Resumos
Apresentam-se os procedimentos para dimensionamento de pilares mistos de aço e concreto do projeto de revisão da norma brasileira ABNT NBR 8800:1986, quando da atuação conjunta de força axial de compressão e momentos fletores. São, também, apresentadas as bases teóricas dos procedimentos, que têm como referências principais a norma européia EN 1994-1-1:2004 e a americana ANSI/AISC 360-05. Mostra-se, ainda, que os resultados fornecidos pelos procedimentos do projeto de revisão têm boa concordância com resultados mais precisos obtidos por uma análise pelo método dos elementos finitos.
Estruturas mistas; pilares mistos; dimensionamento estrutural
This paper presents the design methods for steel and concrete composite columns subjected to compression axial load and bending moments according to the Revision Project of the Brazilian Code ABNT NBR 8800:1986. Presented also is the theoretical basis of the methods, using the European Standard EN 1994-1-1:2004 as a main guideline and the American Standard ANSI/AISC 360-05. It is showed that the results issued from the Revision Project of the Brazilian Code are in good agreement with more accurate results obtained by the finite element method.
Composite structures; composite columns; structural design
ENGENHARIA CIVIL: ESTRUTURA EM AÇO
Bases do dimensionamento de pilares mistos de aço e concreto segundo o projeto de revisão da NBR 8800
Basis for the design of composite steel and concrete columns according to the Brazilian code review project
Rodrigo Barreto CaldasI; Ricardo Hallal FakuryII; João Batista Marques de Sousa Jr.III
IEngenheiro Civil, Doutorando da UFMG Email: caldas@dees.ufmg.br
IIProfessor Doutor da UFMG Email: fakury@dees.ufmg.br
IIIProfessor Doutor da UFOP Email: joao@em.ufop.br
RESUMO
Apresentamse os procedimentos para dimensionamento de pilares mistos de aço e concreto do projeto de revisão da norma brasileira ABNT NBR 8800:1986, quando da atuação conjunta de força axial de compressão e momentos fletores. São, também, apresentadas as bases teóricas dos procedimentos, que têm como referências principais a norma européia EN 199411:2004 e a americana ANSI/AISC 36005. Mostrase, ainda, que os resultados fornecidos pelos procedimentos do projeto de revisão têm boa concordância com resultados mais precisos obtidos por uma análise pelo método dos elementos finitos.
Palavraschave: Estruturas mistas, pilares mistos, dimensionamento estrutural.
ABSTRACT
This paper presents the design methods for steel and concrete composite columns subjected to compression axial load and bending moments according to the Revision Project of the Brazilian Code ABNT NBR 8800:1986. Presented also is the theoretical basis of the methods, using the European Standard EN 199411:2004 as a main guideline and the American Standard ANSI/AISC 36005. It is showed that the results issued from the Revision Project of the Brazilian Code are in good agreement with more accurate results obtained by the finite element method.
Keywords: Composite structures, composite columns, structural design.
1. Introdução
A norma européia EN 199411:2004 apresenta um método simplificado para o dimensionamento de pilares mistos de aço e concreto, pelo qual se obtém o diagrama de interação da força axial de compressão e do momentofletor resistentes da seção, considerando uma distribuição plástica das tensões, com as imperfeições ao longo do pilar tratadas como excentricidades proporcionais ao comprimento destravado da peça. Na verificação de pilares submetidos exclusivamente à compressão axial, por simplicidade, as curvas de dimensionamento de pilares de aço são adotadas. Essa norma apresenta, também, um outro método de dimensionamento, chamado método geral, com base no princípio da compatibilidade de deformações, onde uma distribuição linear de deformações juntamente com as relações tensãodeformação dos materiais são consideradas. O método geral pode ser utilizado para análise de seções assimétricas ou varáveis ao longo do comprimento do pilar, permitindo a utilização de métodos avançados de análise que, em geral, exigem implementação computacional, como os apresentados por Caldas (2004).
Segundo Oehlers e Bradford (1995), o método simplificado para verificação dos pilares flexocomprimidos da EN 199411:2004 tem por base o método desenvolvido por Roik e Bergmann (1989), onde pontos do diagrama de interação da força axial e momentofletor resistentes são obtidos a partir de uma distribuição plástica das tensões.
