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Mapeamento da vulnerabilidade à contaminação das águas subterrâneas localizadas na Bacia Sedimentar do Araripe, Estado do Ceará, Brasil

Mapping groundwater contamination vulnerability in area of the Sedimentary Basin of Araripe, State of Ceara, Brazil

Resumos

O estudo desenvolveu-se com o objetivo de classificar o nível de vulnerabilidade à contaminação da água subterrânea numa região limitada da Bacia Sedimentar do Araripe. A área abrange oito municípios localizados no sul do Estado do Ceará, na região Nordeste do Brasil. A metodologia baseia-se na aplicação do Método GOD (Foster & Hirata, 1988), que consiste na caracterização, por meio de índices, do grau de confinamento da água subterrânea, da ocorrência dos estratos de cobertura e do nível do lençol freático. O resultado final é obtido pela multiplicação dos índices e corresponde a um mapa geral com indicação dos níveis de vulnerabilidade da área. Os resultados, em termos percentuais, revelam que a área apresenta vulnerabilidade à contaminação predominantemente variando de média (41%) à alta (59%), evidenciando a necessidade de desenvolvimento e implantação do zoneamento de proteção do manancial.

Água subterrânea; vulnerabilidade; contaminação; Método GOD; Bacia Sedimentar do Araripe; Brasil


The main object of this research is to classify the groundwater vulnerability to contamination in a limited area of the Sedimentary Basin of Araripe. The area includes eight counties located in the south of the State of Ceará, in the Northeast region of Brazil. The methodology was based on the GOD method (Foster & Hirata, 1988) that consists in the analysis of the groundwater presence, the overall geological stratification of aquifer and the depth of water. The methodology uses several indexes to classify the aquifer. The final result is obtained by the multiplication of the indexes and they can be used to generate a map that indicates the distribution vulnerability levels of the aquifer. The results, in percentile terms, indicate that the area presents predominant vulnerability to contamination between moderate (41%) to high (59%), suggesting the need for development and implementation of groundwater protection zoning.

Groundwater; vulnerability; contamination; GOD method; Sedimentary Basin of Araripe; Brazil


ENGENHARIA CIVIL

Mapeamento da vulnerabilidade à contaminação das águas subterrâneas localizadas na Bacia Sedimentar do Araripe, Estado do Ceará, Brasil

(Mapping groundwater contamination vulnerability in area of the Sedimentary Basin of Araripe, State of Ceara, Brazil)

Paulo Roberto Lacerda TavaresI; Marco Aurélio Holanda de CastroII; Celme Torres Ferreira da CostaIII; José das Graças Procópio da SilveiraIV; Francisco Jocélio Bezerra de Almeida JúniorV

IDoutorando em Engenharia Civil - Área de Concentração Recursos Hídricos pelo Depart. de Eng. Hidráulica e Ambiental-UFC. Professor Assistente da Univ. Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará. E-mail: prltavares@ufc.br

IIProfessor Associado do Depart. de Eng. Hidráulica e Ambiental da Univ. Federal do Ceará, Campus do Pici, Fortaleza, Ceará. E-mail: marco@ufc.br

IIIProfessora Adjunta da Univ. Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará. E-mail: celmetorres@ufc.br

IVEspecialista em Gestão dos Recursos Hídricos, Diretor Presidente da Sociedade Anônima de Água e Esgoto do Crato - SAAEC, Crato, Ceará. E-mail: prosaaec@uol.com.br

VGraduando em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Ceará, Bolsista de Iniciação Científica da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Regional - FUNCAP, Juazeiro do Norte, Ceará. E-mail: jocjr@secrel.com.br

RESUMO

O estudo desenvolveu-se com o objetivo de classificar o nível de vulnerabilidade à contaminação da água subterrânea numa região limitada da Bacia Sedimentar do Araripe. A área abrange oito municípios localizados no sul do Estado do Ceará, na região Nordeste do Brasil. A metodologia baseia-se na aplicação do Método GOD (Foster & Hirata, 1988), que consiste na caracterização, por meio de índices, do grau de confinamento da água subterrânea, da ocorrência dos estratos de cobertura e do nível do lençol freático. O resultado final é obtido pela multiplicação dos índices e corresponde a um mapa geral com indicação dos níveis de vulnerabilidade da área. Os resultados, em termos percentuais, revelam que a área apresenta vulnerabilidade à contaminação predominantemente variando de média (41%) à alta (59%), evidenciando a necessidade de desenvolvimento e implantação do zoneamento de proteção do manancial.

