinum capsule.

Na produção do C3A, do C4AF e da alita foi utilizado o forno Jung (mod. 0916). O C3A e o C4AF foram submetidos à mesma taxa de aquecimento de 7,22 °C/min até 1300 °C, com patamar de 4 h nesta temperatura. As amostras foram retiradas durante o resfriamento na temperatura de 1100 °C; a taxa de resfriamento do forno foi de 6,66 °C/min. O resfriamento das amostras, após a retirada do forno, foi em temperatura ambiente por 5 min e 40 min dentro do dessecador. As amostras foram moídas no pulverizador, sendo utilizados 10 g de material por moagem durante 20 s. O C3A moído foi novamente submetido à sinterização nas mesmas condições de queima e resfriamento inicias. A segunda moagem foi realizada a cada 30 g de material, no moinho Herzog, também por 20 s. Na produção da alita foram utilizados dois patamares de queima, um primeiro aquecimento com taxa de 7,92 °C/min até atingir 950 °C, para o processo de descarbonatação que teve duração de 1 h, e posteriormente foi empregada uma taxa de 8,33 °C/min até 1450 °C, na qual permaneceu por 4 h. O resfriamento da alita foi igual ao realizado na síntese do C3S. A primeira moagem foi realizada em um almofariz e na sequência repetido o processo de queima alterando apenas a moagem final, a qual foi realizada no moinho pulverizador com 30 g de material por 20 s. A rampa de aquecimento e os patamares utilizados para cada amostra encontram-se na Fig. 2, exceto para o C2S, que permaneceu na mufla por 35 dias a 950 °C. O resfriamento foi em temperatura ambiente por 5 min e 40 min no dessecador. Na sequência, o C2S foi moído, a cada 30 g por 20 s, e submetido a mais uma queima a 1100 °C por 2 h no forno Jung. A última etapa de queima consistiu em mais 24 h na mufla (950 °C), repetindo o mesmo processo de resfriamento e moagem empregado na primeira queima.

Figura 2
Curvas de tratamento térmico das composições para a obtenção das fases C3S, C3A, C4AF e alita.
Figure 2
Thermal treatment curves of the compositions to obtain the phases C3S, C3A, C4AF and alite.

As caracterizações da composição química elementar, física e das fases estruturais foram obtidas por: i) espectroscopia por fluorescência de raios X (FRX), com tubo de Rd (rádio), tensão de 30 kV para elementos leves e 50 a 70 kV para elementos pesados, corrente de 10 mA e para a execução da pastilha utilizou-se um fundente de tetraborato de lítio; o percentual da perda ao fogo 4444 Ass. Bras. Normas Técn., NBR NM 18, Cimento Portland - análises químicas, determinação da perda ao fogo (2012). foi utilizado no cálculo da FRX; ii) difração de raios X (DRX), com radiação de CuKα (λ=1,54187 Å), corrente de 40 mA, tensão de 40 kV, tempo de coleta 10,640 s, passo angular de coleta de 0,017° 2θ e intervalo angular de 5° a 70° em varredura 2θ, com o uso do software High Score Plus, v. 3d, no tratamento e no refinamento dos resultados; e iii) distribuição granulométrica em granulômetro a laser (Malvern Instr., Mastersizer 2000) via a seco - todas as amostras apresentaram resíduo ponderado menor que 1%.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As distribuições granulométricas para todas as fases obtidas por síntese encontram-se apresentadas na Fig. 3. A amostra com maior frequência de partículas finas foi o C2S para o intervalo de 0,2 a 2 mm. O C3S foi a amostra que apresentou uma maior concentração de partículas entre 2 e 10 mm, em relação às demais fases. As fases alita, C3A e C4AF apresentaram maiores frequências para os tamanhos de 10 a 30 mm. Nos cimentos regulares a quantidade de partículas contidas entre 3 a 30 mm representa aproximadamente 50 a 70% 4545 G. Iglesias, M.M. Álvarez, J.E. Rodríguez, Cem. Concr. Res. 29 (1999) 727., podendo ultrapassar esta porcentagem para cimentos mais finos. Na Fig. 3b observa-se que as distribuições acumuladas nesse intervalo (linhas verticais pretas) foram superiores a 60% para todas as fases, exceto para o C2S. Este, por ser mais fino, apresentou cerca de 47% das partículas abaixo de 3 mm e aproximadamente 43% na faixa sugerida em 4545 G. Iglesias, M.M. Álvarez, J.E. Rodríguez, Cem. Concr. Res. 29 (1999) 727., sendo 10% superior a 30 mm.

