Acessibilidade / Reportar erro

Evidência molecular de Borrelia burgdorferi sensu lato em pacientes no centro-oeste brasileiro

Resumo

Este estudo promoveu a detecção de DNA de Borrelia burgdorferi sensu lato em amostras de sangue e soro de pacientes com manifestações clínicas e epidemiologia compatíveis com a doença de Lyme-símile brasileira ou síndrome de Baggio-Yoshinari. Para tanto, foi feita triagem sorológica pelos métodos de Elisa e Western blotting e a identificação molecular de B. burgdorferi por meio da amplificação de um fragmento do gene conservado que sintetiza o gancho flagelar (flgE). Os resultados demonstraram sorologia positiva e, pela primeira vez, a presença de DNA de Borrelia burgdorferi sensu lato em humanos na Região Centro-Oeste do Brasil. A análise genética das sequências dos isolados mostrou similaridade às sequências disponíveis no GenBank. Pela análise filogenética inferida pela sequência parcial do gene flgE, a cepa brasileira agrupou-se com a sequência de B. burgdorferi sensu lato. Este estudo abre perspectivas promissoras e reforça a necessidade de estudos adicionais a fim de determinar as características epidemiológicas da doença, bem como o impacto da prevalência da borreliose brasileira no Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil.

Palavras-chave:
Borrelia burgdorferi; Doença de Lyme; flgE; Síndrome de Baggio-Yoshinari; Brasil

Abstract

We aimed to detect DNA of Borrelia burgdorferi in whole blood and serum samples of patients with clinical symptoms and epidemiology compatible with Brazilian Lyme-like disease. Four patients with positive epidemiological histories were recruited for the study. Blood samples were collected, screened by serologic testing by ELISA and Western blotting and molecular identification of B. burgdorferi by amplifying a fragment of the conserved gene that synthesizes the hook flagellar flgE. The results showed positive serology and for the first time, the presence of B. burgdorferi sensu lato in humans in the Midwest region of Brazil. The resulting sequences were similar to GenBank corresponding sequences of B. burgdorferi flgE gene. By neighbor-joining the phylogenetic analysis, the flgE sequence of the Brazilian strain clustered in a monophyletic group with the sequence of B. burgdorferi sensu lato under 100% bootstrap support. This study opens up promising perspectives and reinforces the need for additional studies to determine the epidemiological characteristics of the disease, as well as the impact of the prevalence of Brazilian borreliosis in Mato Grosso do Sul State, Brazil.

Keywords:
Borrelia burgdorferi; Lyme disease; flgE; Baggio-Yoshinari syndrome; Brazil

Introdução

A doença de Lyme (DL) é uma zoonose emergente de caráter multissistêmico, causada por espiroquetas do grupo Borrelia burgdorferi sensu lato e transmitida por carrapatos do complexo Ixodes ricinus.11 Steere AC. Lyme disease. N Engl J Med. 2001;345:115-25.

A distribuição geográfica da doença é ampla e as manifestações clínicas variam conforme a espécie do complexo B. burgdorferi sensu lato encontrada em determinada localidade geográfica.22 Qiu WG, Bruno JF, McCaig WD, Xu Y, Livey I, Schriefer ME, et al. Wide distribution of a high-virulence Borrelia burgdorferi clone in Europe and North America. Emerg Infect Dis. 2008;14:1097-104.,33 Rudenko N, Golovchenkoa M, Grubhoffera L, Oliver JH. Updates on Borrelia burgdorferi sensu lato complex with respect to public health. Ticks Tick Borne Dis. 2011;2:123-8. A diversidade etiológica e antigênica explica o organotropismo e o aparecimento de quadros clínicos e laboratoriais distintos nas diferentes regiões e representa um crescente desafio ao manejo dessa zoonose emergente.11 Steere AC. Lyme disease. N Engl J Med. 2001;345:115-25.

No Brasil, os primeiros casos foram descritos no Estado de São Paulo em 199244 Yoshinari NH, Oyafoso LK, Monteiro FGV, Barros PJL, Cruz FCM, Ferreira LGE, et al. Doença de Lyme: relato de um caso observado no Brasil. Rev Hosp Clin. 1993;48:170-4. e, desde então, outros casos têm sido descritos com técnicas sorológicas e moleculares em diversos estados brasileiros: Mato Grosso do Sul,55 Costa IP, Bonoldi VLN, Yoshinari NH. Perfil clínico e laboratorial da doença de Lyme-símile no Estado de Mato Grosso do Sul: análise de 16 pacientes. Rev Bras Reumatol. 2001;41:142-50.

