Acessibilidade / Reportar erro

Possíveis alterações no mecanismo minimizador de energia da caminhada em decorrência da dor lombar crônica - revisão de literatura

Resumos

Um dos objetivos da marcha é deslocar o corpo no espaço da forma mais econômica possível. Porém, pouco se sabe como os aspectos mecânicos e energéticos da caminhada são afetados pela dor lombar. Ainda, caso haja prejuízos, é pequeno o conhecimento de como as características mecânicas e energéticas da caminhada se manifestam nas atividades funcionais, principalmente nos mecanismos minimizadores de energia da locomoção. Este estudo teve por objetivos: a) descrever os principais mecanismos minimizadores de energia da locomoção; e b) verificar se há indicativos de prejuízos nas características mecânicas e energéticas da caminhada decorrentes da dor lombar crônica (DLC) que possam comprometer os mecanismos minimizadores. Estudo caracterizado como revisão narrativa de literatura. A principal teoria que explica a minimização do dispêndio energético durante a caminhada é a do pêndulo invertido pelo qual o mecanismo minimizador converte energia cinética em energia potencial do centro de massa e vice-versa durante a passada. Esse mecanismo é fortemente influenciado por parâmetros espaços-temporais da marcha, tais como comprimento de passo e velocidade preferida da caminhada, que, por sua vez, podem estar severamente alterados em pacientes com dor lombar crônica. Contudo ainda há muito que se entender sobre os efeitos da dor lombar crônica sobre a capacidade do indivíduo de praticar uma marcha econômica, pois os prejuízos funcionais podem comprometer características mecânicas e energéticas dessa modalidade de marcha e torná-la mais dispendiosa. Desta forma, há indicativos de que tais mudanças funcionais possam comprometer os mecanismos minimizadores de energia.

Dor lombar; Locomoção humana; Caminhada; Biomecânica; Consumo de energia


One goal of the locomotion is to move the body in the space at the most economical way possible. However, little is known about the mechanical and energetic aspects of locomotion that are affected by low back pain. And in case of occurring some damage, little is known about how the mechanical and energetic characteristics of the locomotion are manifested in functional activities, especially with respect to the energy-minimizer mechanisms during locomotion. This study aimed: a) to describe the main energy-minimizer mechanisms of locomotion; b) to check if there are signs of damage on the mechanical and energetic characteristics of the locomotion due to chronic low back pain (CLBP) which may endanger the energy-minimizer mechanisms. This study is characterized as a narrative literature review. The main theory that explains the minimization of energy expenditure during the locomotion is the inverted pendulum mechanism, by which the energy-minimizer mechanism converts kinetic energy into potential energy of the center of mass and vice-versa during the step. This mechanism is strongly influenced by spatio-temporal gait (locomotion) parameters such as step length and preferred walking speed, which, in turn, may be severely altered in patients with chronic low back pain. However, much remains to be understood about the effects of chronic low back pain on the individual's ability to practice an economic locomotion, because functional impairment may compromise the mechanical and energetic characteristics of this type of gait, making it more costly. Thus, there are indications that such changes may compromise the functional energy-minimizer mechanisms.

Lower back pain; Human locomotion; Walk; Biomechanics; Energy consumption


Introdução

A adoção da locomoção sobre duas pernas como forma exclusiva de marcha foi um importante marcador da evolução humana, sendo a economia de energia, neste tipo de locomoção, um dos principais motivos para a fixação do bipedalismo.1Skoyles JR. Human balance, the evolution of bipedalism and dysequilibrium syndrome. Medical Hypotheses. 2006;66:1060-8.

Pontzer H, Raichlen DA, Sockol MD. The metabolic cost of walking in humans, chimpanzees, and early hominins. Journal of Human Evolution. 2009;56:43-54.
-3Le Huec JC, Saddiki R, Franke J, Rigal J, Aunoble S. Equilibrium of the human body and the gravity line: the basics. European Spine Journal. 2011;20 Suppl 5:558-63. Entretanto, locomover-se de modo bipedal nem sempre pode ser considerada tarefa fácil. O tronco, essencialmente instável por sua característica multiarticular, mantém-se estável pela ação muscular que constantemente modifica-se para garantir a postura necessária aos movimentos.4Willigenburg NW, Kingma I, Van Dieen JH. How is precision regulated in maintaining trunk posture? Experimental Brain Research. 2010;203:39-49. Por isso, a capacidade de locomoção depende de uma complexa interação de padrões de movimentos coordenados do quadril, da pelve e da coluna lombar, os quais, quando harmônicos, determinam o padrão biomecânico normal da marcha.1Skoyles JR. Human balance, the evolution of bipedalism and dysequilibrium syndrome. Medical Hypotheses. 2006;66:1060-8.,5Franz JR, Paylo KW, Dicharry J, Riley PO, Kerrigan DC. Changes in the coordination of hip and pelvis kinematics with mode of locomotion. Gait & Posture. 2009;29:494-8.

A caminhada é uma forma de locomoção que se destaca por influenciar vários aspectos nas esferas física, social e evolutiva da existência humana.6Harcourt-Smith WEH, Aiello LC. Fossils, feet and the evolution of human bipedal locomotion. Journal of Anatomy. 2004;204:403-16. Uma visão antropológica e evolutiva nos faz pensar que, se hoje o homem pode caminhar tranquilamente e se utiliza dessa capacidade para realizar suas atividades diárias, no passado, talvez, isso não fosse tão simples para nossos ancestrais, para os quais, provavelmente, a locomoção bípede era utilizada em condições de fuga e produzia maior exaustão e fadiga. Durante todo o período evolutivo, mudanças anatômicas foram se processando lentamente ao longo dos milhares de anos para permitir a fixação dessa modalidade de marcha, provocando adaptações no aparelho locomotor humano que fornece perspectivas sobre distúrbios musculoesqueléticos encontradas no meio clínico atual.7Lovejoy CO. The natural history of human gait and posture. Part 1 Spine an pelvis Gait & Posture. 2005;21:95-112.

