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Aspectos metalúrgicos na avaliação da usinabilidade de aços

Resumos

A usinabilidade é uma propriedade que depende da interação entre o processo de fabricação e as características do material da peça. No caso dos aços, a composição química, a microestrutura e os tratamentos térmicos e mecânicos têm um efeito acentuado na usinabilidade dessa classe de materiais metálicos. No presente trabalho de revisão, citam-se os critérios de avaliação dessa propriedade, bem como o modo de atuação desses fatores na usinabilidade.

aços; usinabilidade; avaliação


The nachinability is a propriety that depend of interaction between the process of manucfature and characteristic of piece material. At case of steels, the composition chemistry, the microstruture and the heat treating and mechanic, have one effect accentuated in machinability of this category of materials metallic. In present work of revision, macking reference criterions in appreciation of this propriety thought as the method of actuation of this agents machinability.

steels; machinability; appreciation


Aspectos metalúrgicos na avaliação da usinabilidade de aços

André Luís de Brito Baptista

Técnico Industrial Metalúrgico - Técnico de Ensino e Pesquisa do Laboratório de Metalografia

e Tratamentos Térmicos / Departamento de Ciências dos Materiais -

Escola de Engenharia Industrial Metalúrgica de Volta Redonda - Universidade Federal Fluminense

E-mail: brito@metal.eeimvr.uff.br

Resumo

A usinabilidade é uma propriedade que depende da interação entre o processo de fabricação e as características do material da peça.

No caso dos aços, a composição química, a microestrutura e os tratamentos térmicos e mecânicos têm um efeito acentuado na usinabilidade dessa classe de materiais metálicos.

No presente trabalho de revisão, citam-se os critérios de avaliação dessa propriedade, bem como o modo de atuação desses fatores na usinabilidade.

Palavras-chave: aços, usinabilidade, avaliação.

Abstract

The nachinability is a propriety that depend of interaction between the process of manucfature and characteristic of piece material.

At case of steels, the composition chemistry, the microstruture and the heat treating and mechanic, have one effect accentuated in machinability of this category of materials metallic.

In present work of revision, macking reference criterions in appreciation of this propriety thought as the method of actuation of this agents machinability.

Keywords: steels, machinability, appreciation.

1. Introdução

Na usinagem de um metal, no início do corte, a ferramenta penetra no material da peça, e este se deforma elástica e plasticamente. Após ultrapassar a tensão máxima de cisalhamento do material, este começa a escoar. Em dependência da geometria da cunha de corte, o material deformado passa a formar um cavaco que desliza sobre a face da cunha de corte. O desempenho do material frente a esse trabalho de usinagem é que vai caracterizar a usinabilidade do mesmo.

Ainda não está definida, em termos precisos, a usinabilidade dos materiais metálicos e, por isso, a citação de um único número, para taxa de usinabilidade, é freqüentemente enganadora.

A usinabilidade dos materiais é uma propriedade difícil de ser determinada, pois depende de diversos fatores dos próprios processos de usinagem, ou seja: velocidade de corte, avanço, profundidade de corte e tipos das ferramentas, das máquinas operatrizes e dos fluidos de corte. Cada material apresenta condições particulares que ditam as normas mais adequadas de usinagem.

Tão importante como as propriedades de desempenho (resistência mecânica, à corrosão, etc.), as propriedades de fabricação como a soldabilidade e a usinabilidade devem ser sempre consideradas na seleção de materiais metálicos. Em princípio, não se pode dizer que um material é melhor que outro. Dependendo das condições de contorno impostas em determinada seleção, é que se pode analisar se a seleção de um determinado material apresenta vantagens sobre outro. Desse modo, deve-se considerar as características exigidas pelo projeto e engenharia, que são as características técnicas, em seguida, devem ser considerados os aspectos de fabricação da peça, inclusive pensando nos equipamentos disponíveis em determinada instalação, que são as características tecnológicas, e, por último, deve-se considerar o aspecto comercial.