Figura 3
Curvas de distribuição granulométrica das fases obtidas por síntese: a) frequência por tamanho de partículas; e b) distribuição acumulada.
Figure 3
Particle size distribution curves of the phases obtained by synthesis: a) frequency by particle size; and b) accumulated distribution.

Na Tabela II, encontram-se listados os percentuais da caracterização química das fases em relação aos teores de óxidos. As perdas ao fogo foram inferiores a 0,29%, pois os materiais já haviam passado pelo processo de descarbonatação durante a síntese. As fases C3A e C4AF atingiram maior grau de pureza, 98,5% e 99,8%, respectivamente, sendo 1,2% de CaO para o aluminato e 0,2% para a ferrita. Nas fases alita, C3S e C2S, foram verificados elevados teores de CaO, 6,6, 4,9 e 5,1%, respectivamente. Várias são as causas que podem estar relacionadas à remanência do CaO, entre elas resfriamento lento, temperatura insuficiente de queima, dosagem inadequada, moagem insatisfatória e falta de homogeneidade da farinha; por analogia aos trabalhos da literatura 4646 M.P. Javellana, I. Jawed, Cem. Concr. Res. 12 (1982) 399.), (4747 N.H. Mtarfi, Z. Rais, M. Taleb, J. Mater. Environ. Sci. 8, 7 (2017) 2541., tais fatores de controle representam uma parcela da complexidade envolvida na produção do cimento Portland. Contudo, a ausência da fase C2S na fase C3S e na alita foi um indício de que o resfriamento foi adequado, pois não houve reversão do C3S para o C2S, que pode ocorrer em resfriamentos mais lentos 4848 F. Sorrentino, Cem. Concr. Res. 41 (2011) 616.. No caso do C3S, que apresentou um grau de pureza de 94,6%, e da alita, com 93%, as temperaturas utilizadas nas queimas foram similares às empregadas na literatura 44 X. Li, W. Xu, S. Wang, M. Tang, X. Shen, Constr. Build. Mater. 58 (2014) 182.), (1212 A. de la Torre, S. Bruque, J. Campo, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 32 (2002) 1347.), (1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129.), (1515 E. Woermann, T. Hahn, W. Eysel, Cem. Concr. Res. 9 (1979) 701.), (1919 I. Maki, H. Haba, Cem. Concr. Res. 13 (1983) 689.), (2121 A. Quennoz, K.L. Scrivener, Cem. Concr. Res. 42 (2012) 1032.), (2222 M.M.C. Fernandez, “Effect of particle size on the hydration kinetics and microstructural development of tricalcium silicate”, Dr. Thesis, École Polytech. Fédérale Lausanne (2008).. Por outro lado, para o C2S, com um grau de pureza de 94,9%, a temperatura utilizada foi inferior à faixa encontrada na literatura 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.), (3333 S. Sahu, J. Mailing, Cem. Concr. Res. 23 (1993) 1331., isto porque foi a única temperatura que resultou em apenas um polimorfo, entre as demais temperaturas testadas previamente (entre 1250 e 1450 °C). Na dosagem, os cálculos foram realizados conforme a estrutura química dos materiais e em g/mol, tendo sido ainda verificado em outras pesquisas o uso das mesmas proporções 1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129.), (2222 M.M.C. Fernandez, “Effect of particle size on the hydration kinetics and microstructural development of tricalcium silicate”, Dr. Thesis, École Polytech. Fédérale Lausanne (2008).), (4949 J.J. Thomas, S.A. Fitzgerald, D.A. Neumann, R.A. Livingston, J. Am. Ceram. Soc. 84 (2001) 1811.. A moagem dos insumos foi adequada, pois os tamanhos das partículas dos reagentes foram inferiores a 50 mm 4848 F. Sorrentino, Cem. Concr. Res. 41 (2011) 616.. A verificação foi realizada com a passagem das matérias-primas pela peneira de 45 mm e todas apresentaram 100% do material passante. A possibilidade do elevado teor de CaO pode ser atribuída então à falta de uma homogeneização adequada nas matérias-primas, a qual foi realizada manualmente com agitação de um recipiente por 5 min. Nos silicatos a temperatura de fusão é elevada dificultando a interação do CaO na estrutura cristalina. Tal fato não ocorreu para os aluminatos que apresentaram maior facilidade de incorporação do CaO.

Tabela II
Caracterização química após o processo de síntese das fases em relação aos teores (%) de óxidos (FRX).
Table II
Chemical characterization after the synthesis process of the phases in relation to the oxides (XRF).