A caminhada bípede engloba muitos aspectos que vão além de um simples ato de posicionar uma perna a frente da outra. Ela pode ser compreendida como um movimento cíclico com perda e recuperação do equilíbrio decorrente da variação constante da posição do centro de massa corporal que promove instabilidade do corpo. Tal instabilidade é compensada pelos movimentos das pernas que variam entre fase de apoio, que pode ser unipodal ou bipodal, e balanço, fase em que a perna está livre no ar. Assim, ao final da fase de balanço, o centro de massa encontra-se posteriorizado em relação à perna estendida anteriormente e começa a se elevar, devido à energia cinética, no início da fase de apoio após o toque do calcâneo no solo. Ao longo da primeira metade do passo, a energia cinética diminui à medida que o centro de massa aumenta a altura e, portanto a energia potencial é acrescida, alcançando seu ponto máximo no meio da fase de apoio unipodal. Na segunda metade do passo, ocorre o inverso; o centro de massa perde altura e a energia potencial é reconvertida em energia cinética. A reconversão entre as energias mecânicas ligadas ao centro de massa durante a caminhada desempenha papel crucial na capacidade de o indivíduo caminhar de maneira mais econômica possível, e sofre influência de uma série de variáveis espaços-temporais da marcha, tais como comprimento de passo e velocidade de caminhada.8Lee CR, Farley CT. Determinants of the center of mass trajectory in human walking and running. Journal of Experimental Biology. 1998;201:2935-44.

Waters RL, Mulroy S. The energy expenditure of normal and pathologic gait. Gait & Posture. 1999;9:207-31.

10 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.
-1111 Schuch CP, Balbinot G, Boos M, Peyré-Tartaruga L, Susta D. The role of anthropometric changes due to aging on human walking: mechanical work, pendulum and efficiency. Biology of Sport. 2011;28:165-70.

O comprometimento do ciclo normal da marcha e a perda das características de conservação de energia entre tronco e movimento dos membros resultam em maior dispêndio energético. Sujeitos com doenças que comprometam a habilidade de caminhar tendem a desenvolver padrões de marcha compensatórios para minimizar o gasto adicional de energia.9Waters RL, Mulroy S. The energy expenditure of normal and pathologic gait. Gait & Posture. 1999;9:207-31.

A dor lombar é uma síndrome comum na população mundial e gera custos socioeconômicos relevantes, sendo que, segundo estimativas, 80% dos indivíduos apresentarão um episódio de dor em algum momento da vida. As desordens lombares são de natureza multifatorial e fatores anatomopatológicos, físicos, neurofisiológicos, psicológicos e sociais têm impacto diferenciado em cada indivíduo e, em cerca de 90% dos casos, não é possível que a causa da disfunção seja determinada, o que caracteriza o quadro de dor lombar inespecífica. Apesar das limitações para se estabelecer a relação entre as características clínicas e as condições causadoras da dor lombar com a eficácia das condutas de tratamento, observa-se que prejuízos biomecânicos e fisiológicos tendem a acompanhar os quadros crônicos de dor lombar. Muitos deles são identificados na literatura, tais como diminuição da velocidade da marcha confortável, diminuição do comprimento do passo e do tempo de balanço,1212 Callaghan JP, Patla AE, McGill SM. Low back three-dimensional joint forces, kinematics, and kinetics during walking. Clinical Biomechanics. 1999;14:203-16.,1313 Newell D, Van Der Laan M. Measures of complexity during walking in chronic non-specific low back pain patients. Clinical Chiropractic. 2010;13:8-14. diminuição da capacidade aeróbia máxima,1414 Duque I, Parra J-H, Duvallet A. Physical deconditioning in chronic low back pain. Journal of Rehabilitation Medicine. 2009;41:262-6. diminuição da resistência dos extensores lombares com consequente anteriorização do centro de massa, pobre controle postural,1515 Brumagne S, Janssens L, Janssens E, Goddyn L. Altered postural control in anticipation of postural instability in persons with recurrent low back pain. Gait & Posture. 2008;28:657-62.,1616 Van Daele U, Hagman F, Truijen S, Vorlat P, Van Gheluwe B, Vaes P.Differences in balance strategies between nonspecific chronic low back pain patients and healthy control subjects during unstable sitting. Spine. 2009;34:1233-8. descoordenação das rotações pélvicas e torácicas,1717 Lamoth CJC, Beek PJ, Meijer OG. Pelvis-thorax coordination in the transverse plane during gait. Gait & Posture. 2002;16:101-14. atraso na ativação planejada do transverso do abdome e prejuízo no fenômeno de relaxamento durante a anteflexão do tronco.1818 Hodges PW. Is there a role for transversus abdominis in lumbo-pelvic stability? Manual therapy. 1999;4:74-86.,1919 Marshall P, Murphy B. The relationship between active and neural measures in patients with nonspecific low back pain. Spine. 2006;31:E518-24.

Em um estudo que identificou as principais atividades desempenhadas com dificuldades na percepção de pacientes com dor lombar crônica, observou-se que 56% dos 101 voluntários avaliados citaram a baixa tolerância à caminhada como uma das cinco atividades mais precariamente desempenhadas, sendo este o item mais prevalente naquela amostra.2020 Andrew Walsh D, Jane Kelly S, Sebastian Johnson P, Rajkumar S, Bennetts K. Performance problems of patients with chronic low-back pain and the measurement of patient-centered outcome. Spine. 2004;29:87-93. Contudo, ainda é limitado o conhecimento sobre como os aspectos mecânicos e energéticos da locomoção, especialmente na caminhada, são afetados pela dor lombar e como os prejuízos resultantes da sua instalação são manifestados nas atividades funcionais, principalmente, nos mecanismos minimizadores de energia da locomoção. O entendimento dessas questões seria um passo para explicar se as alterações durante a caminhada observadas nessa população são decorrentes da incapacidade do organismo em propiciar uma marcha econômica, ou se elas existem justamente para preservar esses mecanismos minimizadores de energia.

Assim, este estudo teve por objetivos: a) descrever os principais mecanismos minimizadores de energia da locomoção; e b) verificar se há indicativos de prejuízos nas características mecânicas e energéticas da caminhada decorrentes da dor lombar crônica que possam comprometer os mecanismos minimizadores.

Método

Este estudo se caracterizou como uma revisão narrativa da literatura. Realizou-se um levantamento Bliográfico nas bases de dados eletrônicas Capes, Pubmed e Scielo de artigos, escritos nas línguas inglesa, portuguesa e espanhola, listados a partir do cruzamento de alguns descritores em inglês (low back pain, human locomotion, walking, biomechanics, gait, energy consumption) e seus correspondentes em português (dor lombar; locomoção humana; caminhada, biomecânica, marcha, consumo de energia) com período de busca delimitado de 1998 até março de 2013; bem como artigos clássicos relacionados ao tema citados nas referências Bliográficas daqueles previamente selecionados.

