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Polimorfismos no gene NAT2 (N-acetiltransferase 2) em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico

RESUMO

Objetivo:

Investigar potenciais associações de quatro substituições do gene NAT2 (N-acetiltransferase 2) e do fenótipo acetilador de NAT2 com o lúpus eritematoso sistêmico (LES) e os fenótipos clínicos.

Métodos:

A análise molecular das substituições 481C > T, 590G > A, 857G > A e 191G > A do gene NAT2 foi feita com a técnica de PCR-RFLP, usando DNA extraído de amostras de sangue periférico obtidas de pacientes com LES (n = 91) e controles (n = 97).

Resultados e conclusões:

O genótipo 857GA foi mais prevalente entre pacientes com LES não brancas (OR = 4,01, IC 95% = 1,18-13,59). O alelo 481 T apresentou associação positiva com as alterações hematológicas que envolvem mecanismos autoimunes, especificamente anemia hemolítica autoimune ou trombocitopenia autoimune (OR = 1,97; IC 95% = 1,01-3,81).

Palavras-chave:
Lúpus eritematoso sistêmico; N-acetiltransferase 2; Polimorfismo genético; Fenótipo acetilador; Fenótipos clínicos

ABSTRACT

Objective:

To investigate potential associations of four substitutions in NAT2 gene and of acetylator phenotype of NAT2 with systemic lupus erythematosus (SLE) and clinical phenotypes.

Methods:

Molecular analysis of 481C>T, 590G>A, 857G>A, and 191G>A substitutions in the NAT2 gene was performed by polymerase chain reaction-restriction fragment length polymorphism (PCR-RFLP) technique, from DNA extracted from peripheral blood samples obtained from patients with SLE (n = 91) and controls (n = 97).

Results and conclusions:

The 857GA genotype was more prevalent among nonwhite SLE patients (OR = 4.01, 95% CI = 1.18-13.59). The 481T allele showed a positive association with hematological disorders that involve autoimmune mechanisms, specifically autoimmune hemolytic anemia or autoimmune thrombocytopenia (OR = 1.97; 95% CI = 1.01-3.81).

Keywords:
Systemic lupus erythematosus; N-acetyltransferase 2; Genetic polymorphism; Acetylator phenotype; Clinical phenotypes

Introdução

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma síndrome autoimune, crônica e sistêmica. O acometimento de diversos tecidos e órgãos é resultante de processos inflamatórios crônicos gerados pela deposição de imunocomplexos decorrentes da produção elevada de autoanticorpos. Embora a etiologia do LES ainda não esteja completamente esclarecida, estudos apontam para uma complexa interação entre determinantes genéticos e ambientais.11 Sato EI. Lúpus eritematoso sistêmico; 2008. Available at: http://www.fmrp.usp.br/cg/novo/images/pdf/conteudo_disciplinas/lupuseritematoso [accessed 11.09.13].
http://www.fmrp.usp.br/cg/novo/images/pd...
Irradiação ultravioleta, medicamentos, agentes infecciosos, tabagismo e diversos agentes químicos têm sido descritos como potenciais fatores de risco para essa doença.22 Kiyohara C, Washio M, Honuchi T, Tada Y, Asami T, Ide S, et al. Cigarette smoking, N-acetyltransferase 2 polymorphisms and systemic lupus erythematosus in a Japanese population. Lupus. 2009;18:630-8. Estudos em diversas populações demonstraram que o hábito tabágico tem associação positiva com o LES, com razões de chances entre 1,6 e 6,6.22 Kiyohara C, Washio M, Honuchi T, Tada Y, Asami T, Ide S, et al. Cigarette smoking, N-acetyltransferase 2 polymorphisms and systemic lupus erythematosus in a Japanese population. Lupus. 2009;18:630-8.

3 Kiyohara C, Washio M, Horiuchi T, Asami T, Ide S, Atsumi T, et al. Cigarette smoking, alcohol consumption, and risk of systemic lupus erythematosus: a case-control study in a Japanese population. J Rheumatol. 2012;39:1363-70.

4 Wallace DJ. Principles of therapy and local measures. In: Wallace DJ, Hahn BH, editors. Dubois’ lupus erythematosus. 7th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2007. p.1132–44.

5 Costenbader KH, Kim DJ, Peerzada J, Lockman SL, Nobles-Knight D, Petri M, et al. Cigarette smoking and the risk of systemic lupus erythematosus: a meta-analysis. Arthritis Rheum. 2004;50:849-57.

6 Freemer MM, King TE Jr, Criswell LA. Association of smoking with dsDNA autoantibody production in systemic lupus erythematosus. Ann Rheum Dis. 2006;65:581-4.
-77 Washio M, Horiuchi T, Kiyohara C, Kodama H, Tada Y, Asami T, et al. Smoking, drinking, sleeping habits, and other lifestyle factors and the risk of systemic lupus erythematosus in Japanese females: findings from the KYSS study. Mod Rheumatol. 2006;16:143-50. Além de influenciar o desenvolvimento de LES, o hábito tabágico também tem sido associado à manutenção de atividade da doença e a menor resposta ao tratamento com antimaláricos.44 Wallace DJ. Principles of therapy and local measures. In: Wallace DJ, Hahn BH, editors. Dubois’ lupus erythematosus. 7th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2007. p.1132–44.,88 Ezra N, Jorizzo J. Hydroxychloroquine and smoking in patients with cutaneous lupus erythematosus. Clin Exp Dermatol. 2012;37:327-34.