A melhora na operação de usinagem está relacionada com a obtenção de componentes com as dimensões desejadas e qualidade superficial satisfatória. Além disto, podem ser obtidos grandes aumentos de produtividade. As vantagens econômicas da escolha certa do material a ser usinado, assim como as ferramentas, fluido de corte, equipamento e condições de usinagem, são consideráveis. Os custos e tempos de produção podem ser significativamente reduzidos através da escolha certa desses parâmetros{2}.

2. Usinabilidade

Arfeld e Hanum{1} comentam que a usinabilidade de um material pode ser definida por um valor numérico comparativo, que expressa um conjunto de propriedades de usinagem de um determinado material em relação a outro tomado como padrão. Essas propriedades são: vida da ferramenta de corte; força de usinagem; acabamento superficial da peça; temperatura de corte; produtividade da máquina operatriz; e as características do cavaco. Os resultados dessas medidas são difíceis de serem analisados devido ao número de variáveis que intervém no processo. Industrialmente, a avaliação mais expressiva da usinabilidade do aço ou ferro fundido se faz através do custo necessário para produzir um grupo de peças em máquina operatriz. As peças devem atender a uma avaliação de qualidade, sendo necessário que tenham tolerância dimensional, acabamento superficial e integridade funcional. Considerados esses fatores como necessários, o custo mínimo das peças somente pode ser alcançado através de uma alta produtividade obtida com elevadas velocidades de corte e baixo desgaste das ferramentas.

A usinabilidade não é uma propriedade intrínseca do material, mas, sim, um resultado da interação do metal com a operação de usinagem. As condições de usinagem são estabelecidas para cada tipo de material e ferramenta. O avanço e a velocidade são limitados pelo calor gerado pelos atritos e pela deformação plástica do cavaco. Quanto maior a usinabilidade do material da peça e a resistência ao desgaste do material da ferramenta, maiores podem ser os avanços e as velocidades de corte. Deve-se levar em consideração os fluidos de corte que têm ação lubrificante e refrigerante. A profundidade de corte é um fator que limita o avanço e a velocidade de corte. Em operações de acabamento, ao invés das de operações desgaste, utilizam-se avanços menores e velocidades maiores para atender as especificações de rugosidade superficial e a precisão das dimensões. Em qualquer trabalho de usinagem, a produção depende dos avanços e velocidades de corte; entretanto as condições mais econômicas de usinagem dependem também de outros fatores como tempo e custos de preparação e colocação das ferramentas nas máquinas{2,3}.

3. Avaliação da usina-bilidade

{2,4,5,7,8,11,16,17,20}

Entendem-se, como propriedades de usinagem de um metal, aquelas que expressam o seu efeito sobre grandezas mensuráveis inerentes ao processo de usinagem.

Para avaliação da usinabilidade, são, geralmente, usados quatro critérios, utilizados isoladamente ou em conjunto:

  • Vida da ferramenta.

  • Força de usinagem.

  • Qualidade superficial da peça.

  • Formação de cavacos (forma e tamanho dos cavacos).

Os fatores que influem na determinação da usinabilidade são:

a) Material da peça (composição química, microestrutura, dureza, propriedades mecânicas, rigidez da peça).

b) Processos mecânicos e condições de usinagem (material e geometria da ferramenta, condições de trabalho, fluido de corte, rigidez da máquina e do sistema de fixação, tipo de operação a ser realizada).

Critério vida da ferramenta {20}

A vida da ferramenta é normalmente o critério de maior importância na caracterização da usinabilidade de um material. A vida "T" é o tempo mínimo que uma ferramenta resiste do início do corte até sua utilização total, sendo definida através da fórmula:

T = Vc k . Cv

Onde:

T = vida da ferramenta [ min ]

VC = velocidade de corte [ m / min ]

CV = vida para VC = 1 m / min [constante]

K = coeficiente angular da curva de vida

A dependência entre T e VC é exponencial e, em sistema bilogarítmico, é representada por uma reta. Os fatores mais importantes para aparecimento de desgaste na ferramenta são as partículas duras e abrasivas da peça, bem como a resistência da matriz, além do material da ferramenta empregado.

