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Efeito dos elementos estranhos (foreign íons) sobre a Microdureza Vickers das fases cristalinas em clínqueres co-processados

Effect of the foreign ions on Vickers micro-hardness of the crystalline phases in the co-processed clinkers

Resumos

Esse trabalho determina o valor médio de microdureza Vickers dos componentes cristalinos do clínquer e estima o efeito dos elementos estranhos (menores) e da composição mineralógica sobre os resultados de microdureza. Para isto, foi coletado um número significativo de amostras sobre a correia de alimentação de moinhos de clínqueres em onze fornos co-processadores no Brasil. Os resultados mostram que a microdureza varia de acordo com o tipo de impurezas e sua distribuição. Também, o conteúdo mineralógico e a razão alumina/ferro desempenham um papel importante.

Clínquer; microdureza; cimento; mineralogia


This study determines the average value of Vickers micro-hardness of the clinker crystalline compounds and evaluates the effect of foreign ions and mineralogical composition on the micro-hardness results. A significant number of samples were collected from the feed-conveyor belt of the clinker ball mill at eleven co-processing kilns in Brazil. The results show that the micro-hardness varies according to the type of impurities and their distribution. Also, the mineralogical content and alumina/iron ratio play an important role.

Clinker; micro-hardness; cement; mineralogy


METALURGIA & MATERIAIS

Efeito dos elementos estranhos (foreign íons) sobre a Microdureza Vickers das fases cristalinas em clínqueres co-processados

Effect of the foreign ions on Vickers micro-hardness of the crystalline phases in the co-processed clinkers

Vládia Cristina G. de SouzaI; Jair Carlos KoppeII; João Felipe Coimbra Leite CostaIII

IPós-Doutoranda, DEMIN - UFRGS - E-mail: vladiasouza@gmail.com

IIProf. Dr., DEMIN- UFRGS - E-mail: jkoppe@ufrgs.br

IIIProf. Dr., DEMIN- UFRGS - E-mail: jfelipe@ufrgs.br

Resumo

Esse trabalho determina o valor médio de microdureza Vickers dos componentes cristalinos do clínquer e estima o efeito dos elementos estranhos (menores) e da composição mineralógica sobre os resultados de microdureza. Para isto, foi coletado um número significativo de amostras sobre a correia de alimentação de moinhos de clínqueres em onze fornos co-processadores no Brasil. Os resultados mostram que a microdureza varia de acordo com o tipo de impurezas e sua distribuição. Também, o conteúdo mineralógico e a razão alumina/ferro desempenham um papel importante.

Palavras-chave: Clínquer, microdureza, cimento, mineralogia.

Abstract

This study determines the average value of Vickers micro-hardness of the clinker crystalline compounds and evaluates the effect of foreign ions and mineralogical composition on the micro-hardness results. A significant number of samples were collected from the feed-conveyor belt of the clinker ball mill at eleven co-processing kilns in Brazil. The results show that the micro-hardness varies according to the type of impurities and their distribution. Also, the mineralogical content and alumina/iron ratio play an important role.

Keywords: Clinker, micro-hardness, cement, mineralogy.

1. Introdução

O clínquer, principal constituinte do cimento Portland, é um material sinterizado e peletizado, resultante da calcinação até aproximadamente 1450ºC de uma mistura de calcário e argila e, eventualmente, de componentes corretivos de natureza silicosa, aluminosa ou ferrífera (Centurione, 1993).

O clínquer compõe-se, basicamente, de silicatos cálcicos gerados na última etapa do processo de clinquerização e que não sofre fusão durante a sua formação: Ca3SiO5 ou alita (C3S) e Ca2SiO4 ou belita (C2S). A fase intersticial ou matriz representa a fase fundida na temperatura de clinquerização correspondente à temperatura de cristalização dos silicatos, sendo constituída por aluminatos e ferro-aluminatos cálcicos: Ca3Al2O3 (C3A) e Ca2(Al2O3)x(Fe2O3)1-x (C4AF). A nomenclatura entre parênteses (mais antiga) é usada no setor de cimento, devendo ser interpretada da seguinte forma: C=CaO, S=SiO2, A=Al2O3 e F=Fe2O3. Ainda, existem outros compostos menos freqüentes como o periclásio (MgO), cal livre (CaO), langbeinita [(K2Ca2(SO4)3)], aphititalita [K3Na(SO4)2], arcanita (K2SO4), entre outros.