Palavras-chave: Água subterrânea, vulnerabilidade, contaminação, Método GOD, Bacia Sedimentar do Araripe, Brasil.

ABSTRACT

The main object of this research is to classify the groundwater vulnerability to contamination in a limited area of the Sedimentary Basin of Araripe. The area includes eight counties located in the south of the State of Ceará, in the Northeast region of Brazil. The methodology was based on the GOD method (Foster & Hirata, 1988) that consists in the analysis of the groundwater presence, the overall geological stratification of aquifer and the depth of water. The methodology uses several indexes to classify the aquifer. The final result is obtained by the multiplication of the indexes and they can be used to generate a map that indicates the distribution vulnerability levels of the aquifer. The results, in percentile terms, indicate that the area presents predominant vulnerability to contamination between moderate (41%) to high (59%), suggesting the need for development and implementation of groundwater protection zoning.

Keywords: Groundwater, vulnerability, contamination, GOD method, Sedimentary Basin of Araripe, Brazil.

1. Introdução

A água tem papel fundamental no desenvolvimento socioeconômico dos países e, neste sentido, identifica-se uma situação que merece crescente preocupação: garantir o abastecimento econômico e seguro de água potável nos meios urbano e rural, sem comprometer a oferta e qualidade de tais recursos hídricos. Nesse contexto, as fontes de água subterrânea se mostram com importância estratégica, uma vez que oferecem uma alternativa de suprimento de qualidade a relativo baixo custo.

A proteção dos mananciais requer o conhecimento detalhado do perigo de contaminação associado à área, que, segundo Foster (1987), é uma função da interação entre a vulnerabilidade do aqüífero à contaminação e a carga contaminante.

O conceito de análise de vulnerabilidade pode ser formalizado como sendo o conjunto de características intrínsecas dos estratos entre a zona saturada e a superfície do solo, o que determina sua suscetibilidade a sofrer os efeitos adversos de uma carga contaminante que é, será ou pode ser aplicada na região acima do nível freático (Foster, 1987). Nesse sentido, faz-se importante atentar para o tipo de carga contaminante, considerada, distinguindo os conceitos de vulnerabilidade integrada e vulnerabilidade específica. Esses conceitos diferem pelo tratamento geral (integrado), considerando um contaminante universal em condições típicas de poluição ou o tratamento separadamente (específico) para cada contaminante, grupos de contaminantes (nutrientes, patógenos, microorganismos, metais pesados, etc.) ou atividades contaminantes.

A determinação da vulnerabilidade está relacionada à capacidade de atenuação da zona vadosa, através da avaliação e integração de diferentes atributos litológicos e hidrogeológicos, tendo sido desenvolvidos diversos métodos de análise. A literatura especializada sinaliza três conjuntos de métodos que podem ser utilizados para avaliar a vulnerabilidade de uma formação aqüífera: métodos que empregam modelos de simulação; métodos estatísticos ou de monitoramento e métodos de índices e superposição.

Os métodos de simulação avaliam a vulnerabilidade por meio da solução de equações do escoamento em meio subterrâneo e transporte de soluto, quantificando a concentração do contaminante no tempo e no espaço.

Os métodos estatísticos são usados para quantificar a vulnerabilidade pela determinação da relação estatística entre a poluição e as condições ambientais observadas, sendo expresso como uma probabilidade de contaminação (Lindström, 2005).

Os métodos de índices baseiam-se na análise de alguns parâmetros do aqüífero, classificando cada característica de acordo com faixas de valores (índices) e distribuídos espacialmente. Os parâmetros individualmente classificados são sobrepostos para compor o mapa geral de vulnerabilidade. Podem-se citar os seguintes métodos de índices: GOD (Foster, 1987); DRASTIC (Aller et al., 1987); SINTACS (Civitia, 1994) e EPIK (Doerfliger & Zwahlen, 1995).

O desenvolvimento dos métodos de avaliação da vulnerabilidade acompanha a necessidade crescente de exploração dos recursos hídricos subterrâneos mundial, como alternativa à carência de água. Os métodos de vulnerabilidade avançam em busca de analisar diferentes tipos de aqüíferos. Exemplo disso são estudos aplicados a aqüíferos cársticos, tais como os propostos por Goldscheider et al. (2000), Zwahlen (2003), Goldscheider (2002; 2005) e Mimi e Assi (2009), utilizando o método PI, estudos feitos com base na cobertura de proteção e condições de infiltração do aqüífero.