Critério força de usinagem {20}

Existem dois fenômenos importantes no corte: cisalhamento do metal diante do ângulo de corte; e atrito na interface ferramenta-cavaco. O trabalho necessário ao corte é composto pelos trabalhos de cisalhamento e pelo de atrito. Qualquer redução desses trabalhos implica a redução do aquecimento e dos esforços no corte e, conseqüentemente, há um menor desgaste das ferramentas.

A grandeza da força de usinagem, que pode ser decomposta em força de corte, força de avanço e força passiva, é um critério de usinabilidade, pois, geralmente, materiais de difícil usinagem também apresentam forças de trabalho maiores.

As componentes da força de usinagem são influenciadas principalmente pelo material da peça, pelas condições de corte e pela geometria da ferramenta. Elas obedecem à fórmula de Kienzle (empírica), que relaciona as características do material, a seção de usinagem e a força de corte.

Para a força de corte FC vale:

FC / b = KC1.1 . h (1-mC)

Onde :

FC = força de corte [ N ]

b = largura de corte [ mm ]

h = espessura de corte [ mm ]

1 - mC = coeficiente angular

KC 1 . 1 = força específica de corte para seção de 1 mm2

A influência do material é dada pelo expoente 1 - mC e pela força específica KC 1.1 . Não é possível estabelecer uma relação perfeita entre a estrutura do material e a força específica de corte, assim como com o coeficiente angular, devido aos diversos fatores de influência que surgem. Normalmente a força de corte cai com o aumento da temperatura na zona de corte. Devido a isso, normalmente altas velocidades de corte levam a menores forças de corte. Ao mesmo tempo, todas as medidas que facilitam o fluxo de cavaco (fluido de corte, grande ângulo de saída) levam a uma diminuição das forças.

Critério qualidade superficial da peça {20}

A qualidade das superfícies obtidas na usinagem pode ser um critério para determinação dos parâmetros de entrada.

A rugosidade é decorrente da forma da quina da ferramenta e do movimento relativo entre peça e ferramenta. No torneamento, ela é influenciada principalmente pela forma do raio de quina da ferramenta e pelo avanço.

A rugosidade aumenta com o aumento do avanço e diminui com o aumento do raio de quina. Com relação à velocidade de corte, a rugosidade inicialmente tende a aumentar com o aumento da velocidade de corte, diminuindo após uma certa velocidade. Isso se deve à formação de gume postiço, que pode ocorrer a pequenas velocidades de corte, fator que desaparece com o emprego de velocidades de corte mais altas.

A profundidade de corte praticamente não tem influência sobre a qualidade superficial, quando a profundidade for superior a um valor mínimo.

Dos ângulos da ferramenta, o ângulo de saída e o ângulo de posição têm a maior influência sobre a qualidade superficial. Com o aumento positivo do ângulo de saída a rugosidade diminuí.

A diminuição do ângulo de posição leva a um aumento da força passiva e, em decorrência, aumenta a possibilidade de vibrações regenerativas, que levam a uma piora da qualidade superficial.

Também o desgaste da ferramenta tem influência sobre a qualidade superficial da peça.

Critério formação de cavacos {1,8,20}

Quando se usina um material mole, se forma uma apara espessa e em forma de fita e ocorre um acabamento superficial ruim. A ferramenta de corte atua como uma cunha, deformando o metal a sua frente por cisalhamento, até que em algum ponto seja atingida a tensão de ruptura e a porção de metal deformada se destaque, formando o cavaco.