O foco desse estudo consistiu na determinação do valor médio de microdureza Vickers das fases cristalinas principais de clínqueres oriundos de co-processamento, técnica que incorpora resíduos durante a sua fabricação, observando-se as suas relações com a presença de elementos estranhos (menores) e variações da composição mineralógica. O estudo da microdureza dos componentes do clínquer se justifica por tratar-se de uma ferramenta nova, de fácil implementação e de um processo não destrutivo, o qual, em conjunto com as demais análises (microscopia óptica, fluorescência e difração de raios X), pode fornecer informações importantes a respeito do processo de queima, tipos de matérias-primas, combustíveis ou co-produtos utilizados e, inclusive, sobre a estimativa de consumo na moagem (Souza, 2007), entre outros aspectos. Os valores de dureza, também, podem ser utilizados em processos de modelagem de microestruturas de concreto, caminho promissor na busca pela redução do número de testes e melhoria incessante da qualidade dos produtos (Velez et al., 2001).

Nesse trabalho, o conteúdo mineralógico dos clínqueres estudados foi determinado por meio de Difração de Raios X (DRX), com uso de refinamento Rietveld (Gobbo, 2003 e Souza, 2007). Os elementos menores foram deterninados por meio de espectrometria de absorção atômica (EAA), antes e após extração seletiva das fases (Campbell, 1999 e Souza, 2007), sendo que, também, foram feitas análises por microscopia eletrônica de transmissão (MEV/EDX), segundo metodologia descrita em Gobbo (2003), Gobbo et al. (2004) e Souza (2007).

2. Materiais e métodos

Na busca por uma maior variedade mineralógica e química possível, entre as amostras de clínqueres de cimento, foram realizadas diversas coletas em onze fornos situadas em unidades de co-processamento no Brasil, denominados de K1 a K11 (forno de origem das amostras).

Todas as amostras de clínquer foram coletadas sobre a correia de alimentação do moinho de cimento, em intervalos regularmente espaçados, totalizando cerca de 300 kg por coleta. Em seguida, a amostra foi homogeneizada e quarteada por meio da montagem de uma pilha longitudinal. O material foi classificado por tamanho e, em seguida, alíquotas de, aproximadamente, 5 kg foram retiradas de cada uma das frações de tamanho. Dessa alíquota, cerca de 1 kg foi destinado a ensaios de microdureza e análises microscópicas (MEV/EDX), 2 kg para difração de raios X e 2 kg para análises químicas.

Os ensaios de microdureza de clínqueres foram realizados em seções polidas preparadas segundo os procedimentos descritos em Souza (2007, 2008a, 2008b) para análises de microscopia óptica. Foi utilizado um indentador Vickers (pirâmide de base quadrada), tendo sido seguidos procedimentos recomendados pela literatura para determinação de microdureza de minerais (Vaughan & Craig (1978), Grabco (2002)). Posteriormente aos ensaios de microdureza, as seções eram cortadas em serra de diamante e transformadas em amostras cúbicas de bordas (cantos) arredondadas para observações em MEV, após novo polimento. Esses procedimentos servem ao propósito de reduzir o volume de resina da amostra, evitando possíveis contaminações e danos ao equipamento, uma vez que a área analisada em MEV costuma ser consideravelemente menor (com relação à microscopia óptica).

Entre os objetivos das análises por MEV, encontra-se o de observar a possível ocorrência de recuperação (variação da área de indentação), assim como o tipo de padrão (registro) da indentação deixada nos cristais, depois de decorrido um tempo significativo do teste, tal como mostrado na Figura 1. Nessa Figura, é possível, inclusive, observar o registro de fratura mais comum: o do tipo reto e radial estrelado, semelhante ao que foi observado nos silicatos (em rochas) por Young e Milmann (1964).