Outra evolução constatada nos últimos anos é a utilização de técnicas neuro-fuzzy em vários estudos hidrogeológicos. Conforme Dixon (2005), as redes neurais e a lógica fuzzy permitem extrair informações a partir de conjuntos de dados incompletos ou contraditórios, contemplando as incertezas e tais conjuntos são adequados para incorporar aos cálculos o tratamento subjetivo e a ordem de importância dos parâmetros de vulnerabilidade (Nobre et al., 2007).

Integradas aos conceitos de inteligência artificial, seguem as técnicas de processamento de informações geográficas, através dos Sistemas de Informações Geográficas - SIG, que permitem, segundo Connell e Daele (2003), o mapeamento interativo das características hidrogeológicas. Trabalhos nesse sentido foram desenvolvidos por Gemitzi et al. (2006), Herlinger Jr. e Viero (2007), Seabra et al. (2009) e Mohammadi et al. (2008), com aplicações em diversas partes do mundo.

Para a determinação da vulnerabilidade de um aqüífero, são considerados basicamente, dois fatores: o nível de inacessibilidade hidráulica da zona saturada do aqüífero e a capacidade de atenuação dos estratos de cobertura da porção saturada do aqüífero. A verificação desses fatores acontece de maneira indireta, através da combinação de inúmeros parâmetros. A complexidade de um método tem relação direta com a quantidade de parâmetros requeridos e, na prática, a escassez e as dificuldades para medição e obtenção desses dados são fatores determinantes na escolha do método a ser utilizado. Dessa forma, o método GOD destaca-se como alternativa preferencial, graças a sua simplicidade conceitual e de aplicação. Tendo sido amplamente testado, o método GOD apresenta resultados satisfatórios com análise de uma reduzida quantidade de parâmetros.

A avaliação de uma menor quantidade de parâmetros característica do método GOD, não implica diminuição na abrangência da análise (Vías et al., 2005). Por exemplo, o processo de recarga é avaliado, individualmente, no método DRASTIC, enquanto que, no método GOD, está incluído no âmbito da classificação dos estratos de cobertura, quando se dá ênfase à ocorrência de fraturas bem desenvolvidas que podem favorecer o fluxo preferencial, reduzindo, substancialmente, a atenuação dos contaminantes, sendo fator crucial para o aumento da vulnerabilidade.

Os mapas de vulnerabilidade servem apenas para avaliar o perigo de contaminação da água subterrânea associado às descargas de substâncias que ocorrem na superfície do terreno em fase líquida dissolvida (Foster et al., 2006). Dessa forma, fatores limitantes à utilização do método GOD correspondem à avaliação do perigo de contaminantes despejados abaixo do subsolo (como pode ocorrer em caso de vazamentos de grandes tanques de armazenagem subterrâneos, de lixiviação de aterros de resíduos sólidos sob a camada de solo e com retirada da zona vadosa, de descargas efluentes em pedreiras e minerações, etc.) e derramamento de solventes orgânicos sintéticos imiscíveis (DNAPLs).

Apesar de apresentarem uma proteção natural relativamente maior à contaminação, as águas subterrâneas estão sob risco crescente, em decorrência da urbanização e desenvolvimento econômico paradoxalmente por elas sustentados. Em algumas regiões, os aqüíferos são as fontes principais e, muitas vezes, a única alternativa de abastecimento, sendo, portanto, a conservação da boa qualidade do manancial um aspecto crítico para a manutenção da vida local.

No contexto de oferta exclusiva de recursos hídricos subterrâneos, está inserida a área estudada. Um crescimento demográfico desordenado mostra-se evidente nos municípios da região do Cariri cearense, incrementando a demanda por água e o conseqüente aumento da produção de esgoto e resíduos sólidos, que, inadequadamente dispostos, representam fontes reais de contaminação das águas captadas para abastecimento público.

2. Caracterização da área

A Bacia Sedimentar do Araripe apresenta uma área de, aproximadamente, 11000 km² e se localiza no alto sertão do Nordeste brasileiro, englobando os Estados de Pernambuco, Piauí e Ceará. Os acessos aos municípios da região podem ser feitos através das rodovias federais asfaltadas BR-232, BR-230, BR-116, BR-122, BR-316, além de rodovias estaduais (DNPM, 1996).