Pelo fato de o material ser mole é necessária uma grande deformação para que seja atingido o ponto de ruptura. Quando isto ocorre, a apara resultante é espessa, indicativa de uma má qualidade de usinagem. Também em conseqüência dessa grande deformação, o contato entre ferramenta e cavaco é maior, surgindo pontos de soldagem entre os dois materiais e ocorrendo um aumento do atrito.

Durante a deformação, o material da apara é encruado, aumentando a sua resistência. A ruptura passa a se dar abaixo da superfície de corte, no metal mais mole, produzindo arrancamentos que prejudicam o acabamento da peça usinada. Quando a diferença de resistência do material da apara e do metal de base torna-se menos significativa, diminui-se a tendência de ocorrer ruptura abaixo da superfície da peça; a deformação necessária para se atingir a tensão de ruptura do cavaco é menor, formando uma apara menos espessa, reduzindo também o atrito e o arrasto sobre a ferramenta.

Um dos fatores que mais limita a velocidade de usinagem é a forma dos cavacos. As pesquisas demonstraram que os metais, ao serem usinados, devem produzir um cavaco frágil e, portanto, quebradiço, o que propicia uma maior facilidade de manuseio e operação. Paralelamente, os cavacos devem ter um raio de curvatura pequeno, para haver menor área de contato e, conseqüentemente, menor atrito com a ferramenta de corte, proporcionando maior vida útil.

No instante do corte, juntamente com a formação do cavaco , ocorre a formação de um ângulo de deformação (y) e um ângulo de cisalhamento (q) .

Um aumento dos ângulos q e y significa que o volume de metal implicado na deformação diminui, aumentando a usinabilidade.

A forma e o tamanho do cavaco são muito importantes, principalmente para os processos de usinagem onde há pouco espaço para os cavacos ou em máquinas-ferramentas com pouco espaço de trabalho.

Cavacos helicoidais planos preferencialmente apresentam a sua saída tangenciando o flanco da ferramenta e, em decorrência disso, danificam o suporte e a quina da ferramenta. Cavacos em fita, cavacos emaranhados e cavacos fragmentados apresentam um perigo para o operador da máquina.

As principais influências sobre a formação dos cavacos são as condições de corte, a geometria da ferramenta e, por parte do material da peça, a deformabilidade, a tenacidade e a resitência ou estado metalúrgico do material.

Através da diminuição da velocidade de corte ou do ângulo de saída, a fragilidade dos cavacos de materiais não muito elásticos aumenta, devido à maior deformação do cavaco. De maior importância é a influência do avanço e do ângulo de posição. Um aumento na espessura do cavaco leva a uma deformação demasiada na superfície de cisalhamento, isto é, aparecem cavacos curtos. Como com um aumento crescente da profundidade de corte devem-se escolher valores maiores de avanços para uma quebra mais favorável do cavaco, utiliza-se normalmente a relação profundidade x avanço como critério de formação de cavaco.

A formação de cavacos é bastante influenciada pela resistência e conformabilidade do material. Uma resistência crescente favorece a quebra dos cavacos. Impurezas como inclusões na matriz do metal provocam uma forma de cavaco irregular, de quebra facilitada. Os elementos de liga exercem grande influência sobre a formação dos cavacos.

4. Aspectos metalúr-gicos que interferem na usinabilidade

Os melhores parâmetros de corte e as características das ferramentas devem ser associados também às condições metalúrgicas do aço ou ferro. Dessa forma, deve-se utilizar a análise química, a dureza e a microestrutura para identificar as melhores combinações, capazes de promover vantagens na usinabilidade {4}.

A aquisição de melhores condições de corte com remoção de cavaco, em processos de usinagem de alta produtividade na indústria, é atribuída, divergentemente, a fatores metalúrgicos de fragilidade do cavaco ou a fatores mecânicos, como a precisão dimensional e ausência de carepa abrasiva. Entre as melhorias obtidas, são notáveis o aumento da vida da ferramenta, a melhor qualidade da superfície usinada, a menor força de corte e, conseqüentemente, o menor consumo de energia, ou seja, a redução de custos{4,5}.