Nos Estados Unidos, a norma ANSI/AISC 36005 prescreve que a obtenção do diagrama de interação entre força axial de compressão e momentofletor resistentes da seção pode ser feita considerando tanto a compatibilidade de deformações como uma distribuição plástica das tensões. As imperfeições são tratadas de forma similar aos pilares de aço, reduzindose a força axial resistente dos pontos que compõem o diagrama de interação. A ANSI/AISC 36005 permite, ainda, que seja usado o mesmo diagrama de interação dos pilares de aço, com o objetivo de tornar o dimensionamento mais expedito. Evidentemente, essa última opção é menos precisa, conduzindo, muitas vezes, a resultados bastante favoráveis à segurança.
Os procedimentos apresentados pela ANSI/AISC 36005 fundamentamse em trabalhos como o de Leon e Aho (2000), onde vários processos de dimensionamento são propostos e discutidos com base em Aho (1996).
No presente trabalho, descrevemse os procedimentos apresentados no projeto de revisão da norma brasileira ABNT NBR 8800:1986, versão de setembro de 2006 (por facilidade de citação, esse projeto de revisão será tratado nesse trabalho como PR NBR 8800:2006), que se fundamenta nas prescrições da EN 199411:2004 e da ANSI/AISC 36005. As bases teóricas desses procedimentos são, também, apresentadas, com destaque para as justificativas para adoção de alguns ajustes nos valores de determinados coeficientes.
2. Procedimentos do PR NBR 8800:2006
2.1 Situações previstas
O PR NBR 8800:2006 prevê o dimensionamento de pilares mistos com seções transversais totalmente revestidas com concreto (Figura 1a), parcialmente revestidas com concreto (Figura 1b), tubulares quadradas ou retangulares preenchidas com concreto (Figura 1c) e circulares preenchidas com concreto (Figura 1d), submetidos à compressão axial ou à flexocompressão. Observase que essas quatro seções são previstas, também, pela EN 199411:2004, mas a ANSI/AISC 36005 não prevê as seções parcialmente revestidas com concreto.
2.2 Pilares submetidos à compressão axial
De acordo com o PR NBR 8800:2006, a força axial resistente de cálculo de pilares mistos axialmente comprimidos sujeitos à instabilidade por flexão é dada por:
onde c é o fator de redução associado à resistência à compressão e é a força axial de compressão resistente de cálculo da seção transversal à plastificação total. Essa força é igual a:
onde ga1, gs e gc são os coeficientes de ponderação da resistência ao escoamento do aço do perfil fy, da resistência ao escoamento do aço da armadura fys e da resistência característica do concreto à compressão fck, respectivamente, e Aa, As e Ac são, pela ordem, a área da seção transversal do perfil de aço, da armadura e do concreto. O coeficiente a deve ser tomado igual a 0,95, nas seções tubulares circulares preenchidas com concreto, e 0,85, nas demais seções.
Os valores adotados para o coeficiente a têm por base a ANSI/AISC 36005. O valor 0,95, para as seções tubulares circulares preenchidas com concreto, leva em conta que, nesse tipo de pilar misto, o concreto desenvolve uma resistência maior decorrente do confinamento. A EN 199411:2004 indica o uso de valores maiores para a, porém limita com mais rigor as relações entre largura e espessura dos elementos componentes do perfil de aço para que não ocorra flambagem local. No PR NBR 8800:2006, optouse por seguir as prescrições da ANSI/AISC 36005, com objetivo de possibilitar a utilização de elementos de aço mais esbeltos. No item 3 desse trabalho, são apresentadas as relações entre largura e espessura para os elementos de aço adotadas no PR NBR 8800:2006.
O fator de redução c é obtido em função da esbeltez relativa,
e da curva de dimensionamento à compressão adequada (curva a para seções tubulares preenchidas com concreto, curva b ou c para seções total e parcialmente revestidas com concreto, com instabilidade em torno do eixo de maior ou menor inércia do perfil de aço, respectivamente). Nessa expressão, é o valor de , dado pela expressão (2), com os coeficientes de ponderação da resistência ga1, gs e gc tomados iguais a 1,0, e Ne é a força axial de flambagem elástica,
onde KL é o comprimento de flambagem do pilar e
é a rigidez efetiva da seção transversal dos pilares mistos, onde Ea e Es são os módulos de elasticidade do aço do perfil e do aço da armadura, respectivamente, Ecr é o módulo de elasticidade reduzido do concreto para consideração dos efeitos da retração e fluência, cujo valor será dado a seguir, Ia, Is e Ic são os momentos de inércia em relação ao eixo de flexão do perfil de aço, da armadura e do concreto, respectivamente. O coeficiente de correção 0,7, que multiplica o termo referente ao componente concreto, leva em conta a fissuração desse material e difere do valor 0,6 que aparece na EN 199411:2004 para corrigir a diferença entre o valor do módulo de elasticidade do concreto definido por essa norma européia e pelo PR NBR 8800:2006.
