Acessibilidade / Reportar erro

Anticorpos contra o vírus da hepatite C em pacientes de alto risco com lúpus eritematoso sistêmico de início juvenil

Resumo

Objetivo

Avaliar a prevalência de infecção pelo vírus da hepatite C (VHC) em pacientes de alto risco com lúpus eritematoso sistêmico de início juvenil (LESJ).

Desenho do estudo

Foram estudados 40 pacientes de baixa renda com LESJ (6 H: 34 M, com média de 19 ± 4,4 anos; duração média da doença de 6 ± 3,2 anos). Incluíram-se no grupo controle 20 crianças e adolescentes saudáveis pareados por nível socioeconômico. Fizeram-se testes anti-VHC com um ensaio imunoenzimático de micropartículas de terceira geração. O critério de inclusão foi o baixo nível socioeconômico.

Resultados

As frequências de anticorpos anti-VHC foram baixas e comparáveis entre os grupos LESJ e controle (2,5% versus 0, p = 1). Os pacientes com LESJ tinham significativamente mais fatores de risco para infecção por VHC em comparação com o grupo controle, incluindo tratamento imunossupressor (90% versus 0, p < 0,0001), internação (50% versus 12,5%, p = 0,0006) e procedimentos invasivos (47,5% versus 12,5%, p = 0,001).

Conclusões

A baixa frequência de anticorpos anti-VHC observada nos pacientes de alto risco com LESJ sugere que esse vírus não parece ter um papel relevante na patogênese dessa doença.

Palavras-chave
Vírus contra a hepatite C; Anti-VHC; Lúpus eritematoso sistêmico de início juvenil

Abstract

Objective

To evaluate the prevalence of hepatitis C virus (HCV) infection in high risk juvenile systemic lupus erythematosus (JSLE).

Study design

Forty low income JSLE patients (6M:34F; mean age 19 ± 4.4 yrs; mean disease duration 6 ± 3.2 yrs) were studied. Twenty healthy children and adolescents matched for social economical level were included as controls. Anti-HCV tests were performed using a third generation microparticle enzyme immunoassay. Inclusion criterion was low social economical level.

Results

The frequencies of anti-HCV antibody were low and comparable between JSLE and control group (2.5% vs. 0, p = 1.0). JSLE patients had significantly more risk factors for HCV infection compared to the control group, including immunosuppressive treatment (90% vs. 0, p < 0.0001), hospitalization (50% vs. 12.5%, p = 0.0006) and invasive procedures (47.5% vs. 12.5%, p = 0.001).

Conclusions

The observed low frequency of anti-HCV antibodies in high risk JSLE suggests that this virus does not seem to have a relevant role in the pathogenesis of this disease.

Keywords
Hepatitis C virus; Anti-HCV; Juvenile systemic lupus erythematosus

Introdução

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune complexa, caracterizada por um amplo espectro de envolvimento de múltiplos órgãos e anormalidades laboratoriais. A doença é caracterizada por alterações imunorregulatórias que culminam em uma produção exacerbada de autoanticorpos. A patogênese do LES ainda não é clara, mas alguns agentes infecciosos, incluindo o vírus da hepatite C (VHC), podem estar envolvidos como possíveis desencadeadores.11 Ramos-Casals M, Font J, Garcia-Carrasco M, Cervera R, Jiménez S, Trejo O, et al. Hepatitis C virus infection mimicking systemic lupus erythematosus: study of hepatitis C virus infection in a series of 134 Spanish patients with systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2000;43(12):2801-6.,22 Berkun Y, Zandman-Goddard G, Barzilai O, Boaz M, Sherer Y, Larida B, et al. Infectious antibodies in systemic lupus erythematosus patients. Lupus. 2009;18(13):1129-35.

O VHC é um vírus de RNA de cadeia simples linear da família Flaviviridae, que tem uma grande variabilidade genômica.33 Koziel MJ. Immunology of viral hepatitis. Am J Med. 1996;100(1):98-109. É bem sabido que a infecção por VHC é uma das causas mais comuns de hepatite viral crônica.33 Koziel MJ. Immunology of viral hepatitis. Am J Med. 1996;100(1):98-109. Além disso, manifestações imunológicas extra-hepáticas adicionais têm sido associadas ao VHC.44 Agmon-Levin N, Ram M, Barzilai O, Porat-Katz BS, Parikman R, Selmi C, et al. Prevalence of hepatitis C serum antibody in autoimmune diseases. J Autoimmun. 2009;32(3–4):261-6.

