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Ultrassonografia articular: confiabilidade interobservadores em artrite reumatoide Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

Resumos

Introdução:

A ultrassonografia (US) tem uso recente na reumatologia, e a confiabilidade do método em pacientes com artrite reumatoide (AR) ainda está por ser definida.

Objetivo:

Testar, em uma pesquisa de AR, a reprodutibilidade da US musculosquelética realizada por reumatologistas com treinamento de um ano por meio da reanálise por um reumatologista com experiência no método.

Pacientes e métodos:

Esse estudo transversal incluiu pacientes de AR consecutivos de nosso centro terciário. O exame US foi realizado nas articulações metacarpofalângicas, articulações interfalângicas proximais e punhos. Os parâmetros avaliados foram: presença de sinovite, sinal de power Doppler (PD), erosões ósseas e alterações cartilaginosas. Um valor Kappa entre 0,20 e 0,40 foi considerado razoável; entre 0,41 e 0,60, moderado; entre 0,61 e 0,80, bom; e acima de 0,81, excelente.

Resultados:

Analisamos 1380 articulações de pacientes com AR (78% mulheres, 78% caucasoides). Média de idade = 58 ± 11,56 anos, duração média da doença = 9,98 ± 7,79 anos, DAS28 média = 3,82 ± 1,53 e HAQ média = 0,91 ± 0,67. A concordância de Kappa para sinovite variou de 0,30-0,70; para sinal PD, de 0,53 até a concordância absoluta; para erosões, de 0,70-0,97; para alterações cartilaginosas, de 0,28-0,63.

Conclusão:

Embora tenha sido obtida concordância interobservadores boa, moderada e excelente para erosões e PD, a concordância para sinovite e alterações cartilaginosas foi me-nos substancial em nossos pacientes com AR ativa. Há necessidade de novos estudos sobre a padronização da técnica de análise, objetivando a melhora da reprodutibilidade da US musculosquelética.

Artrite reumatoide (AR); Ultrassonografia (US); Reprodutibilidade; Kappa


Introduction:

Ultrasonography (US) has a recent use in Rheumatology, and the reliability of the method in rheumatoid arthritis (RA) patients has yet to be clarified.

Objective:

To test, in a RA survey, the reproducibility of musculoskeletal US performed by rheumatologists with one-year training through re-analysis by a Rheumatologist experienced in the method.

Patients and methods:

This cross-sectional study included consecutive RA patients from our tertiary center. US exam was performed in metacarpophalangeal joints, proximal interphalangeal joints, and wrists. Presence of synovitis, power Doppler (PD) signal, bone erosions, and cartilage changes comprised the US parameters evaluated. A kappa value in-between 0.20 and 0.40 was considered fair; in-between 0.41 and 0.60 was moderate; in-between 0.61 and 0.80 was good; and above 0.81 was excellent.

Results:

We analyzed 1,380 joints of 60 RA patients (78% females, 78% caucasoids). Mean age was 58 ± 11.56 years, mean disease duration was 9.98 ± 7.79 years, mean DAS28 was 3.82 ± 1.53, and mean HAQ was 0.91 ± 0.67. Kappa agreement for synovitis ranged from 0.30 to 0.70; for PD signal, from 0.53 to absolute agreement; for erosions, from 0.70 to 0.97; for cartilage changes, from 0.28 to 0.63.

Conclusion:

Although good, moderate and excellent interobserver agreement were obtained for erosions and PD, concordance for synovitis and cartilage changes were less impressive in our patients with active RA. Further studies on standardization of scanning technique are necessary to improve musculoskeletal US reproducibility.

Rheumatoid arthritis; Ultrasonography; Reproducibility; kappa


Introdução

Artrite reumatoide (AR) é uma doença autoimune crônica que afeta sobretudo articulações periféricas. Sob o ponto de vista radiológico, o envolvimento articular se caracteriza por erosões do osso cortical, culminando com deformidades.11. Van den Berg WB, Van Lent PL, Joosten LA, Abdollahi-Roodsaz S, Koenders MI. Amplifying elements of arthritis and joint destruction. Ann Rheum Dis 2007;66:iii45-8.