A área, em estudo, apresenta, aproximadamente, 2230 km², sendo delimitada pelas coordenadas geográficas 39º28'00" e 38º48'00" de longitude oeste de Greenwich e 7º05'00" e 7º36'00" de latitude sul. Está totalmente inserida na porção cearense da Bacia Sedimentar do Araripe, localizada na Região Nordeste do Brasil (Figura 1).


A área se restringe aos depósitos sedimentares localizados em altitudes inferiores a 900m, constituintes dos aqüíferos e aquicludes explotados no chamado Vale do Cariri, responsáveis pelo abastecimento de, aproximadamente, 530.000 pessoas (IBGE, 2007), abrangendo os seguintes municípios: Abaiara, Barbalha, Brejo Santo, Crato, Juazeiro do Norte, Milagres, Missão Velha, Porteiras.

2.1 Clima, temperatura e precipitação

Segundo o sistema de classificação climática de Köppen (Köppen & Geiger, 1928), a área caracteriza-se por um clima quente e úmido com estação seca no inverno. A temperatura média anual se apresenta entre 24ºC e 26ºC e a precipitação média anual é de 1001,4mm, com o período chuvoso começando no verão e atingindo o seu auge na transição verão-outono.

2.2 Vegetação

Em estudo realizado por Austragésilo Filho et al. (2001), considerando Veloso et al. (1991), a vegetação da região caracteriza-se por áreas de floresta ombrófila densa montana (mata úmida), de savana (cerrado) e de savana florestada (cerradão) e, de acordo com Araújo et al. (1998), encontram-se também áreas de carrasco, ocorrendo em solos arenosos sobre chapadas contíguas à vegetação de caatinga, sendo que tais áreas podem ser reconhecidas como entidade própria devido a maior densidade de indivíduos, uniestratificação aparente e quase ausência de cactáceas e bromeliáceas.

2.3 Geomorfologia

Podem-se citar duas abordagens para caracterização do relevo da região. Alguns autores (Small, 1913; Ribeiro & Veríssimo, 1996) compartimentam o referido relevo em duas unidades predominantes: Planalto Sedimentar (Chapada do Araripe), com altitude média de 900m e a Depressão Sertaneja (Vale do Cariri), com altitude média de 400m. Uma segunda abordagem, dada pelo DNPM (1996), reconhece três zonas distintas: Zona de Chapada; Zona de Talude e Zona de Pediplano. Essas abordagens se diferenciam, basicamente, pelo destaque à Zona de Talude, onde estão localizadas centenas de exultórios naturais de água (fontes), responsáveis pela manutenção da rede de drenagem superficial que atravessa o Vale do Cariri.

2.4 Contexto hidrogeológico

Essa região apresenta importância hidrogeológica significativa. Estudos de compartimentação tectônica regional (Ponte & Ponte Filho, 1996) indicam a ocorrência de espessuras sedimentares expressivas, conferindo à área um elevado potencial de armazenamento hídrico subterrâneo.

Conforme o estudo hidrogeológico de caráter regional realizado pelo DNPM (1996), a Bacia Sedimentar do Araripe apresenta uma diversificação litológica caracterizada por seqüências alternadas de arenitos, siltitos, calcários, argilitos e folhelhos, podendo alcançar uma espessura total da ordem de 1600 m, sendo proposta a seguinte divisão hidrogeológica da bacia: Sistema Aqüífero Superior (formações Exu e Arajara), com espessura de ±320 m; Aquiclude Santana, com espessura de ± 180 m; Sistema Aqüífero Médio (formações Rio da Batateira, Abaiara e Missão Velha), com espessura de ± 500 m; Aquiclude Brejo Santo, com espessura de ±400 m e Sistema Aqüífero Inferior (formação Mauriti e parte basal da Formação Brejo Santo), com espessura de ± 60 a 100 m.

3. Material e métodos

O sistema de avaliação do Índice de Vulnerabilidade natural do aqüífero utilizado é resultado de uma combinação de procedimentos propostos por Foster e Hirata (1988), denominada metodologia do Índice GOD. Esse método está subdivido em quatro fases interligadas e sucessivas:

• 1ª Fase: Identificação do tipo e grau de confinamento hidráulico da água subterrânea (Índice G: groundwater occurrence), índice compreendido num intervalo de 0,0 - 1,0.

• 2ª Fase: Caracterização geológica da zona não saturada (Índice O: overall litology of aquifer), índice representado numa escala de 0,3 - 1,0.

• 3ª Fase: Determinação da profundidade do nível da água (Índice D: depth of water), índice analisado numa de escala de 0,6 - 1,0.