5 McMurray RW, Elbourne K. Hepatitis C virus infection and autoimmunity. Sem Arthritis Rheum. 1997;26(4):689-701.
-66 Pawlotsky JM, Roudot-Thoraval F, Simmonds P, Mellor J, Ben Yahia MB, André C, et al. Extrahepatic immunologic manifestations in chronic hepatitis C virus serotypes. Ann Intern Med. 1995;122(3):169-73.

Na verdade, o VHC é um importante indutor da produção de autoanticorpos, como os anticorpos antinucleares (ANA),66 Pawlotsky JM, Roudot-Thoraval F, Simmonds P, Mellor J, Ben Yahia MB, André C, et al. Extrahepatic immunologic manifestations in chronic hepatitis C virus serotypes. Ann Intern Med. 1995;122(3):169-73. fatores reumatoides e crioglobulinas.77 Lee YH, Ji JD, Yeon JE, Byun KS, Lee CH, Song GG. Cryoglobulinemia and rheumatic manifestations in patients with hepatitis C virus infection. Ann Rheum Dis. 1998;57(12):728-31. Descreveu-se ainda uma possível associação desse vírus com doenças reumáticas autoimunes, incluindo a síndrome de Sjögren e a vasculite.88 Mariette X, Zerbib M, Jaccard A, Schenmetzler C, Danon F, Clauvel JP. Hepatitis C virus and Sjogren's syndrome. Arthritis Rheum. 1993;36(2):280-1.,99 Marcellin P, Descamps V, Martinot-Peignoux M, Larzul D, Xu L, Boyer N, et al. Cryoglobulinemia and vasculitis associated with hepatitis C virus infection. Gastroenterology. 1993;104(1):272-7. Em pacientes adultos com LES, alguns estudos apontam para uma prevalência de anticorpos anti-VHC (3-13%) mais elevada do que o esperado para a população geral11 Ramos-Casals M, Font J, Garcia-Carrasco M, Cervera R, Jiménez S, Trejo O, et al. Hepatitis C virus infection mimicking systemic lupus erythematosus: study of hepatitis C virus infection in a series of 134 Spanish patients with systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2000;43(12):2801-6.,1010 Marchesoni A, Battafarano N, Podico M, Tosi S. Hepatitis C virus antibodies and systemic lupus erythematosus. Clin Exp Rheumatol. 1995;13(2):267-8.,1111 Kowdley KV, Subler DE, Scheffel J, Moore B, Smith H. Hepatitis C virus antibodies in systemic lupus erythematosus. J Clin Gastroenterol. 1997;25(2):437-9. e levantam a possibilidade de que a exposição a esse agente infeccioso pode contribuir para a expressão da doença.

Contudo, não existem dados sobre a associação do VHC com o LES juvenil (LESJ). Portanto, o objetivo deste estudo foi investigar a prevalência de anticorpos anti-VHC no soro de pacientes de alto risco com LESJ.

Pacientes e métodos

Inicialmente foram selecionados 50 indivíduos de baixa renda consecutivos que atenderam aos critérios de classificação do Colégio Americano de Reumatologia (ACR)1212 Hochberg MC. Updating the American College of Rheumatology revised criteria for the classification of systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 1997;40(9):1725. para LESJ acompanhados em nossa Unidade de Reumatologia Pediátrica. Dez deles foram excluídos em razão de prontuários incompletos e acompanhamento irregular. Os 40 restantes elegíveis foram incluídos no estudo. Foram selecionados para o grupo controle 20 indivíduos saudáveis pareados por status socioeconômico (de acordo com um questionário padronizado da Associação Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercados).1313 Almeida PM, Wickerrhauser H. Critério de classe econômica da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) e Associação Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercado (ABIPEME); 1991. p. 1–29.