Mecanismos minimizadores da locomoção humana

A caminhada humana normal pode ser definida como a modalidade de marcha que os humanos utilizam para se deslocarem em baixas velocidades. O ciclo da marcha pode ser entendido como o período de tempo entre dois eventos idênticos no processo de caminhada e este ciclo completo é dividido em duas fases: a de apoio e a de balanço.2121 Racic V,Pavic A, Brownjohn JMW. Experimental identification and analytical modelling of human walking forces: Literature review. Journal of Sound and Vibration. 2009;326:1-49.

A fase de apoio inicia-se com o primeiro contato de um pé com o solo, geralmente pelo toque do calcâneo, terminando com o último contato, deste mesmo pé, com o solo o que corresponde ao despregue do hálux. A fase de balanço inicia-se com o último contato de um pé com o solo, terminando com o primeiro contato do pé contralateral com o solo. Na primeira metade da fase de apoio, observa-se uma diminuição da velocidade do centro de massa até que o ponto médio seja alcançado; já na segunda metade o centro de massa aumenta novamente sua velocidade. Durante a fase de apoio o membro inferior mantém-se em extensão e o ponto médio desta fase coincide com o ponto mais alto da trajetória do centro de massa.8Lee CR, Farley CT. Determinants of the center of mass trajectory in human walking and running. Journal of Experimental Biology. 1998;201:2935-44.

Waters RL, Mulroy S. The energy expenditure of normal and pathologic gait. Gait & Posture. 1999;9:207-31.
-1010 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.

Fenômenos complexos, a exemplo da caminhada, em que inúmeras variáveis contribuem para que os mesmos ocorram, algumas inclusive difíceis de serem quantificadas, podem nem sempre ser passíveis de estudo em condições reais. Contudo, em algumas áreas tal como a biomecânica, esses fenômenos são simplificados na forma de modelos, os quais podem ser matemáticos, físicos ou conceituais; e tais modelos permitem entender o fenômeno de maneira mais abrangente.2222 Alexander RM. Modelling approaches in biomechanics. Philosophical Transactions of the Royal Society of London. Series B, Biological Sciences. 2003;358:1429-35.,2323 Kuo AD. The six determinants of gait and the inverted pendulum analogy: A dynamic walking perspective. Human Movement Science. 2007;26:617-56.

Embora contraditórias, há duas teorias (modelos) relatadas nos estudos sobre caminhada que se propõem a explicar os mecanismos pelos quais a marcha pode ser mais econômica: a teoria dos seis determinantes da marcha e a do pêndulo invertido. A principal diferença entre as duas teorias é quanto à trajetória feita pelo centro de massa.2323 Kuo AD. The six determinants of gait and the inverted pendulum analogy: A dynamic walking perspective. Human Movement Science. 2007;26:617-56.

A menos aceita é a teoria dos seis determinantes, a qual propõe que um conjunto de características cinemáticas, tais como flexão do joelho no momento do apoio e rotações pélvicas, dentre outras, são estrategicamente utilizadas para propiciar que o centro de massa do corpo descreva uma trajetória retilínea durante o caminhar. Os argumentos para tal comportamento é que as oscilações verticais do centro de massa geram um gasto energético adicional por conta da necessidade de contração muscular para acelerá-lo e elevá-lo contra a gravidade. A principal crítica a esse modelo é que, para minimizar o gasto energético relacionado com as oscilações do centro de massa, ele cria a necessidade de que as pernas permaneçam flexionadas na maior parte do passo e isso tem consequências energéticas mais onerosas do que as oscilações do centro de massa.2323 Kuo AD. The six determinants of gait and the inverted pendulum analogy: A dynamic walking perspective. Human Movement Science. 2007;26:617-56.

Já a teoria do pêndulo invertido é mais aceita e utilizada nos estudos. A caminhada humana, em terreno plano e sob uma ótica biomecânica, se assemelha a um “ovo rolando” ou a um pêndulo invertido e essas analogias descrevem o comportamento das mudanças das energias ligadas ao centro de massa do corpo. Modelos mecânicos que representam o comportamento do centro de massa do corpo, entendido como o trabalho externo feito para elevar/declinar e acelerar/frenar o centro de massa em relação ao meio ambiente, têm sido utilizados para explicar como cada tipo de marcha emprega e conserva energia mecânica. No modelo de pêndulo invertido, aplicado à caminhada e que também pode ser visto como um modelo de segmento rígido, as energias cinética e potencial mudam em oposição de fase (enquanto uma atinge valor mínimo a outra atinge valor máximo) durante o contato com o solo na fase de apoio unipodal, o que permite trocas entre as duas energias. Esse modelo preconiza que o centro de massa descreve uma trajetória curvilínea durante o passo (similar à de um pêndulo ao contrário) e que o membro inferior que suporta o peso se comporta como um segmento rígido. Além disso, esse mecanismo de flutuação de energia reduz o trabalho mecânico imposto ao sistema muscular pela conservação de energia e essa redução é proporcional à capacidade do organismo em reconverter uma energia em outra (cinética em potencial e vice-versa), característica mecânica denominada de recovery.8Lee CR, Farley CT. Determinants of the center of mass trajectory in human walking and running. Journal of Experimental Biology. 1998;201:2935-44.,1010 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.,2424 Neptune RR, Zajac FE, Kautz SA. Muscle mechanical work requirements during normal walking: the energetic cost of raising the body's center-of-mass is significant. Journal of Biomechanics. 2004;37:817-25.,2525 Gottschall JS, Kram R. Mechanical energy fluctuations during hill walking: the effects of slope on inverted pendulum exchange. Journal of Experimental Biology. 2006;209:4895-900.

Caminhar com o joelho estendido na fase de suporte, então, parece ter duas vantagens: além de proporcionar o deslocamento vertical do centro de massa, facilitando a economia de energia pelas trocas entre energia cinética e potencial, também permite que a linha de ação (vetor) do peso corporal passe próximo às articulações dos membros inferiores fazendo com que haja pouca necessidade da ação muscular para evitar que essas articulações sofram com as cargas que lhe são impostas. Essas duas condições favorecem a economia de energia.2626 Massaad F, Lejeune TM, Detrembleur C. The up and down bobbing of human walking: a compromise between muscle work and efficiency. The Journal of Physiology. 2007;582:789-99.

