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Caracterização da temperabilidade e das curvas de transformação de fases de aços inoxidáveis martensíticos do tipo FeCrNi

Resumos

Nas últimas décadas, foram desenvolvidas novas classes de aços inoxidáveis martensíticos, com composição química 0,01-0,1%C, 11-13%Cr e 2-6%Ni, com o objetivo de atender às necessidades das indústrias de petróleo, por apresentarem boa resistência à corrosão em ambientes de média agressividade associada à boa resistência mecânica. Contudo o seu uso tem sido restrito pelo fato de ser um desenvolvimento recente e muitas de suas propriedades ainda serem motivos de investigações. Esse trabalho estuda as transformações de fases pela técnica dilatométrica de resfriamento rápido, obtendo-se os dados para a construção das curvas de transformação tempo-temperatura-transformação (TTT), em aços inoxidáveis martensíticos fundidos e analisa a influência da adição do níquel nessas transformações. Com base nos resultados obtidos, foram selecionadas as condições dos tratamentos térmicos de têmpera e revenido. Determinaram-se os valores das temperaturas inicial (Ac3) e final (Ac1) da transformação austenítica e as temperaturas de início (Mi) e fim (Mf) da transformação martensítica por resfriamento contínuo, obtendo uma estrutura final martensítica que apresente, simultaneamente, as propriedades de resistência à corrosão e mecânicas recomendadas quando em serviço.

Transformação de fases; têmpera; aço inoxidável martensítico; dilatometria


In the last decades, new classes of martensitic stainless steels were developed with chemical composition 0,01-0,1%C, 11-13%Cr, 2-6%Ni, with the objective of attending mainly the petroleum industry needs because they present good corrosion resistance in medium aggressive environments associated to good mechanical resistance. However, its use has been restricted by the fact of being a recent development and many of its properties are still under investigation. This work studies phase transformations by the dilatometry technique with fast cooling in order to construct the transformation time-temperature-transformation (TTT) curves in cast martensitic stainless steels and to analyze the nickel addition influence on the transformations. Based on the results the quenching and tempering conditions were selected. By continuous cooling, the austenitic transformation temperatures (Ac3) and (Ac1) and martensitic transformation temperatures (Mi) and (Mf) respectively were obtained, which provided the final martensitic structure that presents simultaneously the mechanical and corrosion resistance properties, recommended when in service.

Phases transformation; quenching; martensitic stainless steels; dilatometry


METALURGIA FÍSICA

Caracterização da temperabilidade e das curvas de transformação de fases de aços inoxidáveis martensíticos do tipo FeCrNi

Neide Aparecida MarianoI; Victor Ferrinho PereiraII; César Augusto Duarte RodriguesIII; Pedro Luis di LorenzoIV; João Manuel Domingos de Almeida RolloV

IProfessora Associada da Universidade São Francisco/PPG-ECM. E-mail: neide.mariano@saofrancisco.edu.br

IIGraduando da Universidade São Francisco/Engenharia Mecânica. E-mail: victorfpereira@gmail.com IIIPesquisador da EESC-USP. E-mail: cesaraug@sc.usp.br IVPesquisador da EESC-USP. E-mail: plorenzo@sc.usp.br VProfessor da EESC-USP. E-mail: tfase@sc.usp.br

RESUMO

Nas últimas décadas, foram desenvolvidas novas classes de aços inoxidáveis martensíticos, com composição química 0,01-0,1%C, 11-13%Cr e 2-6%Ni, com o objetivo de atender às necessidades das indústrias de petróleo, por apresentarem boa resistência à corrosão em ambientes de média agressividade associada à boa resistência mecânica. Contudo o seu uso tem sido restrito pelo fato de ser um desenvolvimento recente e muitas de suas propriedades ainda serem motivos de investigações. Esse trabalho estuda as transformações de fases pela técnica dilatométrica de resfriamento rápido, obtendo-se os dados para a construção das curvas de transformação tempo-temperatura-transformação (TTT), em aços inoxidáveis martensíticos fundidos e analisa a influência da adição do níquel nessas transformações. Com base nos resultados obtidos, foram selecionadas as condições dos tratamentos térmicos de têmpera e revenido. Determinaram-se os valores das temperaturas inicial (Ac3) e final (Ac1) da transformação austenítica e as temperaturas de início (Mi) e fim (Mf) da transformação martensítica por resfriamento contínuo, obtendo uma estrutura final martensítica que apresente, simultaneamente, as propriedades de resistência à corrosão e mecânicas recomendadas quando em serviço.

Palavras-chave: Transformação de fases, têmpera, aço inoxidável martensítico, dilatometria.