Os fatores de risco elevado para VHC foram definidos pela baixa renda [classes socioeconômicas brasileiras mais baixas (C, D ou E)] e presença de um ou mais fatores de risco: internações, procedimentos diagnósticos ou terapêuticos invasivos (medicamentos intravenosos, biópsias ou métodos diagnósticos endoscópicos), fármacos imunossupressores, transfusões de produtos derivados do sangue, uso de drogas intravenosas e atividade sexual promíscua (≥ 3 parceiros sexuais por ano).1414 Saraceno B, Kim JY. Alcohol use and sexual risk behaviour: a cross-cultural study in eight countries. World Health Organization; 2005. p. 54–6.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética de nosso Hospital Universitário.

Analisaram-se as manifestações clínicas no momento do diagnóstico da doença e no momento do estudo nos pacientes com LES. Registrou-se a atividade do LES no início do estudo de todos os pacientes com o escore SLE Disease Activity Index (SLEDAI);1515 Bombardier C, Gladman DD, Urowitz MB, Caron D, Chang CH. Derivation of the SLEDAI. A disease activity index for lupus patients. Arthritis Rheum. 1992;35(6):630-40. uma pontuação superior a 8 foi considerada como LESJ ativo.

Fez-se um exame físico sistemático à procura de sinais de insuficiência hepática, incluindo estigmas cutâneos, hepatomegalia, ascite e/ou icterícia.

Detecção de anticorpos anti-vírus da hepatite C

Fizeram-se testes para anticorpos anti-VHC nos soros de todos os pacientes com LES e controles com um ensaio imunoenzimático de terceira geração com MEIA – ensaio imunoenzimático de micropartículas (ELISA-3; Axsym System versão 3.0; Abbott, Abbott Park, IL). O teste MEIA é uma variação do ensaio de imunoadsorção enzimática (EIA) padrão desenvolvido para detectar anticorpos específicos contra as proteínas estruturais e não estruturais do genoma do vírus. Esse método usa placa com os antígenos VHC recombinantes Hcr43, c200, C100-3, pL33c e NS5.

Exames laboratoriais autoimunes e perfil hepático

Todos os indivíduos foram rastreados à procura de anticorpos antinucleares (ANA) por imunofluorescência indireta com células HEp-2 como substrato e anticorpo anti-dsDNA por imunofluorescência indireta com Crithidia luciliae. Além disso, a avaliação sorológica incluiu testes para autoanticorpos Ro e La por imunoeletroforese contracorrente, anticorpos anti-Sm e anti-ENA por hemoaglutinação, anticardiolipina IgM e IgG por ELISA e fator reumatoide por testes de fixação do látex e Waaler-Rose. Além disso, investigou-se a eletroforese de proteínas, crioglobulinas (por crioprecipitação) e complemento total CH100 (por imuno-hemólise), incluindo as frações C3 e C4 (por imunodifusão radial).

Nos exames laboratoriais, o envolvimento hepático foi definido pela presença de enzimas hepáticas elevadas [aspartato aminotransferase (AST), alanino aminotransferase (ALT) e fosfatase alcalina] e aumento de pelo menos duas vezes nos valores normais de bilirrubina em duas ocasiões.

Análise estatística

Os resultados são representados como a média ± desvio padrão para variáveis contínuas e número (%) para variáveis categóricas. As diferenças entre as variáveis categóricas foram avaliadas pelo teste exato de Fisher. Em todos os testes, foi considerada diferença estatisticamente significativa se p < 0,05.

Resultados

Trinta e quatro (85%) pacientes com LESJ e 16 (80%) indivíduos do grupo controle eram do sexo feminino, com média de 19 ± 4,4 anos e 17 ± 3,9 anos, respectivamente (p > 0,05). A média da duração da doença foi de 6 ± 3,2 anos.

As frequências de anti-VHC sérico positivo foram baixas e comparáveis nos grupos LESJ e controle (2,5% versus 0, p = 1). Os pacientes com LESJ tinham significativamente mais fatores de risco para infecção pelo VHC em comparação com o grupo controle, incluindo tratamento imunossupressor (90% versus 0, p < 0,0001), internação (50% versus 12,5%, p = 0,0006) e procedimentos invasivos (47,5% versus 12,5%, p = 0,001) (tabela 1). Nenhum participante tinha história de transfusão de produtos derivados do sangue contaminados ou relação sexual com um indivíduo com VHC.