• 4ª Fase: O índice final (Índice GOD) é calculado multiplicando os resultados da 1ª, 2ª e 3ª fases. O índice máximo correspondente a 1,0 representa a vulnerabilidade extrema e o valor mínimo 0,0 corresponde à vulnerabilidade insignificante.

Os índices apresentam consistência física, considerando as características hidrogeológicas que representam, e matemática, tendo em vista que consistem de escalas relativas e adimensionais de valores, permitindo que características diferentes sejam combinadas. Nesse sentido, o índice G indica a ocorrência de formações geológicas permeáveis, impermeáveis ou semipermeáveis, que têm influência direta na velocidade de escoamento da água subterrânea. O índice O representa a capacidade de atenuação natural dos estratos de cobertura do aqüífero, considerando o grau de consolidação das partículas e a capacidade de retenção físico-química ou da capacidade de reação dos contaminantes com o meio. E, por fim, o índice D denota a distância natural da água à superfície do terreno, também denominada nível estático. Essa distância, portanto, está livre de interferências instantâneas relacionadas à variação do nível, tais como o bombeamento. Em termos matemáticos, a vulnerabilidade é inversamente proporcional ao confinamento, ao nível estático e à consolidação e capacidade de reação dos estratos de cobertura. A Figura 2 apresenta o esquema de aplicação do método GOD, detalhando a escala de valores.


As informações requeridas para a determinação dos índices foram obtidas por meio de investigações de campo e em bases de dados disponíveis em instituições públicas e órgãos de pesquisa, ligados à hidrogeologia, a citar: Companhia de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado do Ceará (COGERH), Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e Companhia de Pesquisa e Recursos Minerais (CPRM).

A elaboração dos mapas referentes a cada índice dá-se pela utilização das ferramentas 3D Anayst e Spatial Analyst, as quais correspondem a extensões que são acionadas no ArcView GIS 3.2 e permitem a interpolação de valores, produzindo, como resultado, mapas em formato GRID, que representam a organização da informação espacial por conjuntos de células, visualizadas através de um gradiente de cores.

Os mapas referentes aos índices G e O foram obtidos após a análise da base de dados disponibilizada pela COGERH, atribuindo os índices conforme descrito na Figura 2 e convertendo a visualização de formato vetorial (polígonos) para o formato GRID.

Quanto ao mapa do índice D, foram selecionados 231 poços distribuídos na área de estudo para aferição, em campo, dos níveis freáticos. Nessa seleção, constituiu-se uma predominância de poços tubulares profundos, construídos, originalmente, para o abastecimento particular ou de pequenas comunidades, com profundidades superiores a 20,0m, diâmetro de revestimento mais comum de 6" e cotas topográficas variando entre 341,9m e 598,0m. Importante destacar a verificação dos níveis em alguns poços rasos, tipo cacimbas, localizados, principalmente, na porção norte da área de estudo, onde o nível do lençol freático varia entre 5,0 e 20m. Após as medições, seguiu-se a composição do mapa a partir da interpolação dos valores, aplicando o Método do Inverso Ponderado da Distância.

O Método do Inverso Ponderado da Distância (Inverse Distance Weighted - IDW) é um procedimento de interpolação que consiste, basicamente, em atribuir um peso para cada ponto amostrado vizinho, em função da distância que ele se encontra do ponto que se quer calcular. Os pesos são calculados de maneira que a soma de todos os pesos dados aos pontos amostrados vizinhos seja igual a 1, ou seja, é atribuído um peso proporcional à contribuição de cada ponto vizinho (Menegol, 2004). A Equação (1) demonstra como o valor do ponto desconhecido pode ser calculado.

Em que:

: valor resultante calculado a partir das amostras Zi até Zn.

n: número de amostras da região a ser analisada.

di: distância de cada amostra ao ponto a ser calculado.

p: expoente de ponderação.

Zi: valor de cada amostra.

Por fim, concluída a elaboração dos mapas relacionados aos índices G, O e D, procede-se a multiplicação dos valores, obtendo, como resultado, o mapa de vulnerabilidade igualmente em formato GRID.

4. Resultados e discussão

As características hidrogeológicas verificadas permitem classificar a área com a ocorrência da água subterrânea de forma não confinada, composta pela sobreposição de aquicludes e aqüíferos livres, com valores de Índice G variando de 0,7 a 0,9. Quanto à caracterização dos estratos de cobertura, constata-se a predominância de arenitos, sobrepostos por sedimentos não consolidados constituídos de argila, areia e cascalho, conferindo uma variação do Índice O entre 0,7 e 0,9. E, com relação ao nível da água subterrânea, destaca-se que 60% da área apresenta níveis entre 20 e 50m e 37%, entre 20 e 5m, predominando, portanto, os Índices D iguais a 0,7 e 0,8. Esses resultados podem ser visualizados nas Figuras 3, 4 e 5.