A transdução pendular entre as energias cinética e potencial reduz o dispêndio de energia química proveniente tanto do trabalho muscular positivo (aquele necessário para aumentar a energia potencial e cinética) quanto do trabalho muscular negativo (aquele necessário para reduzir energia potencial e cinética). A fração de energia mecânica reconvertida devido à transdução pendular (recovery – %R) tem sido definida matematicamente como: %R = 100 (W+f + W+v – W+ext) / (W+f + W+v), onde W+f é o trabalho positivo calculado a partir da soma, ao longo de todo o passo, dos incrementos positivos provocados pelo deslocamento anterior decorrente da energia cinética horizontal (ECh = 0,5MVh2Pontzer H, Raichlen DA, Sockol MD. The metabolic cost of walking in humans, chimpanzees, and early hominins. Journal of Human Evolution. 2009;56:43-54., onde M é a massa do corpo e Vh é a velocidade horizontal instantânea do centro de massa); W+v representa o trabalho positivo calculado a partir da soma, ao longo de todo o passo, dos incrementos positivos provocados pelo deslocamento vertical decorrente da energia potencial gravitacional (EP = Mgh, onde M é a massa do corpo, g a aceleração da gravidade e h é a altura instantânea do centro de massa); W+ext é o trabalho externo positivo calculado a partir da soma, ao longo de todo o passo, dos incrementos positivos provocados pela energia mecânica total do centro de massa (Emtot = EP + ECh + ECv, onde EP é a energia potencial, ECh a energia cinética horizontal e ECv a energia cinética vertical). A ECv (ECv = 0,5MVv2Pontzer H, Raichlen DA, Sockol MD. The metabolic cost of walking in humans, chimpanzees, and early hominins. Journal of Human Evolution. 2009;56:43-54., onde Mv é a velocidade instantânea vertical) tem sido negligenciado nesse cálculo por não influenciar o W+v, já que a velocidade vertical é zero no topo e no vale da curva de energia potencial. Assim, o recovery representa a fração máxima dos incrementos energéticos positivos vinculados ao centro de massa que é reconvertido pelo mecanismo pendular ao longo de todo o ciclo do passo.1010 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.,2727 Cavagna GA, Willems PA, Legramandi MA, Heglund NC. Pendular energy transduction within the step in human walking. Journal of Experimental Biology. 2002;205:3413-22.

Em pêndulos ideais, a troca da energia é completa (a recuperação da energia é 100%). Não obstante, na caminhada de humanos, a recuperação da energia é moderadamente elevada (até 60%) e depende do comprimento do passo e da velocidade da caminhada. A literatura recente sugere alguma contribuição da energia elástica aos mecanismos da caminhada, através do armazenamento dessa energia e da liberação no tendão de calcâneo e possivelmente através do arco do pé. A participação da energia elástica durante a caminhada é aceita por alguns autores, embora ela tenha uma participação aparentemente mais determinante durante a corrida.1010 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.,2828 Fukunaga T, Kubo K, Kawakami Y, Fukashiro S, Kanehisa H, Maganaris CN. In vivo behaviour of human muscle tendon during walking. Proceedings of the Royal Society Biological Sciences. 2001;268:229-33.,2929 Ishikawa M, Komi PV, Grey MJ, Lepola V.Bruggemann G-P Muscle-tendon interaction and elastic energy usage in human walking, Journal of Applied Physiology. 2005;99:603-8.

Durante a locomoção, os parâmetros da marcha são ajustados de forma que a força, o trabalho, a potência e/ou o dispêndio energético sejam minimizados. Assim, na caminhada, a média da potência mecânica é mínima quando o sujeito caminha em uma frequência de passada próxima daquela que é escolhida livremente (velocidade autosselecionada). Correspondentemente, o consumo de oxigênio também é minimizado na mesma frequência.3030 Cavagna GA, Mantovani M, Willems PA, Musch G. The resonant step frequency in human running. Pflugers Archiv European Journal of Physiology. 1997;434:678-84.

Em condições normais, o consumo de energia da caminhada (potência metabólica – consumo de oxigênio por quilograma de massa corporal por um dado tempo) está relacionado com a intensidade do esforço e pode ser afetado por mudanças na velocidade, o que faz desta última uma medida crucial e determinante do gasto energético em testes de caminhada. A influência da velocidade é tão relevante para o consumo de energia, que o custo de oxigênio por metro caminhado (conceito denominado de custo de transporte) é obtido pela razão entre potência metabólica e velocidade da caminhada e é um indicativo da qualidade da caminhada.9Waters RL, Mulroy S. The energy expenditure of normal and pathologic gait. Gait & Posture. 1999;9:207-31.,3131 Dal U, Erdogan T, Resitoglu B, Beydagi H. Determination of preferred walking speed on treadmill may lead to high oxygen cost on treadmill walking. Gait & Posture. 2010;31:366-9.

O custo de transporte é uma medida de economia da locomoção e representa a quantidade de energia metabólica consumida para mover um quilograma de massa corporal por unidade de distância, sendo expresso em J.kg.m-1 1010 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.,3232 Cunningham CB, Schilling N, Anders C, Carrier DR. The influence of foot posture on the cost of transport in humans. The Journal of Experimental Biology. 2010;213:790-7. e fornece uma informação metabólica da qualidade da marcha. De uma forma mais simplificada, entende-se custo de transporte como a força necessária para transportar uma unidade de massa por uma unidade de distância.

O custo de transporte varia em função da velocidade com que a marcha é realizada e normalmente é menor nas velocidades autosselecionadas para cada tipo de marcha. Baseado nisso, Margaria, no final da década de 1930, propôs que as curvas do custo de transporte em função da velocidade assumiam a forma de “U”, pois, quanto mais distante fosse a velocidade estudada daquela autosselecionada, maior seria o custo de transporte.1010 Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.,3333 Bunc V Dlouhá R. Energy cost of treadmill walking. Journal of Sports Medicine and Physical Fitness. 1997;37:103-9. De fato, a velocidade ótima da caminhada tem sido definida em alguns estudos como aquela na qual, simultaneamente, há otimização da contribuição dos parâmetros mecânicos, característicos deste tipo de marcha, e menor custo metabólico.3434 Leurs F, Ivanenko YP, Bengoetxea A, Cebolla A-M, Dan B, Lacquaniti F, et al. Optimal walking speed following changes in limb geometry. The Journal of Experimental Biology. 2011;214:2276-82.