Tabela 1
Dados demográficos e fatores de risco para infecção por VHC em 40 pacientes com LESJ e 20 controles

As internações dos 47 pacientes com LESJ foram decorrentes de infecções bacterianas ou recidivas da doença; no grupo controle, as cinco internações foram ocasionadas por procedimentos invasivos.

O único paciente com LES com anti-VHC detectável era uma do sexo feminino de 23 anos com ultrassonografia do fígado normal, apesar de níveis ligeiramente elevados de transaminases (AST 61 UI/L, ALT 58 UI/L) e hipergamaglobulinemia. Seus níveis de complemento eram normais, o ANA foi positivo (1/200) e todos os outros autoanticorpos, incluindo anticorpos antifígado e crioglobulinas, foram persistentemente negativos. No momento do estudo, tinha um leve eritema malar, fotossensibilidade e artrite com SLEDAI < 8, apesar de usar glicocorticoides em doses baixas e cloroquina.

A análise das manifestações clínicas dos pacientes com LES mostrou que 40 (100%) apresentavam manifestações cutâneas e articulares, 18 (46%) renais, 18 (46%) hematológicas e 15 (38%) neurológicas. Mais de um terço dos pacientes com LES (15/39; 38%) tinha doença ativa (SLEDAI ≥ 8). Metade deles estava em uso de altas doses de GC, que variavam de 0,5 a 1,0 mg/kg/dia, e 90% estavam sob tratamento imunossupressor durante um período médio de 1,5 ± 0,5 anos [azatioprina em 22 (56%), metotrexato em 2 (5%) e ciclofosfamida em 12 (31%); quatro faziam tratamento mensal com GC em pulso].

Outras análises laboratoriais revelaram que 10 (26%) crianças com LESJ tinham hipergamaglobulinemia e 12 (31%) tinham baixos níveis de complemento em comparação com nenhuma criança no grupo controle (p < 0,05). As crioglobulinas eram negativas nos soros de todos os pacientes com LES e controles. Os ANA, anti-dsDNA, anti-Sm e anti-Ro foram positivos nos soros de 100%, 50%, 27,5% e 17,5% dos pacientes com LES, respectivamente. Os autoanticorpos foram uniformemente negativos no grupo controle.

Discussão

Que se tem conhecimento, este é o primeiro estudo a demonstrar uma baixa frequência de sorologia anti-VHC em uma população de pacientes de alto risco com LESJ de um hospital universitário terciário.

A limitação do presente estudo é que hoje em dia todos os adolescentes e adultos jovens estão em risco de doenças sexualmente transmissíveis, como a hepatite C. Esse é um problema em todo o mundo e essa questão é importante não só para as famílias de baixa renda, mas para todas as famílias. Além disso, a baixa quantidade de indivíduos do grupo controle dificulta que se chegue a conclusões definitivas em relação ao VHC em indivíduos saudáveis.

A prevalência da infecção por VHC em doadores de sangue varia nas diferentes regiões geográficas brasileiras; vai de 0,8% em cidades menores, como Curitiba (PR), a 4,78% em cidades grandes como onde foi feito o estudo (São Paulo).1616 Parolin MB, Russo AA, de Almeida PT, Baldanzi GR, Lopes RW. Multicenter study on the prevalence of hepatitis C virus infection in blood donors in the city of Curitiba, Brazil. Arq Gastroenterol. 1999;36(3):117-21.,1717 Ferraz ML, Adania RS, Figueiredo VW, Lanzoni VP, Silva AE. Significance of the presence of antibodies against hepatitis C virus in asymptomatic blood donors. Braz J Med Biol Res. 1996;29(10):1275-82. Contudo, dados sobre a infecção pelo VHC em crianças e adolescentes saudáveis são escassos em todo o mundo. Um estudo feito por Martins1818 Martins RM, Porto SO, Vanderborght BO, Rouzere CD, Queiroz DA, Cardoso DD, et al. Short report: prevalence of hepatitis C viral antibodies among Brazilian children, adolescents and street youths. Am J Trop Med Hyg. 1995;53(6):654-5. em Goiânia, Centro-Oeste do Brasil, revelou uma prevalência de anticorpos anti-VHC nessa faixa etária que variou entre 0,2 e 3%, semelhante a crianças de um centro pediátrico de atenção terciário de Londres, Inglaterra (1,97%).1919 McKeown C, Thaker U, Cubitt WD, Novelli V. Retrospective screening for hepatitis C in a tertiary paediatric referral centre. Commun Dis Public Health. 2003;6(1):40-3.