A associação entre fatores genéticos e lúpus, especificamente o lúpus induzido pela hidralazina, foi avaliada primeiramente em 1970. Foi observada uma relação entre a enzima N-acetiltransferase 2 (NAT2), capaz de acetilar o medicamento, e o lúpus, com uma maior proporção do fenótipo acetilador lento entre os portadores da doença.99 Perry HM Jr, Tan EM, Carmody S, Sakamoto A. Relationship of acetyl transferase activity to antinuclear antibodies and toxic symptoms in hypertensive patients treated with hydralazine. J Lab Clin Med. 1970;76:114-25. Uma dose cumulativa menor de procainamida também se mostrou capaz de induzir lúpus em pacientes com fenótipo acetilador lento quando comparados com pacientes com fenótipo acetilador rápido.1010 Woosley RL, Drayer DE, Reidenberg MM, Nies AS, Carr K, Oates JA. Effect of acetylator phenotype on the rate at which procainamide induces antinuclear antibodies and the lupus syndrome. N Engl J Med. 1978;298:1157-9. Em outro estudo, no qual se considerou o hábito tabágico e o fenótipo da enzima NAT2, envolvida na acetilação de componentes da fumaça do cigarro, o maior risco (2,26 vezes) de desenvolvimento de LES atribuído a pacientes fumantes em relação aos não fumantes foi ainda maior (6,44 vezes) quando o fenótipo lento da enzima NAT2 foi observado.22 Kiyohara C, Washio M, Honuchi T, Tada Y, Asami T, Ide S, et al. Cigarette smoking, N-acetyltransferase 2 polymorphisms and systemic lupus erythematosus in a Japanese population. Lupus. 2009;18:630-8.

As enzimas N-acetiltransferases (NATs) participam da segunda fase do metabolismo de xenobióticos e a reação de acetilação pode ocorrer por duas vias distintas: por meio da O-acetilação, após a ação da enzima de primeira fase citocromo P450 (CYP450), e pela N-acetilação, quando a enzima atua sobre o composto em uma etapa anterior à ação da CYP450. Ambas as vias podem resultar na formação de aduto de DNA.1111 Windmill KF, Gaedigk A, Hall PM, Samaratunga H, Grant DM, McManus ME. Localization of N-acetyltransferases NAT1 and NAT2 in human tissues. Toxicol Sci. 2000;54:19-29.

Existem duas isoformas de enzimas N-acetiltransferases humanas, NAT1 e NAT2, que são diferentemente expressas de acordo com o tecido e que apresentam especificidade para substratos distintos.1111 Windmill KF, Gaedigk A, Hall PM, Samaratunga H, Grant DM, McManus ME. Localization of N-acetyltransferases NAT1 and NAT2 in human tissues. Toxicol Sci. 2000;54:19-29.

12 Meisel P, Giebel J, Peters M, Foerster K, Cascorbi I, Wulff K, et al. Expression of N-acetyltransferases in periodontal granulation tissue. J Dent Res. 2002;81:349-53.
-1313 Mitchell KR, Warshawsky D. Xenobiotic inducible regions of the human arylamine N-acetyltransferase 1 and 2 genes. Toxicol Lett. 2003;139:11-23. A acetilação de compostos aromáticos e aminas heterocíclicas, como o 4-aminobifenil, presente na fumaça do cigarro,1414 Wu H, Dombrovsky L, Tempel W, Martin F, Loppnau P, Goodfellow GH, et al. Structural basis of substrate-binding specificity of human arylamine N-acetyltransferases. J Biol Chem. 2007;282:30189-97. por meio da transferência do grupo acetil de uma molécula de acetil-CoA para o grupo amino livre do composto, é promovida preferencialmente pela NAT2.1414 Wu H, Dombrovsky L, Tempel W, Martin F, Loppnau P, Goodfellow GH, et al. Structural basis of substrate-binding specificity of human arylamine N-acetyltransferases. J Biol Chem. 2007;282:30189-97.

A isoforma NAT2 é codificada pelo gene NAT2, que está localizado no cromossomo 8 (8p22), juntamente com o gene NAT1 e o pseudogene NATP. O gene NAT2 é altamente polimórfico e a diversidade dos alelos descritos resulta da combinação de mutações pontuais de bases selecionadas (SNPs - Single Nucleotide Polymorphisms).1515 García-Martin E. Interethnic and intraethnic variability of NAT2 single nucleotide polymorphisms. Curr Drug Metab. 2008;9:487-97. O fenótipo da enzima pode ser determinado por SNPs existentes na região codificadora do gene, que influenciam a afinidade pelo substrato, a atividade catalítica e/ou a estabilidade da proteína resultante.1616 Rajasekaran M, Abirami S, Chen C. Effects of single nucleotide polymorphisms on human N-acetyltransferase 2 structure and dynamics by molecular dynamics simulation. PLoS ONE. 2011;6:e25801. Dentre as alterações nucleotídicas comumente usadas para inferir o fenótipo acetilador de NAT2, destacam-se 481C > T (rs1799929), 590G > A (rs1799930), 857G > A (rs1799931) e 191G > A (rs1801279).22 Kiyohara C, Washio M, Honuchi T, Tada Y, Asami T, Ide S, et al. Cigarette smoking, N-acetyltransferase 2 polymorphisms and systemic lupus erythematosus in a Japanese population. Lupus. 2009;18:630-8.,1717 Huang C, Chern H, Shen C, Hsu S, Chang K. Association between N-acetyltransferase 2 (NAT2) genetic polymorphism and development of breast cancer in post-menopausal Chinese women Taiwan, an area of great increase in breast cancer incidence. Int J Cancer. 1999;82:175-9.,1818 Hein DW, Doll M, Fretland AJ, Leff MA, Webb SJ, Xiao GH, et al. Molecular genetics and epidemiology of the NAT1 and NAT2 acetylation polymorphisms. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev. 2000;9:29-42.