6 Naka EM, Costa IP, Arão CAB, Soares CO, Yoshinari NH. Pesquisa de anticorpos anti-Borrelia e anti-Babesia em soro de crianças com manifestações clínicas e epidemiologia compatíveis com a Doença de Lyme-Símile no Estado de Mato Grosso do Sul. Rev Bras Reumatol. 2008;48:74-85.
-77 Rezende J, Lopes FA, Alves FCG, Bruno AR, Moreno SE, Costa IP, et al. Detection of Borrelia burgdorferi sensu lato in Mato Grosso do Sul, Brazil. JSM Trop Med Res. 2016;1:1003. Amazonas,88 Talhari S, Santos MNS, Talhari C, de Lima Ferreira LC, Silva RM, Zelger B, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in Brazil: occurrence confirmed by immunohistochemistry and focus floating microscopy. Acta Trop. 2010;115:4-200. Tocantins99 Carranza-Tamayo CO, Costa JNG, Bastos WM. Lyme disease in the state of Tocantins, Brazil: report of the first cases. Braz J Infect Dis. 2012;16:586-9. e Paraná,1010 Gonçalves DD, Moura RA, Nunes M, Carreira T, Vidotto O, Freitas JC, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in humans in a rural area of Paraná State, Brazil. Braz J Microbiol. 2015;46:571-5.

Diferenças observadas nas características epidemiológicas, clínicas e laboratoriais em relação à DL descrita no hemisfério norte permitiram caracterizar a doença de Lyme-símile brasileira (DLSB) ou síndrome de Baggio-Yoshinari,1111 Gauditano G, Bonoldi VLN, Costa IP, Barros-Battesti DM, Barros PJL, Fonseca AH. Síndrome de Lyme-símile ou complexo infecto-reacional do carrapato - Síndrome de Baggio-Yoshinari. Rev Paul Reumatol. 2005;4:16-7.,1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56. que, apesar do clássico eritema migratório e das habituais complicações sistêmicas encontradas na DL, cursa com grande frequência de recorrências e produção de autoanticorpos ao longo da prolongada evolução clínica.1313 Yoshinari NH. Uma longa jornada para entender a Borrelia burgdorferi no Brasil. Rev Bras Reumatol. 2009;49:483-6.

Estudos com métodos moleculares a partir de amostras de humanos com sintomatologia compatível com a DLSB têm reforçado a existência de casos de borreliose no Brasil.1010 Gonçalves DD, Moura RA, Nunes M, Carreira T, Vidotto O, Freitas JC, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in humans in a rural area of Paraná State, Brazil. Braz J Microbiol. 2015;46:571-5.,1414 Mantovani E, Marangoni RG, Gauditano G, Bonoldi VLN, Yoshinari NH. Amplification of the flgE gene provides evidence for the existence of a Brazilian borreliosis. Rev Inst Med Trop São Paulo. 2012;54:153-7. Dessa forma, o presente estudo objetivou investigar a presença de DNA de Borrelia burgdorferi em amostras de pacientes com diagnóstico clínico e sorológico de borreliose no Mato Grosso do Sul, Brasil.

Pacientes e métodos

Selecionamos quatro pacientes com manifestações clínicas e epidemiologia compatível com a DLSB atendidos pelo Serviço de Reumatologia do Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (Humap-UFMS). Todas as pacientes eram do sexo feminino com média de 33,3 (± 11,9) anos. Todas tinham histórico de picadas de carrapato e visitas a áreas de alto risco nas regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil e também preenchiam os critérios brasileiros para o diagnóstico de borreliose, tal como adotados pelo Laboratório de Investigação em Reumatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo (LIM-17), centro de referência no Brasil.1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56.,1515 Yoshinari NH, Mantovani E, Bonoldi VL, Marangoni RG, Gauditano G. Brazilian Lyme-like disease or Baggio-Yoshinari Syndrome: exotic and emerging Brazilian tick-borne zoonosis. Rev Assoc Med Bras. 2010;56:363-9.