Caminhar em velocidades mais altas do que a autosselecionada requer um acréscimo da atividade dos músculos envolvidos na propulsão do corpo para frente e também está associado a um comprimento de passo maior, o que aumenta tanto a atividade dos músculos que contribuem para o balanço da perna, quanto daqueles que contribuem para o controle vertical, já que a excursão vertical do centro de massa do corpo também aumenta. Inversamente, caminhar em velocidades mais baixas torna-se mecanicamente menos eficiente, pois há uma maior necessidade de estabilização e pode-se contar menos com a energia elástica das unidades musculares e tendíneas.3535 Neptune RR, Sasaki K, Kautz SA. The effect of walking speed on muscle function and mechanical energetics. Gait & Posture. 2008;28:135-43.

Consequentemente pode-se pensar que exista um paralelismo entre a energética e a mecânica da locomoção humana. Porém, em virtude de sua complexidade, vários fatores devem ser levados em consideração. Taylor e Heglund3636 Taylor CR, Heglund NC. Energetics and mechanics of terrestrial locomotion. Annual Review of Physiology. 1982;44:97-107. demonstraram que mudanças na potência metabólica observada em função da variação da velocidade e massa corporal não resultam em mudanças paralelas no trabalho mecânico realizado pelos músculos. Esses autores também sugerem que o custo metabólico para geração de força muscular durante a fase de contato do pé com o solo, independente se o trabalho mecânico (produto da força pelo deslocamento) é produzido (ex. contrações concêntricas) ou não (ex. contrações isométricas), é o que determina a taxa na qual se consome energia. Shi e Stuhmiller3737 Sih BL, Stuhmiller JH. The metabolic cost of force generation. Medicine & Science in Sports & Exercise. 2003;35:623-9. concluíram que há uma relação entre custo metabólico e a magnitude e a frequência da aplicação de força, ligadas ao tempo de contato efetivo do pé com o chão, para muitas atividades.

Mudanças na frequência de passada para longe daquela que é natural pode induzir a modificações importantes nos mecanismos minimizadores de energia na caminhada. A uma dada velocidade, o percentual de recovery tende a aumentar quando o comprimento do passo é maior daquele observado na caminhada natural e, inversamente, tende a diminuir quando o comprimento do passo é menor do que o comprimento de passo livremente escolhido.3838 Cavagna GA, Franzetti P. The determinants of the step frequency in walking in humans. The Journal of Physiology. 1986;373:235-42.

A coordenação do tronco durante a caminhada humana também tem sido foco de estudo. O aumento da velocidade de caminhada, em sujeitos normais, modifica a relação de fase entre as rotações do tronco e da pelve no plano horizontal de forma que nas velocidades mais baixas, esses dois segmentos tendem a ter um comportamento mais sincrônico (em fase) que vai se tornando mais assincrônico (fora de fase) à medida que a velocidade vai aumentando. Assim, na caminhada rápida, os movimentos oscilatórios do tronco em relação à pelve se tornam mais evidentes. Apesar dos mecanismos que regem essa coordenação ainda não estarem completamente compreendidos nem mesmo em sujeitos normais, em algumas condições de doença, como na dor lombar, observa-se um prejuízo desse movimento coordenativo de forma que, até durante velocidades mais altas de caminhada os dois segmentos, tronco e pelve, tendem a se movimentar sincronicamente, forçando a um estilo de caminhada mais em bloco.3939 Lamoth CJC, Meijer OG, Wuisman PIJM, Van Dieen JH, Levin MF, Beek PJ. Pelvis-thorax coordination in the transverse plane during walking in persons with nonspecific low back pain. Spine. 2002;27:E92-9.,4040 Huang Y,Meijer OG, Lin J, Bruijn SM, Wu W, Lin X, et al. The effects of stride length and stride frequency on trunk coordination in human walking. Gait & Posture. 2010;31:444-9.

Prejuízos mecânicos e energéticos na caminhada decorrentes da dor lombar

Enquanto sujeitos normais selecionam o comprimento e a frequência de passo de forma a tornar a caminhada mais econômica do ponto de vista energético, aqueles com doenças que envolvem o aparelho locomotor mudam essa estratégia. Grandes comprimentos de passo induzem a modificações no sistema de coordenação entre tronco e pelve tornando maiores as rotações entre esses segmentos durante a caminhada. Nas marchas patológicas, os sujeitos tendem a evitar grandes oscilações da coluna e podem fazer isso de várias formas, e, no caso dos lombálgicos crônicos, eles tendem a caminhar mais lentamente, diminuindo o comprimento e aumentando, em menor proporção, a frequência do passo.4040 Huang Y,Meijer OG, Lin J, Bruijn SM, Wu W, Lin X, et al. The effects of stride length and stride frequency on trunk coordination in human walking. Gait & Posture. 2010;31:444-9.

Sujeitos com dor lombar apresentam várias adaptações durante a caminhada em consequência da dor, tais como: controle postural proprioceptivo alterado; estratégia de tronco e corpo mais rígida levando a adoção da estratégia do tornozelo; aumento da atividade dos músculos lombares durante todos os períodos do passo e, secundariamente, menor relaxamento relativo durante períodos de balanço comparados com duplo apoio; diminuição do componente vertical das forças de reação de solo naqueles sujeitos cuja dor se irradia para os membros inferiores; diminuição da velocidade preferida da caminhada; diminuição da coordenação tórax/pélvica no plano transverso induzindo a um comportamento mais rígido entre esses segmentos; comprimento de passo mais curto; dentre outras. Ainda, pacientes com dor lombar crônica inespecífica, quando solicitados a aumentar a velocidade da marcha, tendem a aumentar mais a cadência da caminhada do que o comprimento do passo, ao contrário dos indivíduos livres de dor.1515 Brumagne S, Janssens L, Janssens E, Goddyn L. Altered postural control in anticipation of postural instability in persons with recurrent low back pain. Gait & Posture. 2008;28:657-62.,4141 Lamoth CJC, Meijer OG, Daffertshofer A, Wuisman PIJM, Beek PJ. Effects of chronic low back pain on trunk coordination and back muscle activity during walking: changes in motor control. European Spine Journal. 2006;15:23-40.

