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Análise de pórticos planos em situação de incêncio pelo método das rótulas plásticas

Resumos

Apresenta-se, nesse trabalho, um modelo numérico computacional para investigação do comportamento de estruturas metálicas aporticadas em situações de incêndio. A análise é dividida em duas etapas, Térmica e Estrutural, respectivamente associadas à determinação do campo não-uniforme de temperaturas e da resposta estrutural sob ação do fogo. Os limites de resistência estrutural, relacionados com o tempo crítico de resistência ao fogo, são estimados por meio de modelo refinado de rótulas plásticas, permitindo-se considerar, de forma computacionalmente eficiente, os efeitos inelásticos de material e mudança de geometria. Resultados numéricos obtidos pelo modelo implementado, para um edifício de 4 andares, são apresentados e criticamente comparados com aqueles gerados pelo programa SAFIR, permitindo-se concluir sobre a aplicabilidade do modelo proposto.

Estruturas de aço; incêndio; rótulas plásticas


A numeric computational model is presented in this paper to investigate the behaviour of steel-framed structures under fire conditions. The analysis methodology is divided into two main parts, related to thermo and mechanical evaluations, respectively associated to the determination of nonuniform temperature range and structural response under fire action. The structural limits, related to the ultimate critical resistance time, are evaluated by means of a second-order refined plastic-hinge model, being allowed the consideration of inelastic effects resulting from the material and geometrical changing in configuration, in a computationally efficient way. Numerical results obtained from the implemented model for a 4-story building frame, are presented and critically compared to those from the FEM program SAFIR, determining the applicability of the proposed analysis model.

steel structures; fire design; plastic-hinges


ENGENHARIA CIVIL

Análise de pórticos planos em situação de incêncio pelo método das rótulas plásticas

Alexandre LandesmannI; Eduardo de Miranda BatistaII

IProf. Adjunto, Departamento de Estruturas, Faculdade de Arquitetura e Urbansimo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Av. Brigadeiro Trompowsky s/n, CEP 21941-590, Rio de Janeiro. E-mail: landesmann@ufrj.br

IIProf. Adjunto, Programa de Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio de Janeiro - COPPE/UFRJ. Caixa Postal 68.506, CEP 21945-970, Rio de Janeiro/RJ - Brasil. E-mail: batista@coc.ufrj.br

RESUMO

Apresenta-se, nesse trabalho, um modelo numérico computacional para investigação do comportamento de estruturas metálicas aporticadas em situações de incêndio. A análise é dividida em duas etapas, Térmica e Estrutural, respectivamente associadas à determinação do campo não-uniforme de temperaturas e da resposta estrutural sob ação do fogo.

Os limites de resistência estrutural, relacionados com o tempo crítico de resistência ao fogo, são estimados por meio de modelo refinado de rótulas plásticas, permitindo-se considerar, de forma computacionalmente eficiente, os efeitos inelásticos de material e mudança de geometria. Resultados numéricos obtidos pelo modelo implementado, para um edifício de 4 andares, são apresentados e criticamente comparados com aqueles gerados pelo programa SAFIR, permitindo-se concluir sobre a aplicabilidade do modelo proposto.

Palavras chaves: Estruturas de aço, incêndio, rótulas plásticas.

ABSTRACT

A numeric computational model is presented in this paper to investigate the behaviour of steel-framed structures under fire conditions. The analysis methodology is divided into two main parts, related to thermo and mechanical evaluations, respectively associated to the determination of nonuniform temperature range and structural response under fire action.

The structural limits, related to the ultimate critical resistance time, are evaluated by means of a second-order refined plastic-hinge model, being allowed the consideration of inelastic effects resulting from the material and geometrical changing in configuration, in a computationally efficient way. Numerical results obtained from the implemented model for a 4-story building frame, are presented and critically compared to those from the FEM program SAFIR, determining the applicability of the proposed analysis model.

Keywords: steel structures, fire design, plastic-hinges.