Uma das pacientes estava na fase aguda (diagnosticada dentro de três meses do início da doença) e as outras três estavam na fase tardia (diagnosticados mais de três meses após o início da doença) da borreliose. A paciente que estava em fase de doença aguda apresentava sintomas flu-like, inclusive febre, cefaleia, mialgia e artralgia. As pacientes que estavam no estágio tardio da doença tinham desenvolvido artrite e apresentavam distúrbios cognitivos, manifestavam-se com sintomas inespecíficos, inclusive perda de memória, alterações do sono e alterações do humor, quadro depressivo com indiferença social e perda de apetite, além da recorrência de sintomas flu-like e fadiga crônica. Todas apresentaram resultados positivos nos testes sorológicos para B. burgdorferi G39/40, de origem americana, com metodologias Elisa e WB1616 Barros PJL [PhD Thesis] Caracterização clínica e laboratorial da doença de Lyme no Brasil, através de métodos imunológicos e reação em cadeia de polimerase. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2000. p. 163. de acordo com a padronização e interpretação recomendadas pelo laboratório de referência nacional LIM-17.1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56.,1515 Yoshinari NH, Mantovani E, Bonoldi VL, Marangoni RG, Gauditano G. Brazilian Lyme-like disease or Baggio-Yoshinari Syndrome: exotic and emerging Brazilian tick-borne zoonosis. Rev Assoc Med Bras. 2010;56:363-9.

Quarenta indivíduos em bom estado geral, sem histórico de picada de carrapato ou de viagem recente a áreas de alto risco, forneceram amostras de sangue e foram incluídos no grupo de controle. Trinta indivíduos eram do sexo feminino (75%) e dez eram do masculino (25%). A média foi de 34,6 (± 19,2) anos.

DNA foi extraído com kit QIAamp DNA Kit (QIAGEN®) a partir de amostras de 100 µL de sangue periférico e de soro, de acordo com as instruções do fabricante. A pureza (260 nm/280 nm) e a concentração (ng/µL) total de DNA foram determinadas por densidade óptica em espectrofotômetro (BioDrop® Touch Duo Spectrophotometer by BioDrop England).

Os iniciadores usados foram desenhados por Rezende et al. (Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI - Processo BR 10 2016 021522 6) para amplificação de um fragmento de 262 pb da região de codificação do gene conservado que sintetiza o gancho flagelar (flgE) de B. burgdorferi descrito por Sal et al.1717 Sal MS, Li C, Motalab MA, Shibata S, Aizawa SI, Charon NW. Borrelia burgdorferi uniquely regulates its motility genes and has an intricate flagellar hook basal body structure. J Bacteriol. 2008;190:1912-21. Foram usados os seguintes primers: flgE 262 FW (5′-TCCTCCGGGATTCATACAAG-3′) e flgE 262 Rev (5′-TGGGTGCAAATGTAGGTGAA-3′).

Amplificação foi feita em 25 µL de volume final de reação com 17,55 µL de H2O ultrapura livre de DNAse/RNAse, 2,50 µL de Tampão PCR 10x, 0,75 µL de MgCl2 (1,5 mM), 0,50 µL de dNTP mix (10 mM), 0,25 µL de cada primer (10 pmoles), 0,2 µL de Platinum™ TaqDNA Polymerase e 3 µL de DNA extraído da amostra.

As condições de ciclos da PCR consistiram de uma desnaturação inicial durante 3 minutos a 95 °C, seguida de 45 ciclos repetitivos, consistiu em desnaturação a 95 °C por 20 segundos, anelamento a 62 °C por 25 segundos, extensão a 72 °C por 25 segundos, seguidos por uma extensão final durante 5 minutos a 72 °C. As boas práticas de laboratório foram seguidas para evitar a contaminação e, em cada reação, foi incluído um controle negativo (água) para descartar possibilidade de contaminação. Borrelia anserina foi usada como um controle positivo em todas as reações. Os produtos de PCR foram analisados em eletroforese de gel de agarose a 1,5%, corado com SYBR Gold (Invitrogen) e analisados por transiluminação de UV.