Para primeiras estimativas de dureza, adotou-se o número mínimo de 3 seções polidas de cada uma das três frações de tamanho mais representativas do clínquer (com relação à distribuição de tamanhos da alimentação do moinho de clínquer). Nesse trabalho, foram escolhidas as frações -19+ 9.5 mm, -9.5+4.8 mm e -4.8+2.4 mm: dez nódulos da primeira fração e dez da segunda foram randomicamente escolhidos e montados em vinte seções polidas com 30 mm de diâmetro. Depois, trinta nódulos da terceira fração foram embutidos em três seções polidas (dez nódulos por seção). O número de amostras analisadas por clínquer foi mantido constante, pois, quando comparados os valores de desvio das amostras (com relação a cada forno/unidade co-processadora), estes fornecem, então, uma boa idéia da heterogeneidade dos clínqueres. A variância dos valores de microdureza está, portanto, diretamente relacionada ao número de amostras e a sua heterogeneidade. Ainda, essa heterogeneidade diz respeito, também, ao quimismo das fases e às características mecânicas dos cristais (presença de fraturas, poros, inclusões, distorções do retículo, defeitos e deformações dos arranjos cristalinos).

Para cada composto cristalino, foram realizadas mais de 20 micro-indentações por amostra ou seção polida, sendo o valor médio de microdureza Vickers utilizado na elaboração de gráficos ou tabelas.

Ainda, para análises de espectrometria de absorção atômica (EAA), os nódulos de clínquer foram quebrados até -2 mm e depois passaram por moagem até granulometria 100% menor que 75µm, segundo metodologia descrita em Souza (2008b). Cuidados especiais foram tomados para evitar contaminação em peneiras e equipamentos. Em seguida, esse material foi dividido em duas metades: uma para cada técnica de EAA aplicada (SES e PES).

  • Sem extração seletiva (EAA-SES): as amostras pulverizadas eram encaminhadas às análises de absorção após digestão em ácido nítrico e fluorídrico em sistema fechado. Os elementos analisados foram Ba, Pb, Mn, Ti, Zn, Co, Cu, Cr, Mo e Ni.

  • Pós-extração seletiva (EAA-PES): as amostras pulverizadas foram encaminhadas às etapas de extração seletiva, antes de serem encaminhadas às análises de absorção, para separar os silicatos das fases da matriz e fases menores. Os elementos analisados foram Ba, Pb, Mn, Ti e Zn.

As concentrações médias dos elementos Ba, Pb, Mn, Ti e Zn de cada forno, obtidas por meio da técnica de EAA-PES (EAA após extração seletiva), foram ponderadas pela composição mineralógica determinada por DRX quantitativo (Rietveld). Em seguida, esses resultados foram plotados contra aqueles obtidos por EAA sem extração seletiva (EAA-SES). Verificou-se, então, uma reta passando muito próxima da origem e com inclinação próxima a 45°, refletindo que existe pouca diferença entre o uso de uma técnica ou outra. Por outro lado, para correlacionar resultados de EAA aos de microdureza, de forma a considerar isoladamente as fases principais e identificar diferenças de resistência à deformação entre matriz e silicatos, passaram a ser utilizados somente os resultados obtidos por EAA-PES. Assim, somente os resultados de EAA-PES foram utilizados para confecção dos gráficos expostos nesse trabalho.

A metodologia da extração seletiva dos compostos cristalinos de clínqueres para análise em absorção atômica baseou-se naquela utilizada também por Campbell (1999) para preparação de lâminas e análise em microscopia óptica. Essa metodologia sofreu algumas modificações com finalidade de analisar os materiais por EAA - a metodologia completa pode ser vista em Souza (2008b).

Para análises de difração de raios X quantitativas, as amostras foram pulverizadas e prensadas em pastilhas de cerca de 10g. As medidas foram feitas na faixa de 10º a 80º com passo de 0.02° e contagem de 2s por passo. A metodolologia e demais detalhes, tais como as posições atômicas utilizadas, podem ser encontrados, também, em Souza (2007 e 2008b).