No tratamento dos difratogramas de raios X o erro máximo (GOF - goodness of fit) apresentado foi de 3,98. Valores de GOF inferiores a 5 podem ser considerados como resultados de um bom refinamento 5050 L.A. Gobbo, “Aplicação da difração de raios-X e método de Rietveld no estudo de cimento Portland”, Tese Dr., Un. S. Paulo, S. Paulo (2009)..

C3S: na síntese do C3S foi obtida a estrutura triclínica (T3), de acordo com a Fig. 4. Nesta figura encontram-se os picos denominados como I, II e III para os intervalos de 32° a 33° e 51° a 52° 2θ. As flechas com linhas cheias indicam a sobreposição nos picos da própria estrutura T3 e a flecha com linha e ponto apresenta a sobreposição do CaO. Os mesmos picos principais para o C3S de estrutura T3 foram verificados em 1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129.. Na síntese realizada em 1313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129. o teor de CaO remanescente foi de 0,2%, enquanto no presente artigo o teor foi de 4,6%. Os processos de sínteses foram realizados na mesma temperatura (1600 °C), porém o tempo de queima, a quantidade de nódulos e os sistemas de homogeneização das matérias-primas foram distintos nos dois estudos. Ao analisar a Fig. 5, na qual é apresentada a contribuição de cada produto para a formação dos picos, foi possível observar a influência do CaO remanescente (cor preta) entre os ângulos de 32,1° a 32,5° e também 53,5° até 54,1°. Por outro lado, no intervalo angular de 51° a 52° (2θ) o perfil apresentou apenas sobreposições da fase C3S. Embora o teor de CaO tenha sido elevado de 4,6%, foi possível identificar com precisão a fase obtida na síntese, bem como determinar a presença de apenas um polimorfo.

Figura 4
Difratogramas de raios X para a estrutura triclínica do C3S (perfil em linha pontilhada representa o resultado do teste e a linha contínua os valores calculados) entre intervalos angulares de: a) 31° a 33°; e b) 51° a 52°. As flechas com linha cheia indicam as sobreposições do polimorfo triclínico e a flecha com ponto e linha a sobreposição do CaO.
Figure 4
XRD patterns for the triclinic structure of the C3S (the profile in dotted line represents the test result and the continuous line the calculated values) between angular intervals of: a) 31° to 33°; and b) 51° to 52°. The full line arrows indicate the overlaps of the triclinic structure and the dashed arrow the overlap of the CaO.

Figura 5
Difratogramas de raios X do C3S nos intervalos angulares de: a) 28° a 33°; e b) 49° a 54°. O perfil formado por pontos representa os valores obtidos e a curva com linha cheia refere-se aos valores calculados. A contribuição do polimorfo triclínico para cada pico está destacada na cor cinza claro, com suas sobreposições. A influência do CaO está apresentada pela distribuição na cor preta.
Figure 5
XRD patterns of C3S in the angular intervals between: a) 28° to 33°; and b) 49° to 54°. The profile in dots represents the analysis values and the continuous line refers to the calculated curve. The contribution of the triclinic polymorph to each peak is highlighted in light gray with its overlaps. The influence of CaO is presented by the black color distribution.

C2S: nos clínqueres, geralmente a maior ocorrência é para o polimorfo C2S-β 1616 A. Wesselsky, O.M. Jensen, Cem. Concr. Res. 39 (2009) 973.. Para tanto, neste trabalho foram testados diferentes processos de forma que se conseguiu eliminar totalmente o polimorfo C2S-γ. Isto se fez necessário tendo em vista que o polimorfo γ é o que apresenta a menor reatividade 1414 H.F.W. Taylor, Cement chemistry, Academic Press, London (1990).. Apesar de se conseguir apenas um polimorfo, a presença de CaO também foi elevada, 5,1%. Tal fato dificultou a análise do difratograma de raios X principalmente para os picos localizados entre 31,5° e 32,3° (2θ), conforme mostrado na Fig. 6. Entre os picos 32,14 e 32,22° o C2S-β apresenta dois picos definidos 2626 L.A. Gobbo, “Os compostos do clínquer Portland: sua caracterização por difração de raios-X e quantificação por refinamento de Rietveld”, Diss. Mestr., Un. S. Paulo, S. Paulo (2003)., contudo, devido ao CaO remanescente (32,18° e 32,27°), a sobreposição resultou em apenas um pico. Foi possível avaliar também a sobreposição do CaO no pico 37,34° que apresentou elevada intensidade, conforme ilustrado nas Figs. 6 e 7. Na ausência do CaO, o pico na posição angular 37,34° apresentaria intensidade inferior ao pico seguinte, 37,44° 2626 L.A. Gobbo, “Os compostos do clínquer Portland: sua caracterização por difração de raios-X e quantificação por refinamento de Rietveld”, Diss. Mestr., Un. S. Paulo, S. Paulo (2003).. A proporção calculada pelo método de Rietveld está apresentada na Fig. 7, sendo duas estruturas utilizadas para determinar o C2S-β. A predominância do C2S-β-1 pode ser observada pelas distribuições em cinza claro, enquanto o C2S-β-2 na cor cinza. A cor preta refere-se à sobreposição ocasionada pela presença do CaO.