As amostras positivas foram purificadas com QIAEX® II Gel Extraction Kit (Qiagen GmbH) e sequenciadas em sequenciador automático de DNA ABI Prism 3130 (Applied Biosystems®) em ambas as direções com BigDye Ready Reaction mix (ABI Corporation®). O alinhamento foi feito em software Clustal W2® com as sequências obtidas neste estudo e a sequência disponível no GenBank (Número de Acesso: CP009656.1). A análise filogenética foi inferida para o gene flgE com o programa MEGA 7.0® e um dendograma foi construído pelo método de Neighbor-Joining.1818 Saitou N, Nei M. The neighbor-joining method: a new method for reconstructing phylogenetic trees. Mol Biol Evol. 1987;4:406-25. Valores de confiança para os ramos individuais da árvore resultante foram determinados pela análise de bootstrap com 100 repetições.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) conforme indicado no protocolo de pesquisa número 1.065.681 de 15 de maio de 2015 - CAAE 42325815.1.0000.0021. Todos os controles e pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

A presença de anticorpos anti-Borrelia e a amplificação do DNA de Borrelia burgdorferi sensu lato para o gene flgE foram detectadas em todas as amostras analisadas (tabela 1).

Tabela 1
Resultado da sorologia para B. burgdorferi por Elisa e Western blotting e da PCR para o gene flgE em amostras de pacientes

Para a reação de PCR foram submetidas oito amostras (quatro sangue total e quatro soros) e 100% (4/4) das amostras de sangue total e 25% (1/4) das amostras de soro humano foram positivas (fig. 1).

Figura 1
PCR do gene flgE analisado em gel de agarose a 1,5% corado com brometo de etídeo: PM = peso molecular (100pb); C- = controle negativo; 1, 2, 3 e 4 = amostras de soro de pacientes com borreliose brasileira; 5, 6, 7 e 8 = amostras de sangue total de pacientes com borreliose brasileira; C+ = Borrelia anserina.

As sequências obtidas neste estudo apresentaram homologia com sequências de B. burgdorferi sensu lato depositadas no GenBank e possibilitaram a identificação em nível de espécie. A extensão sequenciada e avaliada do gene flgE de acordo com as sequências disponíveis no GenBank foi de 228 pb, que codificam 76 aminoácidos.

As sequências obtidas neste estudo foram depositadas no GenBank com os números de acesso KU712208, KU712209, KU712210, KY073265 e KY073266. As sequências foram agrupadas em um grupo monofilético pela análise filogenética, pelo método de Neighbor-Joining, com 100%de suporte bootstrap (fig. 2).

Figura 2
Árvore filogenética baseada na comparação da região codificadora do gene flgE de Borrelia burgdorferi.

Discussão

Nossos resultados fornecem evidência de Borrelia burgdorferi sensu lato em amostras de sangue total e a inédita detecção do DNA da espiroqueta amplificada para o gene flgE em amostra de soro humano em nossa região.

O gene que sintetiza o gancho flagelar (flgE) é um gene cromossômico único, de aproximadamente 1 kb, e que codifica para a proteína flagelina (41 kDa). Por ser altamente conservado, sua diversidade é valiosa para distinguir as espécies de Borrelia.1919 Picken RN. Polymerase chain reaction primers and probes derived from flagellin gene sequences for specific detection of the agents of Lyme Disease and North-American Relapsing Fever. J Clin Microbiol. 1992;30:99-114.,2020 Fukunaga M, Okada K, Nakao M, Konishi T, Sato Y. Phylogenetic analysis of Borrelia species based on flagellin gene sequences and its application for molecular typing of Lyme disease borreliae. Int J Syst Bacteriol. 1996;46:898-905. A análise filogenética com a sequência de genes da flagelina confirmou a homologia entre os isolados.

Todas as amostras de sangue total analisadas apresentaram positividade e apenas uma única amostra de soro foi positiva na reação de PCR. Coburn et al.2121 Coburn J, Leonh JM, Erban JK. Integrin αIIbβ3 mediates binding of the Lyme disease agent Borrelia burgdorferi to human platelets. Proc Natl Acad Sci U S A. 1993;90:7059-63. demonstraram a capacidade de ligação de B. burgdorferi às plaquetas do hospedeiro e Goodman et al.2222 Goodman JL, Bradley JF, Ross AE, Goellner P, Lagus A, Vitale B, et al. Bloodstream invasion in early Lyme disease: results from a prospective, controlled, blinded study using the polymerase chain reaction. Am J Med. 1995;99:6-12. afirmam que talvez esse seja o motivo da maior concentração de espiroquetas no plasma em relação ao soro e sugerem que o plasma seja a amostra preferencial para pesquisa.