A baixa frequência desses anticorpos nos pacientes com LESJ relatada neste estudo foi inesperada, em decorrência do fato de que todos os pacientes tinham baixos níveis sociais e pelo menos um tinha um fator de risco adicional conhecido para a transmissão do VHC, como o uso de fármacos imunossupressores, internações e intervenções invasivas.1818 Martins RM, Porto SO, Vanderborght BO, Rouzere CD, Queiroz DA, Cardoso DD, et al. Short report: prevalence of hepatitis C viral antibodies among Brazilian children, adolescents and street youths. Am J Trop Med Hyg. 1995;53(6):654-5.,2020 Alter MJ, Margolis HS, Krawczynski K, Judson FN, Mares A, Alexander WJ, et al. The natural history of community acquired hepatitis C virus in the United States. N Eng J Med. 1992;327(27):1899-905. Essa baixa prevalência pode ser parcialmente explicada pelo fatos de que os pacientes eram predominantemente do sexo feminino e de que a presença do vírus parece ser influenciada pelo gênero, mais frequente em homens.44 Agmon-Levin N, Ram M, Barzilai O, Porat-Katz BS, Parikman R, Selmi C, et al. Prevalence of hepatitis C serum antibody in autoimmune diseases. J Autoimmun. 2009;32(3–4):261-6. Isso concorda com o encontrado por Karakoc et al., que relataram uma frequência de 2,6% de anti-VHC por ELISA em uma coorte de 38 pacientes do sexo feminino com LES, semelhante à população da mesma região usada como controle.2121 Karakoc Y, Dilek K, Gullulu M, Yavuz M, Ersoy A, Akalyn H, et al. Prevalence of hepatitis C virus antibody in patients with systemic lupus erythematosus. Ann Rheum Dis. 1997;56(9):570-1. Além disso, em nosso ambulatório de reumatologia, os pacientes com LESJ são rotineiramente orientados quanto à atividade sexual e proteção contra doenças sexualmente transmissíveis; portanto, a baixa frequência de sorologia anti-VHC observada no grupo com LES pode estar relacionada a uma melhor orientação dos pacientes.

Por outro lado, a metodologia usada não parece explicar a quase ausência dessa reatividade no presente estudo, uma vez que as micropartículas são usadas para aumentar a superfície do reagente, o que possibilita altos níveis de sensibilidade e especificidade.2222 Kuo G, Choo QL, Alter HJ, Gitnick GL, Redeker AG, Purcell RH, et al. An assay for circulating antibodies to a major etiologic virus of human non-A, non-B hepatitis. Science. 1989;244(4902):362-4. Na verdade, nenhum dos nossos 15 pacientes com doença ativa (índice SLEDAI elevado) apresentou um teste anti-VHC positivo, apesar do relato prévio de sorologia anti-VHC falso-positiva relacionada com a atividade do lúpus.55 McMurray RW, Elbourne K. Hepatitis C virus infection and autoimmunity. Sem Arthritis Rheum. 1997;26(4):689-701.,1111 Kowdley KV, Subler DE, Scheffel J, Moore B, Smith H. Hepatitis C virus antibodies in systemic lupus erythematosus. J Clin Gastroenterol. 1997;25(2):437-9.,2323 Barron KS, Silverman ED, Gonzales J, Reveille JD. Clinical, serologic and immunogenetic studies in childhood-onset systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 1993;36(3):348-54.

Além disso, o VHC também tem sido associado a uma alta variedade de manifestações extra-hepáticas, incluindo a glomerulonefrite membranoproliferativa, a porfiria cutânea tardia, o líquen plano e a tireoidite.44 Agmon-Levin N, Ram M, Barzilai O, Porat-Katz BS, Parikman R, Selmi C, et al. Prevalence of hepatitis C serum antibody in autoimmune diseases. J Autoimmun. 2009;32(3–4):261-6.

5 McMurray RW, Elbourne K. Hepatitis C virus infection and autoimmunity. Sem Arthritis Rheum. 1997;26(4):689-701.

6 Pawlotsky JM, Roudot-Thoraval F, Simmonds P, Mellor J, Ben Yahia MB, André C, et al. Extrahepatic immunologic manifestations in chronic hepatitis C virus serotypes. Ann Intern Med. 1995;122(3):169-73.