42 Lee CE, Simmonds MJ, Etnyre BR, Morris GS. Influence of pain distribution on gait characteristics in patients with low back pain: part 1: vertical ground reaction force. Spine. 2007;32:1329-36.

43 Brumagne S, Janssens L, Knapen S, Claeys K, Suuden-Johanson E. Persons with recurrent low back pain exhibit a rigid postural control strategy. European Spine Journal. 2008;17:1177-84.

44 Lamoth CJC, Stins JF, Pont M, Kerckhoff F, Beek PJ. Effects of attention on the control of locomotion in individuals with chronic low back pain. Journal of NeuroEngineering and Rehabilitation. 2008;5:13.
-4545 Sung PS, Park H-S. Gender differences in ground reaction force following perturbations in subjects with low back pain. Gait & Posture. 2009;29:290-5.

Lamoth et al.4444 Lamoth CJC, Stins JF, Pont M, Kerckhoff F, Beek PJ. Effects of attention on the control of locomotion in individuals with chronic low back pain. Journal of NeuroEngineering and Rehabilitation. 2008;5:13. observaram que indivíduos com dor lombar que caminharam em uma mesma velocidade relativa (110% da preferida) que sujeitos sem dor lombar apresentaram comprimento de passo, velocidade de caminhada e variabilidade do comprimento de passada significativamente menores, mas isso não ocorreu quando se avaliou a frequência de passada. Elbaz et al.4646 Elbaz A, Mirovsky Y, Mor A, Enosh S, Debbi E, Segal G, et al. A novel biomechanical device improves gait pattern in patient with chronic nonspecific low back pain. Spine. 2009;34:E507-12. observaram que pacientes com lombalgia crônica inespecífica apresentam assimetria no apoio unipodal e nas fases de balanço e apoio, além de menor velocidade de caminhada. Esses autores sugerem que a diminuição da velocidade de caminhada nesses pacientes pode ser compreendida como um mecanismo protetor atribuído à tentativa de diminuir as forças de reação de solo para minimizar a sobrecarga na coluna e evitar a dor.

A dor, ao menos no que se refere à caminhada, parece desempenhar um papel mais importante nos episódios agudos. Moe-Nilssen, Ljunggren e Torebjork4747 Moe-Nilssen R, Ljunggren AE, Torebjork E. Dynamic adjustments of walking behavior dependent on noxious input in experimental low back pain. Pain. 1999;83:477-85. verificaram se a mensuração da aceleração da coluna lombar, quantificada por um acelerômetro, poderia indicar mudanças no comportamento motor durante a caminhada em consequência de dor lombar transitória induzida experimentalmente pela injeção de solução salina hipertônica no músculo longuíssimo do dorso. Eles encontraram interação dinâmica entre dor e adaptação no desempenho motor ao observar redução da aceleração lombar durante o período de manutenção da dor induzida e acreditam que essa mudança foi processada pelo sistema nervoso vegetativo.

Taylor, Evans e Goldie4848 Taylor NF, Evans OM, Goldie PA. The effect of walking faster on people with acute low back pain. European Spine Journal. 2003;12:166-72. compararam um grupo de voluntários com dor lombar aguda sete dias após o início do quadro de dor e seis semanas depois, quando o quadro de dor não existia mais. Também avaliaram sujeitos sem dor lombar e, em cada avaliação, todos os voluntários caminharam na velocidade autosselecionada e em uma intensidade 40% mais rápida do que a autosselecionada. Esses autores observaram que nas velocidades mais altas, o grupo lombar, durante o período de agudização, teve adaptações significativas na maneira de caminhar tais como aumentos da inclinação pélvica, da flexão lateral da coluna lombar e do comprimento de passada em relação à avaliação pós-teste. Entretanto, não foram encontradas diferenças em relação ao grupo controle. Esses achados sugerem que a dor pode provocar modificações no estilo de caminhar.

Nas condições de dor crônica, o entendimento dos processos adaptativos se torna muito mais complexo. Em concordância, outros estudos também deslocam o foco do quadro álgico como variável determinante na população de lombálgicos crônicos em detrimento do quadro funcional. Embora ainda não seja consenso, tem aumentado o corpo de evidências sugerindo que as alterações supraespinais (neurodegeneração da porção dorsolateral do córtex pré frontal; gradativo decréscimo do volume de substância cinzenta neocortical, do córtex pré-frontal e do tálamo, dentre outros) presentes naqueles com dor lombar crônica inespecífica podem conter os mecanismos que justificam os achados clínicos. Assim, acredita-se que essa reorganização dentro do cérebro seja capaz de gerar o quadro de dor persistente mesmo quando nenhuma alteração física esteja presente, e isso inclui neurodegeneração cortical e inibição descendente produzindo estado de sensibilidade anormal; memória de dor; e geração de dor central em consequência das incongruências sensório-motoras quando o paciente se movimenta. Portanto, as alterações motoras observadas nesses indivíduos teriam uma origem mais central do que periférica e esse conhecimento cria a necessidade de se repensar tanto a natureza do problema quanto a melhor maneira de abordá-lo, pois, pelo que tudo indica, as alterações físicas deixam de ser causa e passam a ser consequência de uma importante alteração na representação central e nas tentativas individuais para manter a funcionalidade mesmo com um esquema corporal alterado.4949 Wand BM, O'Connell NE. Chronic non-specific low back pain -sub-groups or a single mechanism? BMC Musculoskeletal Disorders. 2008;9:11. Available from: http://dx.doi.org/10.1186/1471-2474-9-11
http://dx.doi.org/10.1186/1471-2474-9-11...

Outros estudos também confirmaram as mudanças de volume e densidade tanto do córtex quanto da substância branca entre sujeitos com dor lombar crônica.5050 Buckalew N, Haut MW, Morrow L, Weiner D. Chronic pain is associated with brain volume loss in older adults: preliminary evidence. Pain Medicine. 2008;9:240-8.