Os fatores básicos que influenciam na obtenção desses requisitos são o trabalho a frio, a microestrutura, características mecânicas, composição química e inclusões{4}.

Trabalho a frio

A deformação a frio pode melhorar a usinagem, através do encruamento provocado, o que aumenta a dureza e dificulta o empastamento do cavaco sobre a ferramenta e a formação da aresta postiça de corte. Se a dureza da peça for elevada excessivamente, haverá um desgaste exagerado da ferramenta e um acréscimo na potência necessária {6}.

O saldo entre a diminuição da força de corte e o efeito oposto pelo aumento da resistência mecânica à deformação representa os parâmetros de análise que definem o compromisso para obtenção da melhoria de usinabilidade {5}.

Nakamura e col. {5} confirmaram que a taxa de desgaste da ferramenta é reduzida pelo trabalho a frio, atribuindo esse resultado à redução da energia de corte necessária e à queda da temperatura de trabalho.

Porém, em materiais que apresentam alta taxa de encruamento e alta ductilidade, o trabalho a frio provoca queda acentuada na usinabilidade {2}.

Yamamoto {4} concluiu que o efeito resultante de dois fatores (queda de ductilidade versus aumento de dureza) é que vai determinar a melhoria ou não da usinabilidade.

Comprovou-se {5} que há uma melhora na performance de produção, após o trabalho a frio, atribuída também aos aspectos mecânicos. Nesse estudo, barras trefiladas permitiram obter ganho de produtividade em relação às barras brutas de laminação. Barras retificadas obtiveram maiores ganhos do que as barras trefiladas. Os resultados mostram que a melhor performance na usinagem foi obtida, basicamente, pelas melhores características dimensionais e de superfície.

Microestrutura

Do ponto de vista tecnológico, a estrutura do material é de suma importância, tendo em vista que a mesma está correlacionada com as propriedades mecânicas, físicas e químicas da peça {7}.

No tocante à microestrutura, Ferraresi{8} cita que, em função da possibilidade da transformação da microestrutura do aço ou ferro fundido, sem alteração da composição química, ela se constitue num importante fator de influência na usinabilidade. Os microconstituintes alteram as características de ductilidade e de fragilidade em função da sua presença, quantidade e forma, promovendo diferentes condições de quebra de cavaco, abrasividade, força e temperatura de corte. A presença de fases aciculares tipo bainita e martensita, em função do efeito extremamente abrasivo, também é indesejável na usinagem {9}.

O tamanho de grão é um dos parâmetros a se controlar, devido ao efeito de fragilização do cavaco, produzido em função de uma estrutura de grãos grosseiros {9}. Porém, com uma estrutura mais refinada, menores são as fronteiras intergranulares e maiores são os contatos de natureza química e eletrostática, melhorando o comportamento frente às solicitações mecânicas impostas no trabalho de usinagem {7}.

Características mecânicas

Desde o início desse século, desenvolveram-se estudos visando a relacionar as propriedades mecânicas com a usinabilidade do material, lançando mão dos valores de resistência à tração, limite de escoamento, alongamento e dureza, como referência para comparação {8}.

Gonzales e Cupini citam que entre as propriedades mecânicas, principalmente a dureza exerce uma influência marcante sobre a usinabilidade dos materiais{5}.

Chiaverini {10} afirma que valores altos para a dureza significam dificuldades de usinagem, ao passo que valores médios e baixos associam-se com boas propriedades de usinabilidade, mas que as medidas de dureza não serviriam de um modo absoluto como guia para determinação de verdadeira usinabilidade.

Cita-se que a melhora da usinabilidade se obtém em condições conflitantes de alta ductilidade, baixa resistência à tração e maior fragilidade, ou seja, baixa elasticidade{1}. Porém encontra-se a citação de que a melhor usinabilidade estaria associada a uma condição de baixa dureza (e resistência) e baixa ductilidade {2}.

