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Análise de deformações-limites em chapas metálicas

Analysis of limit strains in metallic sheets

Resumos

A Curva Limite de Conformação (CLC) é uma ferramenta muito útil, tanto na avaliação do comportamento plástico de chapas, quanto no projeto do ferramental para solucionar problemas de manufatura nas etapas de tentativas de erros-e-acertos. Esse trabalho apresenta o modelamento matemático da CLC com base em equações constitutivas em elasto-plasticidade e um critério de plasticidade anisotrópica. Demonstra-se, primeiro, que as deformações-limites no domínio de estiramento biaxial são controladas por um parâmetro material definido pela razão entre os limites de escoamento em deformação plana e tração biaxial simétrica. As previsões teóricas do modelo proposto apresentaram boa concordância com medidas experimentais disponíveis, na literatura, para uma chapa de alumínio A1100, e sugerem, igualmente, que os parâmetros do modelo de plasticidade, adotado para descrever anisotropia inicial de chapas metálicas, sejam identificados com bases em ensaios monotônicos de tração uniaxial e biaxial.

Modelamento; curva-limite de conformação; plasticidade dos metais; conformação de chapas


The Forming Limit Curve (FLC) is a very useful tool to assess either the plastic behavior of thin metallic sheets or the tooling design to solve manufacturing problems during the try-out steps. This work presents the mathematical modeling of the FLC based on elasto-plastic constitutive equations and anisotropic plasticity yield criterion. It is firstly demonstrated that the limit strains in the biaxial stretching domain are controlled by a material parameter defined by the ratio between the yield stresses in plane-strain tension and equibiaxial tension. The theoretical predictions of the proposed model showed a good agreement with the experimental data available in the literature for an aluminum A1100 sheet and also indicated that the parameters of plasticity model, adopted to describe the initial plastic anisotropy of metallic sheets, must be identified from monotonic uniaxial and biaxial tensile tests data.

Modeling; forming limit curve; metal plasticity; sheet metal forming


METALURGIA E MATERIAIS METALLURGY AND MATERIALS

Análise de deformações-limites em chapas metálicas

Analysis of limit strains in metallic sheets

Maria Carolina dos Santos FreitasI; Luciano Pessanha MoreiraII; Rabih MakkoukIII; Gerard FerronIV

IAluna de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Metalúrgica, Universidade Federal Fluminense, Volta Redonda - RJ. carol@metal.eeimvr.uff.br

IIProfessor Adjunto, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Metalúrgica, Universidade Federal Fluminense, Volta Redonda - RJ. luciano.moreira@metal.eeimvr.uff.br

IIIProfessor Associado, Institut Universitaire de Tecnhologie, Génie Industriel et Maitenance, Université Libanaise, Saida, Líbano. rmakkouk@ul.edu.lb

IVProfessor, Laboratoire de Physique et Mécanique des Matériaux, Université de Metz, Metz, França. ferron@lpmm.sciences.univ-metz.fr

RESUMO

A Curva Limite de Conformação (CLC) é uma ferramenta muito útil, tanto na avaliação do comportamento plástico de chapas, quanto no projeto do ferramental para solucionar problemas de manufatura nas etapas de tentativas de erros-e-acertos. Esse trabalho apresenta o modelamento matemático da CLC com base em equações constitutivas em elasto-plasticidade e um critério de plasticidade anisotrópica. Demonstra-se, primeiro, que as deformações-limites no domínio de estiramento biaxial são controladas por um parâmetro material definido pela razão entre os limites de escoamento em deformação plana e tração biaxial simétrica. As previsões teóricas do modelo proposto apresentaram boa concordância com medidas experimentais disponíveis, na literatura, para uma chapa de alumínio A1100, e sugerem, igualmente, que os parâmetros do modelo de plasticidade, adotado para descrever anisotropia inicial de chapas metálicas, sejam identificados com bases em ensaios monotônicos de tração uniaxial e biaxial.

Palavras-chave: Modelamento, curva-limite de conformação, plasticidade dos metais, conformação de chapas.

