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A ‘‘EMPRESA NEGLIGENTE’’ E O ‘‘EVENTO ACIDENTAL’’: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS PARA UM GRUPO DE EX-FUNCIONÁRIOS DA SAMARCO1 1 O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de financiamento 001. 2 2 Recebido em 29/6/2020, aceito em 24/2/2021.

THE “NEGLIGENT COMPANY” END THE “ACCIDENTAL EVENT”: SOCIAL REPRESENTATIONS FOR A GROUP OF FORMER SAMARCO EMPLOYEES

LA ‘‘EMPRESA NEGLIGENTE’’ Y EL ‘‘EVENTO ACCIDENTAL’’: REPRESENTACIONES SOCIALES PARA UN GRUPO DE EX EMPLEADOS DE SAMARCO

RESUMO

O presente estudo tem como objetivo analisar as representações sociais (RS) da Samarco e do rompimento da barragem de Mariana (MG) para um grupo de ex-funcionários que aderiram ao Programa de Demissão Voluntária (PDV) da empresa em junho de 2016. Foi considerada a abordagem qualitativa como guia para a coleta e a análise de dado. Foram realizadas entrevistas individuais com dez ex-funcionários que aderiram ao PDV. As entrevistas foram transcritas e submetidas à análise inicial do programa Iramuteq. Posteriormente foram interpretadas a partir do aporte teórico da Teoria das Representações Sociais (TRS). Os resultados evidenciaram que os entrevistados procedentes das áreas da operação e da saúde e segurança compreenderam o desastre como um fenômeno acidental e os entrevistados procedentes das áreas administrativas interpretaram o desastre como resultado de uma postura negligente da mineradora. O estudo mostrou a influência das diversas informações presentes na mídia, nas interpretações do fato por pessoas próximas (família e amigos) e na gestão simbólica por parte da empresa na construção dessas RS. A pesquisa contribui ao aprofundara discussão sobre a dinâmica de construção e (re)reorganização de RS em diferentes grupos a partir de um episódio marcante e as múltiplas influências presentes nesse processo.

Palavras-chave:
Desastre; Barragem; Samarco; Representações Sociais

ABSTRACT

The present study aims to analyze the social representations (SR) of Samarco and the rupture of the Mariana tailing dam (MG) for a group of former employees who joined the company's Voluntary Dismissal Program (VDP) in June 2016. The qualitative approach was considered as a guide for data collection and analysis. Individual interviews were conducted with ten former employees who joined the VDP. The interviews were transcribed and submitted to the initial analysis of the Iramuteq program. Subsequently, they were interpreted based on the Theory of Social Representations (TRS). The results showed that interviewees from the areas of operation and health and safety understood the disaster as an accidental phenomenon, and interviewees from the administrative areas interpreted the disaster as a result of the mining company´s negligence. The study showed the influence in the construction of these SR by various information present in the media, in the interpretations of the fact by close people (family and friends), and the symbolic management by the company. The research contributes to deepening the discussion about the SR's dynamics of construction and (re)organization in different groups from an unusual episode and the multiple influences present in this process.

Keywords:
Disaster; Tailing Dam; Samarco; Social Representations

RESUMEN

El presente estudio tiene como objetivo analizar las representaciones sociales (RS) de Samarco y la ruptura de la represa Mariana (MG) para un grupo de ex empleados que se unieron al Programa de Despido Voluntario (PDV) de la empresa en junio de 2016. el enfoque cualitativo se considera una guía para la recopilación y el análisis de datos. Se realizaron entrevistas individuales con diez ex empleados que ingresaron al PDV. Las entrevistas fueron transcritas y sometidas al análisis inicial del programa Iramuteq. Posteriormente, se interpretaron a partir del aporte teórico de la Teoría de las Representaciones Sociales (TRS). Los resultados mostraron que los entrevistados de las áreas de operación y salud y seguridad entendieron el desastre como un fenómeno accidental y los entrevistados de las áreas administrativas interpretaron el desastre como resultado de la actitud negligente de la empresa minera. El estudio mostró la influencia de las distintas informaciones presentes en los medios de comunicación, en las interpretaciones del hecho por personas cercanas (familiares y amigos) y en la gestión simbólica de la empresa en la construcción de estas RS. La investigación contribuye a profundizar la discusión sobre las dinámicas de construcción y (re)organización de las RS en diferentes grupos a partir de un episodio destacable y las múltiples influencias presentes en este proceso.

Palabras clave:
Desastre; Represa; Samarco; Representaciones Sociales

INTRODUÇÃO

A tarde do dia 5 de novembro de 2015 representou um marco na vida de milhares de pessoas que, de alguma forma, foram impactadas pelo maior desastre ambiental da história do Brasil e o pior do mundo desde os anos de 1960 (ANA, 2016). O rompimento da barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco e localizada no município de Mariana (MG), liberou um volume estimado de 39,2 milhões de metros cúbicos de rejeitos de lama proveniente das atividades de extração do minério, ocasionando 19 mortes e uma intensa destruição nos povoados próximos à barragem e diversos outros impactos que se estenderam por 650 km (ROJAS; PEREIRA, 2017ROJAS, C. M.; PEREIRA, D. B. O rompimento da barragem de Fundão/MG: reflexões preliminares sobre a modus operandi da Samarco/Vale/BHP. In: ANPOCS, 2017, Caxambu. Anais da ANPOCS. Caxambu: ANPOCS, 2017.).