As propriedades intrínsecas são de grande influência, dependendo do tipo de operação de fabricação a que o material está submetido, significando que algumas propriedades terão uma influência mais nítida em um determinado tipo de operação e efeitos menores ou até mesmo nulos em outro tipo.

Deve-se destacar que as propriedades mecânicas dos materiais assumem que as características dimensionais são homogêneas, no entanto, a realidade demonstra que essas características não o são (não-homogêneas). Isto significa que pode haver pequenas variações na espessura, devido a vazios, inclusões, variações no tamanho de grão, textura ou concentração de soluto, todas originando variações na resistência local do metal.

Composição química

As primeiras tentativas de se determinar a usinabilidade de um metal, a partir de sua composição química, foram realizadas em 1948 por J. Sorensen e, dez anos mais tarde, por Bodart e colaboradores {8}.

A adição de elementos de liga produz modificações microestruturais, conduzindo a um endurecimento, que tem reflexo sobre as propriedades mecânicas obtidas e sobre a usinabilidade, dependendo da quantidade, forma e distribuição desses elementos {11}.

Os átomos de soluto permanecem em solução, aumentando a dureza através dos efeitos endurecedores de solução sólida supersaturada. O notável efeito endurecedor pode ser justificado pela grande diferença de raios atômicos e de eletronegatividade. Os átomos de impurezas interagiram com os campos de tensões hidrostáticas e cisalhantes, formando uma atmosfera com as discordâncias em cunha em hélice, resultando também em um impedimento ao movimento das mesmas, facilitando, assim, o rompimento do cavaco {7}.

De um modo geral, os efeitos dos elementos químicos participantes da composição do material na usinagem podem ser encarados da seguinte maneira: Primeiro, os elementos que aumentam a proporção de perlita diminuem o teor de carbono no ponto eutetoide, o que causa endurecimento por solução sólida. Segundo, elementos que atuam na fragilização da ferrita. Um terceiro ponto são os elementos residuais e os provenientes da fusão/vazamento, que podem promover efeitos diversos, além da presença de inclusões{1,9}.

Os elementos ligantes podem também formar partículas duras e abrasivas, prejudicando a usinabilidade {2}.

Inclusões

A presença de partículas que são insolúveis no metal e que interrompem a continuidade da matriz, tanto pode exercer efeitos benéficos, quanto prejudiciais à usinagem, o que vai depender da sua dureza, forma e distribuição {11}.

As inclusões podem consistir num dos maiores nucleadores de danos no interior dos materiais metálicos, podendo originar poros e trincas conforme se processa a deformação. Esses defeitos funcionariam como uma heterogeneidade na espessura do material e seriam condições suficientes para o aparecimento de estricção localizada, especialmente próxima a superfície do metal, favorecendo, assim, o trabalho de corte.

Efeito das inclusões na matriz metálica{12,13,14,15}

O metal não é uma matéria contínua e, quando se faz a análise do seu comportamento, tomam-se em consideração aspectos estruturais, tais como tamanho e distribuição de vazios, inclusões e partículas de segunda fase, tamanho de grão, microtopografias superficiais e texturas cristalográficas.

Em relação à deterioração de propriedades do metal, comprovou-se que a maior razão tamanho da inclusão / espessura do material possui efeito equivalente à relação tamanho de grão / espessura da peça.

Materiais provenientes de lingoteiras iguais, forjados com bitolas muito próximas e que tiveram o mesmo tratamento térmico, apresentaram resultados diferentes nos ensaios. Essa diferença de propriedades mecânicas foi atribuída, principalmente, às diferenças de inclusões não metálicas.

O principal fator contribuinte para a anisotropia das propriedades mecânicas é a presença de inclusões não metálicas que atuam como iniciadoras de fratura .