Devido à importância do tema em questão e à ausência de pesquisas brasileiras, neste estudo foi feita a avaliação da presença de quatro substituições no gene NAT2 (481C > T, 590G > A, 857G > A e 191G > A) e do fenótipo da enzima NAT2 em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico residentes no Rio de Janeiro. Nossa população de estudo foi estratificada de acordo com o hábito tabágico e características étnicas. Nas nossas análises, foram consideradas ainda algumas características clínicas da doença.

Material e métodos

População de estudo

A população de estudo foi selecionada a partir de um grupo de mulheres participantes de um estudo anterior, que incluiu sequencialmente pacientes com LES (conforme os critérios de classificação do Colégio Americano de Reumatologia), acompanhadas regularmente na Disciplina de Reumatologia da UERJ, e mulheres sem lúpus, que haviam comparecido para consulta ginecológica de rotina em um setor da mesma universidade.1919 Klumb EM, Araújo ML Jr, Jesus GR, Santos DB, Oliveira AV, Albuquerque EM, et al. Is higher prevalence of cervical intraepithelial neoplasia in women with lupus due to immunosuppression?. J Clin Rheumatol. 2010;16:153-7.,2020 Klumb EM, Pinto AC, Jesus GR, Araujo M Jr, Jascone L, Gayer CR, et al. Are women with lupus at higher risk of HPV infection. Lupus. 2010;19:1485-91.

Aspectos clínicos e sociodemográficos, incluindo informações sobre cor da pele/etnia da participante e de seus pais, por autodeclaração, e hábito tabágico foram obtidos por meio da aplicação de um questionário semiestruturado. Os pacientes e controles foram classificados como brancos quando o indivíduo e seus pais eram brancos por autodeclaração e como não brancos quando o indivíduo e/ou pelo menos um dos pais era pardo ou negro por autodeclaração. Dados clínicos específicos foram obtidos a partir de revisão de prontuário.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE/UERJ #321 e #909) e todas as pacientes foram incluídas somente após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido previamente aprovado.

Análise molecular dos polimorfismos de NAT2

O DNA genômico foi extraído a partir das amostras de sangue periférico de acordo com Vargas-Torres et al. (2014).2121 Vargas-Torres SL, Portari EA, Klumb EM, Guillobel HCR, Camargo MJ, Russomano FB, et al. Association of CDKN2A polymorphisms with the severity of cervical neoplasia in a Brazilian population. Biomarkers. 2014;19:121-7. A análise das substituições 481C > T, 590G > A, 857G > A e 191G > A do gene NAT2 foi feita com a técnica de reação de polimerase em cadeia-polimorfismo de comprimento de fragmentos de restrição - PCR-RFLP (Polymerase Chain Reaction-Restriction Fragment Length Polymorphism), de acordo com Huang et al. (1999),1717 Huang C, Chern H, Shen C, Hsu S, Chang K. Association between N-acetyltransferase 2 (NAT2) genetic polymorphism and development of breast cancer in post-menopausal Chinese women Taiwan, an area of great increase in breast cancer incidence. Int J Cancer. 1999;82:175-9. com algumas modificações. A amplificação do DNA genômico foi feita com os seguintes iniciadores: 5′-GGAACAAATTGGACTTGG-3′ e 5′-TCTAGCATGAATCACTCTGC-3′ (Life Technologies). Após a amplificação, alíquotas do produto de PCR foram digeridas separadamente com as enzimas de restrição KpnI (481C > T) e BamHI (590G > A), seguida de análise eletroforética em gel de agarose, e MspI (857G > A) e TaqI (191G > A), seguida de análise por eletroforese em gel de poliacrilamida. Após a eletroforese, os géis foram corados com brometo de etídeo e os produtos das digestões foram visualizados sob luz UV. Para avaliação da reprodutibilidade da técnica, 10% das amostras foram selecionadas aleatoriamente e reavaliadas.

Classificação fenotípica

Neste trabalho, foi usada a classificação bimodal,1717 Huang C, Chern H, Shen C, Hsu S, Chang K. Association between N-acetyltransferase 2 (NAT2) genetic polymorphism and development of breast cancer in post-menopausal Chinese women Taiwan, an area of great increase in breast cancer incidence. Int J Cancer. 1999;82:175-9. em que os fenótipos intermediário e rápido são agrupados em uma única categoria. Assim, a presença e a ausência do alelo WT (ausência das quatro substituições de NAT2, 481C > T, 590G > A, 857G > A e 191G > A) definem os fenótipos rápido e lento, respectivamente. Na prática, amostras sem alguma das quatro alterações ou heterozigotas para apenas uma das substituições foram consideradas como tendo fenótipos acetiladores rápidos. Já as amostras homozigotas em apenas uma das substituições foram classificadas como fenótipos acetiladores lentos. A definição dos fenótipos de amostras apresentando duas ou mais alterações foi feita considerando-se todas as combinações possíveis de alelos e verificando sua frequência na nossa população, conforme a análise de estimativa de haplótipos feita a partir das frequências das substituições individuais, como descrito posteriormente. Combinações com pelo menos um haplótipo raro, com frequência estimada menor do que 0,01, foram consideradas improváveis e foram descartadas.

As amostras sem resultado para uma das quatro substituições analisadas cujo genótipo faltante não interferiria no fenótipo definido pelas outras três substituições foram incluídas no estudo.