No Brasil, pacientes diagnosticados com características sugestivas de borreliose apresentam histórico de exposição a carrapatos, quadro clínico sugestivo com frequentes recorrências, sorologia positiva mas com títulos baixos e pouco persistentes, inclusive a visualização de estruturas sugestivas de espiroquetas em amostras de sangue de pacientes com perfil clínico compatível.1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56.,1313 Yoshinari NH. Uma longa jornada para entender a Borrelia burgdorferi no Brasil. Rev Bras Reumatol. 2009;49:483-6.

A presença de anticorpos anti-Borrelia pelas técnicas de Elisa e WB tem sido demonstrada em pacientes sintomáticos e assintomáticos, com epidemiologia positiva de contato com carrapato, em diversas regiões do Brasil.55 Costa IP, Bonoldi VLN, Yoshinari NH. Perfil clínico e laboratorial da doença de Lyme-símile no Estado de Mato Grosso do Sul: análise de 16 pacientes. Rev Bras Reumatol. 2001;41:142-50.,66 Naka EM, Costa IP, Arão CAB, Soares CO, Yoshinari NH. Pesquisa de anticorpos anti-Borrelia e anti-Babesia em soro de crianças com manifestações clínicas e epidemiologia compatíveis com a Doença de Lyme-Símile no Estado de Mato Grosso do Sul. Rev Bras Reumatol. 2008;48:74-85.,88 Talhari S, Santos MNS, Talhari C, de Lima Ferreira LC, Silva RM, Zelger B, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in Brazil: occurrence confirmed by immunohistochemistry and focus floating microscopy. Acta Trop. 2010;115:4-200.

9 Carranza-Tamayo CO, Costa JNG, Bastos WM. Lyme disease in the state of Tocantins, Brazil: report of the first cases. Braz J Infect Dis. 2012;16:586-9.
-1010 Gonçalves DD, Moura RA, Nunes M, Carreira T, Vidotto O, Freitas JC, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in humans in a rural area of Paraná State, Brazil. Braz J Microbiol. 2015;46:571-5.

Entretanto, a observação de um padrão de reatividade sorológica diferente da DL com baixa sensibilidade e títulos variáveis levou à definição de critérios nacionais para interpretação dos testes sorológicos. O LIM-17, centro de referência no Brasil, adota um critério de avaliação do WB que se baseia não na presença de bandas específicas, mas no quantitativo de bandas, sendo considerado teste positivo a presença de duas bandas para IgM, quatro para IgG ou ainda um padrão combinado de uma banda IgM e duas bandas IgG.1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56.,1515 Yoshinari NH, Mantovani E, Bonoldi VL, Marangoni RG, Gauditano G. Brazilian Lyme-like disease or Baggio-Yoshinari Syndrome: exotic and emerging Brazilian tick-borne zoonosis. Rev Assoc Med Bras. 2010;56:363-9.

A descrição de espiroquetas na sua forma L, conhecidas como bactérias deficientes em parede celular e que podem alterar sua morfologia quando as condições de sobrevivência não são favoráveis,1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56. e a posterior detecção de Borrelia burgdorferi sensu stricto por Mantovani et al.1414 Mantovani E, Marangoni RG, Gauditano G, Bonoldi VLN, Yoshinari NH. Amplification of the flgE gene provides evidence for the existence of a Brazilian borreliosis. Rev Inst Med Trop São Paulo. 2012;54:153-7. auxiliaram no entendimento da maioria das controvérsias da DLSB: longa permanência das espiroquetas no hospedeiro devido aos mecanismos de evasão das defesas do hospedeiro,2323 Berende A, Oosting M, Kullberg BJ, Netea MG, Joosten LAB. Activation of innate host defense mechanisms by Borrelia. Eur Cytokine Netw. 2010;21:7-18. dificuldades para cultivá-las nos meios tradicionais como o BSK, embora descrevam a visualização de estruturas sugestivas de espiroquetas em amostras de sangue humano de pacientes com perfil clínico compatível1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56., baixa resposta imunológica contra a bactéria que ocasiona títulos baixos e pouco persistentes de anticorpos, desenvolvimento de autoimunidade1212 Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56. e resistência à sua eliminação dos hospedeiros, ocorrem recidivas clínicas e sorológicas.1313 Yoshinari NH. Uma longa jornada para entender a Borrelia burgdorferi no Brasil. Rev Bras Reumatol. 2009;49:483-6.,2323 Berende A, Oosting M, Kullberg BJ, Netea MG, Joosten LAB. Activation of innate host defense mechanisms by Borrelia. Eur Cytokine Netw. 2010;21:7-18.