Figura 6
Difratograma de raios X do C2S para os picos de maior representação do polimorfo β e do CaO. Os C2S-β-1 e C2S-β-2 representam duas referências com distintos parâmetros para o mesmo polimorfo C2S-β, conforme banco de dados disponibilizados pela Votorantim Cimentos.
Figure 6
XRD pattern of C2S for the main peaks of β polymorph and CaO. C2S-β-1 and C2S-β-2 represent two references with distinct parameters for the same polymorph C2S-β, according to the database from Votorantim Cimentos.

Figura 7
Difratograma de raios X do C2S com estrutura monoclínica β para o intervalo angular de 28° a 38°. A linha pontilhada representa a curva obtida no experimento e a linha contínua refere-se à calculada. No interior do difratograma estão apresentados os polimorfos de C2S-β na cor cinza e cinza claro e o CaO na cor preta.
Figure 7
XRD pattern of C2S with monoclinic structure β for the angular range 28° to 38° (2θ). The dotted line represents the experimental curve and the solid line refers to the calculated curve. Within the pattern the C2S-β polymorphs in gray and light gray and the CaO in black are shown.

Síntese do C3A: o C3A apresentou um sistema cristalino cúbico, devido à não utilização de dopagem. Na Fig. 8 mostra-se o pico de maior intensidade para as posições angulares entre 33,20° e 33,28°. A curva de ensaio (linha pontilhada) resultou muito semelhante à curva obtida no refinamento (linha contínua), sendo o erro GOF de 4,91. Foi possível atingir uma baixa quantidade de CaO, inferior a 1,2%, e com pureza de 98,8% para o C3A, podendo ser recomendada a utilização deste processo de síntese em trabalhos futuros.

Figura 8
Pico principal do C3A cúbico obtido pela difratometria de raios X; a linha pontilhada corresponde ao resultado da análise e a linha cheia à curva calculada.
Figure 8
Main peak of the cubic C3A obtained by X-ray diffraction; the dotted line corresponds to the analysis result and the full-line to the calculated curve.

Síntese do C4AF: o C4AF apresentou um difratograma de raios X (Fig. 9) similar ao do estudo 4242 E. Suzuki, N. Tsuyuki, Y. Aoyama, O. Machinaga, J. Ceram. Soc. Japan 104, 7 (1996) 631.. Na análise pelo modelo de Rietveld foi utilizado como padrão de referência a brownmilerita com um sistema cristalino ortorrômbico. Os dois principais picos da ferrita (33,84° e 33,92°) não se sobrepuseram aos picos principais das demais fases, C3A, C2S e C3S. O maior teor de CaO encontrado foi de 0,2%, sem a presença de Ca(OH)2, desta forma o grau de pureza obtido foi de praticamente 100%, sendo também recomendado este processo de síntese em fornos semelhantes.

Figura 9
Difratograma de raios X do C4AF; linha com pontos refere-se ao resultado do teste e a linha contínua ao calculado.
Figure 9
XRD pattern of the C4AF; dotted line refers to the test result and the continuous line to the calculated curve.