3. Resultados e discussão

São muitos os fatores a serem considerados na interpretação dos resultados de ensaios de microdureza Vickers (HV), mas o mais importante, inicialmente, é observar a carga utilizada durante o ensaio, pois os valores podem mudar, significativamente, se ela não for mantida constante, conforme ilustra a Figura 2.


Na Figura 2, é observado que os valores de microdureza (HV) obtidos com cargas entre 25 gf e 50 gf são similares para as fases alita, belita e matriz. Nas cargas menores que 25 gf ou maiores que 50 gf, as curvas de microdureza versus força se aproximam, impedindo uma segura diferenciação de dureza entre alita, belita e matriz (fase intersticial, F.I.). Além disso, os valores de dureza para cada uma dessas fases, variam bastante entre as cargas de 25 e 50 gf. Isto se deve ao fato de que, na carga menor que 25 gf, não é possível visualizar a impressão com nitidez e, na carga maior, 100 gf, ocorrerá uma maior influência das outras fases, que estão próximas à região de indentação.

Portanto as cargas mais indicadas são 25 gf para tamanhos médios de alita e belita menores que 20µm e 50 gf, para tamanhos maiores. Quando desejado comparar clínqueres com tamanhos médios diferentes de cristal, a opção deve ser feita pela carga menor, conforme realizado nesse trabalho. Além disso, é de bom senso que nunca devem ser feitas interpretações ou comparações entre valores de microdureza de conjunto de dados com cargas aplicadas diferentes.

Um resumo dos resultados dos ensaios de microdureza Vickers é apresentado na Tabela 1 por meio dos valores médios finais obtidos para os clínqueres estudados. Na Tabela 1, são apresentados os valores de dureza média das amostras de cada forno, sendo que estes foram ponderados (MP, média ponderada), na última coluna da Tabela 1, pela composição mineralógica dos clínqueres, segundo resultados mostrados na Tabela 2.

Os valores para os desvios (Tabela 1), segundo a NBRNM-ISO6507-1 (ABNT, 2008), são altos, mas isto pode ser devido a muitos fatores, tais como à presença de microfissuras nos cristais; à presença de diferentes elementos-traços na mesma fase mineral; à proximidade da indentação com a borda dos cristais; à orientação dos cristais; à influência de poros ou zonas de cristais de periclásio e cal livre; ao tamanho dos cristais e, especialmente, ao desmembramento dos cristais de belita. Por esses motivos, quão mais heterogênea a amostra (mais variada for mineralogia e textura do clínquer), maior deve ser, a princípio, o número de amostras testadas, levando-se em consideração, é claro, a variância obtida preliminarmente e o intervalo de confiança desejado (Gy (1968), Sinclair (1976), Lyman (2007)).

Raramente medições de dureza Vickers na matriz apresentarão desvios pequenos, pois, em geral, ela está semi-cristalizada e seus componentes são de reduzidíssimo tamanho. Por isso, não podem ser distinguidas facilmente, neste tipo de ensaio, as indentações realizadas sobre aluminatos e de ferroaluminatos. Inclusive, a amostra K5 foi a que apresentou o menor desvio de dureza para fase intersticial (2,2%), devido à grande quantidade de cristais de aluminato cúbico, que tornou possível distingui-los da ferrita. Assim, o valor médio de dureza Vickers da matriz dos clínqueres do forno K5 corresponde, quase que essencialmente, à dureza do aluminato cúbico.

A despeito dos resultados de microindentação poderem ser afetados por muitos fatores, tendo sido observados desvios em média de 10%, mas podendo chegar até 20%, os ensaios de microdureza determinaram, com sucesso, a potencialidade das fases cristalinas com relação a sua resistência à deformação. Especialmente, eles ajudaram a comprovar hipóteses importantes, tais como: (i) que os cristais da matriz (fase intersticial indiscriminada) são, em geral, bem mais resistentes à deformação que os silicatos, apresentando microdureza média superior e (ii) que ambos os silicatos, belita e alitas, são capazes de se deformar plasticamente com quantidades de resistência similares.