A Samarco é uma empresa brasileira de mineração fundada em 1977, de capital fechado e controlada por duas acionistas em partes iguais: a australiana BHP Billiton Ltda e a brasileira Vale S.A. Seu principal produto são pelotas de minério de ferro e as suas duas unidades operacionais ficam localizadas nos municípios de Mariana (MG) e Anchieta (ES). A barragem de Fundão, assim como as suas outras duas barragens, Santarém e Germano, foram construídas para acomodar os rejeitos oriundos da extração e beneficiamento de minério de ferro (SAMARCO, 2016).

Bento Rodrigues foi a primeira região a ser afetada diretamente pela lama. A região era um distrito do município de Mariana (MG), com aproximadamente 600 habitantes. Devido à gravidade do desastre, o distrito desapareceu soterrado pela lama, deixando todos os sobreviventes desabrigados. Além das irreparáveis perdas humanas, os danos foram muito além do diâmetro atingido diretamente pelo rompimento: a lama tóxica chegou ao rio Doce, cuja bacia hidrográfica abrange e abastece mais de 200 municípios dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, causando impactos sociais, ambientais e econômicos com desdobramentos até os dias atuais.

Desde o ocorrido, emergiram debates na sociedade de forma geral. Veio à mídia, por exemplo, que o sistema de aterro hidráulico utilizado em Mariana (MG) é o mais comum para esse tipo de construção e decorre de um risco assumido deliberadamente pelas mineradoras, uma vez que, embora haja sistemas mais seguros, eles elevam os custos da operação, comprometendo a lucratividade das empresas (GONÇALVES; VESPA; FUSCO, 2015GONÇALVES, E.; VESPA, T.; FUSCO, N. Tragédia Evitável. Revista Veja. Minas Gerais, Edição 2.452, ano 48, n 46, p. 70-71, 2015.). Além disso, o desastre de Mariana (MG) não se configurou como um caso isolado, o que ficou evidente com o mapeamento de pelo menos mais 50 barragens de rejeitos consideradas de alto risco pela Agência Nacional de Mineração, além de um novo rompimento de barragem em 2019, na cidade de Brumadinho (MG), também sob o controle da Vale (JUCÁ, 2020).