Análise estatística

O teste t de Student foi usado para analisar as diferenças entre médias e desvios padrão e foi feito com o software GraphPad Prism versão 6.05 (GraphPad Software, Inc., San Diego, CA).

A população de estudo foi testada em relação ao princípio de Hardy-Weinberg pelo teste de qui-quadrado (χ2), admitiu-se grau de liberdade igual a 1, por meio do software SNPStats (Institut Català d’Oncologia, Barcelona, Spain).2222 Solé X, Guinó E, Valls J, Iniesta R., Moreno V. SNPStats: your web tool for SNP analysis. Available at: http://bioinfo.iconcologia.net/SNPstats_web [accessed 20.10.14].
http://bioinfo.iconcologia.net/SNPstats_...

As diferenças entre as frequências genotípicas e alélicas dos grupos de casos e de controles foram avaliadas pelo teste de χ2 ou teste exato de Fisher. As razões de chances (OR - odds ratio) e os intervalos de confiança (IC 95%) foram determinados para estimar a magnitude da associação das substituições de NAT2 com a presença de lúpus eritematoso sistêmico, usando, quando possível, os modelos genéticos codominante, dominante e recessivo. O alelo mais frequente e o genótipo homozigoto desse alelo foram considerados como referências. Esses testes foram feitos com o software GraphPad Prism versão 6.05 (GraphPad Software, Inc., San Diego, CA).

As análises de interações entre genótipos ou fenótipos de NAT2, hábito tabágico, características étnicas e o diagnóstico de LES, possíveis associações entre genótipos ou fenótipos de NAT2 e diversas características clínicas do LES, assim como a estimativa de haplótipos a partir das frequências dos genótipos correspondentes às quatros substituições, foram feitas com o software SNPStats (Institut Català d’Oncologia, Barcelona, Spain).2222 Solé X, Guinó E, Valls J, Iniesta R., Moreno V. SNPStats: your web tool for SNP analysis. Available at: http://bioinfo.iconcologia.net/SNPstats_web [accessed 20.10.14].
http://bioinfo.iconcologia.net/SNPstats_...
Foram considerados significativos valores de p menores do que 0,05.

Resultados

Nossa população de estudo foi composta por 188 participantes, 91 pacientes com LES (grupo de casos) e 97 mulheres sem LES (grupo controle). As médias de idade (± desvio padrão) das pacientes com LES (40,6 ± 11,1 anos; 20-69 anos) e dos controles (36,9 ± 10,8 anos; 17-66 anos), no momento de inclusão no estudo, foram significativamente diferentes (p = 0,0214). Embora as distribuições por faixa etária nos dois grupos também tenham se mostrado diferentes (p = 0, 0168), aproximadamente 60% das mulheres pertencentes aos dois grupos apresentaram idade entre 30 e 49 anos. O percentual de mulheres não brancas se mostrou diferente entre os dois grupos de estudo, com valor de p marginal (p = 0,0539). As características clínicas mais importantes observadas nas pacientes portadoras de LES podem ser observadas na tabela 1.

Tabela 1
Características clínicas das pacientes portadoras de lúpus eritematoso sistêmico avaliadas no estudo

Foram avaliadas 188 amostras de DNA, correspondentes à nossa população de estudo, em relação às quatro substituições de NAT2. Os perfis de digestão representativos de cada uma das análises podem ser visualizados na figura 1.

Figura 1
Análise molecular de quatro substituições no gene NAT2. (A) Fotografia de um gel de agarose 2% com brometo de etídeo para análise da substituição 481C > T. Linha 1 -controle negativo da reação de digestão (amplicon íntegro); Linha 2 - amostra representativa do genótipo NAT2 481CC (dois alelos com sítio de restrição da KpnI); Linha 3 - amostra representativa do genótipo NAT2 481CT (apenas um dos alelos com sítio de restrição da KpnI); Linha 4 - amostra representativa do genótipo NAT2 481TT (dois alelos sem sítio de restrição da KpnI); Linha 5 - padrão de peso molecular (GeneRuler™ 100 bp DNA Ladder, ready to use - Fermentas). (B) Fotografia de um gel de poliacrilamida 6% corado com brometo de etídeo para análise da substituição 590G > A. Linha 1 - controle negativo da reação (amplicon íntegro); Linha 2 - amostra representativa do genótipo NAT2 590GG (dois alelos com sítio adicional de restrição da TaqI); Linha 3 - amostra representativa do genótipo NAT2 590GA (apenas um dos alelos com sítio adicional de restrição da TaqI); Linha 4 - amostra representativa do genótipo NAT2 590AA (dois alelos sem sítio adicional de restrição da TaqI); Linha 5 - padrão de peso molecular (GeneRuler™ 100 bp DNA Ladder, ready to use -Fermentas). (C) Fotografia de um gel de agarose 1% corado com brometo de etídeo para análise da substituição 857G > A. Linha 1 - controle negativo da reação de digestão (amplicon íntegro); linhas 2 e 5 - amostras representativas do genótipo NAT2 857GG (dois alelos com o sítio adicional de restrição da BamHI); Linhas 3 e 4 - amostras representativas do genótipo NAT2 857GA (apenas um dos alelos com o sítio adicional de restrição da BamHI); Linha 6 - padrão de peso molecular (GeneRuler™ 100 bp DNA Ladder, ready to use - Fermentas). (D) Fotografia de gel de poliacrilamida 5% corado com brometo de etídeo para análise da substituição 191G > A-. Linha 1 - amostra representativa do genótipo NAT2 191GA (apenas um dos alelos com sítio de restrição da MspI); Linhas 2 e 3 - amostras representativas do genótipo NAT2 191GG (dois alelos com sítio adicional de restrição da MspI); Linhas 4 - controle negativo da reação de digestão (amplicon íntegro); Linha 5 - padrão de peso molecular (GeneRuler™ 1 kp DNA Ladder, ready to use - Fermentas).