24 Yoshinari NH, Bonoldi VLN, Barros-Battesti DM, Schumaker TTS. Doença de Lyme-símile no Brasil. Rev Bras Reumatol. 1999;39:57-8.
-2525 Shinjo SK, Gauditano G, Marchiori PE, Bonoldi VLN, Costa IP, Mantovani E, et al. Manifestação neurológica na Síndrome de Baggio-Yoshinari (Síndrome brasileira semelhante à doença de Lyme). Rev Bras Reumatol. 2009;49:492-505.

Esses resultados confirmam a existência de borreliose causada por B. burgdorferi sensu lato no Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil, com sintomas semelhantes a DL clássica e sugerem a necessidade de prosseguir com os estudos epidemiológicos, sorológicos e moleculares a fim de melhor caracterizar essa zoonose emergente na região, que raramente é fatal, porém de grande morbidade quando não adequadamente diagnosticada e tratada, devido às recorrências e complicações clínicas progressivas.

  • Financiamento
    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (Fundect).

Agradecimentos

À equipe do LIM-17 pelo treinamento e a cooperação durante este estudo e aos professores Dra. Susana Elisa Moreno (UCDB), Dra. Ana Rita Coimbra Motta de Castro (UFMS) e Dr. Cristiano Marcelo Espinola Carvalho (UCDB) pela inestimável colaboração.