O debate acadêmico tem-se dado de forma ampla, problematizando o contexto, as causas e as consequências socioambientais. Há estudos que se dedicam ao mapeamento do impacto a atividades como agricultura e pesca (FERNANDES et al, 2016FERNANDES, G. et al. Deep into the mud: ecological and socio-economic impacts of the dam breach in Mariana, Brazil. Brazilian Journal of Nature Conservation, v. 14, n. 2, 2016, p. 35-45.), à discussão jurídica do evento enquanto Ecocídio, em razão do dano ambiental de grande proporção (MULITERNO; STOHRER, 2018MULITERNO, T.; STOHRER, C. M. S. O dano ambiental de grande proporção como ecocídio e a possibilidade de punição pelo Tribunal Penal Internacional. Ponto de Vista Jurídico, v. 7, n. 2, p. 34-49, 2018.), à dissonância entre discurso e prática a partir da análise dos relatórios aos stakeholders (COSENZA et al, 2018COSENZA, J. P.; RIBEIRO, C. M. A.; LEVYA, A.; DIOSA, S. A. CSR Sensemaking on the collapse of the Samarco’s tailings dam. Rev. Cont Org, v. 12, p. 1-16, 2018.), à problematização do apagamento das fronteiras entre as esferas estatal e empresarial, que engendra a negligência do capital privado em suas operações e a inoperância do poder público nas ações de fiscalização (LACAZ, PORTO; PINHEIRO, 2017LACAZ, F. A. C.; PORTO, M. F.; PINHEIRO, T. M. M. Tragédias brasileiras contemporâneas: o caso do rompimento da barragem de rejeitos de Fundão/Samarco. Rev Bras Saúde Ocup, v. 42, n. 9, p. 1-12, 2017.), e ao silenciamento de conflitos e tensões com o objetivo da expansão de vários setores produtivos, inclusive o setor minerador (DEL GAUDIO; FREITAS; PEREIRA, 2015DEL GAUDIO, R. S.; FREITAS, E. de S. M.; PEREIRA, D. B. Desenvolvimento sustentável e ideologia: interpelações. Lutas Sociais, v. 19, n. 35, p. 98-111, 2015.). Na área de Administração no Brasil vêm ganhando fôlego problematizações sobre o caso com destaque as análises dos discursos corporativos e midiáticos produzidos a partir do rompimento da barragem. Medeiros, Alcadipani e Oliveira (2018MEDEIROS, C. R. O.; ALCADIPANI, R.; OLIVEIRA, L. B. Mitos no Desengajamento Moral: Retóricas da Samarco em um Crime Corporativo. RAC, v. 22, n. 1, art. 4, pp. 70-91, 2018.) mobilizam um referencial teórico que discute crimes corporativos para explorar os mecanismos de desengajamento moral utilizados pela Samarco para dissuadir a sociedade quanto a sua responsabilidade. Saraiva e Ferreira (2018SARAIVA, C. M.; FERREIRA, P. T. M. A Lama da Samarco e o Crime Corporativo: uma reflexão necessária. Administração Pública e Gestão Social, v. 9, n. 2, p. 75-83, 2018.) ponderam teoricamente que, ainda que à época não tenha sido juridicamente determinada a culpabilidade da empresa, é possível aproximar o ocorrido a categoria de crimes corporativos, considerando o favorecimento do processo de rompimento não apenas por atitudes individuais de seus agentes, mas por um conjunto de ações institucionais que incluem tentativas deliberadas de neutralizar seu papel no rompimento. Souza, Tarifa e Panhoca (2019SOUZA, F. M.; TARIFA, M. R.; PANHOCA, L. O rompimento da barragem de Mariana (MG): mudanças no disclosure ambiental do setor de mineração. Revista de Gestão Ambiental e Sustentabilidade, v.8, n.1, p. 172-187, 2019.) analisaram as demonstrações financeiras e relatórios de sustentabilidade de empresas mineradoras e concluem que estas utilizam estratégias de ocultação e atribuição a fatores externos, apresentando um discurso enviesado e seletivo sobre os impactos ambientais de suas operações. Freitas et al (2019FREITAS, C. H. G.; DORNELA, F. J., SILVA, M. C., JÚNIOR, V. M. V.; MEDEIROS, C. R. O. Representações discursivas da Veja e Carta Capital sobre o rompimento da barragem da Samarco: crime e desastre. Revista Ciências Administrativas, v. 25, n. 2, p. 1-16, 2019.) analisaram as representações sobre o ocorrido em duas revistas de circulação nacional (Veja e Carta Capital) e concluíram que ambas questionam a responsabilidade social e tecem uma imagem negativa da empresa, o que, segundo os autores, evidencia um discurso social de que não é mais possível avaliar o desempenho de uma empresa sem considerar os efeitos de sua atividade sobre a sociedade e meio.

A Farol: Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, importante periódico científico dos Estudos Organizacionais brasileiros, publicou em 2019 um dossiê que tem como ponto central as relações entre poder público, corporações e sociedade civil em torno de conflitos socioambientais em territórios marcados pela atividade mineradora (FAROL, 2019). Perspectivas críticas estão presentes nas discussões sobre a prevalência da racionalidade instrumental e seu papel na supressão da individualidade das pessoas que participaram do movimento “Justiça sim, desemprego não! #FicaSamarco” organizado pela ACIAM (Associação Comercial de Mariana) e por representantes da OAB presentes em Mariana (MG) (FERREIRA; SARAIVA, 2019FERREIRA, P. M.; SARAIVA, C. M. A catástrofe como perpetuadora da sociedade unidimensional. Farol, v. 6, n. 15, p. 42-78, abr. 2019.); nas reflexões sobre o espaço contraditório na produção e circulação de representações dos atingidos pela mineração (ANDRADE; ALCÂNTARA; PAIVA, 2019ANDRADE, L. F. S.; ALCÂNTARA, V. C.; PAIVA, A. L. Contradições do espaço social: estudo das representações contrárias à mineração de ouro em Paracatu, MG. Farol, Belo Horizonte, v. 6, n. 15, p. 79-144, 2019.); na análise do processo de construção de significados por meio da subjetividade de agentes públicos que atuaram no socorro aos atingidos pela lama (RIBEIRO et al, 2019RIBEIRO, J. V. C.; BOAVA, D. L. T.; MACEDO, F. M. F.; PEREIRA, J. J. O rompimento da barragem da Samarco e a construção de significados: o caso de agentes públicos de órgãos de amparo e socorro aos atingidos pela lama. Farol, v. 6, n. 15, p. 115-162, 2019.); e na problematização do papel da Responsabilidade Social Empresarial na perpetuação de cenários de violação crônica de direitos humanos (PINTO, 2019PINTO, J. Reflexões sobre o papel da SER em cenários de conflito socioambiental: o caso da Siderúrgica CSA na periferia carioca de Santa Cruz. Farol, v. 6, n. 15, p. 163-175, 2019.).