Atualmente, a ultrassonografia (US) musculosquelética passou a ser uma importante ferramenta no diagnóstico e monitorização das doenças reumáticas, especialmente em AR. Em comparação com a avaliação clínica e a radiografia, esse método demonstrou maior sensibilidade para a detecção da sinovite reumatoide e erosão articular.22. Kane D, Balint PV, Sturrock RD. Ultrasonography is superior to clinical examination in the detection and localization of knee joint effusion in rheumatoid arthritis. J Rheumatol 2003;30:966-71.

US tem algumas vantagens, quando comparada a outras técnicas de obtenção de imagens: é técnica não invasiva, rápida, de baixo custo e pode exibir várias articulações em movimento; além disso, pode ser repetida sem maiores riscos e é bem aceita pelo paciente.33. Joshua F, Lassere M, Bruyn GA, Szkudlarek M, Naredo E, Schmidt WA et al. Summary findings of a systematic review of the ultrasound assessment of synovitis: proceedings of OMERACT 8. J Rheumatol 2007;34:839-47. Apesar dessas vantagens significativas, os achados sonográficos permanecem ainda altamente dependentes do operador, exigindo conhecimento profissional de anatomia, patologia e das técnicas possibilitadas pelo aparelho de US.44. Grassi W, Cervini C. Ultrasonography in Rheumatology: an evolving technique. Ann Rheum Dis 1998;57:268-71. Isso se deve em parte à avaliação subjetiva das imagens e ao baixo grau de padronização da técnica, por causa do pequeno número de estudos multicêntricos avaliando a concordância interobservadores.55. Naredo E, Rodriguez M, Campos C, Rodriguez-Heredia JM, Medina JA, Giner E et al. Validity, reproducibility and responsiveness of a twelve-joint simplified power Doppler ultrasonographic assessment of joint inflammation in rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 2008;59: 515-22.

O presente estudo tem por objetivo analisar a concordância interobservadores de dados obtidos por dois reumatologistas com treinamento de um ano em US, em comparação com os dados de um especialista em US. Até a presente data, essa concordância interobservadores entre reumatologistas de diferentes experiências em US não foi ainda detalhada em pacientes brasileiros com AR.

Materiais e métodos

Pacientes

Pacientes com AR segundo os critérios do American College of Rheumatology, 1987,66. Arnett FC, Edworthy SM, Bloch DA, McShane DJ, Fries JF, Cooper NS et al. The American Rheumatism Association 1987 revised criteria for the classification of rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 1988;31:315-24. foram recrutados no Hospital São Lucas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, Brasil, para esse estudo transversal. Excluímos os pacientes com história prévia de fratura ou cirurgia na mão dominante. O estudo foi aprovado pela comissão de ética local e todos os pacientes assinaram o documento de livre consentimento.

Os pacientes examinados foram submetidos por metodologia cega ao exame US por um reumatologista. Outro reumatologista efetuou o cálculo do escore de atividade da doença (DAS28). Esse escore define a remissão, quando abaixo de 2,6; baixa atividade, 2,6-3,2; atividade moderada,. 3,2-5,1; e atividade intensa, quando > 5,1.77. Ostergaard M, Ejbjerg B, Szkudlarek M. Imaging in early rheumatoid arthritis: roles of magnetic resonance imaging, ultrasonography, conventional radiography and computed tomography. Best Pract Res Clin Rheumatol 2005;19:91-116. Os pacientes também responderam ao questionário de avaliação da saúde (HAQ); entre 0 e 1: leve limitação; acima de 1 e até 2: limitação moderada; e acima de 2 até 3: grave limitação.88. Fries JF, Spitz P, Kraines G, Holman H. Measurement of Patient Outcome in Arthritis. Arthritis Rheum 1980;23:137-45.