As propriedades de ductilidade, tenacidade e limite de fadiga são menores na direção transversal que na direção longitudinal, o mesmo não ocorrendo com os limites de escoamento e de resistência, que apresentam valores praticamente iguais. Isto se deve ao alinhamento de inclusões, na direção longitudinal de impurezas segregadas e de outros microconstituintes. O grau de deformação a quente e a estrutura bruta de solidificação do material também contribuem para o problema.

A máxima deformação que um material pode sofrer está limitada pelo fenômeno de localização da deformação e/ou fratura. A localização da deformação ocorre como conseqüência da perda de estabilidade plástica da peça.

A evolução de danos durante o processo de deformação depende, além da trajetória de deformação, da distribuição, da forma, da natureza e do tamanho médio das inclusões não metálicas inicialmente presentes no material.

É aceito que o mecanismo de fratura das ligas que contêm inclusões não metálicas envolve a nucleação e o crescimento e coalescência desses vazios.

Os vazios são nucleados em volta de inclusões, ou pela quebra das inclusões, ou pela separação da matriz e inclusão na interface matriz-partícula (descolamento). Os vazios parecem ser primeiramente nucleados nas inclusões maiores; nos últimos estágios de deformação, os menores precipitados podem também servir para nuclear cavidades. Os mecanismos de nucleação envolvem relaxação de partes das tensões existentes em volta das partículas. O amolecimento local devido a essa relaxação durante a formação do vazio pode ser um dos fatores para a localização de bandas de cisalha-mento. A forma das inclusões também exerce efeito na nucleação de vazios, inclusões alongadas tendem a se quebrar e as arredondadas tendem a sofrer descolamento.

Superposto ao efeito de forma, tem-se, ainda, o efeito da composição das inclusões. Dependendo da composição química das inclusões não metálicas, estas apresentaram diferentes compor-tamentos mecânicos durante o processamento a quente e a frio, o que influenciará o modo de nucleação de vazios durante a posterior utilização do material.

As inclusões de óxidos, quando alongadas, geram vazios pela quebra de partículas; quando arredondadas, nucleiam vazios pela descoesão da partícula- matriz. As inclusões de oxi-sulfeto de mangânes e sulfeto de manganês, apesar de apresentaram formas alongadas, nucleiam cavidades pelo descolamento de partículas da matriz. As inclusões de silício, de forma sempre arredondadas, nucleiam vazios pela separação da interface partícula/matriz.

Materiais com mais baixa energia de falha de empilhamento vão nuclear mais rápido os vazios em volta das inclusões, pois as discordâncias em volta da partícula tendem a se mover melhor de um modo planar do que ondulado.

Pode-se dizer que, das inclusões, a composição química, a morfologia, a deformabilidade a frio e a quente e o coeficiente de expansão térmica devem ser analisados em conjunto, pois o comportamento das partículas dependem desses fatores.

As inclusões de óxido de manganês têm alta deformabilidade a frio e a quente, enquanto que os silicatos e as inclusões de alumina são indeformáveis durante o trabalho a frio e a quente, respectivamente, e as inclusões de sulfeto de mangânes são deformáveis até a temperatura de 100ºC.

As diferentes contrações térmicas das inclusões com relação à matriz, durante todo o processo de fabricação, contribuem para a formação de vazios. As inclusões de óxido de mangânes possuem coeficiente de expansão térmica similar ao do aço, isto é, contraem-se a uma mesma velocidade do que a matriz, enquanto que as inclusões de sulfeto de mangânes apresentam coeficiente de expansão térmica maior que a matriz, de maneira a favorecer a formação de vazios ao redor dessas partículas.

Inclusões não-metálicas

Sulfetos - A presença de enxofre em níveis elevados exerce um efeito prejudicial no ensaio de estricção e, conseqüentemente, na qualidade dos produtos{15}. A temperatura de transição também sofre alterações, primeiramente ocorre um aumento, caindo posteriormente {15}. O enxofre, nos aços, está praticamente todo na forma de sulfeto. Esses sulfetos possuem baixo ponto de fusão e se localizam nos contornos de grão, tornando-se prejudiciais, sem qualquer interesse industrial. A solução do problema veio com a adição de certos níveis de manganês ao banho, o qual, além de propiciar melhor rendimento metalúrgico, colabora na usinabilidade, permitindo aumentar a velocidade de corte, a vida da ferramenta, a segurança e a produtividade{1}.