As produções apresentadas evidenciam o que vem se tornando um robusto debate acadêmico sobre crimes corporativos que em geral aborda posicionamentos e ações empresariais ou do poder público e discursos midiáticos produzidos em virtude dos eventos catastróficos recentes. No caso específico dos rompimentos das barragens ocorridos no Brasil, o acesso a trabalhadores das corporações envolvidas para a realização de pesquisas é algo desafiador, por um lado devido à imagem negativa das empresas, e por outro devido a todos os esforços de gerenciamento de impressão por elas empreendidos. Assim, o presente estudo representa uma contribuição à literatura em Estudos Organizacionais, não apenas pelo acesso a trabalhadores que estavam vinculados à Samarco na época, mas também por investigar a dinâmica de reorganização das representações sociais dessas pessoas a partir de um episódio tão marcante na vida organizacional. A presente pesquisa tem como objetivo, portanto, analisar as representações sociais da Samarco e do desastre a partir da perspectiva de um grupo de ex-funcionários que aderiram ao Programa de Demissão Voluntária (PDV) lançado pela empresa em junho de 20166 6 O referido programa consistiu em oferecer alguns benefícios, além dos definidos pela CLT, para aqueles que aderissem ao programa até final de julho de 2016. Na época, o número de empregados era na ordem de 3500 funcionários. Aderiram ao PDV um total de 924 pessoas, sendo 455 no Espírito Santo e 469 em Minas Gerais (SAMARCO, 2016). .

Para a análise empreendida, optou-se por utilizar como aporte teórico a Teoria das Representações Sociais (TRS), por oferecer um quadro de referência mais adequado para compreender condutas humanas de forma sensível ao contexto cultural e situacional no qual são produzidas (SAMMUT et al., 2015SAMMUT, G. S.; ANDREOULI, E., GASKELL, G., & VALSINER, J. Social representations: a revolutionary paradigm? In: ANDREOULI, E.; GASKELL, G.; VALSINER, J. (Org.). The Cambridge Handbook of Social Representations. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 3-11.). Para o alcance do objetivo proposto, utilizou-se a abordagem qualitativa de pesquisa que assume a postura teórica da composição cultural da realidade social e subjetiva (FLICK, 2004FLICK, U. Uma introdução à pesquisa qualitativa. 2ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2004.). Foram realizadas 10 entrevistas com ex-funcionários que aderiram ao PDV, material que foi transcrito, submetido ao programa Iramuteq e analisado com o aporte da TRS.

A TRS é uma teoria frequentemente mobilizada nos Estudos Organizacionais (MARTINS-SILVA et al, 2016MARTINS-SILVA, P. O.; SILVA JUNIOR, A. D.; PERONI, G. G. H.; MEDEIROS, C. P. D.; VITÓRIA, N. O. D. Teoria das representações sociais nos estudos organizacionais no Brasil: análise bibliométrica de 2001 a 2014. Cad. EBAPE.BR, v. 14, n. 4. 2016.) que permite compreender os processos de produção e reprodução de sentidos compartilhados pelos sujeitos analisados (CAVEDON, 2008CAVEDON, N. R. Antropologia para Administradores. Porto Alegre: EdUFRGS, 2008.). Entender os processos de desestabilização e estabilização, assim como da tensão e conflito na produção e alteração de tais representações permite aproximar-se do contexto organizacional dos sujeitos estudados e compreender os pontos de contato desse contexto com o mundo social de forma mais ampla.

Nesse sentido, em termos de contribuições, destacamos que este artigo apresenta relevância ao aprofundar-se na discussão sobre a dinâmica de construção, organização e reorganização das representações sociais a partir de um episódio marcante, em um contexto organizacional caracterizado pela influência de um elemento estranho, que no caso estudado foi o desastre. Embora a mineração seja uma atividade de risco em que acidentes ocorrem, o tipo de desastre ocorrido não é algo usual neste tipo de atividade. A literatura já mostrou que a presença de um elemento estranho em um campo representacional gera um grande número de racionalizações, muitas vezes contraditórias e que podem resultar numa insuportável desarmonia intra e interpessoal (FLAMENT, 2001FLAMENT, C. Estrutura e dinâmica das representações sociais. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 173-186.). Uma outra contribuição é a compreensão de que o grupo de pertença interfere na forma como esse elemento estranho será interpretado e associado a uma nova representação ou a uma já existente. Também é contribuição desse estudo, especialmente para o campo da Administração, compreender as influências que os sistemas de crenças e normas sociais consolidadas pela própria organização exercem no processo de elaboração e negociação das representações sociais sobre ela.

1 TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: PRINCIPAIS CONCEITOS

A TRS compreende o estudo dos processos de elaboração das representações sociais, que são conhecimentos socialmente compartilhados e que contribuem para a construção da realidade de um determinado grupo (JODELET, 2001; MOSCOVICI, 2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.). As representações sociais são sistemas de crenças, noções e práticas que orientam o indivíduo no meio social. Seu propósito é transformar elementos da realidade que são estranhos ou perturbadores em um conhecimento do senso comum, transformando algo não-familiar em familiar (MOSCOVICI, 2000).