A combinação dos fatores intrínsecos ao manancial, que caracterizam o acesso à água subterrânea, permitiu classificar, aproximadamente, 40% da área com vulnerabilidade média e 59% com vulnerabilidade alta, destacando, ainda, a ocorrência de 1% de área com vulnerabilidade insignificante correspondente ao afloramento das rochas consolidadas compactas (granito, migmatito e gnaisse) no município de Juazeiro do Norte, conforme Figura 6.


Analisando a vulnerabilidade por município, destacam-se Abaiara e Missão Velha com, aproximadamente, 90% e 70%, respectivamente, dos seus mananciais subterrâneos classificados como altamente vulneráveis (Figura 7). E, considerando os três principais municípios da região, em termos de população abastecida com água subterrânea, Barbalha se apresenta em situação mais desfavorável, com 60% de área altamente vulnerável, seguido por Crato (54%) e Juazeiro do Norte (38%).


Faz-se importante enfatizar que, em escala regional, conforme aplicado, o Método GOD apresenta resultados satisfatórios, que podem ser empregados no planejamento de políticas públicas e conscientização da população quanto à proteção do aqüífero. Enquanto que análises específicas de avaliação e proteção de zonas de captação (poços e nascentes) requerem uma escala mais detalhada e, nesse caso, a complexidade da conformação hidrogeológica e litológica dessa região, com evidências, constatadas em campo, por meio de perfis estratigráficos, da ocorrência de camadas com características confinantes e variações na sobreposição das formações hidrogeológicas, precisa de ser considerada.

5. Conclusões

Diante das características climáticas peculiares, da grande disponibilidade de recursos minerais e, especialmente, da ocorrência de reservas hídricas subterrâneas significativas, a região do Cariri cearense oferece condições ímpares de desenvolvimento socioeconômico, se comparada à maior parte das demais porções semi-áridas do Nordeste brasileiro. Portanto a relativa abundância dos recursos naturais caririenses, com localização singular no território brasileiro, e considerando as pressões econômicas de desenvolvimento, justifica a preocupação em aliar exploração e preservação e, neste sentido, análises, tais como a vulnerabilidade à contaminação dos aqüíferos, aplicam-se na tentativa de garantir a explotação, com comprometimento mínimo da disponibilidade em quantidade e qualidade para as gerações futuras.

No caso em questão, o método GOD demonstrou evidentes vantagens de aplicação, diante, principalmente, da limitada quantidade de dados disponíveis e das dificuldades operacionais do levantamento de campo em tão extensa área. Para aprimorar a abrangência da avaliação, faz-se importante realizar um estudo direcionado à análise de sensibilidade, no qual os parâmetros de entrada sejam sistematicamente modificados, dentro de limites razoáveis, de modo a estabelecer os efeitos de tais variações sobre a vulnerabilidade. Tal procedimento permite compreender como alterações futuras e reais nos parâmetros, tais como ações antrópicas de modificação do meio (explotação exagerada de água; remoção de estratos de cobertura, etc.), serão captadas pelo método.

Os resultados práticos demonstram a fragilidade do manancial subterrâneo local e a necessidade de adoção de políticas de zoneamento para ocupação ordenada dos espaços urbanos. A preocupação com a contaminação faz-se explicada, considerando a deficiência na infra-estrutura de coleta de esgoto e disposição dos resíduos sólidos, características evidentes na área de estudo. Com isso, recomenda-se a determinação espacial precisa das fontes de contaminação, organizando-as em um Sistema de Informações Geográficas, confrontando a disposição das áreas vulneráveis às cargas contaminantes, resultando no diagnóstico completo do risco de contaminação.

6. Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio financeiro da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Regional - FUNCAP e as contribuições apresentadas pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará - COGERH, pela Companhia de Água e Esgoto do Ceará - CAGECE e pela Sociedade Anônima de Água e Esgoto do Crato-CE - SAAEC, imprescindíveis à realização desse trabalho.

7. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 10/08/2008 e aprovado em 13/04/2009.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jul 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2009

Histórico

  • Aceito
    13 Abr 2009
  • Recebido
    10 Ago 2008
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