No tocante à usinabilidade, a forma, o tamanho, a distribuição e a composição dos sulfetos têm um papel importante {6}.

Prefere-se, como favorável, a morfologia globular dos sulfetos, que dependerá do processamento do material{1}.

O manganês possui a maior afinidade química pelo enxofre e, na medida em que cresce o seu teor, aumenta-se a usinabilidade, devido o sulfeto desse metal ser mais macio e deformável do que os compostos com outros metais. Essa vantagem, porém, não compensa o maior desgaste das ferramentas, a perda de conformabilidade a quente e ductilidade à temperatura ambiente, o aparecimento dos piores acabamentos superficiais e a diminuição da resistência à corrosão {6}.

Alumina - As inclusões de Al2O3 originam-se no metal líquido, durante o trabalho a quente, sendo que as mesmas tornam-se alinhadas. Esse óxido é duro e abrasivo, portanto prejudicial à usinabilidade {2,15}.

Controle de morfologia de inclusões

O objetivo é a formação de óxidos que sejam menos deformáveis no trabalho a quente e de baixo ponto de fusão no lugar de inclusões duras. Esse óxido atua de forma muito parecida com os sulfetos: forma, durante a usinagem, um filme lubrificante sobre a aresta de corte, devido às altas temperaturas desenvolvidas (1000ºC a 1250ºC), e favorece a quebra dos cavacos{2,14,18,19}.

Inclusões metálicas

Uma grande melhoria pode ser conseguida adicionando-se, em teores da ordem de 1%, elementos especiais, sós ou em conjunto. Tais elementos, como Pb e Bi, originam inclusões, que, por sua forma, tamanho e distribuição, facilitam a usinagem {7,11}.

A solubilidade desses elementos no metal é quase nula. Durante a solidificação, estes separam-se na forma de partículas discretas e fracas, permanecendo em suspensão submicroscópica, criando-se uma pseudoliga e os glóbulos formados têm baixa resistência e baixa coesão, atuando como descontinuidades, proporcionando a redução da resistência ao cisalhamento, o que facilita o rompimento dos cavacos, que são menores e de menor diâmetro, tendo, assim, menor área de contato ferramenta - cavaco. Por terem ponto de fusão baixos, esses elementos fundem-se ao contato com a ferramenta, formando uma película líquida e aderente sobre ela, com a ação lubrificante, reduzindo a resistência à fricção {1,2,4,11,17}.

Existem afirmações de outras formas de atuação dos metais macios tais como liquação do chumbo, causando fragilidade pela formação de microtrincas nas zonas primária e secundária de cisalha-mento, concentração de tensões introduzidas pela diferença de propriedades mecânicas entre as inclusões e a matriz, redução na deformabilidade do sulfeto de manganês, pela presença do chumbo na interface {4}.

5. Conclusão

A usinabilidade é um conjunto de caraterísticas que compõem uma resposta do metal às solicitações encontradas durante a sua usinagem. Assim sendo, esta é influenciada pela operação específica em uso, pelo tipo de teste, pela velocidade máxima de corte para um dado acabamento de superfície, pela quantidade de material arrancado, pelo desgaste da ferramenta, pelas condições metalúrgicas do metal, etc.

Os aspectos metalúrgicos envolvidos na obtenção de propriedades reprodutíveis de usinabilidade variam de acordo com o material a ser trabalhado.

6. Referências Bibliográficas

Artigo recebido em 05/04/2002 e aprovado em 02/06/2002.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Out 2002
  • Data do Fascículo
    Abr 2002

Histórico

  • Recebido
    05 Abr 2002
  • Aceito
    02 Jun 2002
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