Métodos

O exame de US do punho, segunda e terceira articulações interfalângicas proximais e metacarpofalângicas foi realizado com um equipamento de alta resolução My Lab 60 (ESAOTE, Gênova, Itália) com um transdutor linear de alta frequência (18 MHz). A frequência do PD variou de 8,0-10,0 MHz, a frequência de repetição do pulso (FRP) de 0,5-1,0. O exame foi realizado no lado dominante (dorsal e ventral) em um scan longitudinal e transversal, com o objetivo de avaliar os parâmetros a seguir: presença de sinovite (qualitativo e semiquantitativo), sinal do power Doppler (PD, qualitativo e semiquantitativo), presença de erosões (qualitativo) e avaliação da cartilagem (escores qualitativo e semiquantitativo).

As imagens foram registradas e arquivadas no site Dropbox; com isso, todos os investigadores obtiveram acesso remoto. O exame foi realizado por dois reumatologistas com o mesmo nível de treinamento de um ano em US (cursos EULAR básico e intermediário), sendo um deles o principal autor deste estudo. Cada reumatologista examinou independentemente, em momentos diferentes, 30 pacientes distintos (base de dados total de 60 pacientes). Além disso, cada um desses profissionais obteve suas próprias imagens, tendo registrado em separado avaliações para reanálise por um reumatologista especializado em US musculosquelética. Esse especialista em US tinha mais de cinco anos de experiência em US musculosquelética, sendo considerado como referência nacional no campo. Nenhum dos três profissionais envolvidos na avaliação tinha conhecimento da interpretação dos demais reumatologistas. As análises estatísticas foram realizadas com uso dos dados totais dos dois reumatologistas e da reanálise feita pelo especialista.

Na análise das US, sinovite foi pontuada pela escala de cinzas da US como: 0 = ausência; 1 = leve (imagem hipoecoica discreta/anecoica na cápsula articular); 2 = moderada (a cápsula articular está elevada paralelamente à área articular); e 3 = importante distensão da cápsula articular).99. Bruce B, Fries JF. The Health Assessment Questionnaire (HAQ). Clin Exp Rheumatol 2005;23:S14-8.

A avaliação quantitativa da atividade inflamatória sinovial com o uso do PD foi classificada como: 0 = ausência (sem sinal de PD, sem sinal de cor intra-articular); 1 = leve (até três sinais de cor ou dois sinais isolados e 1 sinal confluente na área intra-articular); 2 = moderada (acima de grau 1 até < 50% da área intra-articular ocupada por sinais de cor); e 3 = grave (> 50% da área intra-articular com fluxo, ocupada com sinais de cor).1010. Szkudlarek M, Court-Payen M, Stranberg C, Klarlund M, Klausen T, Ostergaard M. The Power Doppler ultrasonography for assessment of synovitis in metacarpophalangeal joints of patients with rheumatoid arthritis. A Comparison with dynamic magnetic resonance imaging. Arthritis Rheum 2001;44:2018-23.

A presença de erosões foi avaliada nos planos transversal e longitudinal, sendo classificada como se segue: 0 = sem erosão; 1 = erosão muito pequena (< 1 mm); 2 = pequena (1- 2 mm); 3 = moderada (2-4 mm); e 4 = grande (> 4 mm).1111. Wakefield RJ, Balint PV, Szkudlarek M, Filippucci E, Backhaus M, D'Agostino MA et al. OMERACT 7 Special Interest Group. Musculoskeletal ultrasound including definitions for Ultrasonographic pathology. J.Rheumatol 2005;32:2485-7.

A avaliação das cartilagens foi dividida em: 0 = cartilagem hialina normal; 1 = perda da nitidez da margem superficial da cartilagem hialina; 2 = defeito parcial de espessura da camada cartilaginosa; 3 = defeito de espessura na cartilagem com osso subcondral normal; e 4 = perda completa da camada cartilaginosa e envolvimento do osso subcondral.1212. Disler DG, Raymond E, May DA , Wayne JS, McCauley TR. Articular cartilage defects: in vitro evaluation of accuracy and interobserver reliability for detection and grading with US. Radiology 2000;215:846-51.