A TRS baseia-se no pressuposto de que o mundo social seja constituído por uma pluralidade de pessoas e fenômenos em toda sua complexidade e imprevisibilidade. Entender como os sujeitos, a partir de tal variedade, conseguem transformar o mundo em uma realidade estável e previsível é o principal objetivo da teoria (MOSCOVICI, 2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.). Neste sentido, a TRS fornece um caminho para conceituar e investigar a sinergia existente entre os aspectos sociais e cognitivos das pessoas, lançando um olhar socioconstrucionista sobre a realidade (ARRUDA, 2011ARRUDA, A. Representações sociais: dinâmicas e redes. Teoria das representações sociais, v. 50, p. 335-370, 2011.).

As representações sociais são produto da interação e comunicação (MOSCOVICI, 2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.), mas a experiência individual também atua profundamente na elaboração das representações sociais, a partir do momento que ela é compartilhada e se torna uma experiência social (JODELET, 2005JODELET, D. Experiência e representações sociais. In: MENIN, M. S. S.; SHIMIZU, A. M. (Org.). Experiência e representação social: questões teóricas e metodológicas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005. p. 23-56.).

De acordo com Moscovici (2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.), a transformação dos fatos que desconhecemos em algo familiar é realizada por meio de dois processos: ancoragem e objetivação. A ancoragem é um processo de comparação no qual os indivíduos comparam algo estranho e perturbador com o seu sistema pré-existente de categorias e o ancoram em alguma categoria apropriada, transformando-o em familiar. A objetivação é o processo pelo qual as pessoas transformam um conceito em uma imagem, ou seja, transformam algo abstrato em concreto (MOSCOVICI, 2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.).

Enquanto fenômeno social e culturalmente situado, as representações sociais podem ser entendidas como sistemas de conhecimento com papel dual, que atuam de forma prescritiva (guiando a ação humana) e transformativa (permitindo lidar com o novo). Assim, elas se encontram imbricadas aos meios de renegociação simbólica para que sejam resolvidos aspectos de crenças e comportamentos que podem tornar-se problemáticos, configurando a teoria como um recurso valioso para a compreensão de processos de estabilidade e adaptação de grupos sociais, especialmente em períodos de mudança social (SARTAWI, 2015SARTAWI, M. Exploring stability and change through social representations: towards an understanding of religious communities. In: ANDREOULI, E.; GASKELL, G.; VALSINER, J. (Org.). The Cambridge Handbook of Social Representations. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 341-357.).

A representação social, então, possibilita ao indivíduo entender e interpretar fenômenos socialmente significativos. Neste caso, o que é criticamente significativo é que diferentes representações existem sobre um mesmo objeto social, ou seja, coexistem diferentes interpretações sobre a realidade que podem competir entre si por legitimidade (HOWARTH, 2006HOWARTH, C. A social representation is not a quiet thing: Exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, v. 45, n. 1, p. 65-86, 2006.). Os estudos realizados por Howarth (2004HOWARTH, C. Re‐presentation and resistance in the context of school exclusion: Reasons to be critical. Journal of community & applied social psychology, v. 14, n. 5, p. 356-377, 2004.) em uma escola inglesa de ensino médio, por exemplo, demonstram a presença da tensão e conflito na construção e na negociação da representação social sobre os alunos negros. Nesse processo, ora observa-se uma representação que estigmatiza, ora uma representação que apresenta possibilidades de resistência. Neste estudo, a autora demonstra o papel das representações sociais na manutenção dos padrões racializados de exclusão de escolas na Grã-Bretanha e como os jovens colaboram para resistir e rejeitar as relações opressivas por meio do discurso e práticas que questionam essas relações.

A TRS, numa perspectiva crítica, tem interesse também em investigar:

Como os diferentes significados são afirmados e contestados? Como existem diferentes versões do mesmo fenômeno, mesmo encontro ou mesmo evento? Quais são as consequências de "usar" ou resistir a essas diferentes versões? Como lidamos com a imprevisibilidade e a incerteza de sistemas de conhecimento tão diversos e móveis? [...] Que recursos as pessoas trazem para essas batalhas? Quem são os vencedores e os perdedores no campo de batalha da representação social? (HOWARTH, 2006HOWARTH, C. A social representation is not a quiet thing: Exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, v. 45, n. 1, p. 65-86, 2006., p. 12).

No Brasil, de maneira geral, observa-se que a TRS tem sido utilizada em investigações para “enfrentar questões vivas que atravessam a sociedade brasileira hoje em dia” (JODELET, 2011JODELET, D. Ponto de vista: Sobre o movimento das representações sociais na comunidade científica brasileira. Temas em Psicologia, v. 19, n. 1, p. 19-26, 2011., p. 22). Segundo Jodelet (2011JODELET, D. Ponto de vista: Sobre o movimento das representações sociais na comunidade científica brasileira. Temas em Psicologia, v. 19, n. 1, p. 19-26, 2011.), as pesquisas têm auxiliado na compreensão e no enfrentamento de problemas sociais importantes, são eles: educação, saúde, ambiente, política e justiça social, movimentos sociais, memória e história. O foco dos estudos em TRS mais recentemente tem sido compreender os eventos sociais que sobressaem numa dada comunidade, de forma a compreender alguns aspectos de sua apropriação pela sociedade e apreender as diferenças observadas nessa apropriação por diferentes grupos (CHAMON; MACIEL; AREOSA, 2020CHAMON, E. M. Q. O; MACIEL, S. C.; AREOSA, S. V. C. Dossiê temático sobre representações e práticas sociais. PSI UNISC, v. 4, n. 2, p. 4-6, 2020.).