O grupo controle obedeceu ao princípio de Hardy-Weinberg com respeito às substituições analisadas (tabela 2). As distribuições genotípicas e alélicas correspondentes às quatro substituições do gene NAT2, assim como as distribuições fenotípicas de NAT2 (tabela 2) e as frequências dos haplótipos (tabela 3) não apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre casos e controles.

Tabela 2
Distribuições genotípicas e alélicas relativas a cada uma das quatro substituições do gene NAT2 e o fenótipo acetilador nos grupos de casos (pacientes lúpicas) e controles
Tabela 3
Distribuições de haplótipos do gene NAT2 nos grupos de casos (pacientes lúpicas) e controles

A população de estudo foi subdividida, de acordo com as características étnicas, em dois subgrupos, brancas e não brancas. Não foi observada diferença significativa nas análises relacionadas às substituições 481C > T, 590G > A e 191G > A ou o fenótipo de NAT2. No entanto, com relação à substituição 857G > A, o genótipo GA foi mais prevalente no grupo de pacientes com LES em relação aos controles apenas entre as participantes não brancas (OR = 4,01, IC 95% = 1,18-13,59; p = 0,023) (tabela 4).

Tabela 4
Análise de interação entre os genótipos relativos às substituições no gene NAT2 ou o fenótipo de NAT2, a origem étnica nos grupos de casos (pacientes lúpicas) e controles

A população de estudo foi ainda estratificada de acordo com o hábito tabágico (fumantes ou ex-fumantes e não fumantes). Não foi observada qualquer associação dessa variável, juntamente com os genótipos de NAT2 ou o fenótipo acetilador da enzima, com o diagnóstico da doença (dados não mostrados).

As análises mencionadas anteriormente foram feitas apenas no grupo de pacientes com lúpus considerando as seguintes características clínicas: presença de eritema malar, lesões discoides, fotossensibilidade, úlcera oral, artrite, pleurite, pericardite, anemia hemolítica autoimune, trombocitopenia autoimune, psicose, convulsão, proteinúria e FAN positivo. O alelo 481 T se mostrou mais prevalente em pacientes com alterações hematológicas (anemia hemolítica autoimune ou trombocitopenia autoimune) quando comparadas com aquelas que não apresentavam essa característica (OR = 1,97; IC 95% = 1,02-3,82; p = 0,0477). Não se observou qualquer associação entre as demais substituições de NAT2 ou o fenótipo de NAT2 e as características clínicas das pacientes (dados não mostrados). Na análise que incluiu o hábito tabágico, o grupo de pacientes com LES foi subdividido em fumantes atuais e não fumantes, incluindo os ex-fumantes. O hábito tabágico, isoladamente, mostrou-se associado às lesões de lúpus discoide (OR = 8,62, IC 95% = 2,40-30,96; p = 0,0011) e proteinúria (OR = 0,17, IC 95% = 0,05-0,59; p = 0,0056). No entanto, a análise conjunta dos genótipos de NAT2, ou fenótipo acetilador, e o hábito tabágico não revelou qualquer associação com as características clínicas das pacientes portadoras de LES (dados não mostrados).

Discussão e conclusão

As variantes de NAT2 (N-acetiltransferase 2) têm sido amplamente estudadas para avaliar: a sua distribuição entre grupos étnicos distintos, o que pode estar relacionado também à exposição a diferentes fatores ambientais; e sua associação com uma vasta gama de doenças, incluindo as de origem autoimune. Neste trabalho, avaliamos a possível existência de associação entre os polimorfismos 481C > T, 590G > A, 857G > A e 191G > A do gene NAT2 e o lúpus eritematoso sistêmico.

Os estudos de associação entre NAT2 e o LES descritos na literatura, em geral, consideram o fenótipo acetilador, e não os polimorfismos de NAT2 isoladamente. Considerando que as substituições analisadas neste trabalho podem interferir nos níveis de expressão gênica por meio de mecanismos de regulação pós-transcricionais (481C > T), alterar a estabilidade da enzima (590G > A e 191G > A) ou modificar a seletividade e a atividade catalítica (857G > A),1616 Rajasekaran M, Abirami S, Chen C. Effects of single nucleotide polymorphisms on human N-acetyltransferase 2 structure and dynamics by molecular dynamics simulation. PLoS ONE. 2011;6:e25801. a análise de associação foi feita também com cada uma das substituições de modo isolado. Entretanto, nossos resultados revelaram ausência de associação entre as quatro substituições de NAT2 ou o fenótipo acetilador de NAT2 e a doença (tabela 1). A estimativa de haplótipos também não revelou qualquer associação com o LES (tabela 2), embora tenha auxiliado na classificação fenotípica das amostras, como mencionado anteriormente. Trabalhos recentes também têm usado esse recurso para inferir os fenótipos de NAT2 a partir dos dados de genotipagem.2323 Singla N, Gupta D, Birbian N, Singh J. Association of NAT2, GST and CYP2E1 polymorphisms and anti-tuberculosis drug-induced hepatotoxicity. Tuberculosis. 2014;94:293-8.,2424 Selinski S, Blaszkewicz M, Ickstadt K, Hengstler JG, Golka K. Refinement of the prediction of N-acetyltransferase 2 (NAT2) phenotypes with respect to enzyme activity and urinary bladder cancer risk. Arch Toxicol. 2013;87:2129-39.