7 Lee YH, Ji JD, Yeon JE, Byun KS, Lee CH, Song GG. Cryoglobulinemia and rheumatic manifestations in patients with hepatitis C virus infection. Ann Rheum Dis. 1998;57(12):728-31.

8 Mariette X, Zerbib M, Jaccard A, Schenmetzler C, Danon F, Clauvel JP. Hepatitis C virus and Sjogren's syndrome. Arthritis Rheum. 1993;36(2):280-1.
-99 Marcellin P, Descamps V, Martinot-Peignoux M, Larzul D, Xu L, Boyer N, et al. Cryoglobulinemia and vasculitis associated with hepatitis C virus infection. Gastroenterology. 1993;104(1):272-7. A notável capacidade do VHC de induzir autoanticorpos tem despertado interesse específico na possível associação entre o LES e a hepatite crônica causada pelo VHC.66 Pawlotsky JM, Roudot-Thoraval F, Simmonds P, Mellor J, Ben Yahia MB, André C, et al. Extrahepatic immunologic manifestations in chronic hepatitis C virus serotypes. Ann Intern Med. 1995;122(3):169-73. Na verdade, relatou-se que os pacientes com lúpus concomitantemente infectados pelo VHC expressam características distintas, com menor frequência de envolvimento cutâneo e títulos mais baixos de anticorpos anti-dsDNA e maior frequência de lesões hepáticas;2424 Feng H, Zhang GY, Xie HF, Chen ML, Shi W, Wang LY. Hepatitis C virus infection combined with systemic lupus erythematosus. Zhong Nan Da Xue Xue Bao Yi Xue Ban. 2006;31(6):891-3. esse padrão foi observado no único paciente com essa condição descrito no presente estudo. As crioglobulinas também são frequentemente encontradas nos pacientes VHC positivos, em contraste com os pacientes VHC negativos com LES,2525 Perlemuter G, Cacoub P, Sbaï A, Hausfater P, Thibault V, Le TH, et al. Hepatitis C virus infection in systemic lupus erythematosus: a case–control study. J Rheumatol. 2003;30(7):1473-8. embora essas não tenham sido encontradas em nosso paciente.

Em conclusão, este estudo sugere que o VHC não parece representar uma complicação importante no LESJ. Continua a ser necessário determinar a possível relevância desse vírus nas manifestações do lúpus.