Nos Estudos Organizacionais, a operacionalização desta teoria emergiu de forma imbricada a fenômenos relacionados à cultura organizacional (CAVEDON, 2008CAVEDON, N. R. Antropologia para Administradores. Porto Alegre: EdUFRGS, 2008.), debruçando-se sobre processos de construção da realidade organizacional. Estudos como os de Cezar e Fantinel (2018CEZAR, L. C.; FANTINEL, L. D. Entre um bom papo e um café se vende o artesanato: representações sociais em um centro de comercialização da economia solidária. Brazilian Business Review, v. 15, n. 5, p. 475-493, 2018.) e Loureiro, Dantas e Fantinel (2018LOUREIRO, C. M. S.; DANTAS, M. F.; FANTINEL, L. D. Os despossuídos e a prisão: representações sociais sobre pessoas vivendo com HIV/AIDS em uma casa de apoio. Revista Brasileira de Estudos Organizacionais, v. 5, n. 1, p. 123-146, 2018.) são exemplos de como a TRS pode ser mobilizada para o desvendamento dessa realidade social por meio das significações circulantes entre pessoas inseridas em determinado contexto organizacional. Nesse sentido, a articulação da TRS para esses fins possibilita a compreensão de processos de construção social do senso comum (MARTINS-SILVA et al, 2016MARTINS-SILVA, P. O.; SILVA JUNIOR, A. D.; PERONI, G. G. H.; MEDEIROS, C. P. D.; VITÓRIA, N. O. D. Teoria das representações sociais nos estudos organizacionais no Brasil: análise bibliométrica de 2001 a 2014. Cad. EBAPE.BR, v. 14, n. 4. 2016.), acessando a produção de saberes por meio das construções simbólicas dos próprios sujeitos, inclusive (e especialmente) na estabilização e desestabilização de sentidos contraditórios e ambíguos (CEZAR; FANTINEL, 2018CEZAR, L. C.; FANTINEL, L. D. Entre um bom papo e um café se vende o artesanato: representações sociais em um centro de comercialização da economia solidária. Brazilian Business Review, v. 15, n. 5, p. 475-493, 2018.).

Sobre os processos de transformações das representações sociais, identificamos na literatura estudos empíricos que já se debruçaram sobre essa dinâmica. Tem-se problematizações sobre a representação social de doenças como o HIV/AIDS, que foi-se distanciando de uma representação de morte e dando lugar à representação de vida e de sobrevivência, atrelada a significados que remetem a síndrome a uma doença crônica, não fatal e que possui controle através de fármacos disponíveis por programas governamentais (GOMES, SILVA e OLIVEIRA, 2011GOMES, A. M. T.; SILVA, E. M. P.; OLIVEIRA, D. C. Representações sociais da AIDS para pessoas que vivem com HIV e suas interfaces cotidianas. Revista Latino-Am. Enfermagem, v. 19, n. 3, 485-492, 2011.). Contextos organizacionais como prisões também foram investigados, enfocando a transformação de representações sociais do espaço prisional circulantes entre detentas, associadas diretamente às vivências, conhecimentos e afetos que se realizam naquele ambiente, que vai da repulsa e distanciamento antes de conhecê-lo, passando pelo pavor total e chegando à aceitação resignada (FRINHANI e SOUZA, 2005FRINHANI, F. M. D.; SOUZA, L. Mulheres encarceradas e espaço prisional: uma análise de representações sociais. Psicologia: Teoria e Prática, v. 7, n. 1, p. 61-79, 2005.).

A reorganização do campo representacional consiste em um esforço de intermediação entre fatos concretos e as crenças individuais e coletivas; a familiarização com o novo pode ocorrer tanto via enquadramento em categorias previamente conhecidas quanto pela classificação em novas categorias (MOSCOVICI, 2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.). Assim, a estabilização da realidade social evidencia os processos de reorganização das representações sociais a partir de experiências e do contato interpessoal, olhar que corresponde a nossa proposta nesta pesquisa.

Nossa perspectiva neste artigo, no entanto, difere da abordagem culturalista tradicionalmente mobilizada pela área dos Estudos Organizacionais. Neste artigo, o foco recai sobre a perspectiva societal (DOISE, 2002DOISE, W. Da psicologia social à psicologia societal. Psicologia Teoria e Pesquisa, v. 18, n. 1, p. 27-35, 2002.) e a perspectiva crítica dos estudos das representações sociais (HOWARTH, 2006HOWARTH, C. A social representation is not a quiet thing: Exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, v. 45, n. 1, p. 65-86, 2006., 2004).