Os polimorfismos no gene NAT2 analisados apresentam distribuições alélicas diferentes entre diversas populações. Sabbagh et al. (2011) fizeram um levantamento das frequências de diversos polimorfismos de NAT2, e também de seu fenótipo, em todo o mundo.2525 Sabbagh A, Darlu P, Crouau-Roy B, Poloni ES. Arylamine N-acetyltransferase 2 (NAT2) genetic diversity and traditional subsistence: a worldwide population survey. PLoS ONE. 2011;6:e18507. A distribuição mundial da frequência dos polimorfismos avaliados neste estudo encontra-se na tabela 5. As frequências observadas no grupo controle se assemelham àquelas encontradas em diversos continentes. O alelo NAT2 191A apresentou frequência de 0,02, igual à observada na América, enquanto a frequência do alelo NAT2 590A foi similar à observada na África (0,23 e 0,25, respectivamente). Já os alelos NAT2 481 T (0,35) e NAT2 857A (0,08) apresentaram frequências intermediárias em relação às encontradas na África e na América. A população do Rio de Janeiro, assim como a população brasileira em geral, é resultante da mistura de grupos étnicos, em particular africanos, europeus e ameríndios nativos. Estudos demonstram que a população do Rio de Janeiro apresenta, aproximadamente, 31% de marcadores de ancestralidade característicos de africanos, 55% de europeus e 14% de ameríndios.2626 Manta FSN, Pereira R, Vianna R, de Araújo ARB, Gitaí DLG, Silva DA, et al. Revisiting the genetic ancestry of Brazilians using autosomal AIM-Indels. PLoS ONE. 2013;8:e75145. Nessa mesma população, foi observado que indivíduos brancos, por autodeclaração, apresentavam 86% de ancestralidade europeia e 13% de ancestralidade africana ou ameríndia. Já os indivíduos autodeclarados não brancos, pardos ou negros, tinham 24% e 49% de ancestralidade africana e 67% e 43% de ancestralidade europeia, respectivamente.2727 Pena SDJ, Di Pietro G, Fuchshuber-Moraes M, Genro JP, Hutz MH, Kehdy FSG, et al. The genomic ancestry of individuals from different geographical regions of Brazil is more uniform than expected. PLoS ONE. 2011;6:e17063. Esses dados evidenciam o maior grau de miscigenação presente em pardos e negros autodeclarados. O alto grau de heterogeneidade étnica da nossa população de estudo poderia explicar os valores próximos, mas não iguais, àqueles observados em outras populações.

Tabela 5
Frequências dos alelos menos frequentes de NAT2 (481 T, 590A, 857A, 191A) observadas em diversas populações

Na literatura, existem relatos sobre a associação de polimorfismos de NAT2 com diversas doenças, tais como diferentes tipos de câncer,2828 Hein DW. N-acetyltransferase 2 genetic polymorphism: effects of carcinogen and haplotype on urinary bladder cancer risk. Oncogene. 2006;25:1649-58. periodontite2929 Meisel P, Timm R, Sawaf H, Fanghãnel J, Siegmund W, Kocher T. Polymorphism of the N-acetyltransferase (NAT2), smoking and the potential risk of periodontal disease. Arch Toxicol. 2000;74:343-8. e doenças autoimunes,33 Kiyohara C, Washio M, Horiuchi T, Asami T, Ide S, Atsumi T, et al. Cigarette smoking, alcohol consumption, and risk of systemic lupus erythematosus: a case-control study in a Japanese population. J Rheumatol. 2012;39:1363-70.,3030 Klareskog L, Padyukov L, Alfredsson L. Smoking as a trigger for inflammatory rheumatic diseases. Curr Opin Rheumatol. 2007;19:49-54.,3131 Mikuls TR, Levan T, Gould KA, Yu F, Thiele GM, Bynote KK, et al. Impact of interactions of cigarette smoking with NAT2 polymorphisms on rheumatoid arthritis risk in African Americans. Arthritis Rheum. 2012;64:655-64. que têm o hábito tabágico como fator de risco ambiental.2929 Meisel P, Timm R, Sawaf H, Fanghãnel J, Siegmund W, Kocher T. Polymorphism of the N-acetyltransferase (NAT2), smoking and the potential risk of periodontal disease. Arch Toxicol. 2000;74:343-8.,3232 Rouissi K, Ouerhani S, Marrakchi R, Ben Slama MR, Sfaxi M, Ayed M, et al. Combined effect of smoking and inherited polymorphisms in arylamine N-acetyltransferase 2, glutathione S-transferases M1 and T1 on bladder cancer in a Tunisian population. Cancer Genet Cytogenet. 2009;190:101-7. Já foi observada uma associação entre o fenótipo acetilador de NAT2, o tabagismo e o LES.22 Kiyohara C, Washio M, Honuchi T, Tada Y, Asami T, Ide S, et al. Cigarette smoking, N-acetyltransferase 2 polymorphisms and systemic lupus erythematosus in a Japanese population. Lupus. 2009;18:630-8. Entretanto, na população brasileira não há estudo acerca da associação dos polimorfismos no gene NAT2 e/ou do fenótipo acetilador com essa doença, especialmente em fumantes. Embora diversos autores considerem que a exposição aos componentes do tabaco possa constituir um “gatilho” para o desenvolvimento do LES,22 Kiyohara C, Washio M, Honuchi T, Tada Y, Asami T, Ide S, et al. Cigarette smoking, N-acetyltransferase 2 polymorphisms and systemic lupus erythematosus in a Japanese population. Lupus. 2009;18:630-8.