O módulo de elasticidade reduzido do concreto é dado por:
onde NSd,G é a parcela da força axial solicitante de cálculo, NSd, devida à ação permanente e quase permanente e j é o coeficiente de fluência, obtido da ABNT NBR 6118:2003. Admitese, simplificadamente, que o coeficiente de fluência seja tomado igual a 2,5 nas seções total ou parcialmente revestidas com concreto e igual a zero nas seções tubulares preenchidas com concreto. Admitese, ainda, que a relação NSd,G/NSd seja considerada igual a 0,6.
Os valores simplificados apresentados para o coeficiente de fluência e para a relação NSd,G/NSd partem da observação dos valores médios de rigidez efetiva prescritos pela EN 199411:2004 e pela ANSI/AISC 36005. No caso dos pilares preenchidos com concreto, o perímetro da seção do componente concreto em contato com a atmosfera tende a zero e, além disso, a umidade do concreto é maior, o que faz com que o coeficiente de fluência seja pequeno.
2.3 Pilares submetidos à flexocompressão
Para a verificação dos efeitos da força axial de compressão e dos momentosfletores segundo o PR NBR 8800:2006, podese utilizar um modelo de cálculo mais simples, denominado modelo de cálculo I, ou um modelo mais rigoroso, denominado modelo de cálculo II.
2.3.1 Modelo de cálculo I
O modelo de cálculo I tem por base a ANSI/AISC 36005 e utiliza as mesmas expressões de interação entre força axial e momentosfletores prescritas para os pilares de aço. Assim, o dimensionamento pode ser feito (ver Figura 2a para o caso de momentofletor em relação a um dos eixos, x ou y, das seções transversais mostradas na Figura 1), para NSd /NRd > 0,2, pela expressão
e, para NSd /NRd < 0,2, pela expressão
onde MSd,xe MSd,y são os momentosfletores solicitantes de cálculo, respectivamente, em relação aos eixos x e y, MRd,x e MRd,y são os momentosfletores resistentes de plastificação de cálculo, respectivamente, em torno dos eixos x e y, dados por e . O PR NBR 8800:2006 apresenta expressões para obtenção desses momentos.
2.3.2 Modelo de cálculo II
O modelo de cálculo II tem por base o método simplificado da EN 199411:2004. A verificação dos efeitos da força axial de compressão e dos momentos fletores pode ser feita a partir das expressões
representadas no diagrama da Figura 2b (essa figura mostra o caso de momentofletor em relação a um dos eixos, x ou y, das seções transversais mostradas na Figura 1).
Nessas expressões:
a) µx é um coeficiente igual a:
b) µy é um coeficiente calculado da mesma forma que µx, trocandose as grandezas referentes a x por y.
c) Nc é a força axial resistente de cálculo apenas do componente concreto, Nc = a fck Ac/gc, onde as grandezas são as mesmas apresentadas na expressão (2).
d) Mc,x e Mc,y são dados, respectivamente, por 0,9 e 0,9 . O coeficiente 0,9, existente também na EN 199411:2004, tem por base observações feitas por Chung e Narayanan (1994), que justificam sua presença pela não consideração dos limites de deformação do concreto na obtenção do diagrama de interação e por ajustes relativos aos efeitos locais de segunda ordem que são calculados a partir da rigidez efetiva considerando a área total do concreto, sem desprezar a região fissurada. Nas expressões (7) e (8) do modelo de cálculo I, esse coeficiente é tomado igual a 1,0, uma vez que tais expressões são, em geral, mais conservadoras.
e) Md,x e Md,y são dados, respectivamente, por 0,8 e 0,8 , onde e são os momentosfletores máximos resistentes de plastificação de cálculo em torno do eixo x e y, respectivamente, determinados considerando uma distribuição plástica de tensões para um força axial igual a Nc/2. O coeficiente 0,8 considera a possibilidade de o momentofletor ocorrer para uma força axial independente menor do que seu valor de cálculo. Essa situação levaria a momentosfletores resistentes menores, quando as forças axiais solicitantes forem inferiores a Nc/2 (figura 2b). Por causa dessa condição, caso Md,x seja menor que Mc,x, o valor do primeiro deve ser tomado igual ao do segundo. O mesmo ocorre em relação à Md,y e Mc,y.
f) MSd,x e MSd,y são os momentosfletores solicitantes de cálculo, respectivamente, em relação aos eixos x e y. Esses momentos, caso não seja feita análise mais rigorosa, são iguais aos momentos obtidos na análise da estrutura somados aos momentos devidos às imperfeições ao longo do pilar, dados por:
em relação ao eixo x ou y, respectivamente, devendose considerar o caso mais desfavorável segundo a expressão (10). Nessas expressões, L é o comprimento destravado do pilar, Ne,x = p2(EI)e,x/Lx2 e Ne,y = p2(EI)e,y/Ly2, onde os subscritos x e y referemse à flexão em torno desses eixos (Figura 1).