ABSTRACT

The Forming Limit Curve (FLC) is a very useful tool to assess either the plastic behavior of thin metallic sheets or the tooling design to solve manufacturing problems during the try-out steps. This work presents the mathematical modeling of the FLC based on elasto-plastic constitutive equations and anisotropic plasticity yield criterion. It is firstly demonstrated that the limit strains in the biaxial stretching domain are controlled by a material parameter defined by the ratio between the yield stresses in plane-strain tension and equibiaxial tension. The theoretical predictions of the proposed model showed a good agreement with the experimental data available in the literature for an aluminum A1100 sheet and also indicated that the parameters of plasticity model, adopted to describe the initial plastic anisotropy of metallic sheets, must be identified from monotonic uniaxial and biaxial tensile tests data.

Keywords: Modeling, forming limit curve, metal plasticity, sheet metal forming.

Nomenclatura

D -

tensor de 2ª ordem de taxa de deformação total

ei -

base ortonormal (i=1,2,3)

E -

módulo de elasticidade longitudinal

f -

função de escoamento

f0 -

imperfeição geométrica inicial

F (σ) -

função homogênea de primeiro grau, em relação às componentes de tensão

H (σ) -

módulo plástico

h -

espessura

K -

coeficiente de resistência

n -

eixo normal a imperfeição geométrica

t -

eixo tangencial a imperfeição geométrica

N -

expoente de encruamento

R -

coeficiente de anisotropia normal

Se -

tensor de 4ª ordem de submissão elástica

xi -

eixos de simetria ortotrópica (i=1,2,3)

ε0 -

pré-deformação

εi -

componentes de deformações principais (i=1,2,3)

εp -

taxa de deformação plástica efetiva

λ, µ -

constantes elásticas de Lamè

ν -

coeficiente de Poisson

σij-

tensor de tensões de Cauchy de 2ª ordem

σi-

componentes de tensões principais (i=1,2,3)

σ -

tensão efetiva

ρ -

trajetória de deformação

φ -

orientação dos eixos de simetria ortotrópica ψ - orientação da imperfeição geométrica

1. Introdução

O conceito de Diagrama Limite de Conformação (DLC) foi introduzido por Keeler (1965) para os valores positivos da menor deformação principal no plano da chapa. Em seguida, Goodwin (1968) estendeu-o aos domínios de deformações situados entre os estados de tração uniaxial e estiramento biaxial. Este diagrama é definido pelos valores das menores (e2) e maiores (e1) deformações plásticas principais obtidas no plano da chapa. A curva definida por meio de trajetórias lineares de deformação, ou seja, r = e2/e1 constante, é conhecida como Curva Limite de Conformação (CLC). É comum pensar que os limites de deformações independam do tipo de ensaio adotado e representem, portanto, uma propriedade intrínseca do material. Os valores dos limites de deformações são então obtidos separando-se as regiões sem fratura aparente das zonas onde houve estricção localizada e ou até mesmo ruptura. Os pontos da CLC são usualmente obtidos a partir de medidas em grades de círculos previamente impressos na superfície do esboço. O procedimento experimental para obter-se a CLC requer um número considerável de corpos de provas e depende tanto da técnica de ensaios adotada (punção hemisférico ou plano, expansão hidráulica, tração plana e biaxial) quanto do tipo de definição dos limites de deformação (estricção e fratura).

Nesse contexto, a previsão dos limites de deformação, em chapas metálicas, com auxílio de modelos teóricos ou numéricos, torna-se imperativa, visto que os tempos necessários para a obtenção experimental da CLC são longos. A partir de previsões confiáveis, é possível auxiliar o projeto do ferramental, diminuir o número de etapas de tentativas de erros-e-acertos e reduzir custos no desenvolvimento de produtos, assim como de aplicação de novos materiais metálicos. A previsão de deformações-limites tem sido o objeto de um grande número de análises teóricas e numéricas. A abordagem teórica mais conhecida adotada, nesse trabalho, baseia-se na existência de uma imperfeição geométrica inicial na espessura da chapa, na qual os limites de deformação são resultantes do processo de localização de escoamento plástico (Marciniak & Kuczynski, 1967).