51 Buckalew N, Haut MW, Aizenstein H, Morrow L, Perera S, Kuwabara H, et al. Differences in brain structure and function in older adults with self-reported disabling and non-disabling chronic low back pain. Pain Medicine. 2010;11:1183-97.
-5252 Wood PB. Variations in brain gray matter associated with chronic pain. Current Rheumatology Reports. 2010;12:462-9. Essas mudanças foram observadas em diversas áreas corticais, inclusive em aéreas relacionadas com o processamento da velocidade da marcha, como o corpo caloso, que também parece estar associado com pobre aptidão física e duração da dor.5151 Buckalew N, Haut MW, Aizenstein H, Morrow L, Perera S, Kuwabara H, et al. Differences in brain structure and function in older adults with self-reported disabling and non-disabling chronic low back pain. Pain Medicine. 2010;11:1183-97. As modificações estruturais e funcionais que ocorrem no cérebro dos lombálgicos sugeridas por esses estudos dão crédito à hipótese de que esses pacientes sejam menos capazes de adequar seus parâmetros espaços temporais da caminhada que indivíduos livres de dor. Consequentemente, como a cinemática da marcha desempenha papel relevante nos mecanismos minimizadores de energia, amplia-se a hipótese preconizando-se que esses pacientes sejam, também, menos econômicos.

Assim, torna-se relevante identificar se as alterações durante a caminhada, observadas nessa população, são decorrentes, também, da incapacidade do organismo em propiciar uma marcha econômica, ou se elas existem, justamente, para preservar a economia da marcha.

Ao menos no que tange à abrangência da presente revisão de literatura, não foram encontrados estudos que correlacionassem os prejuízos motores na locomoção, largamente descritos entre os lombálgicos crônicos, com os mecanismos minimizadores de energia da caminhada. Isso sugere a necessidade, consequentemente, de estudos que busquem compreender se nessa população há ou não prejuízo desses mecanismos.

Considerações finais

A principal teoria que explica a minimização do dispêndio energético durante a caminhada é a do pêndulo invertido e o mecanismo minimizador desta teoria seria a reconversão que ocorre, durante a caminhada, entre as energias mecânicas atreladas ao centro de massa do corpo (energias cinética e potencial). Contudo esse mecanismo minimizador é fortemente influenciado por parâmetros espaços-temporais da marcha que, por sua vez, podem estar severamente alterados naqueles com dor lombar crônica. Dessa forma, há indícios de que tais mudanças funcionais possam comprometer os mecanismos minimizadores de energia.