1. Introdução

Recentes trabalhos técnico-científicos sobre a investigação do comportamento de estruturas de aço, em situações de incêndio (Chan & Chan, 2001; Liew et al., 2002; Cai et al., 2003), podem ser genericamente ordenados em dois grupos básicos: (a) modelos numéricos sofisticados, desenvolvidos à luz do Método dos Elementos Finitos (MEF), aplicados na análise global de estruturas, como é o caso do Programa SAFIR (Franssen et al., 2000); e (b) modelos simplificados, empregados exclusivamente na verificação de elementos isolados a partir de provisões estabelecidas em normatização vigente (EC-3/Parte-2, 2001; NBR-14432, 2000). Alternativamente, a metodologia de análise proposta nesse trabalho se apresenta como uma solução computacionalmente mais eficiente do que a desenvolvida pelo MEF, sem, contudo, desprezar os efeitos não-lineares decorrentes da interação das ações da elevação de temperatura e de carregamentos externos, ignoradas pelos modelos simplificados.

O programa desenvolvido (Landesmann, 2003), Pórtico Não-Linear sob Fogo (PNL-F), é composto por dois estágios fundamentais, Análise Térmica e Análise Estrutural, que se interligam durante todo o processo de desenvolvimento do incêndio. Assim, na primeira etapa, determina-se a variação do campo de temperaturas das seções-transversais expostas ao fogo e sua influência nas propriedades mecânicas e físicas do aço, conforme modelo de transferência de calor detalhado no item 2.1 desse trabalho. A etapa seguinte, consiste na análise global das estruturas planas sob fogo, desenvolvida segundo o Método de Rótulas Plásticas, cujas bases são tratadas no item 2.2. Os resultados computacionais, obtidos para uma estrutura aporticada submetida à diferentes condições de incêndio, são apresentados na seção 3 do presente trabalho. A avaliação dos resultados encontrados e as principais conclusões desse trabalho estão apresentadas respectivamente nas seções 4 e 5.

2. Material e Métodos

2.1 Análise Térmica

A determinação da variação do campo de temperaturas dos elementos expostos ao fogo, em função do tempo decorrido de incêndio, é obtida por meio de um modelo térmico unidimensional (Cook et al., 1989). Nessa fase, apenas a direção transversal da seção é discretizada (ao longo do eixo y dado pela Figura 1), admitindo-se que a distribuição longitudinal de temperaturas (eixo x) é uniforme e idêntica àquela estimada para a seção-transversal.


A solução do sistema global de equações, que representará o equilíbrio térmico na seção-transversal {q}n, é obtida por meio de um procedimento numérico de integração temporal, incremental-iterativo, dado pela seguinte expressão:

(1)

na qual apresentam-se: vetor de fluxo de calor {R}, matriz de condução de calor [Kt] e matriz de massa concentrada [M], dados, respectivamente, pelas Eqs. (2) a (4):

(2)

(3)

(4)

O operador de somatório representa a participação de cada segmento da seção transversal (k). ac e ar referem-se, respectivamente, ao coeficiente de transferência de calor por convecção, tomado igual a 25 W/m2 ºC (EC-3/Parte-2, 2001), e ao componente de fluxo de calor por radiação, determinado com base na temperatura do aço qa (em ºC) computada no icremento anterior {q}n-1, da seguinte forma:

ar = 5,67 . 10-8eres [(qg + 273)2 + (qa + 273)2] [(qg + 273) + (qa + 273)

(5)

sendo que eres corresponde à emissividade resultante, adotando-se 0,5 (EC-3/Parte-2, 2001), qg é a temperatura do ambiente, obtida em função de curvas tempo-temperatura (ISO 834-1, 1999). A massa específica do aço (ra), dada pela Eq. (3), é considerada independente da temperatura, cujo valor sugerido pelo EC-3/Parte-2 (2001) é de 7850 kg/m3. A condutividade térmica (la) e o calor específico (ca) são apresentados pelo EC-3/Parte-2 (2001).