Além dos efeitos benéficos do encruamento e da sensibilidade à taxa de deformação, no retardamento do processo de estricção localizada (Neale & Chater, 1980), já é muito conhecido que as previsões das deformações-limites dependem, fortemente, do modelo de plasticidade adotado e, em particular, da forma da superfície de escoamento (Barlat, 1987). Progressos consideráveis foram obtidos, nesses últimos vinte anos, na previsão de deformações-limites, em processos de conformação de chapas, pelo emprego de modelos de plasticidade propostos, na literatura, para fornecer uma melhor descrição do comportamento plástico sob condições de carregamentos biaxiais. Por exemplo, previsões teóricas, em boa concordância com resultados experimentais, foram obtidas para ligas de alumínio (Cao et al., 2000; Wu et al., 2003), assim como para um aço bake-hardening, ensaiado segundo trajetórias de deformação lineares e não-lineares (Butuc et al., 2010). Recentemente, os efeitos das componentes de tensões normais ao plano da chapa e cisalhamento, fora desse plano, foram considerados, tanto em extensões do modelo original de Marciniak e Kuczynski (1967), quanto nos trabalhos de Allwood e Shouler (2009), Assempour et al. (2011), Eyckens et al. (2011) e Nurcheshmeh e Green (2011). Esses efeitos de tensões, fora do plano da chapa, não são desprezíveis, tanto em alguns processos de conformação de chapas, quanto na hidroconformação e na estampagem incremental de chapas, processos nos quais elevadas tensões compressivas podem ter lugar.

O presente trabalho visa a contribuir com o modelamento matemático da CLC, isto em atendimento à crescente demanda dos usuários dos conceitos de limites de deformações em chapas metálicas, os quais, por sua vez, se encontram nos setores da indústria metal-mecânica. Em particular, nas indústrias siderúrgica (fornecedores de chapas) e automotiva (estamparias), nas quais as exigências variam, desde o desenvolvimento de novos aços (avançados de alta resistência) e produtos (formas complexas de estampos), até o emprego de materiais metálicos mais leves e competitivos (ligas de alumínio). Primeiro, são detalhadas as equações constitutivas em elasto-plasticidade e são detalhados os modelos de localização e plasticidade anisotrópica adotados. Depois, as análises teóricas realizadas colocam em evidência os efeitos da forma da superfície de escoamento, nas previsões do modelo de localização. Por fim, são realizadas comparações entre as previsões do modelo e as medidas experimentais disponíveis, na literatura, para duas ligas de alumínio.

2. Modelamento

Equações constitutivas

Em primeiro lugar, a medida de deformações é definida como a integral das taxas de deformação descritas em um referencial corotacional definido em uma base ortonormal e (ei, i=1,2,3) que gira segundo a taxa de rotação do tensor spin. As equações constitutivas são definidas, para o caso particular de pequenas deformações elásticas, a partir da decomposição aditiva do tensor de taxa de deformação total, D, em uma parte elástica, De, e outra parte plástica, Dp, a saber:

A parte elástica é definida pela lei generalizada de Hooke pelo produto entre o tensor de submissão elástica de 4ª ordem Se

e a derivada de Jaumann, aplicada ao tensor de tensões de Cauchy, σ, o que significa que o comportamento do material é hipoelástico. As componentes de deformações plásticas são obtidas pela regra da normalidade definida por:

onde a função f define a condição de escoamento plástico em conjunto com a hipótese de encruamento isotrópico, definida por:

ao passo que εp é a taxa de deformação plástica efetiva conjugada com a medida tensão efetiva σ, a qual, por sua vez, define o tamanho da superfície de escoamento. F(σ) é uma função homogênea de 1º grau, em relação às componentes de tensão. Para completar a descrição do comportamento plástico, a evolução do encruamento, em função da relação entre as grandezas efetivas tensão-deformação plástica, é definida por:

onde H() = /p é o módulo plástico.

Método de integração

O procedimento geral de integração das equações constitutivas é baseado no algoritmo de previsão-elástica e correção-plástica, conhecido como método do retorno normal. Maiores detalhes da implantação numérica desse algoritmo podem ser encontrados no trabalho de Moreira e Ferron (2007). Nesse método, são conhecidos, no início do incremento de cálculo computacional, t, o estado de tensões, σij, os incrementos do tensor de deformação total, ΔDij e certas variáveis de estado como, por exemplo, as que descrevem o encruamento. Primeiro, a previsão elástica é feita com a lei de Hooke, a partir do incremento de deformação total, ou seja,

onde λ e µ são as constantes de Lamè, definidas em função do módulo de elasticidade longitudinal, E, e do coeficiente de Poisson, ν. Em seguida, uma vez que a condição de carregamento é verificada, f > 0 na Eq.(4). O estado de tensões, no fim do incremento de cálculo, é obtido pela seguinte correção plástica:

visto que, no escoamento dos metais dúcteis, assume-se a condição de incompressibilidade plástica. Caso contrário, o estado de tensões, no fim do incremento, fica definido pela Eq.(6). É interessante notar que os incrementos de deformação plástica são definidos pela Eq.(3) e, deste modo, a única incógnita da Eq.(7) passa a ser o incremento de deformação plástica efetiva, uma vez que as derivadas parciais da função de escoamento são definidas na previsão elástica:

O incremento de deformação plástica efetiva pode ser obtido, estabelecendo-se, primeiramente o princípio da equivalência do trabalho plástico realizado pelo estado de tensões corrigido com aquele correspondente às grandezas efetivas, a saber,

e, substituindo na Eq. (9) as Eqs.(3) e (7) com = t + H(t)Δep, obtém-se:

Modelo de localização

A Figura 1 esquematiza o modelo de localização tipo Marciniak-Kuczynski, adotado no presente trabalho. Maiores detalhes desse tipo de modelamento podem ser encontrados nos trabalhos de Mesrar et al. (1998) e Makkouk et al. (2008). Nesse tipo modelo, existem duas zonas, a saber, a primeira com espessura homogênea e a segunda zona na qual encontra-se a imperfeição geométrica, na forma de um entalhe inclinado. Essas zonas são designadas pelos índices a e b, respectivamente. O ponto O define a origem de um sistema de coordenadas comum às duas zonas, isto é, (O,n,t,x3), onde n e t definem os eixos normal e tangencial ao defeito, ao passo que x3 é um eixo normal ao plano segundo a direção da espessura da chapa. Ademais, as direções principais dos eixos de simetria ortotrópica e as componentes de taxa de deformação são definidas pelos sistemas de eixos (x1,x2,x3) e (e1,e2,x3), respectivamente. As orientações entre esses sistemas são definidas pelos ângulos φ=(x1,e1)=(x2,e2) e ψ =(x1,n)=(x2,t). O tamanho inicial da imperfeição é definido pela razão entre as espessuras iniciais nas duas zonas, isto é, f0 = h0b / h0ª.


O modelo de localização assume um estado plano de tensões cujas direções principais, na zona homogênea, são definidas pelos eixos (1,2) indicados na Figura 1. Essa hipótese é considerada válida para chapas finas e deve ser relaxada para alguns processos de conformação de chapas, como, por exemplo, hidroconformação e estampagem incremental, nos quais elevadas tensões compressivas podem ter lugar durante a deformação plástica (Allwood & Shouler, 2009). Em geral, as deformações-limites em chapas metálicas são assumidas como uma propriedade intrínseca do material, apesar de dependerem da trajetória de deformação. Portanto, assume-se, implicitamente, que os efeitos estruturais, relacionados às condições de contorno do processo de deformação plástica, não têm nenhuma influência nas deformações-limites. Esta é a razão pela qual a grande maioria dos modelos teóricos estarem fundamentados em uma análise localizada, na qual somente as propriedades materiais devem ser definidas, para se determinarem as deformações-limites sob condições de carregamentos prescritos.

A solução do problema é, então, estabelecida por meio das condições de equilíbrio de forças entre as duas zonas nas direções normal n e tangencial t, a imperfeição:

em conjunto com a condição de compatibilidade de deformações, segundo a direção tangencial é:

As equações anteriormente apresentadas formam um sistema de equações não-lineares para a zona defeituosa b, uma vez que são impostos, na zona homogênea a, os incrementos de deformação total segundo os eixos (e1,e2). Nesse trabalho, um algoritmo de bisseção foi adotado para se calcularem os incrementos de deformação total na zona b, que atendam as condições de equilíbrio. Por fim, para cada razão entre os incrementos de deformação total, na zona homogênea, as deformações-limites, na estricção, são obtidas pelas seguintes condições:

No modelo de localização do tipo Marciniak-Kuczynski, é necessário assumir um valor inicial da imperfeição em torno de 1% da espessura da zona homogênea. No domínio de deformações de embutimento profundo, onde ε1 > 0 e ε2 < 0, a orientação inicial da imperfeição geométrica, ψª(0), é variada entre 0,2 e 0,3 radianos. Já, no domínio de deformações por estiramento biaxial (ε1 e ε2 > 0), a imperfeição é assumida como perpendicular à maior componente de tensão principal, ou seja, ψ = 0. O presente modelo de localização foi implementado em linguagem Fortran.