Referências

  • 1
    Skoyles JR. Human balance, the evolution of bipedalism and dysequilibrium syndrome. Medical Hypotheses. 2006;66:1060-8.
  • 2
    Pontzer H, Raichlen DA, Sockol MD. The metabolic cost of walking in humans, chimpanzees, and early hominins. Journal of Human Evolution. 2009;56:43-54.
  • 3
    Le Huec JC, Saddiki R, Franke J, Rigal J, Aunoble S. Equilibrium of the human body and the gravity line: the basics. European Spine Journal. 2011;20 Suppl 5:558-63.
  • 4
    Willigenburg NW, Kingma I, Van Dieen JH. How is precision regulated in maintaining trunk posture? Experimental Brain Research. 2010;203:39-49.
  • 5
    Franz JR, Paylo KW, Dicharry J, Riley PO, Kerrigan DC. Changes in the coordination of hip and pelvis kinematics with mode of locomotion. Gait & Posture. 2009;29:494-8.
  • 6
    Harcourt-Smith WEH, Aiello LC. Fossils, feet and the evolution of human bipedal locomotion. Journal of Anatomy. 2004;204:403-16.
  • 7
    Lovejoy CO. The natural history of human gait and posture. Part 1 Spine an pelvis Gait & Posture. 2005;21:95-112.
  • 8
    Lee CR, Farley CT. Determinants of the center of mass trajectory in human walking and running. Journal of Experimental Biology. 1998;201:2935-44.
  • 9
    Waters RL, Mulroy S. The energy expenditure of normal and pathologic gait. Gait & Posture. 1999;9:207-31.
  • 10
    Saibene F, Minetti AE. Biomechanical and physiological aspects of legged locomotion in humans. European Journal of Applied Physiology. 2003;88:297-316.
  • 11
    Schuch CP, Balbinot G, Boos M, Peyré-Tartaruga L, Susta D. The role of anthropometric changes due to aging on human walking: mechanical work, pendulum and efficiency. Biology of Sport. 2011;28:165-70.
  • 12
    Callaghan JP, Patla AE, McGill SM. Low back three-dimensional joint forces, kinematics, and kinetics during walking. Clinical Biomechanics. 1999;14:203-16.
  • 13
    Newell D, Van Der Laan M. Measures of complexity during walking in chronic non-specific low back pain patients. Clinical Chiropractic. 2010;13:8-14.
  • 14
    Duque I, Parra J-H, Duvallet A. Physical deconditioning in chronic low back pain. Journal of Rehabilitation Medicine. 2009;41:262-6.
  • 15
    Brumagne S, Janssens L, Janssens E, Goddyn L. Altered postural control in anticipation of postural instability in persons with recurrent low back pain. Gait & Posture. 2008;28:657-62.
  • 16
    Van Daele U, Hagman F, Truijen S, Vorlat P, Van Gheluwe B, Vaes P.Differences in balance strategies between nonspecific chronic low back pain patients and healthy control subjects during unstable sitting. Spine. 2009;34:1233-8.
  • 17
    Lamoth CJC, Beek PJ, Meijer OG. Pelvis-thorax coordination in the transverse plane during gait. Gait & Posture. 2002;16:101-14.
  • 18
    Hodges PW. Is there a role for transversus abdominis in lumbo-pelvic stability? Manual therapy. 1999;4:74-86.
  • 19
    Marshall P, Murphy B. The relationship between active and neural measures in patients with nonspecific low back pain. Spine. 2006;31:E518-24.
  • 20
    Andrew Walsh D, Jane Kelly S, Sebastian Johnson P, Rajkumar S, Bennetts K. Performance problems of patients with chronic low-back pain and the measurement of patient-centered outcome. Spine. 2004;29:87-93.
  • 21
    Racic V,Pavic A, Brownjohn JMW. Experimental identification and analytical modelling of human walking forces: Literature review. Journal of Sound and Vibration. 2009;326:1-49.
  • 22
    Alexander RM. Modelling approaches in biomechanics. Philosophical Transactions of the Royal Society of London. Series B, Biological Sciences. 2003;358:1429-35.
  • 23
    Kuo AD. The six determinants of gait and the inverted pendulum analogy: A dynamic walking perspective. Human Movement Science. 2007;26:617-56.
  • 24
    Neptune RR, Zajac FE, Kautz SA. Muscle mechanical work requirements during normal walking: the energetic cost of raising the body's center-of-mass is significant. Journal of Biomechanics. 2004;37:817-25.
  • 25
    Gottschall JS, Kram R. Mechanical energy fluctuations during hill walking: the effects of slope on inverted pendulum exchange. Journal of Experimental Biology. 2006;209:4895-900.
  • 26
    Massaad F, Lejeune TM, Detrembleur C. The up and down bobbing of human walking: a compromise between muscle work and efficiency. The Journal of Physiology. 2007;582:789-99.
  • 27
    Cavagna GA, Willems PA, Legramandi MA, Heglund NC. Pendular energy transduction within the step in human walking. Journal of Experimental Biology. 2002;205:3413-22.
  • 28
    Fukunaga T, Kubo K, Kawakami Y, Fukashiro S, Kanehisa H, Maganaris CN. In vivo behaviour of human muscle tendon during walking. Proceedings of the Royal Society Biological Sciences. 2001;268:229-33.
  • 29
    Ishikawa M, Komi PV, Grey MJ, Lepola V.Bruggemann G-P Muscle-tendon interaction and elastic energy usage in human walking, Journal of Applied Physiology. 2005;99:603-8.
  • 30
    Cavagna GA, Mantovani M, Willems PA, Musch G. The resonant step frequency in human running. Pflugers Archiv European Journal of Physiology. 1997;434:678-84.
  • 31
    Dal U, Erdogan T, Resitoglu B, Beydagi H. Determination of preferred walking speed on treadmill may lead to high oxygen cost on treadmill walking. Gait & Posture. 2010;31:366-9.
  • 32
    Cunningham CB, Schilling N, Anders C, Carrier DR. The influence of foot posture on the cost of transport in humans. The Journal of Experimental Biology. 2010;213:790-7.
  • 33
    Bunc V Dlouhá R. Energy cost of treadmill walking. Journal of Sports Medicine and Physical Fitness. 1997;37:103-9.
  • 34
    Leurs F, Ivanenko YP, Bengoetxea A, Cebolla A-M, Dan B, Lacquaniti F, et al. Optimal walking speed following changes in limb geometry. The Journal of Experimental Biology. 2011;214:2276-82.
  • 35
    Neptune RR, Sasaki K, Kautz SA. The effect of walking speed on muscle function and mechanical energetics. Gait & Posture. 2008;28:135-43.
  • 36
    Taylor CR, Heglund NC. Energetics and mechanics of terrestrial locomotion. Annual Review of Physiology. 1982;44:97-107.
  • 37
    Sih BL, Stuhmiller JH. The metabolic cost of force generation. Medicine & Science in Sports & Exercise. 2003;35:623-9.
  • 38
    Cavagna GA, Franzetti P. The determinants of the step frequency in walking in humans. The Journal of Physiology. 1986;373:235-42.
  • 39
    Lamoth CJC, Meijer OG, Wuisman PIJM, Van Dieen JH, Levin MF, Beek PJ. Pelvis-thorax coordination in the transverse plane during walking in persons with nonspecific low back pain. Spine. 2002;27:E92-9.
  • 40
    Huang Y,Meijer OG, Lin J, Bruijn SM, Wu W, Lin X, et al. The effects of stride length and stride frequency on trunk coordination in human walking. Gait & Posture. 2010;31:444-9.
  • 41
    Lamoth CJC, Meijer OG, Daffertshofer A, Wuisman PIJM, Beek PJ. Effects of chronic low back pain on trunk coordination and back muscle activity during walking: changes in motor control. European Spine Journal. 2006;15:23-40.
  • 42
    Lee CE, Simmonds MJ, Etnyre BR, Morris GS. Influence of pain distribution on gait characteristics in patients with low back pain: part 1: vertical ground reaction force. Spine. 2007;32:1329-36.
  • 43
    Brumagne S, Janssens L, Knapen S, Claeys K, Suuden-Johanson E. Persons with recurrent low back pain exhibit a rigid postural control strategy. European Spine Journal. 2008;17:1177-84.
  • 44
    Lamoth CJC, Stins JF, Pont M, Kerckhoff F, Beek PJ. Effects of attention on the control of locomotion in individuals with chronic low back pain. Journal of NeuroEngineering and Rehabilitation. 2008;5:13.
  • 45
    Sung PS, Park H-S. Gender differences in ground reaction force following perturbations in subjects with low back pain. Gait & Posture. 2009;29:290-5.
  • 46
    Elbaz A, Mirovsky Y, Mor A, Enosh S, Debbi E, Segal G, et al. A novel biomechanical device improves gait pattern in patient with chronic nonspecific low back pain. Spine. 2009;34:E507-12.
  • 47
    Moe-Nilssen R, Ljunggren AE, Torebjork E. Dynamic adjustments of walking behavior dependent on noxious input in experimental low back pain. Pain. 1999;83:477-85.
  • 48
    Taylor NF, Evans OM, Goldie PA. The effect of walking faster on people with acute low back pain. European Spine Journal. 2003;12:166-72.
  • 49
    Wand BM, O'Connell NE. Chronic non-specific low back pain -sub-groups or a single mechanism? BMC Musculoskeletal Disorders. 2008;9:11. Available from: http://dx.doi.org/10.1186/1471-2474-9-11
    » http://dx.doi.org/10.1186/1471-2474-9-11
  • 50
    Buckalew N, Haut MW, Morrow L, Weiner D. Chronic pain is associated with brain volume loss in older adults: preliminary evidence. Pain Medicine. 2008;9:240-8.
  • 51
    Buckalew N, Haut MW, Aizenstein H, Morrow L, Perera S, Kuwabara H, et al. Differences in brain structure and function in older adults with self-reported disabling and non-disabling chronic low back pain. Pain Medicine. 2010;11:1183-97.
  • 52
    Wood PB. Variations in brain gray matter associated with chronic pain. Current Rheumatology Reports. 2010;12:462-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2015

Histórico

  • Recebido
    23 Nov 2013
  • Aceito
    28 Jan 2014
Sociedade Brasileira de Reumatologia Av Brigadeiro Luiz Antonio, 2466 - Cj 93., 01402-000 São Paulo - SP, Tel./Fax: 55 11 3289 7165 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: sbre@terra.com.br