A interface entre as análises térmica e estrutural é descrita nesse trabalho, por meio de uma metodologia de seções-equivalentes, onde a segmentação adotada, inicialmente pelo cálculo térmico (Figura 1), é utilizada na determinação das novas propriedades da seção-transversal (Landesmann, 2003). Nesse procedimento, cada segmento do modelo térmico k é transformado em uma parcela da seção-transversal, tendo suas propriedades de resistência e rigidez modificadas pelos fatores de redução do módulo de elasticidade (kE,q) e do limite de escoamento (kfy,q), propostos pelo EC-3/Parte-2 (2001), em função da temperatura do segmento (qk). Assim, a área equivalente da seção-transversal (Aq) e o respectivo momento de inércia (Iq) são determinados da seguinte forma:

(6)

(7)

onde as dimensões de cada segmento k (bk, hk, yk) estão ilustradas na Figura 1. Os limites de resistência plástica efetiva, associados, respectivamente, às rijezas axial (Pyq) e flexional (Mpq), são determinados pelas seguintes equações:

(8)

(9)

onde fyq é o limite de escoamento do aço (fy) em função da temperatura. As tensões térmicas são consideradas no modelo proposto por meio do Método de Duhamel (Ossenbruggen et al., 1973), onde o elemento de viga-coluna é considerado cinematicamente determinado, obtendo-se um vetor de carregamentos nodais composto pelas seguintes componentes, respectivamente relacionadas com o alongamento (Pq) e com a flexão (Mq):

(10)

(11)

onde Eq é o módulo de elasticidade do aço (E) em função da temperatura e o termo eq representa o alongamento térmico (EC-3/Parte-2, 2001). Apresenta-se, na Eq. (12), um valor médio de temperatura, denominada como temperatura de referência (Landesmann, 2003), a ser empregado posteriormente (Eq. 19) na formulação de formação de rótulas plásticas:

(12)

2.2 Análise estrutural

O comportamento global de estruturas metálicas aporticadas sob condições de incêndio é descrito nesse trabalho por meio de um modelo não-linear refinado de rótulas plásticas. Nessa metodologia, os efeitos decorrentes do escoamento do aço são simulados através de parâmetros numéricos, que reduzem, progressivamente, as rijezas do elemento viga-coluna em função do desenvolvimento de regiões plásticas.

Em linhas gerais, a formulação implementada possui as seguintes características: (a) emprego de funções de redução de rigidez hq, na simulação do processo de formação de rótulas plásticas; (b) adoção de modelos de módulo tangente Et, considerando, implicitamente, ambos os efeitos de tensão residual e imperfeição geométrica inicial; (c) interpolação da rigidez flexional através de funções de estabilidade, permitindo-se acurada identificação dos mecanismos de instabilidade do elemento; (d) consideração da teoria de grandes deslocamentos e pequenas deformações (Powell, 1969), na solução do sistema global de equações.

A relação de rigidez tangente do elemento viga-coluna, apresentado na Figura 2, para o caso de formação de duas rótulas plásticas em ambas extremidades da barra (A e B), é dada por:

(13)


Na expressão anterior (Eq. 13), os coeficientes S1 e S2, denominados funções de estabilidade (Liew et al., 1993), são obtidos a partir da derivação da equação diferencial do elemento viga-coluna, conforme é apresentado nas Eqs. (14) e (15):

(14)

(15)

Onde r = P / (p2EI / L2).