References

  • 1
    Ramos-Casals M, Font J, Garcia-Carrasco M, Cervera R, Jiménez S, Trejo O, et al. Hepatitis C virus infection mimicking systemic lupus erythematosus: study of hepatitis C virus infection in a series of 134 Spanish patients with systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2000;43(12):2801-6.
  • 2
    Berkun Y, Zandman-Goddard G, Barzilai O, Boaz M, Sherer Y, Larida B, et al. Infectious antibodies in systemic lupus erythematosus patients. Lupus. 2009;18(13):1129-35.
  • 3
    Koziel MJ. Immunology of viral hepatitis. Am J Med. 1996;100(1):98-109.
  • 4
    Agmon-Levin N, Ram M, Barzilai O, Porat-Katz BS, Parikman R, Selmi C, et al. Prevalence of hepatitis C serum antibody in autoimmune diseases. J Autoimmun. 2009;32(3–4):261-6.
  • 5
    McMurray RW, Elbourne K. Hepatitis C virus infection and autoimmunity. Sem Arthritis Rheum. 1997;26(4):689-701.
  • 6
    Pawlotsky JM, Roudot-Thoraval F, Simmonds P, Mellor J, Ben Yahia MB, André C, et al. Extrahepatic immunologic manifestations in chronic hepatitis C virus serotypes. Ann Intern Med. 1995;122(3):169-73.
  • 7
    Lee YH, Ji JD, Yeon JE, Byun KS, Lee CH, Song GG. Cryoglobulinemia and rheumatic manifestations in patients with hepatitis C virus infection. Ann Rheum Dis. 1998;57(12):728-31.
  • 8
    Mariette X, Zerbib M, Jaccard A, Schenmetzler C, Danon F, Clauvel JP. Hepatitis C virus and Sjogren's syndrome. Arthritis Rheum. 1993;36(2):280-1.
  • 9
    Marcellin P, Descamps V, Martinot-Peignoux M, Larzul D, Xu L, Boyer N, et al. Cryoglobulinemia and vasculitis associated with hepatitis C virus infection. Gastroenterology. 1993;104(1):272-7.
  • 10
    Marchesoni A, Battafarano N, Podico M, Tosi S. Hepatitis C virus antibodies and systemic lupus erythematosus. Clin Exp Rheumatol. 1995;13(2):267-8.
  • 11
    Kowdley KV, Subler DE, Scheffel J, Moore B, Smith H. Hepatitis C virus antibodies in systemic lupus erythematosus. J Clin Gastroenterol. 1997;25(2):437-9.
  • 12
    Hochberg MC. Updating the American College of Rheumatology revised criteria for the classification of systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 1997;40(9):1725.
  • 13
    Almeida PM, Wickerrhauser H. Critério de classe econômica da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) e Associação Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercado (ABIPEME); 1991. p. 1–29.
  • 14
    Saraceno B, Kim JY. Alcohol use and sexual risk behaviour: a cross-cultural study in eight countries. World Health Organization; 2005. p. 54–6.
  • 15
    Bombardier C, Gladman DD, Urowitz MB, Caron D, Chang CH. Derivation of the SLEDAI. A disease activity index for lupus patients. Arthritis Rheum. 1992;35(6):630-40.
  • 16
    Parolin MB, Russo AA, de Almeida PT, Baldanzi GR, Lopes RW. Multicenter study on the prevalence of hepatitis C virus infection in blood donors in the city of Curitiba, Brazil. Arq Gastroenterol. 1999;36(3):117-21.
  • 17
    Ferraz ML, Adania RS, Figueiredo VW, Lanzoni VP, Silva AE. Significance of the presence of antibodies against hepatitis C virus in asymptomatic blood donors. Braz J Med Biol Res. 1996;29(10):1275-82.
  • 18
    Martins RM, Porto SO, Vanderborght BO, Rouzere CD, Queiroz DA, Cardoso DD, et al. Short report: prevalence of hepatitis C viral antibodies among Brazilian children, adolescents and street youths. Am J Trop Med Hyg. 1995;53(6):654-5.
  • 19
    McKeown C, Thaker U, Cubitt WD, Novelli V. Retrospective screening for hepatitis C in a tertiary paediatric referral centre. Commun Dis Public Health. 2003;6(1):40-3.
  • 20
    Alter MJ, Margolis HS, Krawczynski K, Judson FN, Mares A, Alexander WJ, et al. The natural history of community acquired hepatitis C virus in the United States. N Eng J Med. 1992;327(27):1899-905.
  • 21
    Karakoc Y, Dilek K, Gullulu M, Yavuz M, Ersoy A, Akalyn H, et al. Prevalence of hepatitis C virus antibody in patients with systemic lupus erythematosus. Ann Rheum Dis. 1997;56(9):570-1.
  • 22
    Kuo G, Choo QL, Alter HJ, Gitnick GL, Redeker AG, Purcell RH, et al. An assay for circulating antibodies to a major etiologic virus of human non-A, non-B hepatitis. Science. 1989;244(4902):362-4.
  • 23
    Barron KS, Silverman ED, Gonzales J, Reveille JD. Clinical, serologic and immunogenetic studies in childhood-onset systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 1993;36(3):348-54.
  • 24
    Feng H, Zhang GY, Xie HF, Chen ML, Shi W, Wang LY. Hepatitis C virus infection combined with systemic lupus erythematosus. Zhong Nan Da Xue Xue Bao Yi Xue Ban. 2006;31(6):891-3.
  • 25
    Perlemuter G, Cacoub P, Sbaï A, Hausfater P, Thibault V, Le TH, et al. Hepatitis C virus infection in systemic lupus erythematosus: a case–control study. J Rheumatol. 2003;30(7):1473-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    22 Out 2014
  • Aceito
    27 Out 2015
Sociedade Brasileira de Reumatologia Av Brigadeiro Luiz Antonio, 2466 - Cj 93., 01402-000 São Paulo - SP, Tel./Fax: 55 11 3289 7165 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: sbre@terra.com.br