References

  • 1
    Steere AC. Lyme disease. N Engl J Med. 2001;345:115-25.
  • 2
    Qiu WG, Bruno JF, McCaig WD, Xu Y, Livey I, Schriefer ME, et al. Wide distribution of a high-virulence Borrelia burgdorferi clone in Europe and North America. Emerg Infect Dis. 2008;14:1097-104.
  • 3
    Rudenko N, Golovchenkoa M, Grubhoffera L, Oliver JH. Updates on Borrelia burgdorferi sensu lato complex with respect to public health. Ticks Tick Borne Dis. 2011;2:123-8.
  • 4
    Yoshinari NH, Oyafoso LK, Monteiro FGV, Barros PJL, Cruz FCM, Ferreira LGE, et al. Doença de Lyme: relato de um caso observado no Brasil. Rev Hosp Clin. 1993;48:170-4.
  • 5
    Costa IP, Bonoldi VLN, Yoshinari NH. Perfil clínico e laboratorial da doença de Lyme-símile no Estado de Mato Grosso do Sul: análise de 16 pacientes. Rev Bras Reumatol. 2001;41:142-50.
  • 6
    Naka EM, Costa IP, Arão CAB, Soares CO, Yoshinari NH. Pesquisa de anticorpos anti-Borrelia e anti-Babesia em soro de crianças com manifestações clínicas e epidemiologia compatíveis com a Doença de Lyme-Símile no Estado de Mato Grosso do Sul. Rev Bras Reumatol. 2008;48:74-85.
  • 7
    Rezende J, Lopes FA, Alves FCG, Bruno AR, Moreno SE, Costa IP, et al. Detection of Borrelia burgdorferi sensu lato in Mato Grosso do Sul, Brazil. JSM Trop Med Res. 2016;1:1003.
  • 8
    Talhari S, Santos MNS, Talhari C, de Lima Ferreira LC, Silva RM, Zelger B, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in Brazil: occurrence confirmed by immunohistochemistry and focus floating microscopy. Acta Trop. 2010;115:4-200.
  • 9
    Carranza-Tamayo CO, Costa JNG, Bastos WM. Lyme disease in the state of Tocantins, Brazil: report of the first cases. Braz J Infect Dis. 2012;16:586-9.
  • 10
    Gonçalves DD, Moura RA, Nunes M, Carreira T, Vidotto O, Freitas JC, et al. Borrelia burgdorferi sensu lato in humans in a rural area of Paraná State, Brazil. Braz J Microbiol. 2015;46:571-5.
  • 11
    Gauditano G, Bonoldi VLN, Costa IP, Barros-Battesti DM, Barros PJL, Fonseca AH. Síndrome de Lyme-símile ou complexo infecto-reacional do carrapato - Síndrome de Baggio-Yoshinari. Rev Paul Reumatol. 2005;4:16-7.
  • 12
    Mantovani E, Costa IP, Gauditano G, Bonoldi VLN, Higuchi ML, Yoshinari NH. Description of Lyme disease-like syndrome in Brazil: is it a news tick borne disease or Lyme disease variation?. Braz J Med Biol Res. 2007;40:443-56.
  • 13
    Yoshinari NH. Uma longa jornada para entender a Borrelia burgdorferi no Brasil. Rev Bras Reumatol. 2009;49:483-6.
  • 14
    Mantovani E, Marangoni RG, Gauditano G, Bonoldi VLN, Yoshinari NH. Amplification of the flgE gene provides evidence for the existence of a Brazilian borreliosis. Rev Inst Med Trop São Paulo. 2012;54:153-7.
  • 15
    Yoshinari NH, Mantovani E, Bonoldi VL, Marangoni RG, Gauditano G. Brazilian Lyme-like disease or Baggio-Yoshinari Syndrome: exotic and emerging Brazilian tick-borne zoonosis. Rev Assoc Med Bras. 2010;56:363-9.
  • 16
    Barros PJL [PhD Thesis] Caracterização clínica e laboratorial da doença de Lyme no Brasil, através de métodos imunológicos e reação em cadeia de polimerase. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2000. p. 163.
  • 17
    Sal MS, Li C, Motalab MA, Shibata S, Aizawa SI, Charon NW. Borrelia burgdorferi uniquely regulates its motility genes and has an intricate flagellar hook basal body structure. J Bacteriol. 2008;190:1912-21.
  • 18
    Saitou N, Nei M. The neighbor-joining method: a new method for reconstructing phylogenetic trees. Mol Biol Evol. 1987;4:406-25.
  • 19
    Picken RN. Polymerase chain reaction primers and probes derived from flagellin gene sequences for specific detection of the agents of Lyme Disease and North-American Relapsing Fever. J Clin Microbiol. 1992;30:99-114.
  • 20
    Fukunaga M, Okada K, Nakao M, Konishi T, Sato Y. Phylogenetic analysis of Borrelia species based on flagellin gene sequences and its application for molecular typing of Lyme disease borreliae. Int J Syst Bacteriol. 1996;46:898-905.
  • 21
    Coburn J, Leonh JM, Erban JK. Integrin αIIbβ3 mediates binding of the Lyme disease agent Borrelia burgdorferi to human platelets. Proc Natl Acad Sci U S A. 1993;90:7059-63.
  • 22
    Goodman JL, Bradley JF, Ross AE, Goellner P, Lagus A, Vitale B, et al. Bloodstream invasion in early Lyme disease: results from a prospective, controlled, blinded study using the polymerase chain reaction. Am J Med. 1995;99:6-12.
  • 23
    Berende A, Oosting M, Kullberg BJ, Netea MG, Joosten LAB. Activation of innate host defense mechanisms by Borrelia. Eur Cytokine Netw. 2010;21:7-18.
  • 24
    Yoshinari NH, Bonoldi VLN, Barros-Battesti DM, Schumaker TTS. Doença de Lyme-símile no Brasil. Rev Bras Reumatol. 1999;39:57-8.
  • 25
    Shinjo SK, Gauditano G, Marchiori PE, Bonoldi VLN, Costa IP, Mantovani E, et al. Manifestação neurológica na Síndrome de Baggio-Yoshinari (Síndrome brasileira semelhante à doença de Lyme). Rev Bras Reumatol. 2009;49:492-505.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    22 Nov 2016
  • Aceito
    14 Abr 2017
Sociedade Brasileira de Reumatologia Av Brigadeiro Luiz Antonio, 2466 - Cj 93., 01402-000 São Paulo - SP, Tel./Fax: 55 11 3289 7165 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: sbre@terra.com.br