O módulo tangente Et, que é empregado em substituição do módulo elástico (E) na Eq. (13), foi determinado (Landesmann, 2003) com base na curva de flambagem de colunas (EC-3/Parte-2, 2001), para elementos expostos ao fogo:

(16)

Nas situações onde o elemento estrutural encontra-se abrigado do fogo, adota-se a seguinte expressão, proposta por Liew e White (1993), a partir das especificações do AISC-LRFD (1997):

(17)

Apresenta-se na Eq. (18) o coeficiente a, definido por Liew et al. (1993), como o "estado de esforços combinados", derivado da superfície de resistência plástica do AISC-LRFD (1997):

(18)

O processo de formação de rótulas plásticas proposto nesse trabalho considera os efeitos decorrentes da perda de rigidez gradual inelástica, através de um polinômio de quarto grau aplicado para perfis metálicos tipo I ou H (Landesmann, 2003), conforme apresentado a seguir pela Eq. (19), juntamente com a Tabela 1, em função da temperatura de referência, qref (Eq. 12):

hq = c1 + c2 . a + c3 . a2 + c4 . a3 + c5 . a4

(19)

h = 4a (1 - a) para a > 0,5 (20)

Para a simulação de rótulas plásticas de elementos abrigados da ação do fogo, utiliza-se o seguinte modelo proposto por Liew et al. (1993), independente da variação de temperatura:

3. Resultados

3.1 Edifício industrial sob ação de incêndio

O edifício industrial originalmente proposto por Leon et al. (1996) foi submetido, no presente trabalho, à ação de diferentes curvas de aumento de temperatura. A configuração geométrica, os carregamentos e as propriedades do aço empregado que caracterizam o modelo estrutural adotado estão esquematizados na Figura 3. A ação do incêndio é compartimentada na região delimitada (Figura 3), de modo que somente os elementos estruturais neste contorno sofrem influência direta decorrentes do aumento da temperatura, os demais elementos estruturais, abrigados da ação do fogo, são simulados com base na formulação original de análise avançada sob condições normais de temperatura (Eqs. 17 e 20).


As curvas de variação de temperatura, postuladas para o compartimento considerado (Figura 3), são apresentadas na Figura 4, considerando-se as seguintes condições: (a) curva de incêndio padronizado (ISO 834-1, 1999); (b) curva paramétrica com baixa taxa de ventilação (EC-3/Parte-2, 2001) e (c) com alta taxa de ventilação.


A comparação entre os resultados de variação de deslocamento horizontal (D) no topo do pórtico do edifício para os 3 cenários de aquecimento (Figura 4), obtidos pelos programas PNL-F e SAFIR (Franssen et al., 2000), é apresentada na Figura 5. Observa-se que os deslocamentos laterais da estrutura aumentam a uma taxa relativamente baixa durante os primeiros 300 segundos de duração do incêndio. Contudo, a partir desse instante, significativas regiões inelásticas são observadas ao longo da estrutura, que, rapidamente (aprox. 200 segundos depois), conduzem à perda de equilíbrio, ou seja, ao colapso estrutural.


4. Discussão

As diferenças percentuais computadas entre as respostas obtidas pelos programas SAFIR e PNL-F, variando de 4 a 10%, aproximadamente, são consideradas satisfatórias, tendo em vista as diversas simplificações introduzidas na análise do edifício de 4 andares. O comportamento estimado pelo programa PNL-F é ligeiramente mais conservativo - conduz a menores tempos críticos de resistência ao fogo - para as três situações analisadas. Tal fato deve-se, fundamentalmente, à incorporação dos efeitos de imperfeições geométricas iniciais e de tensões residuais nos modelos numéricos sob condições de temperatura ambiente.

5. Conclusões

As verificações realizadas com auxílio da metodologia de análise proposta, apresentadas na Seção 3 desse trabalho, mostraram-se satisfatórias, quando comparadas com o programa SAFIR, o que permite concluir que ambos os procedimentos de solução computacional - Análise Térmica e Análise Estrutural - apresentados no presente trabalho, Seção 2, podem ser adotados na avaliação do comportamento de estruturas de pórticos planos de aço, sob condições de incêndio.

6. Agradecimentos

O primeiro autor agradece o apoio dado pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). As opiniões e conclusões apresentadas são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, a visão regulatória da CNEN.

7. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 09/02/2004 e aprovado em 25/04/2005.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jul 2005
  • Data do Fascículo
    Jun 2005
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