Análise estatística

Os valores de Kappa foram utilizados na avaliação da concordância das variáveis interobservadores. Kappa ponderado foi calculado quando a correlação linear estava abaixo de 50%. Utilizamos PABAK (Kappa ajustado para viés e para prevalência) para correlações lineares acima de 50%.1313. Fleiss JL, Levin B, Paik MC. Statistical methods for rates and proportions, 3rd ed. Hoboken NJ, USA: John Wiley & Sons; 2003. Os intervalos de confiança foram obtidos utilizando o erro-padrão (EP) de Kappa ponderado (kp) (não zero) conforme se segue: [Kappa inferior do intervalo = -1.96 *EP (kp)] e [Kappa na faixa alta = + 1.96 * EP (kp)].1313. Fleiss JL, Levin B, Paik MC. Statistical methods for rates and proportions, 3rd ed. Hoboken NJ, USA: John Wiley & Sons; 2003.

Os valores de Kappa foram divididos em: <0,20: baixa concordância; 0,21-0,40: razoável; 0,41-0,60: moderada; 0,61-0,80: boa; e 0,81-1: excelente concordância.1313. Fleiss JL, Levin B, Paik MC. Statistical methods for rates and proportions, 3rd ed. Hoboken NJ, USA: John Wiley & Sons; 2003. O nível de significância dos testes estatísticos foi de 5%. Os programas estatísticos utilizados foram SPSS 12.1 e WinPepi para cálculo dos diferentes Kappas.

Resultados

Dos 60 pacientes com AR, 47 (78%) eram mulheres e também 78% pertenciam à raça branca. A média de idade era de 58 ± 11,56 anos, enquanto a duração média da doença era de 9,98 ± 7,79 anos. Quarenta e dois pacientes (70%) testaram positivamente para fator reumatoide. O escore DAS28 médio foi de 3,8, sugerindo atividade moderada da doença, enquanto o HAQ médio de 0,91 indicava leves limitações de nossos pacientes.

No total, 1380 imagens dos 60 pacientes foram avaliadas pelos dois investigadores. As tabelas 1 e 2 mostram os percentuais de concordância dos dados dos dois reumatologistas e do especialista. Os valores de Kappa revelaram concordância boa a excelente para erosão (0,70-0,97); moderada a excelente para PD (0,53-1), aqui incluída a concordância absoluta na terceira articulação metacarpofalângica ventral; e concordância razoável a boa para sinovite (0,30-0,70) e alterações cartilaginosas (0,28-0,63).

Tabela 1
Concordância e valores de Kappa para sinovite e power Doppler
Tabela 2
Concordância e valores de Kappa para erosões e alterações na cartilagem

Discussão

A utilidade da US na monitoração de alterações estruturais de articulações reumatoides já foi previamente descrita.1414. Mendonça JA. Yazbek MA, Laurindo IM, Bertolo MB. Wrist ultrasound analysis of patients with early rheumatoid arthritis. Braz J Med Biol Res 2011;44:11-5.,1515. Naredo E, Bonillag, Gamero F, Uson J, Carmona L, Laffon A. Assessment of inflammatory activity in rheumatoid arthritis: a comparative study of clinical evaluation with grey scale and power Doppler ultrasonography. Ann Rheum Dis 2005;64:375-81. Avanços tecnológicos melhoraram a definição das imagens US, expandindo o espectro do método na reumatologia e em outras áreas.1616. Filippucci E, Iagnocco A, Meenagh G, Riente L, Delle Sediei A, Bombardieri S, et al. Ultrasound imaging for the rheumatologist. Clin Exp Rheumatol 2006;24:1-5.,1717. Grassi W, Salaffi F, Filippucci E. Ultrasound in rheumatology. Best Pract Res Clin Rheumatol 2005;19:467-85.