ABSTRACT

In the last decades, new classes of martensitic stainless steels were developed with chemical composition 0,01-0,1%C, 11-13%Cr, 2-6%Ni, with the objective of attending mainly the petroleum industry needs because they present good corrosion resistance in medium aggressive environments associated to good mechanical resistance. However, its use has been restricted by the fact of being a recent development and many of its properties are still under investigation. This work studies phase transformations by the dilatometry technique with fast cooling in order to construct the transformation time-temperature-transformation (TTT) curves in cast martensitic stainless steels and to analyze the nickel addition influence on the transformations. Based on the results the quenching and tempering conditions were selected. By continuous cooling, the austenitic transformation temperatures (Ac3) and (Ac1) and martensitic transformation temperatures (Mi) and (Mf) respectively were obtained, which provided the final martensitic structure that presents simultaneously the mechanical and corrosion resistance properties, recommended when in service.

Keywords: Phases transformation, quenching, martensitic stainless steels, dilatometry.

1. Introdução

As indústrias de petróleo dos Estados Unidos e da Europa, desde o início de 1950, já registravam a ocorrência de diversos tipos de corrosão em tubulações de aços e equipamentos empregados na extração de petróleo e gás, quando expostos a meio contendo íons de cloreto. Contudo, nos últimos trinta anos, com o crescente desenvolvimento mundial da produção de petróleo e gás, em reservas marítimas, a importância no conhecimento de novos materiais, nos mecanismos de corrosão, assim como na sua prevenção em evitar falhas catastróficas, tem sido cada vez mais reconhecida como de alta necessidade tecnológica (Deleu et al., 1999; Dhooge, 1999; Kondo et al., 1999).

Dessa forma, as pesquisas têm se intensificado no estudo do comportamento de ligas resistentes à corrosão, como o aço inoxidável martensítico, super martensítico, dúplex, superdúplex e aço inoxidável austenítico com elevado teor de manganês.

Esses aços possuem excelente resistência à corrosão e à oxidação, devido à ação passivante, principalmente, do cromo e níquel e, em menor grau, devido aos elementos de liga Mo, Cu, Si, Al, formarem um filme de óxido contínuo, aderente e estável na superfície, protegendo-os contra ambientes corrosivos.

De maneira geral, quanto maior a quantidade de elementos passivantes na liga, maior será a sua resistência à corrosão, desde que estes se encontrem em solução na matriz. Caso esses elementos se combinem formando precipitados, como carbonetos, nitretos, sulfetos, boretos e/ou fases intermetálicas, o seu efeito passivante diminuirá proporcionalmente à formação dessas fases.

O elevado custo do níquel tem levado ao desenvolvimento de novas ligas de aços inoxidáveis como: aço inoxidável dúplex, aço inoxidável superdúplex, aço inoxidável austenítico com elevado teor de manganês, aço inoxidável martensítico e supermartensítico. E várias técnicas de refino secundário foram desenvolvidas, com o objetivo de reduzir o teor dos intersticiais carbono e nitrogênio em sua microestrutura, diminuindo a corrosão intergranular, a fragilização e a corrosão por pite (Dhooge, 1999).

No entanto, o desafio ainda tem sido desenvolver ligas que associem boa resistência mecânica, soldabilidade, resistência à corrosão e baixo custo, para serem utilizadas como alternativa viável no campo de produção das indústrias química e petroquímica.

Na última década, foram desenvolvidas novas classes de aços inoxidáveis martensíticos, com teores de carbono entre de 0,01 e 0,1%, cromo entre 11e 13%, níquel entre 2 e 6% e molibdênio em torno de 2%, com o objetivo de atender às necessidades do segmento da indústria do petróleo, oferecendo alternativas prática e econômica para a substituição dos aços carbono com inibidores de corrosão e parte dos inoxidáveis austeníticos utilizados nas indústrias petrolíferas, principalmente em campos de produção "Offshore" (Straube, 1988; Vodarek et al., 2001; Carrouge, 2002).

Essas ligas são de grande interesse para as indústrias de petróleo, por apresentarem boa resistência à corrosão em ambientes de média agressividade e boa soldabilidade, quando comparadas aos tradicionais aços inoxidáveis martensíticos. Porém os tratamentos térmicos empregados são essenciais na obtenção das microestruturas e propriedades mecânicas desejadas.

O tratamento térmico consiste em uma têmpera seguida de um revenido simples ou duplo, cujas condições são otimizadas para conceder ao aço a resistência mecânica, dureza e tenacidade necessárias, sendo que os principais parâmetros envolvidos são: taxa de aquecimento e resfriamento, temperatura e tempo de austenitização e ciclos térmicos de revenido. Assim, o objetivo desse trabalho foi estabelecer as condições otimizadas dos tratamentos térmicos de têmpera e revenido, através dos valores das temperaturas inicial (Ac3) e final (Ac1) da transformação austenítica e as temperaturas de início (Mi) e de fim (Mf) da formação martensítica. Os resultados obtidos serão de grande importância para o setor de fundição de aços inoxidáveis, pois poderá sugerir e propor alternativas nos tratamentos térmicos que possibilitarão o melhor desempenho dos materiais nas condições de serviço, otimizando as propriedades mecânicas.

