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Misturas de um solo laterítico com cimento e bentonita para uso em cortinas verticais

Mixtures of a lateritic soil with cement and bentonite for slurry wall purposes

Resumos

É crescente mundo afora o uso de cortinas verticais para contenção da contaminação em água subterrânea. Os solos lateríticos, pela sua ampla distribuição no Brasil, possuem grande potencial de aplicação nessas obras. Entretanto algumas questões ainda carecem de maior investigação, como a interação e compatibilidade desses solos com a bentonita e o cimento, principais aditivos usados para melhorar as propriedades das cortinas. O presente artigo avalia propriedades de um solo laterítico e suas misturas com bentonita e cimento, incluindo a investigação de parâmetros geotécnicos mecânicos e hidráulicos. A campanha laboratorial consistiu de ensaios de caracterização física, físico-química e mineralógica, de condutividade hidráulica, de compressão simples e de cisalhamento direto. Os resultados demonstram que a adição de 3% de bentonita em amostras compactadas não trouxe a diminuição esperada da condutividade hidráulica do solo laterítico, ainda que tenha proporcionado um considerável incremento na resistência ao cisalhamento da mistura.

Cortinas verticais; bentonita; cimento; reaterro; condutividade hidráulica


There is an increasing worldwide demand for slurry walls to contain contaminated groundwater. Lateritic soils, due to their wide distribution in the Brazilian territory, have great potential to be used in these cases. However, some issues remain uncertain and need investigation, including the interaction and compatibility of these soils with bentonite or cement, the most used additives to improve their geotechnical properties. This work evaluates some mechanical and hydraulic properties of a lateritic soil sample and its mixtures with bentonite and cement. The laboratorial procedures consisted of physical, physico-chemical and mineralogical characterization, hydraulic conductivity, uniaxial compression and direct shearing testing. The results demonstrate that the addition of 3% of bentonite in compacted samples did not decrease the hydraulic conductivity of the lateric soil as expected. On the other hand, the addition of cement has led to a 100-fold increase in this parameter, in spite of the substantial increase in the shear strength caused by the mixture.

Slurry cutoff walls; bentonite; cement; backfill; hydraulic conductivity


ENGENHARIA CIVIL

Misturas de um solo laterítico com cimento e bentonita para uso em cortinas verticais

Mixtures of a lateritic soil with cement and bentonite for slurry wall purposes

Priscila BatistaI; Adilson do Lago LeiteII

IEngenheira Civil, Mestra em Geotecnia. Belo Horizonte-MG, Brasil - E-mail: priscilacivil@yahoo.com.br

IIProfessor Doutor, Departamento de Engenharia Civil. Universidade Federal de Ouro Preto Ouro Preto-MG, Brasil - E-mail: alleite@em.ufop.br

Resumo

É crescente mundo afora o uso de cortinas verticais para contenção da contaminação em água subterrânea. Os solos lateríticos, pela sua ampla distribuição no Brasil, possuem grande potencial de aplicação nessas obras. Entretanto algumas questões ainda carecem de maior investigação, como a interação e compatibilidade desses solos com a bentonita e o cimento, principais aditivos usados para melhorar as propriedades das cortinas. O presente artigo avalia propriedades de um solo laterítico e suas misturas com bentonita e cimento, incluindo a investigação de parâmetros geotécnicos mecânicos e hidráulicos. A campanha laboratorial consistiu de ensaios de caracterização física, físico-química e mineralógica, de condutividade hidráulica, de compressão simples e de cisalhamento direto. Os resultados demonstram que a adição de 3% de bentonita em amostras compactadas não trouxe a diminuição esperada da condutividade hidráulica do solo laterítico, ainda que tenha proporcionado um considerável incremento na resistência ao cisalhamento da mistura.

Palavras-chave: Cortinas verticais, bentonita, cimento, reaterro, condutividade hidráulica.