A abordagem societal procura compreender como diferentes grupos constroem diferentes representações sociais sobre um mesmo objeto social. A explicação aborda as crenças, valores e normas estabelecidas pelos diferentes grupos. Já a abordagem crítica procura analisar os diferentes grupos e interesses presentes na negociação da interpretação da realidade e compreender os elementos que favorecem a legitimação de uma determinada representação social. As abordagens mencionadas embora tenham focos distintos, podem ser utilizadas de forma complementar (MARTINS-SILVA et al, 2016MARTINS-SILVA, P. O.; SILVA JUNIOR, A. D.; PERONI, G. G. H.; MEDEIROS, C. P. D.; VITÓRIA, N. O. D. Teoria das representações sociais nos estudos organizacionais no Brasil: análise bibliométrica de 2001 a 2014. Cad. EBAPE.BR, v. 14, n. 4. 2016.).

Ao explorarmos esses processos, apresentamos a dinâmica das representações sociais em sua reorganização e negociação cotidiana em um contexto caracterizado pela influência de um elemento estranho de grande impacto para o ambiente e para a sociedade como um todo, que no caso estudado foi o rompimento da barragem em Mariana (MG) para um grupo específico de pessoas. Entendemos, como Flament (2001FLAMENT, C. Estrutura e dinâmica das representações sociais. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 173-186.), que a presença de um elemento estranho em um campo representacional gera um grande número de racionalizações que podem resultar em duas possibilidades: retornar às antigas representações sociais ou reestruturar o campo de representação. A dinâmica entre essas duas possibilidades perpassa necessariamente pela construção de representações sociais sobre a empresa envolvida no rompimento da barragem.

Na literatura observa-se diversos estudos que demonstram que empresas mineradoras atuam para gerir o consenso positivo em relação as suas atividades de mineração, como por exemplo, os estudos de Horowitz (2014), Maher (2019MAHER, R.; VALENZUELA, F.; BÖHM, S. The enduring state: An analysis of governance-making in three mining conflicts. Organization Studies, v. 40, n. 8, p. 1169-1191, 2019.), Maher, Valenzuela e Böhm, (2019). Estes estudos tratam da relação de mineradoras com a comunidade em que estão instaladas e analisam as diversas práticas utilizadas desde as consideradas éticas relacionadas a responsabilidade social corporativa, como contratar organizações não governamentais para auxiliar na mediação com a comunidade e realizar investimentos locais até as antiéticas como cooptação, encontros privados com autoridades do estado, fornecimento de benefícios financeiros a entidades públicas e privadas para obter êxito em relação aos seus interesses.

O estudo de Horowitz (2014) que analisou o caso da empresa Vale situada na Ilha Nova Caledônia no Oceano Pacífico demonstra como a empresa diante de dois posicionamentos distintos sobre as atividades mineradoras (um favorável e outro desfavorável) por parte da comunidade, conseguiu por meio dos processos de mediação deslegitimar o posicionamento contrário a empresa. Já os estudos de Maher (2019MAHER, R.; VALENZUELA, F.; BÖHM, S. The enduring state: An analysis of governance-making in three mining conflicts. Organization Studies, v. 40, n. 8, p. 1169-1191, 2019.), Maher, Valenzuela e Böhm, (2019) investigaram mineradoras localizadas em países Latino-Americanos que atuam junto as comunidades locais para que estas sejam favoráveis à sua permanência e, consequentemente, consigam garantir a continuidade das atividades da empresa. Esses exemplos indicam o processo de gestão de sentido realizados por diferentes mineradoras evidenciando como o poder econômico é utilizado para reverter situações desfavoráveis às mineradoras.

Mais especificamente sobre o rompimento da barragem de Fundão, Medeiros, Alcadipani e Oliveira (2018MEDEIROS, C. R. O.; ALCADIPANI, R.; OLIVEIRA, L. B. Mitos no Desengajamento Moral: Retóricas da Samarco em um Crime Corporativo. RAC, v. 22, n. 1, art. 4, pp. 70-91, 2018.) evidenciaram que a análise das declarações da empresa e de seus representantes sobre o caso constroem 3 mitos que constituem-se em uma forma de explicar “rotinas, procedimentos, interpretar eventos do passado e estabelecer compromissos com valore e ideias” (MEDEIROS; ALCACIPANI; OLIVEIRA, 2018MEDEIROS, C. R. O.; ALCADIPANI, R.; OLIVEIRA, L. B. Mitos no Desengajamento Moral: Retóricas da Samarco em um Crime Corporativo. RAC, v. 22, n. 1, art. 4, pp. 70-91, 2018., p. 77), são eles: 1) Nós estamos fazendo o que deve ser feito; 2) Nós não colocamos a sociedade e o meio ambiente em risco, e; 3) A culpa não é nossa. Estes mitos são uma forma de gerir os sentidos de maneira a construir representações sociais favoráveis a empresa.