Ainda,com relação aos resultados de EAA-PES (Figura 3), foi verificado que o valor médio de dureza se correlaciona, de forma quase linear, com a concentração dos elementos estranhos (menores) e com conteúdo mineralógico, de tal forma que poderia ser sugerida a seguinte relação hipotética:


onde a dureza Vickers (HV) da matriz dos clínqueres é proporcional à concentração de Ba (ppm) e de ferrita (C4AF), mas inversamente proporcional à concentração (ppm) dos metais Pb, Zn, Mn e Ti (MT-Metais de Transição) e ao conteúdo de aluminato (C3A), conforme mostram os gráficos da Figura 3.

Na Figura 4 (à direita), pode ser observado que 46% das amostras analisadas mostram matriz de baixa dureza (5 a 8 GPa). Esse grupo de amostras apresenta baixo conteúdo de C4AF (<10%) e elevado conteúdo de aluminato (>5%). Ainda, essas mesmas amostras apresentam matriz enriquecida em metais de transição (em especial manganês), mas com baixa concentração de bário (Figura 3). Amostras com média a elevada dureza (>8GPa) possuem um conteúdo significativamente maior de C4AF, menor conteúdo de metais de transição (em especial manganês), mas concentração de bário significativamente maior, embora existam exceções. Entre estas, encontram-se as amostras vindas do forno K9, as quais apresentaram concentração anômala de cerca de 3.500 ppm de Ba só na matriz e dureza média da matriz de 7 GPa.


Na Figura 4 (à esquerda), vê-se que 55% das amostras analisadas mostram silicatos com baixa dureza Vickers (5 a 7 GPa). Ainda, elas representam a maioria dos fornos de clínquer amostrados no Brasil. Clínqueres como K8 e K3 apresentaram conteúdo anômalo de Ba e Fe2O3 e baixo conteúdo de álcalis. Maior conteúdo de ferro poderia estar significando, também, uma menor entrada de elementos estranhos (foreign íons), ou seja, de impurezas no sistema, o que teria contribuído ainda mais para o aumento da microdureza dos silicatos dos clínqueres produzidos por esses fornos.

Assim, com auxílio das Tabelas 1 e 2, bem como das Figuras 5 e 6, pode ser observado que o valor médio de dureza dos silicatos, também, está correlacionado com as impurezas presentes. Isso inclui o bário, os metais estudados, assim como a razão entre os óxidos de alumínio e ferro e, em especial, à concentração de álcalis. Com base nos resultados mostrados, é proposta, então, a seguinte relação hipotética para os silicatos:


sendo a dureza Vickers (HV) da alita ou belita proporcional à concentração de Ba (ppm) e ao conteúdo de óxido de ferro; por outro lado, inversamente proporcional à concentração (ppm) dos metais de transição (em especial de Mn), ao conteúdo de alumínio (Al2O3) e à concentração dos óxidos de potássio e sódio (álcalis).

Os resultados mostrados na Figura 5 sugerem, portanto, que clínqueres pobres em alumina e álcalis conterão silicatos mais resistentes à deformação.


Foram analisadas as fases das amostras por EDX em MEV e verificou-se que os clínqueres do forno K9 realmente apresentam conteúdo mais elevado de bário; por outro lado, o bário concentrou-se quase que exclusivamente na matriz (não foi detectado bário nos silicatos). Os mesmos clínqueres mostraram razões elevadas de alumínio/ferro nos seus silicatos: 4,2 e 1,8 para alitas e belitas, respectivamente. O teor, também, elevado de álcalis (> 1,5 %) nas alitas e belitas sugere que o alumínio entrou em grande quantidade, por difusão, juntamente com os álcalis, nas alitas e nas belitas, tornando-se suas principais impurezas. Isto pode ter impedido a entrada de outros elementos estranhos, tais como os metais de transição, Mn e Ti. O conteúdo total de elementos estranhos, nesse clínquer, analisado por EAA, é o menor de todos analisados (apenas 800 ppm contra uma média de 1.500 ppm dos clínqueres estudados). A dureza média da matriz e dos silicatos dos clínqueres do forno K9, também, foi muito baixa com relação à maioria dos clínqueres estudados.