2. Materiais e métodos

Os aços utilizados foram os inoxidáveis martensítico fundido, das classes 13Cr4Ni0,02C e 13Cr2Ni0,1C. Essas ligas foram obtidas em forno convencional a arco elétrico, de refinamento tipo AOD (Descarbonetação Argônio-Oxigênio) e vazado em moldes de areia aglomerada com resina fenólica-uretânica, em forma de blocos tipo quilha.

Os ensaios dilatométricos foram realizados no dilatômetro de têmpera rápida com austenitização realizada a 1100ºC por tempo de encharque de 60 minutos para ambas as amostras, obtendo-se, como resultados, os valores de Ac1, Ac3, Mi e Mf.

Os ensaios isotérmicos foram realizados com o ciclo térmico: taxa de aquecimento fixa de 0,33ºC/s até 1100ºC, mantida nessa temperatura por 10 minutos e resfriado a 80ºC/s até as temperaturas isotérmicas de 580, 650, 700, 750 e 800ºC, para o aço 13Cr4Ni0,02C e 580, 680, 730, 780 e 830ºC, para o aço 13Cr1,0Ni0,1C, durante uma hora e resfriada a 80oC/s até a temperatura ambiente, para os dois aços. As medidas de dureza foram realizadas sob norma ASTM E-18 e o ensaio de tração, sob a norma ASTM-E8M, a temperatura ambiente

3. Resultados e discussão

As Figuras 1 e 2 mostram as curvas obtidas após ensaios de dilatometria, com taxa de aquecimento de 0,33ºC/s até 1100ºC e resfriamento com taxa de 30ºC/s até a temperatura ambiente. No aquecimento, foram determinadas as temperaturas inicial (Ac3) e final (Ac1) da transformação austenítica e no resfriamento, as temperaturas de início (Mi) e fim (Mf) da transformação martensítica e os seus valores estão apresentados na Tabela 1. Na mesma tabela, para comparação, estão, também, apresentados valores obtidos por outros pesquisadores.



Com os valores de Ac3, foi selecionada a temperatura de austenitização dentro do campo gama, para posterior têmpera, sendo de 1020ºC para o aço 13Cr4Ni0,02C e de 1000ºC para o 13Cr2Ni0,1C, uma vez que o campo da ferrita ä se localiza acima de 1100ºC, segundo o diagrama de equilíbrio Fe-Cr (ASTM, 1990). Analogamente, com Ac1, foi possível propor uma faixa de temperatura para o tratamento de revenimento. A literatura mostra, para os aços da classe 13Cr4Ni0,02C, o revenimento realizado em temperaturas ligeiramente acima de Ac1 (Iwabuchi & Sawada, 2000; Nalbone, 2000).

O tratamento térmico definido consistiu em: três horas a 1050ºC, com posterior têmpera ao ar, e revenimento a 670ºC, com resfriamento ao ar.

No entanto, para a classe dos aços 13Cr2Ni0,1C, o tratamento de revenimento é feito em temperaturas abaixo de Ac1 (Iwabuchi & Sawada, 2000). Dessa forma, o tratamento térmico, para essa classe dos aços, consistiu em: uma hora a 1000ºC, com têmpera ao ar, e revenimento a 700ºC, com resfriamento ao ar.

A Tabela 2 apresenta os valores de resistência mecânica máxima e dureza dos aços após os tratamentos térmicos selecionados e os valores especificados (ASTM A743-743M-98).

Com os dados obtidos, após os ensaios isotérmicos, foi possível construir um perfil da curva da cinética de transformação de fases, na fase inicial de transformação dos aços estudados, e curvas de transformação tempo-temperatura-transformação (TTT), conforme mostra a Figura 3.


A adição do níquel como elemento de liga, nos aços, modifica a cinética das transformações de fases, alterando a microestrutura final. O níquel é um elemento austenitizante que, além de ampliar o campo gama e abaixar a temperatura Mi, também retarda a difusão do carbono, aumentando a temperabilidade dos aços. O níquel retarda o processo de precipitação de carbonetos do tipo Cr23C6, provocando um aumento na tenacidade do material e afetando diretamente as temperaturas de transformações Mi, Ac1 e Ac3. Esse efeito foi observado neste trabalho, através dos aços 13Cr4Ni0,02C e 13Cr2Ni0,1C e por Iwabuchi (Iwabuchi & Sawada, 2000).

4. Conclusões

A determinação das temperaturas de transformações de fases possibilitou selecionar os parâmetros dos tratamentos térmicos de têmpera e revenido. Esses parâmetros possibilitaram a obtenção dos valores de resistência mecânica máxima e dureza, dentro das especificações para as classes dos aços, proporcionando melhor desempenho nas condições de serviço. O elemento Ni evidenciou um efeito retardador no processo de difusão do carbono e, conseqüentemente, na precipitação de carbonetos, deslocando o início da curva TTT para tempos maiores

5. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 30/07/2006 e aprovado em 05/10/2006.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2007
  • Data do Fascículo
    Mar 2007

Histórico

  • Aceito
    05 Out 2006
  • Recebido
    30 Jul 2006
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