3 Kiyohara C, Washio M, Horiuchi T, Asami T, Ide S, Atsumi T, et al. Cigarette smoking, alcohol consumption, and risk of systemic lupus erythematosus: a case-control study in a Japanese population. J Rheumatol. 2012;39:1363-70.

4 Wallace DJ. Principles of therapy and local measures. In: Wallace DJ, Hahn BH, editors. Dubois’ lupus erythematosus. 7th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2007. p.1132–44.

5 Costenbader KH, Kim DJ, Peerzada J, Lockman SL, Nobles-Knight D, Petri M, et al. Cigarette smoking and the risk of systemic lupus erythematosus: a meta-analysis. Arthritis Rheum. 2004;50:849-57.

6 Freemer MM, King TE Jr, Criswell LA. Association of smoking with dsDNA autoantibody production in systemic lupus erythematosus. Ann Rheum Dis. 2006;65:581-4.
-77 Washio M, Horiuchi T, Kiyohara C, Kodama H, Tada Y, Asami T, et al. Smoking, drinking, sleeping habits, and other lifestyle factors and the risk of systemic lupus erythematosus in Japanese females: findings from the KYSS study. Mod Rheumatol. 2006;16:143-50. tivemos acesso às informações sobre o hábito de fumar por ocasião da coleta das amostras biológicas, e não à época de abertura da doença. Por isso, nossa população de estudo foi subdividida em dois subgrupos de acordo com o hábito tabágico, fumantes ou ex-fumantes e não fumantes. Nossos resultados não revelaram qualquer associação entre essas variáveis e a doença (dados não mostrados). É importante ressaltar que no momento em que uma paciente é diagnosticada recebe a orientação de não fumar, o que pode ter criado um viés na análise. De fato, um número menor de fumantes e ex-fumantes foi observado no grupo de casos, o que não está relacionado a uma proteção do hábito tabágico em relação ao desenvolvimento da doença. Cabe destacar que dados adicionais de tabagismo, incluindo o tempo de exposição e a quantidade de maços de cigarro/dia, no momento do primeiro sinal de manifestação da doença, poderiam contribuir para as análises feitas, considerando a possibilidade de diversos componentes da fumaça do cigarro serem diferencialmente metabolizados em função do fenótipo acetilador. Porém, o momento do início da doença é um aspecto complexo de ser estabelecido. É frequente um período de muitos meses entre o início dos sintomas e o diagnóstico da doença.

Além da diferença na frequência dos polimorfismos de NAT2 em diferentes populações, a incidência de LES é maior em pacientes etnicamente miscigenados.55 Costenbader KH, Kim DJ, Peerzada J, Lockman SL, Nobles-Knight D, Petri M, et al. Cigarette smoking and the risk of systemic lupus erythematosus: a meta-analysis. Arthritis Rheum. 2004;50:849-57. Por isso, neste estudo avaliamos se havia associação entre a distribuição dos polimorfismos de NAT2 e o LES em pacientes com essa característica étnica. Usamos a autodeclaração e informações sobre a cor de pele parental (pai e mãe) para definir a origem étnica das pacientes, como reportado na literatura,2121 Vargas-Torres SL, Portari EA, Klumb EM, Guillobel HCR, Camargo MJ, Russomano FB, et al. Association of CDKN2A polymorphisms with the severity of cervical neoplasia in a Brazilian population. Biomarkers. 2014;19:121-7. mas reconhecemos que outros métodos poderiam se apresentar mais adequados. Resultados significativos foram observados apenas em relação ao polimorfismo NAT2 857G > A. O genótipo NAT2 857GA representou potencial de risco para a doença em mulheres não brancas (tabela 4). A substituição NAT2 857G > A tem como consequência, na proteína, a troca do aminoácido glicina por glutamato (G286E). Essa alteração modifica o acesso ao sítio ativo da enzima, o que resulta em diminuição da seletividade e da capacidade catalítica.1616 Rajasekaran M, Abirami S, Chen C. Effects of single nucleotide polymorphisms on human N-acetyltransferase 2 structure and dynamics by molecular dynamics simulation. PLoS ONE. 2011;6:e25801. Portanto, o polimorfismo NAT2 857G > A está relacionado à redução no metabolismo de aminas aromáticas e heterocíclicas.1616 Rajasekaran M, Abirami S, Chen C. Effects of single nucleotide polymorphisms on human N-acetyltransferase 2 structure and dynamics by molecular dynamics simulation. PLoS ONE. 2011;6:e25801. A substituição 857G > A está presente em 11 alelos de NAT2, dos quais dois apresentam fenótipo acetilador lento e os demais ainda não tiveram seus fenótipos definidos.3333 Boukouvala S, Hein DW, Grant DM, Sim E, Minchin RF, Agúndez JAG, et al. The arylamine N-acetyltransferase gene nomenclature committee. Democritus University of Thrace. Available at: http://nat.mbg.duth.gr/Human%20NAT2%20alleles_2013.htm [accessed 26.11.14].
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O fenótipo acetilador lento poderia conferir maior risco para o LES, uma vez que o organismo permaneceria por mais tempo exposto, por exemplo, a componentes da fumaça do cigarro.