Abstract

There is an increasing worldwide demand for slurry walls to contain contaminated groundwater. Lateritic soils, due to their wide distribution in the Brazilian territory, have great potential to be used in these cases. However, some issues remain uncertain and need investigation, including the interaction and compatibility of these soils with bentonite or cement, the most used additives to improve their geotechnical properties. This work evaluates some mechanical and hydraulic properties of a lateritic soil sample and its mixtures with bentonite and cement. The laboratorial procedures consisted of physical, physico-chemical and mineralogical characterization, hydraulic conductivity, uniaxial compression and direct shearing testing. The results demonstrate that the addition of 3% of bentonite in compacted samples did not decrease the hydraulic conductivity of the lateric soil as expected. On the other hand, the addition of cement has led to a 100-fold increase in this parameter, in spite of the substantial increase in the shear strength caused by the mixture.

Keywords: Slurry cutoff walls, bentonite, cement, backfill, hydraulic conductivity.

1. Introdução

O uso de cortinas verticais com o propósito de conter o avanço de plumas contaminantes em direção à água subterrânea é crescente no Brasil e no mundo (Evans & Opdyke, 2006; Nobre et al., 2006). Trata-se de escavações em forma de trincheira, que podem alcançar até dezenas de metros de profundidade, colocadas estrategicamente para conter, divergir ou encapsular o fluxo contaminante subterrâneo (Figura 1).


Simultaneamente ao processo de escavação, a trincheira é preenchida com uma mistura de bentonita e água, denominada lama bentonítica, a qual possui funções de estabilização geotécnica e diminuição da condutividade hidráulica. Após a escavação, a trincheira é reaterrada, de modo que parte da lama bentonítica introduzida é expulsa, e a parte restante tende a permanecer recobrindo as paredes e o fundo da vala, formando uma película fina (do inglês: filter cake).

Essa película, se bem constituída, é a principal responsável pela diminuição da condutividade hidráulica da cortina. O reaterro (do inglês: backfill), normalmente constituído pelo próprio material escavado, pode ser misturado à bentonita e/ou cimento, de modo a diminuir ainda mais a sua condutividade hidráulica e aumentar a sua resistência mecânica. Geomembranas também podem ser aplicadas junto ao reaterro para diminuir ainda mais a condutividade hidráulica da cortina (Shackelford & Jefferis, 2000; Katsumi et al., 2008).

Os solos lateríticos, por sua vez, recobrem aproximadamente 65% do território brasileiro (Melfi, 1994). De forma geral, eles são caracterizados por uma composição mineralógica dominada por quartzo, óxidos/hidróxidos de Fe-Al-Mn, e caulinita como argilomineral predominante. Em campo, eles, normalmente, apresentam alta porosidade e drenabilidade, em perfis de alteração de grandes espessuras e bastante homogêneos. Nogami e Vilibor (1985) trazem maiores discussões sobre a aplicação dos conceitos podelógicos dos solos lateríticos em geotecnia. Somente por sua ampla ocorrência já se poderia dizer que os solos lateríticos apresentam grande potencial para aplicação em cortinas verticais. Apesar desse potencial, pouco ainda se sabe sobre o comportamento geotécnico e químico desses solos quando misturados às argilas bentoníticas comercializadas em nosso território, com exceção dos trabalhos de Farnezi e Leite (2007) e Lukiantchuki e Esquivel (2007). Quando as misturas são com bentonita e cimento, o conhecimento é ainda mais restrito (Batista & Leite, 2007).

Há que se atentar, também, para a capacidade de suporte das misturas, uma vez que grandes profundidades podem ser escavadas para se conterem plumas contaminantes mais profundas. Segundo Pinto (2000), quando compactados, os solos lateríticos possuem elevada capacidade de suporte, sendo, por isto, muito aplicados em pavimentos. Por outro lado, em função da alta plasticidade da bentonita, sua adição aos solos lateríticos deverá ser avaliada em termos mecânicos.

Usualmente a bentonita aplicada, nessas misturas, é do tipo sódica, já que a cálcica produz uma lama menos estável e, também, forma uma película relativamente mais permeável, pois é menos expansiva quando hidratada (Saes, 1990). Por sua vez, o cimento é, basicamente, composto por silicatos, aluminatos e óxidos alcalinos, alcançando elevados valores de pH, quando em meio aquoso. Devido à grande quantidade de íons cálcio (Ca2+) liberados em solução pelo cimento, sua mistura com a bentonita sódica poderá resultar em troca catiônica do sódio (Na+) pelo cálcio (Ca2+), transformando, gradativamente, a bentonita sódica em cálcica, envolvendo todas as conseqüências que isto pode causar, como aumento da condutividade hidráulica, maior instabilidade, etc. (Mitchell, 1993).