O principal objetivo de nosso estudo foi avaliar a concordância interobservadores da US musculosquelética em pacientes com AR, um tópico ainda por explorar. A ideia fundamental foi analisar dados de dois reumatologistas treinados em cursos básicos e intermediários de US com reanálise por um reumatologista especializado em US musculosquelética.

A grande maioria (cerca de três quartos) de nossa pesquisa de 60 pacientes com AR estava constituída por mulheres da raça branca. A relação entre mulheres e homens era parecida com a descrita na Europa e nos Estados Unidos.1818. Mody GM, Cardiel MH. Challenges in the management of rheumatoid arthritis in developing countries. Best Practice & Research Clinical Rheumatology 2008;22:621-41. A média de idade de nossos pacientes girou em torno dos 60 anos, com uma duração média da doença de aproximadamente 10 anos. A idade por ocasião do surgimento da doença, em nossa pesquisa por volta dos 50 anos, foi maior do que a previamente descrita.1818. Mody GM, Cardiel MH. Challenges in the management of rheumatoid arthritis in developing countries. Best Practice & Research Clinical Rheumatology 2008;22:621-41.

Como um todo, nossa população de AR demonstrava doença ativa (DAS28 médio 3,8, configurando atividade moderada). Com efeito, apenas dois pacientes se encontravam em remissão (DAS28 ≤ 2,6). Quanto ao questionário HAQ (valor médio 0,91), nossa pesquisa revelou leve limitação; apenas quatro pacientes exibiam limitações graves (HAQ > 2,0).

No total, analisamos 1380 imagens para presença de sinovite, sinal PD, erosões ósseas e alterações cartilaginosas. O habitual coeficiente Kappa de Cohen1919. Guggenmoos-Holzmann, I. The Meaning of Kappa: Probabilistic Concepts of Reliability and Validity Revisited. J Clin Epidemiol 1996;49:775-82. não era apropriado para nosso estudo, visto que lidávamos com variáveis semiquantitativas ordenadas e grande heterogeneidade na prevalência dessas variáveis. Então nos propusemos usar o Kappa ponderado quando a correlação linear se situasse abaixo de 50%; e PABAK para concordâncias acima de 50%.2020. Vieira AJ, Garrett JM. Understanding Interobserver Agreement: The Kappa Statistic. Family Medicine 2005;37:360-3.

A mais elevada concordância em nosso estudo (Kappas bons a excelentes; 0,70-0,97) dizia respeito à presença de erosões ósseas. Os Kappas para PD foram moderados a excelentes (0,53-1,00), inclusive com concordância absoluta no terceiro MCF. Mas ao exame das imagens percebemos que nenhum paciente tinha PD positivo nesse local. Com relação à sinovite, os dados foram bem menos impressionantes, com Kappas variando de razoáveis até bons na melhor das hipóteses (0,30-0,70). Vale a pena citar que sinovite e PD são duas variáveis que devem ser dinamicamente analisadas no exame US; uma sutil mudança no ângulo do transdutor pode arruinar a interpretação desses parâmetros.

A concordância interobservadores para US musculosquelética foi avaliada por Naredo et al. em 2006.2121. Naredo E, Möller I, Maragues C, de Agustin JJ, Scheel AK, Grassi W et al. Interobserver reliability in musculoskeletal ultrasonography: results from a "Teach the Teachers" rheumatologist course. Ann Rheum Dis 2006;65:14-9. Esse projeto (Teach the Teachers, i.e. "Ensinar os Professores") incluiu 22 reumatologistas e um radiologista com experiência. Nas mãos e no pulso, o valor médio de Kappa para sinovite foi 0,73, ligeiramente superior ao nosso valor; quanto às erosões, o valor de Kappa (0,64), embora conceitualmente moderado, foi mais baixo do que aquele obtido por nós.