Modelo de plasticidade

Para descrever o comportamento anisotrópico da chapa, foi adotado o modelo fenomenológico proposto por Ferron et al. (1994). Esse critério é definido para um estado plano de tensões através de uma representação em coordenadas polares. A Figura 2 ilustra o princípio dessa descrição através da superfície de escoamento traçada no espaço de tensões principais normalizadas pela tensão equivalente. A função de escoamento desse modelo é definida, no caso de anisotropia normal, por meio de uma extensão do critério isotrópico de Drucker (1949) por:


onde:

A, B e k são parâmetros que podem ser obtidos a partir do valor médio do coeficiente de anisotropia plástica de Lankford R e dos limites/tensões de escoamento em tração biaxial simétrica e em cisalhamento puro, σ1 = σ2 = σb e σ1 = - σ2 = τ, respectivamente.

Ainda, valores do parâmetro k > 0, que atendam à convexidade da superfície de escoamento (Ferron et al., 1994), possibilitam um achatamento nas regiões dos estados de tensões de cisalhamento puro e tração/compressão plana. O modelo quadrático de Hill (1948) pode ser obtido como um caso particular da Eq. (14), quando m = 2, k = 0, B = 3A, onde A = 1+2R. Na ausência de dados experimentais dos limites de escoamento em cisalhamento puro e tração biaxial simétrica, os parâmetros do modelo de Ferron et al. (1994) são obtidos impondo-se a relação B = 3A, em conjunto com um valor de k e, em seguida, o parâmetro A é determinado a partir do valor do coeficiente de anisotropia normal R=(R0+2R45+R90)/4, onde R0, R45 e R90 são os valores do coeficiente de anisotropia plástica obtidos a partir de ensaios de tração uniaxial realizados em orientações paralela, a 45 e 90 graus, respectivamente, em relação a direção de laminação da chapa. Por fim, a descrição do encruamento é dada pela equação de Swift:

onde K é o coeficiente de resistência, ε0 é a pré-deformação e N é o expoente de encruamento.

3. Resultados e discussão

A seguir são apresentados, primeiramente, os resultados dos efeitos da anisotropia plástica sobre as previsões teóricas das deformações-limites. Para tal, adotou-se um material modelo com 1 mm de espessura inicial e constantes elásticas de um aço carbono, módulo de Young E = 210.000 MPa e coeficiente de Poisson ν = 0,29. Os parâmetros adotados, para se descrever o encruamento, segundo a Eq.(15) foram K = 500 MPa, N = 0,20 e ε0 = N/100, respectivamente. Nessa análise teórica, o valor adotado, para o tamanho inicial da imperfeição geométrica do modelo de Marciniak-Kuczynski, foi 0,997.

Em seguida, foram realizadas simulações para a previsão da CLC de duas ligas de alumínio, cujas deformações-limites foram definidas na condição de estricção localizada no trabalho conduzido por Takuda et al. (2000). Essa escolha foi justificada visto que esses autores realizaram os ensaios de acordo com a metodologia Marciniak (1973), na qual é empregada uma máscara com um furo central entre o punção cilíndrico de fundo plano e o corpo de prova. Esse procedimento visa a garantir que a fratura ocorra nessa região central isenta dos efeitos de atrito e flexão, possibilitando, assim, uma boa validação do modelo tipo Marciniak-Kuczynski desenvolvido nesse trabalho. As propriedades elásticas das ligas de alumínio são definidas por E = 69.000 MPa e ν = 0,33 enquanto que os parâmetros da equação de encruamento são definidos por K = 171 MPa, N = 0,26 e ε0 = 8,22x10-4 e K = 570 MPa, N = 0,21 e ε0 = 8,07x10-4, para as ligas de alumínio A1100 e A5182, respectivamente. Ambos os materiais com espessura inicial de 1 mm foram definidos pelos valores experimentais do coeficiente de anisotropia normal R, 0,78 e 0,93, para as ligas A1100 e A5182, respectivamente. Em todos os casos, os parâmetros do modelo de Ferron et al. (1994) foram obtidos impondo-se B = 3A, para um dado valor do parâmetro k, assumindo o expoente m = 2. Na análise de influência da anisotropia plástica, o valor de k foi igual a 0,2 e, nas comparações com as medidas experimentais obtidas, para as ligas de alumínio k, foi escolhido igual a 0,35.