3. Flambagem local dos elementos de aço
Segundo o PR NBR 8800:2006, as resistências de todos os materiais devem ser atingidas sem que ocorra flambagem local dos elementos do perfil de aço da seção transversal. Para evitar essa flambagem, não podem ser ultrapassadas as relações dadas a seguir:
a) Nas seções tubulares circulares preenchidas com concreto: D/t < 0,15Ea/fy.
b) Nas seções tubulares retangulares preenchidas com concreto: bi/t < 2,26(Ea/fy)1/2.
c) Nas seções I ou H parcialmente revestidas com concreto: bf/tf< 1,49(Ea/fy)1/2.
Nas relações apresentadas: D é o diâmetro externo da seção tubular circular de aço (Figura 1d); t é a espessura da chapa que compõe a seção de aço; bi é a largura da chapa que compõe a seção tubular retangular ou quadrada de aço (Figura 1c); e bf e tf são, respectivamente, a largura e espessura das mesas da seção de aço (Figura 1b).
Para as seções totalmente revestidas com concreto (Figura 1a), caso os cobrimentos exigidos no PR NBR 8800:2006 sejam observados, não é necessária a verificação de flambagem local.
As relações apresentadas têm por base a ANSI/AISC 36005, cujas prescrições levam em conta o efeito da restrição à flambagem local dos elementos de aço proporcionada pelo concreto, com base em diversos estudos, entre os quais os de Bradford et al. (2000). Esses pesquisadores apresentam os modelos e a calibração da relação largura e espessura de seções tubulares circulares preenchidas com concreto.
4. Avaliação dos modelos
No trabalho de Caldas et al. (2005) foram feitas análises por meio do método dos elementos finitos (Caldas, 2004; Sousa Jr. & Caldas, 2005), para avaliação dos modelos de cálculo I e II, citados no item 2. Nas análises realizadas, um pilar misto totalmente envolvido teve seu comprimento e espessuras das chapas que compõem o perfil variando segundo os limites de esbeltez relativa, expressão (3), e fator de contribuição do aço, d = fy Aa/(ga1 ), respectivamente. Dessa forma, foi possível obter uma avaliação do comportamento dos modelos de cálculo dentro dos seus limites de aplicação. Chegouse à conclusão que os modelos de cálculos apresentam segurança adequada, sendo que, para pilares com esbeltez relativa baixa e com pequeno fator de contribuição do aço, o modelo de cálculo I é bastante conservador em relação ao modelo de cálculo II (Figura 3a), e que, para pilares com alto fator de contribuição do aço ou grande esbeltez relativa, os dois modelos fornecem resultados próximos (Figura 3b).
5. Conclusões
Nesse trabalho, são mostrados os dois procedimentos para dimensionamento de pilares mistos de aço e concreto do projeto de revisão da norma brasileira ABNT NBR 8800:1986 (PR NBR 8800:2006), chamados de modelo de cálculo I e modelo de cálculo II, quando da atuação conjunta de força axial de compressão e momentos fletores. São, também, apresentadas as bases teóricas dos dois modelos, que têm como referências principais a norma européia EN 199411:2004 e a americana ANSI/AISC 36005, e as explicações para adoção de ajustes nos valores de determinados coeficientes.
Destacouse que Caldas et al. (2005) mostraram que os resultados fornecidos pelos dois modelos foram comparados amplamente com os fornecidos por uma análise usando o método dos elementos finitos, tendose chegado a uma boa concordância. Nesse trabalho, são reproduzidas as comparações feitas para dois pilares totalmente revestidos com concreto. Observouse que o modelo de cálculo I, por ser mais simples, fornece quase sempre resultados mais conservadores que o modelo II, sendo esse conservadorismo mais pronunciado para pilares mistos com esbeltez relativa baixa e com pequeno fator de contribuição do aço.
6. Agradecimentos
Ao CNPq, à FAPEMIG e à V&M, que tornaram possível a elaboração desse trabalho.
7. Referências bibliográficas
Artigo recebido em 24/11/2006 e aprovado em 28/11/2006.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
07 Ago 2007 -
Data do Fascículo
Jun 2007
Histórico
-
Aceito
28 Nov 2006 -
Recebido
24 Nov 2006