Iagnocco et al. informaram valores de Kappa para sinovite, tenossinovite e erosões entre 0,73 e 0,89; novamente, a concordância para sinovite, mas não para erosões, foi mais alta do que em nosso estudo.2222. Iagnocco A, Ossandon A, Coari G, Conti F, Priori R, Alessandri C, et al. Wrist joint involvement in systemic lupus erythematosus. An ultrasonographic study. Clin Exp Rheumatol 2004;22:621-4. Segundo Gutierrez et al., o treinamento de 4 semanas para reumatologistas sem experiência em US foi suficiente para a obtenção de concordância moderada a excelente para erosões ósseas.2323. Gutierrez M, Filippucci E, Ruta S, Salaffi F, Blasetti P, Geso LD, Grassi W. Inter-observer reliability of high-resolution ultrasonography in the assessment of bone erosions in patients with rheumatoid arthritis: experience of an intensive dedicated training programme. Rheumatology 2011;50:373-80.

Os valores de Kappa para alterações cartilaginosas também podem ser interpretados como uma surpresa negativa em nosso estudo (desempenho razoável a bom no máximo, 0,28-0,63). Na teoria, as imagens da cartilagem deviam ter sido mais reprodutíveis, visto que sua interpretação é estática. A avaliação da cartilagem foi apenas recentemente padronizada;2424. Filippucci E, Luz KR, Di Geso L, Salaf F, Tardella M, Carotti M et al. Interobserver reliability of ultrasonography in the assessment of cartilage damage in rheumatoid arthritis. Ann Rheum Dis 2010;69:1845-8. isso implica dificuldades no treinamento de profissionais para esse parâmetro. Sabidamente, os cursos básicos e intermediários de US tendem a enfatizar o treinamento para os parâmetros de sinovite e de erosão. De maneira ligeiramente diferente de nossos dados, Filippucci et al. relataram concordância interobservadores moderada a boa para alterações cartilaginosas (0,56-0,76).2424. Filippucci E, Luz KR, Di Geso L, Salaf F, Tardella M, Carotti M et al. Interobserver reliability of ultrasonography in the assessment of cartilage damage in rheumatoid arthritis. Ann Rheum Dis 2010;69:1845-8.

US tem sido considerado um exame dependente do operador. Por essa razão, os estudos de US para confiabilidade interobservadores têm grande importância. Reumatologistas europeus com grande experiência em US musculosquelética formataram o EULAR Standing Committee for Education and Training em US, para a disseminação do conhecimento dessa técnica em reumatologia para diferentes países.2525. Scheel AK, Schmidt WA, Hermann KG, Bruyn GA, D'Agostino MA, Grassi W, et al. Interobserver reliability of rheumatologist performing musculoskeletal ultrasonography: results from a EULAR ''Train the Trainer'' course. Ann Rheum Dis 2005;64:1043-9. No correr da implementação da padronização da US, naturalmente aumentará o volume de estudos multicêntricos baseados em evidência.

Apesar da boa concordância geral obtida para a maioria das variáveis avaliadas no presente estudo, reconhecemos que o conhecimento da US musculosquelética tem uma curva de aprendizado que depende da crescente experiência do examinador e da padronização dos parâmetros. A US, uma extensão emergente do exame físico para o reumatologista, se situa não apenas como ferramenta diagnóstica, mas também como parâmetro para a monitoração das doenças.

Nosso estudo apresenta limitações logísticas que devem ser mencionadas. A amostra de AR poderia ser maior, para que fossem obtidas análises estatísticas mais confiáveis. Os procedimentos de US não foram realizados simultaneamente. Por último, não nos foi possível, no momento, comparar as variáveis US com escores de atividade e de comprometimento funcional.

Concluindo, em nossa pesquisa de pacientes com AR ativa, em sua maioria as variáveis da US se revelaram reprodutíveis. Foi observada confiabilidade interobservadores razoável a boa para sinovite e alterações cartilaginosas, moderada a excelente para PD e boa a excelente para erosões ósseas. Novos estudos deverão definir mais adequadamente a utilidade e reprodutibilidade da US musculosquelética em pacientes com AR e em outros transtornos reumáticos correlatos.

  • Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2014

Histórico

  • Recebido
    17 Maio 2013
  • Aceito
    27 Set 2013
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