Outro aspecto relevante é o aumento substancial de cátions na solução induzido pela dissolução do cimento, o que poderá conduzir à contração da dupla camada iônica dos minerais (Mitchell, 1993, Shackelford, 1994, Gleason et al., 1997), com conseqüente floculação dos argilominerais existentes, o que também poderá afetar as propriedades mecânicas e hidráulicas da cortina.

Nesse contexto, esse trabalho avalia propriedades de resistência mecânica e condutividade hidráulica de misturas de um solo laterítico com bentonita e cimento Portland com vistas à sua aplicação em cortinas verticais. Para isto, foram realizados ensaios laboratoriais de caracterização, condutividade hidráulica em permeâmetro de parede rígida, compressão simples e cisalhamento direto.

2. Materiais e métodos

O solo laterítico empregado nesse trabalho de pesquisa foi coletado em local próximo à estrada que liga o município de Mariana ao Distrito de Cachoeira do Brumado (Minas Gerais). Ele foi escolhido por tratar-se de um perfil tipicamente laterítico de solo residual de gnaisse. A Figura 2 apresenta a curva granulométrica desse solo natural.


A bentonita sódica utilizada foi adquirida comercialmente e o tipo de cimento avaliado foi o Portland de alto forno CP III 40 RS.

As proporções de solo e bentonita das misturas foram definidas com base em valores citados em D'Appolonia e Ryan (1979), Sharma e Lewis (1994), Anderson e Hee (1995) e Ryan e Day (2002). Com relação à proporção de cimento, não foram encontrados registros na literatura das quantidades utilizadas em cortinas, sendo arbitrada a quantidade inicial de 3% (em relação à massa seca de solo). As proporções aplicadas são as seguintes:

  • Amostra SN: 100% de solo natural.

  • Amostra B: 100% de bentonita.

  • Amostra SB: 97% de solo natural e 3% de bentonita.

  • Amostra SCB: 94% de solo natural, 3% de bentonita e 3% de cimento.

Os ensaios de caracterização podem ser agrupados em três categorias: geotécnica, mineralógica e físico-química. A Tabela 1 resume os ensaios geotécnicos realizados e as normas da ABNT utilizadas para tal.

A caracterização físico-química consistiu na determinação dos seguintes parâmetros: pH, condutividade elétrica do extrato aquoso, capacidade de troca catiônica e superfície específica. A determinação do pH e da condutividade elétrica do extrato aquoso (CE) teve como base o trabalho de Camargo et al. (1986), onde, para o pH, adotou-se a relação solo:água 1:2,5, adotando-se a relação 1:1 para a CE. Para a determinação da capacidade de troca catiônica (CTC) e da superfície específica (SE), utilizou-se o método recomendado por Pejon (1992).

Somente foi avaliada a composição mineralógica da amostra SN (solo natural) e, para isto, foram aplicadas técnicas de difração de raios X. A amostra B (bentonita) foi avaliada por Farnezi (2006). Como não foi executada, nesse trabalho, a determinação da composição mineralógica das misturas, fica, então, tal determinação sugerida para trabalhos futuros.

Para a determinação da condutividade hidráulica, inicialmente, foram ensaiadas as amostras SN, SB e SCB. Posteriormente, foi constituída uma outra mistura específica para esse ensaio, que apresentava as proporções (massa seca) de 96% de solo natural, 3% de bentonita e 1% de cimento. Tal amostra recebeu a denominação de SCB1 e sua constituição teve o propósito de investigar a influência da diminuição do teor de cimento sobre a condutividade hidráulica (K) da amostra SCB.

Os corpos-de-prova foram moldados com dimensões de 5 cm de diâmetro e 11 cm de altura por meio de compactação estática, considerando-se a energia de compatação do ensaio Proctor Normal (5,72 Kg/cm/cm³). Em geral, os teores de umidade de compactação se situaram entre 1 e 2 % acima dos respectivos teores de umidade ótima das amostras, obtidas a partir das curvas de compactação das mesmas.