Síntese da alita: a alita apresentou dois polimorfos, o monoclínico e o triclínico, sendo este último o predominante. Na Fig. 10 encontram-se os picos principais para a alita e a contribuição dos polimorfos para cada pico. O sistema triclínico foi predominante, 52,6% (cor cinza claro), e o monoclínico com 40,4% (cinza e cinza escuro); o teor de CaO (cor preta) remanescente foi elevado, 6,6%, e a portlandita em torno de 0,5% (branco). De la Torre et al. 1212 A. de la Torre, S. Bruque, J. Campo, M.A.G. Aranda, Cem. Concr. Res. 32 (2002) 1347. apresentaram um estudo da aplicação de Rietveld na alita contendo magnésio para a avaliação de uma possível alteração no polimorfo em relação à fase pura. Os autores concluíram que o aumento no teor de magnésio acarretou algumas alterações na estrutura cristalina, sendo elas: T1 sem Mg g T3 para baixo Mg g T3 + M3 para alto teor de Mg. A mesma tendência foi verificada para a alita com 2% de MgO, cujo polimorfo monoclínico foi identificado. Na Fig. 11 foi possível observar as pequenas alterações no difratograma devido à presença do magnésio em relação ao C3S. As alterações em decorrência da adição do Mg estão indicadas com o apontamento da seta preta. O Mg promoveu a ocorrência do polimorfo monoclínico M1, contudo o T3 ainda foi predominante. Na Fig. 11b ficou mais evidente a alteração na alita devido ao teor de Mg utilizado, apresentando apenas dois picos, característico da estrutura M1+T31313 X. Ren, W. Zhang, J. Ye, Cem. Concr. Res. 99 (2017) 129., enquanto o C3S exibiu os três picos bem definidos para o mesmo intervalo angular (T3). O processo de queima da alita pode ser avaliado pelo teor de CaO remanescente. Na primeira queima o teor foi de 10,4%. Após a moagem e a execução da segunda queima o teor reduziu para 6,6%. Na Fig. 12 estão apresentados os difratogramas de raios X para as duas queimas no intervalo angular entre 37,3° e 37,7°, segundo pico principal do CaO que não teve sobreposição de outra fase química. A segunda queima possibilitou reduzir aproximadamente 36,5% o teor de CaO, entretanto o teor remanescente ainda foi elevado.

Figura 10
Difratogramas de raios X para o sistema cristalino alita (triclínico - T3, e monoclínico - M1-1 e M1-2, duas referências para o mesmo polimorfo, com alguns parâmetros distintos de acordo com o banco de dados disponibilizado pela Votorantim Cimentos) para o intervalo angular de: a) 28° a 33°; e b) 51° a 54°. Dentro dos difratogramas está mostrada a contribuição para cada fase na intensidade dos picos e suas sobreposições: alita triclínica (cinza claro), alita monoclínica (cinza escuro e cinza médio), CaO (preto) e Ca(OH)2 (branco).
Figure 10
XRD patterns for the alite crystalline system (triclinic - T3, and monoclinic - M1-1 and M1-2, two references for the same polymorph, with some different parameters according to the database provided by Votorantim Cimentos) in the interval between: a) 28° to 33°; and b) 51° to 54 °. Within the patterns the contribution to the peak intensity of each phase and their overlap are shown: triclinic alite (light gray), monoclinic alite (medium gray and dark gray), CaO (black), and Ca(OH)2 (white).

Figura 11
Diferença entre os perfis dos difratogramas de raios X para a alita e C3S no intervalo angular de: a) 32° a 33°; e b) 51° a 52°.
Figure 11
Difference between the XRD pattern profiles for alite and C3S in the angular range: a) 32° to 33°; and b) 51° to 52°.

Figura 12
Análise quantitativa do CaO pelo método de Rietveld: a) uma queima (10,4% CaO); e b) duas queimas (6,6% CaO). A linha tracejada indica a contagem por segundo de 3600 para o segundo pico principal do CaO.
Figure 12
Quantitative analysis of CaO by the Rietveld method: a) one firing (10.4% CaO); and b) two firings (6.6% CaO). Dashed line indicates the count per second of 3600 for the second major peak of CaO.

CONCLUSÕES

Os aluminatos apresentaram elevada pureza, próximo de 1% de CaO para o C3A e 0,2% para o C4AF, indicando que o processo de homogeneização foi adequado. Porém, no caso dos silicatos, faz-se necessário avaliar outras formas de homogeneização preliminares ao tratamento térmico, a fim de reduzir a quantidade de CaO remanescente. Essa ocorrência deveu-se principalmente à maior temperatura de fusão dos silicatos que, na ausência dos aluminatos para a formação da fase líquida, não foram capazes de incorporá-lo na estrutura. O processo de moagem entre queimas possibilitou a redução de até 36,5% no teor de CaO remanescente, contudo o teor ainda foi alto para os silicatos, entre 4,6 e 6,6%. A partir da síntese das fases separadamente foi possível verificar com precisão os polimorfos presentes em cada uma delas, bem como identificar as sobreposições dos compostos e dos próprios polimorfos, sendo que estes resultados podem auxiliar no tratamento de difratogramas de clínqueres e de cimentos.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à infraestrutura e ao apoio do Laboratório Central da Votorantim Cimentos, em especial a Silvia Vieira, a Viviane Magalhães e ao Renan d’Paula, bem como ao Instituto Lactec. Também agradecem aos recursos financeiros fornecidos pela CAPES com a bolsa de doutorado (número do processo 1522224) e ao CNPq pela bolsa de produtividade em pesquisa 1D, número do processo 302672/2016-8.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2018
  • Revisado
    01 Jul 2018
  • Aceito
    08 Ago 2018
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