Cabe destacar que as variáveis origem étnica e genótipos de NAT2 857G > A não se mostraram isoladamente associadas ao LES. Entretanto, a literatura aponta para uma maior incidência de LES em indivíduos etnicamente miscigenados,11 Sato EI. Lúpus eritematoso sistêmico; 2008. Available at: http://www.fmrp.usp.br/cg/novo/images/pdf/conteudo_disciplinas/lupuseritematoso [accessed 11.09.13].
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e, em uma população de Ilhéus (Bahia/Brasil), o genótipo 857GA se mostrou mais prevalente em negros, quando comparados com brancos e ameríndios.3434 Talbot J, Magno LAV, Santana CVN, Sousa SMB, Melo PR, Correa RX, et al. Interethnic diversity of NAT2 polymorphisms in Brazilian admixed populations. BMC Genet. 2010;11:87. A ancestralidade da população do Rio de Janeiro se assemelha aos valores estimados para a população do Nordeste brasileiro.2626 Manta FSN, Pereira R, Vianna R, de Araújo ARB, Gitaí DLG, Silva DA, et al. Revisiting the genetic ancestry of Brazilians using autosomal AIM-Indels. PLoS ONE. 2013;8:e75145.,3535 Magalhães da Silva T, Sandhya Rani MR, de Oliveira Costa GN, Figueiredo MA, Melo PS, Nascimento JF, et al. The correlation between ancestry and color in two cities of Northeast Brazil with contrasting ethnic compositions. Eur J Hum Genet. 2015;23:984-9. Entretanto, tem sido sugerido que os grandes centros urbanos, como o Rio de Janeiro, apresentam padrões de misturas étnicas ainda mais diversos.2626 Manta FSN, Pereira R, Vianna R, de Araújo ARB, Gitaí DLG, Silva DA, et al. Revisiting the genetic ancestry of Brazilians using autosomal AIM-Indels. PLoS ONE. 2013;8:e75145.

Os órgãos acometidos e a intensidade das manifestações clínicas em pacientes com LES caracterizam a gravidade da doença e de alguma forma direcionam a seleção do esquema terapêutico. O único resultado significativo na análise de interação dos polimorfismos de NAT2 ou do fenótipo acetilador com características clínicas do LES foi a maior prevalência do alelo 481 T em pacientes com alterações hematológicas, especificamente anemia hemolítica autoimune ou trombocitopenia autoimune (dados não mostrados). A redução desses tipos celulares pode estar associada à imunossupressão, gerada pela gravidade da doença ou pelo uso de medicamentos imunomoduladores.3636 Bashal F. Hematological disorders in patients with systemic lupus erythematosus. Open Rheumatol J. 2013;7:87-95. Até o momento não há indícios do modo como os genótipos com o alelo 481T de NAT2 possam influenciar na redução dessas células sanguíneas. Necessita-se, sem dúvida, de maiores investigações.

No entanto, ao se considerar apenas o hábito tabágico, foi observada correlação com a presença de lúpus discoide (OR = 8,62; IC 95% 2,40-30,96; p = 0,0011) e proteinúria (OR = 0,17; IC 95% 0,05-0,59; p = 0,0056). Em diversos estudos, as alterações dermatológicas presentes em pacientes com LES foram associadas ao tabagismo e, como citado anteriormente, o tratamento dessas lesões em fumantes parece exigir doses mais altas de antimaláricos, em comparação com aqueles que não fumam.3737 Dutz J, Werth VP. Cigarette smoking and response to antimalarials in cutaneous lupus erythematosus patients: evolution of a dogma. J Invest Dermatol. 2011;131:1968-70.

38 Piette EW, Foering KP, Chang AY, Okawa J, Ten Have TR, Feng R, et al. Impact of smoking in cutaneous lupus erythematosus. Arch Dermatol. 2011;148:317-22.
-3939 Bourré-Tessier J, Peschken CA, Bernatsky S, Joseph L, Clarke AE, Fortin PR, et al. Association of smoking with cutaneous manifestations in systemic lupus erythematosus. Arthritis Care Res (Hoboken). 2013;65:1275-80. No nosso estudo, o número reduzido de pacientes com LES e fumantes (n = 7) não nos permitiu inferir se o hábito tabágico de fato influenciou na abordagem farmacológica. O hábito tabágico é associado também a alterações renais, como a proteinúria e a nefropatia.4040 Xu D, You X, Wang Z, Zeng Q, Xu J, Jiang L, et al. Chinese systemic lupus erythematosus treatment and research group registry VI: effect of cigarette smoking on the clinical phenotype of Chinese patients with systemic lupus erythematosus. PLoS ONE. 2015;10:e0134451. No entanto, neste estudo, das 71 pacientes com proteinúria apenas sete eram fumantes atuais, 13 eram ex- fumantes e a maioria nunca fumou.

Na população brasileira, são poucos os estudos sobre as distribuições genotípicas e alélicas de NAT2, além de não haver relatos a respeito da associação de polimorfismos em NAT2 e o LES. Nosso trabalho é pioneiro nessa área e o entendemos como formulador da hipótese de um potencial papel dos polimorfismos de NAT2 como fator associado à doença em nosso país e eventual associação com fenótipos clínicos específicos. Entretanto, mais estudos que envolvam populações maiores são necessários para confirmar a associação entre o polimorfismo NAT2 857G > A e o lúpus eritematoso sistêmico em mulheres brasileiras autodeclaradas não brancas, incluindo idealmente a caracterização étnica com o uso de marcadores de ancestralidade.

  • Financiamento
    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (476116/2009-0), Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) (E-26/170.922/2004 e E-26/111.334/2011), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Centro de Estudos em Reumatologia Pedro Ernesto (CERPE).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    10 Jun 2015
  • Aceito
    23 Jul 2016
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