O tempo de saturação dos corpos-de-prova durou, em média, 1 mês. Tal procedimento foi feito por meio de uma mangueira de água conectada na base da célula de permeabilidade, imprimindo-se um gradiente hidráulico de 5. As condições dos ensaios foram de carga variável, onde os procedimentos seguiram as recomendações da norma NBR 14545/00 (2000). Para as amostras SN, SB e SCB, foram executados dois ensaios e, para a amostra SCB1, somente um ensaio foi feito.

Com o objetivo de avaliar as variações na resistência mecânica das amostras SB e SCB, em relação à amostra SN, foram realizados ensaios de compressão simples e de cisalhamento direto.

Os procedimentos dos ensaios de compressão simples seguiram as recomendações da norma DNER-IE 004/94 (1994). Os corpos-de-prova foram moldados à semelhança dos procedimentos anteriormente descritos, para a determinação da condutividade hidráulica, diferenciando-se por não terem sido submetidos ao processo de saturação após a compactação. A compressão dos corpos-de-prova foi feita em uma prensa CBR, com velocidade de aplicação de carga de 0,2 mm/min. Três corpos-de-prova foram avaliados para cada amostra.

Os ensaios de cisalhamento direto foram executados de acordo com os procedimentos sugeridos pela norma norte-americana D 3080-04 (2004) da ASTM. A moldagem dos corpos-de-prova foi feita em molde CBR, utilizando-se do cilindro grande. Posteriormente à compactação, cada corpo-de-prova foi talhado nas dimensões de 10,2 x 10,2cm² e 2,00 cm de altura, sob condições não saturadas. As seguintes tensões normais foram aplicadas nas amostras SN e SB: 50, 100, 200 e 400 kPa. No caso da amostra SCB, as tensões normais foram 200, 300 e 400 kPa, pois as tensões de 50 e 100 kPa não se mostraram aplicáveis, devido à elevada deformação dos corpos-de-prova. A velocidade de aplicação das cargas foi de 0,004 mm/min e o critério de ruptura adotado foi o de Mohr-Coulomb.

3. Resultados e discussões

3.1 Caracterização

As características geotécnicas e físico-químicas obtidas dos ensaios realizados são apresentadas na Tabela 2.

A análise granulométrica revelou que a adição de bentonita (amostra SB) não alterou, significativamente, a quantidade de argila da amostra SN, o que não era esperado face à quantidade de argila presente na bentonita (ver Tabela 2, amostra B). Por sua vez, o teor de argila da amostra SCB decresceu 16% em relação à amostra SN. Infere-se que o cimento causou agregação e/ou floculação na amostra SCB, o que poderia ter se refletido no aumento da fração silte e na diminuição da fração argila desta última amostra em relação à amostra SN. O mesmo fenômeno de agregação pode ter acontecido em relação à adição da bentonita pura, justificando a constância no teor de argila e o incremento dos teores de silte e de areia fina.

Como esperado, a mistura SB apresentou maior plasticidade e atividade em relação à amostra SN devido à presença da bentonita. Por outro lado, a variação no valor dos índices de plasticidade (IP) e de atividade da amostra SCB em relação à amostra SN mostrou-se pouco significativa, fornecendo indícios sobre o efeito da adição de cimento no comportamento geotécnico da mistura de solo laterítico e bentonita (amostra SB). Por sua vez, a CTC e a SE das amostras SB e SCB são similares, comprovando a baixa influência do cimento sobre esses parâmetros.

A Tabela 2 mostra a acidez da amostra SN (pH = 5,3), como era esperado para um solo laterítico. Adicionalmente, observam-se maiores valores de pH para as amostras SB (pH = 7,0) e SCB (pH = 12,2). Certamente esse aumento do pH das amostras SB e SCB, em relação à amostra SN, está relacionado à adição de bentonita e cimento, mais alcalinos como se vê na Tabela 2. Shackelford (1994), estudando a influência de soluções de NaOH em solos, concluiu que a caulinita sofre mais influência de soluções alcalinas que a montmorilonita. Adicionalmente, em valores de pH muito alcalinos poderá haver dissolução da fase mineral, aumentando, assim, a condutividade hidráulica (Yong et al., 1991).