A Figura 3 compara as deformações-limites, em função dos valores da anisotropia plástica normal R obtidas a partir dos modelos de plasticidade de Hill quadrático (1948) e Ferron et al. (1994). Como esperado, verifica-se, primeiramente, em relação a um material isotrópico (R = 1), que as deformações-limites, no domínio de embutimento profundo, aumentam com os valores de R. Por outro lado, as deformações decrescem no domínio de estiramento biaxial com o aumento da anisotropia plástica. Esses efeitos de anisotropia, no domínio de estiramento biaxial, podem ser explicados pelo traçado das superfícies de escoamento, representado na Figura 4. Verifica-se que um aumento de R equivale a um decréscimo na razão definida entre os limites de escoamento em deformação plana, por tração biaxial e expansão biaxial simétrica, e o parâmetro P = σDPb proposto, originalmente, por Barlat (1987). Uma diminuição do valor de P, devido ao aumento do limite de escoamento, em tração biaxial simétrica, implica no decréscimo das deformações-limites, no domínio de estiramento biaxial. Vide previsões obtidas para R = 1,0 e 2,0. Na verdade, o parâmetro P caracteriza melhor o efeito de mudança de trajetória de deformação na estricção em direção ao estado plano de deformação em comparação ao valor de R identificado somente por uma solicitação simples de tração uniaxial.



Logo, as deformações-limites, no estiramento biaxial, são controladas por esse parâmetro material. Isto explica, também, a diferença entre os modelos de plasticidade, uma vez que as superfícies de escoamento obtidas, com a descrição de Ferron et al. (1994), têm um achatamento entre as regiões de deformação plana e o cisalhamento puro e, portanto, ocorrem menores valores de P, quando tais valores são comparados às previsões do modelo de Hill (1948).

Foram realizadas simulações para a previsão da CLC na estricção das ligas de alumínio A1100 e A5182, caracterizadas por por Takuda et al. (2000) por meio da técnica de Marciniak (1973).

Nessas análises, foi adotado somente o modelo de plasticidade de Ferron et al. (1994), assumindo-se valores para o tamanho inicial da imperfeição geométrica do modelo de Marciniak-Kuczynski iguais a 0,998 e 0,997, para as ligas de alumínio A1100 e A5182, respectivamente. A Figura 5 compara as previsões das deformações-limites obtidas com os resultados experimentais. É possível observar uma boa concordância com os valores experimentais do alumínio A1100. Já o comportamento experimental, na estricção do alumínio A5182, foi reproduzido somente na região próxima ao embutimento profundo. Essas diferenças sugerem um ajuste dos parâmetros do critério de plasticidade, tomando-se, como base, os ensaios de tração biaxial simétrica, sob condições de deformação plana. Isto foi feito para se determinarem os valores dos parâmetros A, B e k do modelo de plasticidade Ferron et al. (1994), assim como para se identificar o valor inicial da imperfeição geométrica f0.


4. Conclusões

O modelo de previsão de deformações-limites desenvolvido nesse trabalho considera a lei generalizada de elasticidade de Hooke e anisotropia plástica normal sob as hipóteses de estado plano de tensões e encruamento isotrópico. Foram analisados os efeitos de forma da superfície de escoamento sobre as previsões teóricas da Curva-Limite de Conformação (CLC). No domínio de deformações por estiramento biaxial, foi demonstrado que as deformações-limites são controladas pelo parâmetro material definido pela razão entre os valores dos limites de escoamento em deformação plana por tração e a expansão biaxial simétrica. As comparações com resultados disponíveis na literatura apresentaram boa concordância com as deformações-limites experimentais obtidas para o alumínio A1100. Entretanto as previsões, para a liga de alumínio A5182, indicam a realização de ensaios de tração sob condições de deformação plana e tração biaxial simétrica, para que haja um melhor ajuste dos parâmetros do modelo de plasticidade adotado e uma melhor identificação do valor inicial da imperfeição geométrica do modelo de Marciniak-Kuczynski.

5. Agradecimentos

Luciano Pessanha Moreira agradece a Université de Lorraine em Metz na França (Professor Visitante) e ao CNPq (Bolsa PQ2). Maria Carolina dos Santos Freitas agradece a CAPES pelas Bolsas de Doutorado (PROAP/CAPES).

6. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 27 de março de 2012

Aprovado em 28 de agosto de 2012

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Dez 2012
  • Data do Fascículo
    Dez 2012

Histórico

  • Recebido
    27 Mar 2012
  • Aceito
    28 Ago 2012
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