Por outro lado, clínqueres, tais como os do forno K8, K3 e K2, com baixíssima razão alumina/ferro (em média, 30% a mais de ferro) nas alitas, mostram dureza Vickers bastante elevada para os silicatos, em torno de 9 GPa.

Dessa forma, a dureza dos silicatos pode ser função resultante das quantidades e da distribuição das impurezas presentes (substituintes ou foreign íons) e dos efeitos que esses íons exercem na rede cristalina, além é claro, da razão alumina/ferro, a qual também exerce papel fundamental na sua formação. O efeito da razão alumina/ferro sobre o tamanho dos cristais e textura dos clínqueres pode ser melhor compreendido em Taylor (1990), Souza (2007) e Centurione (1993).

Ainda, foi observado que os valores médios de dureza dos silicatos é, geralmente, menor do que aqueles apresentados pela matriz. Na literatura (Anton & Subhash, 2000), é sugerido que a resistência à fratura e/ou tenacidade dos cristais está inversamente correlacionada à sua deformação. Assim, cristais que se deformam pouco terão maior probabilidade de se fraturarem, ou seja, os silicatos tendem a ser mais resistentes à fratura do que os cristais da matriz, embora a dimensão das fraturas (cracks) geradas durante a indentação devesse ser mensurada e comparada para poder estabelecer valores (Anstis et al., 1981).

Se a resistência à deformação está correlacionada aos elementos estranhos, então estes devem, também, influenciar na moabilidade dos clínqueres, processo de mais alto custo na unidades fabris. Importante, então, citar que isto já vem sendo há bastante tempo sugerido por outros autores, tais como Opoczky (1996, 2004) e Hills (2007). Em trabalho anterior (Souza, 2007), as mesmas amostras foram analisadas, por outro lado, além dos ensaios de microdureza, os clínqueres de origem foram submetidos a ensaios de moagem para verificar seu consumo específico de energia (determinar o índice de trabalho ou work index (WI) em kWh/t). Foi encontrada uma correlação negativa entre os resultados de WI e microdureza. Se uma moabilidade maior sugere, claramente, uma resistência à fratura por parte dos cristais de clínquer menor, consequentemente, também, sugere uma correlação inversa entre resistência à fratura e resistência à deformação nesse caso.

4. Conclusões

Os ensaios de microdureza apresentam-se como uma nova ferramenta de análise de clínqueres de cimento, pois são de fácil implementação, de rápida execução, de baixo custo e não destrutivos. As amostras podem ser observadas, também, posteriormente, em microscópio óptico e de varredura para análises qualitativas e quantitativas mineralógicas, sem maiores problemas, requerendo apenas mais tempo e treinamento.

Os resultados mostraram que a dureza dos silicatos é, geralmente, menor que da matriz. Isto significa que silicatos de clínquer têm menor resistência à deformação e, sugere, por conseguinte, que eles tendem a apresentar maior resistência à fratura.

Os clínqueres estudados mostraram, também, uma variação significativa nos valores de dureza dos cristais e na dureza média ponderada (considerando conteúdo mineralógico). Resultados de análises químicas por EAA e EDX confirmaram que as impurezas, tais como os metais de transição (especialmente o Mn) e os álcalis, além da razão alumina/ferro, têm efeito pronunciado sobre a dureza dos cristais de clínquer.

5. Agradecimentos

Agradecimentos especiais ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq, ao Laboratório de Pesquisa Mineral (LPM, UFRGS) e ao Grupo CIMPOR (em especial, à fábrica da Cimbagé).

6. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 29/04/2009

Aprovado em 21/01/2010.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2010
  • Data do Fascículo
    Jun 2010

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2009
  • Aceito
    21 Jan 2010
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