Para avaliar a influência específica da adição de cimento sobre o pH da amostra SB, diferentes dosagens (em porcentagem de massa seca) desse composto foram adicionadas a essa amostra, conforme os procedimentos para mensuração do pH indicados em Camargo et al. (1986). Os valores obtidos são apresentados no diagrama da Figura 3. Ele mostra que, a partir de, aproximadamente, 3% de cimento, o pH atinge, aproximadamente, o valor 12 e se mantém, praticamente, constante até a máxima dosagem utilizada, que foi 25%. Como esperado, a incorporação do cimento causou aumento da saturação das bases e do consumo total dos íons Al3+ e H+ trocáveis nas soluções, gerando aumento gradativo do pH.


O aumento dos íons em solução devido à adição de bentonita e cimento pode ser comprovado pelo expressivo incremento dos valores de CE das amostras SB e SCB, em relação à amostra SN (ver Tabela 2).

Os difratogramas de raios X da fração fina (passante na peneira de abertura 0,075 mm), em lâminas de sedimentação das amostras SN e B, revelaram a presença de caulinita na amostra SN. Farnezi (2006) observou montmorilonita, caulinita, micas e quartzo na bentonita utilizada (amostra B). Considera-se tal mineralogia compatível com os aspectos genéticos de tais amostras.

3.2 Condutividade hidráulica

Os resultados de condutividade hidráulica (K) são mostrados na Tabela 3. Nota-se que o K médio da amostra SB é um pouco maior que o da amostra SN, acontecendo o inverso do que era esperado, em se tratando da adição de bentonita. A amostra SCB apresentou aumento de K da ordem de 100 vezes, em relação às amostras SN e SB (de 10-7 para 10-5 cm/s), demonstrando o efeito acentuado do cimento sobre essa propriedade. A amostra SCB1, por sua vez, não apresentou o mesmo aumento de K, em relação às amostras SN e SB, como aconteceu para a amostra SCB, permanecendo na ordem de 10-7 cm/s. Conclui-se que o efeito da adição de 1% de cimento sobre a condutividade hidráulica é bem menor que no caso da amostra SCB (3% de cimento).

Especulando-se sobre a causa da diferença da condutividade hidráulica da amostra SB, em relação à amostra SN, formulou-se a hipótese da agregação dos grãos devido à adição de bentonita. Essa argila seria, então, o elemento ligante dos grãos da amostra SN, causando incremento no "diâmetro efetivo" dos grãos, e, por conseqüência, aumento no diâmetro dos poros. De qualquer forma, tal hipótese carece de melhor investigação, sugerindo-se microscopia tradicional em lâminas delgadas, ou microscopia eletrônica de varredura (MEV), por exemplo.

3.3 Compressão simples

As Figuras 4, 5 e 6 mostram os diagramas cartesianos tensão x deformação (%) para os três corpos-de-prova ensaiados de cada uma das amostras SN, SB e SCB. Observa-se uma razoável semelhança entre os respectivos gráficos para os níveis de tensão anteriores à ruptura, havendo maior dispersão para os níveis superiores.




Comparando-se os resultados gerais das amostras SN e SB, percebe-se que a tensão e a deformação na ruptura são menores para a amostra SB, demonstrando o efeito da adição de bentonita nesta última amostra.Vale notar, também, que a tensão e a deformação na ruptura da amostra SCB (Figura 6) são maiores que as das amostras SN (Figura 4) e SB (Figura 5), demonstrando o incremento de rigidez provocado pela adição de cimento na amostra SCB.

A Figura 7 mostra os gráficos que representam a média aritmética de alguns pontos dos gráficos das Figuras 4, 5 e 6, situados em iguais níveis de deformação dos três ensaios de cada amostra. A resistência máxima na ruptura (Rc), bem como os valores do módulo de elasticidade (E), para 50% de Rc, são apresentados na Tabela 4.


Comparando-se os gráficos da amostra SN e SB, é possível se observar que a presença da bentonita na amostra SB diminuiu sua resistência máxima, em relação à amostra SN, como era esperado, devido à alta plasticidade desse tipo de argila. Por outro lado, os maiores valores de E da amostra SB, em relação à amostra SN, não eram esperados, visto que havia expectativa da diminuição desse parâmetro devido ao acréscimo de bentonita. Talvez esse aumento de rigidez esteja relacionado à maior agregação dos grãos comentada anteriormente, porém tal hipótese carece de maior investigação.

A comparação dos resultados das amostras SN e SB com os resultados da amostra SCB revela o ganho significativo de resistência e rigidez proporcionado pela adição de cimento, da ordem de 2 vezes, para a resistência de pico, e 3 vezes para o módulo de elasticidade.

3.4 Cisalhamento direto

A Figura 8 mostra as envoltórias de resistência das amostras SN, SB e SCB obtidas dos ensaios de cisalhamento direto. Adicionalmente, na Tabela 5, são apresentados os valores de coesão (c) e ângulo de atrito (j) obtidos desses ensaios.


Quando se compara os valores das amostras SN e SB, percebe-se que são menores para a amostra SB, principalmente a coesão (c). Certamente essa diminuição está relacionada à adição de bentonita, a qual, possivelmente, resultou em um aumento da floculação dos minerais de argila presentes no solo laterítico (amostra SN). Essa floculação, provavelmente, se deve ao aumento da salinidade ocasionado pela adição de bentonita, como indicado pelo maior valor da condutividade elétrica da amostra SB, em relação à amostra SN (ver Tabela 2).

Por sua vez, o ganho de resistência da amostra SCB, em relação à amostra SN, só foi notado na coesão (parâmetro c), sendo que o ângulo de atrito (j) decresceu. A maior cimentação entre os grãos provida pelo cimento pode explicar esse aumento na coesão.

4. Conclusões

As principais conclusões são destacadas a seguir:

  • Em termos granulométricos, a adição de bentonita ou de bentonita com cimento ao solo laterítico não resultou no aumento da fração argila, como era esperado.

  • Para as amostras SB, quantidades de até 3% de cimento alteraram, significantemente, o pH e a condutividade elétrica do solo laterítico.

  • A adição de bentonita aumentou um pouco a condutividade hidráulica da amostra de solo laterítico puro; a mistura com bentonita e cimento, por sua vez, aumentou essa propriedade em, aproximadamente, 100 vezes.

  • A diminuição do teor de cimento da amostra SCB para 1%, praticamente, não alterou a condutividade hidráulica em, relação ao solo laterítico; essa porcentagem deve ser considerada em estudos futuros.

  • A adição de bentonita diminuiu, consideravelmente, a resistência de pico do solo laterítico, mais aumentou um pouco sua rigidez, fato não esperado, em função da alta plasticidade dessa argila.

  • Houve ganho de resistência e rigidez proporcionado pelo acréscimo de cimento e esse fato deverá ser analisado num contexto de aplicação. Esse contexto pode envolver simulações numéricas de cenários construtivos de cortinas verticais, por exemplo.

De uma forma mais generalística as conclusões anteriormente reportadas indicam que o acréscimo de bentonita não diminuiu a condutividade hidráulica da amostra de solo laterítico como era esperado, apesar de ter aumentado, consideravelmente, sua capacidade de retenção de contaminantes. Adicionalmente, o acréscimo de cimento, apesar de ter aumentado a resistência da mistura, promoveu aumento considerável em sua condutividade hidráulica.

Considerando que o principal objetivo das cortinas verticais é conter as plumas contaminantes, esse aumento poderia comprometer a funcionalidade desse tipo de obra, sugirindo estudos mais aprofundados sobre o tema, incluindo misturas de diferentes teores de solos lateríticos, bentonita e cimento.

5. Agradecimentos

Os autores agradecem à CAPES, pela bolsa de mestrado concedida à Priscila Batista e, também, à CEMIG (Estação Adelaide), pelo uso de seu laboratório para a compactação de algumas amostras. O auxílio do técnico laboratorista Edmar Fernando Freitas Coelho na preparação das amostras e na realização dos ensaios é reconhecido. Finalizando, os autores agradecem aos revisores desse artigo pelas correções e expressivas melhorias no texto.

6. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 10/03/2009

Aprovado em 15/10/2009.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2010
  • Data do Fascículo
    Jun 2010

Histórico

  • Aceito
    15 Out 2009
  • Recebido
    10 Mar 2009
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