Nesse artigo, evidenciaremos a possibilidade do uso conjunto das abordagens societal e crítica, para a compreensão do processo de elaboração das representações sociais. Também mostraremos como coexistem duas racionalidades sobre o evento que estão em processo de negociação para alcançar legitimidade para explicar a realidade (HOWARTH, 2006HOWARTH, C. A social representation is not a quiet thing: Exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, v. 45, n. 1, p. 65-86, 2006.). Essas possibilidades são exploradas ao longo da análise dos dados.

2 PROCEDIMENTOS DE PESQUISA

Foi considerada a abordagem qualitativa como guia para a coleta e a análise de dados, com base na postura teórica da composição cultural da realidade social e subjetiva (FLICK, 2004FLICK, U. Uma introdução à pesquisa qualitativa. 2ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2004.). Essa escolha deveu-se a busca pela compreensão do processo de formação das representações sociais do desastre ocorrido em Mariana (MG) e da Samarco para um grupo de ex-funcionários que aderiram ao PDV.

Segundo Creswell (2003CRESWELL, J. W. Uma estrutura para projeto. Projeto de Pesquisa: métodos qualitativos, quantitativos e mistos. Porto Alegre: Artmed, 2003.), a pesquisa qualitativa permite que o pesquisador compreenda o significado de um fenômeno a partir do ponto de vista dos sujeitos e entenda o sentido subjetivo do objeto investigado. Tal pesquisa possibilita o entendimento minucioso das crenças, atitudes, valores e motivações relacionadas aos comportamentos dos indivíduos situados em um determinado contexto específico (BAUER; GASKELL; ALLUM, 2002GASKELL, G. Entrevistas individuais e grupais. In: BAUER, M.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. Rio de Janeiro: Vozes, 2002. Cap. 3, p. 64-89.). Ressalta-se que os procedimentos adotados na pesquisa seguiram as normas da Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde sobre ética em pesquisa com seres humanos, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos sob o parecer de número 2364742.

Considerando que a possibilidade maior de desvendamento das representações sociais ocorra na fala (CAVEDON, 2008CAVEDON, N. R. Antropologia para Administradores. Porto Alegre: EdUFRGS, 2008.), para a realização desta pesquisa foram realizadas entrevistas semiestruturadas individuais. Foram entrevistados 10 ex-funcionários da Samarco, de ambas as unidades de produção, Ubu (ES) e Germano (MG). Como critério de inclusão dos participantes foi delimitado o seguinte requisito: ter aderido ao PDV, que foi proposto no mês de junho de 2016, exatamente 7 meses após o desastre em Mariana (MG). A escolha por esse requisito está relacionada ao pressuposto de que a colaboração em participar com a pesquisa seria mais viável entre as pessoas que não mais tivessem vínculo empregatício com a Samarco.

Os entrevistados foram recrutados pela técnica da bola de neve, em que umas poucas pessoas indicam outras e assim por diante (ALVES, 1991ALVES, A. J. O Planejamento de Pesquisas Qualitativas em Educação. Cadernos de Pesquisa n. 77, p. 53-61, 1991.). A amostra foi de conveniência devido à facilidade de inserção de uma das pesquisadoras no campo. Essa proximidade com o fenômeno que foi estudado exigiu uma cautela maior a respeito da necessidade de uma postura de aproximação e distanciamento do objeto pesquisado.

É importante relatar que, embora tenha sido garantida a não identificação dos sujeitos pesquisados, sete pessoas não retornaram o contato ou declinaram de participar da pesquisa. Após contatos com 17 pessoas enquadradas no critério de seleção dos sujeitos, chegou-se a um total de 10 pessoas que aceitaram fazer parte da pesquisa. O grupo pesquisado é composto por 8 mulheres e 2 homens das unidades de produção Ubu (ES) e Germano (MG), cujas idades variam entre 29 e 45 anos. Todos são casados, com exceção de um que é solteiro. O tempo de permanência na empresa está entre 2 a 21 anos, sendo que a grande maioria, 8 pessoas, possuem o tempo de permanência entre 6 a 9 anos. Quanto à escolaridade, um entrevistado possui curso superior incompleto, dois possuem curso superior completo e sete são pós-graduados.

Os participantes eram provenientes dos seguintes departamentos: dois da produção, dois da manutenção, dois da saúde, um da segurança, dois do suprimento e um da comunicação. Os cargos, em sua maior parte, foram os seguintes: técnico, analista, engenheiro e supervisor. Os detalhamentos sobre os cargos foram omitidos para que não fosse possível a identificação dos sujeitos.

Cada entrevista durou em média 60 minutos e todas ocorreram via Skype, estando os participantes sempre nas suas respectivas casas. O Skype é um programa gratuito que possibilita conversas simultâneas em áudio e vídeo usando computadores. Destaca-se que, mesmo não havendo copresença física e imediata, há nestas interações tecnologicamente mediadas um importante ganho em qualidade e sutileza dos dados, tais como a entonação da voz e as expressões faciais, pois se aproximam da situação social presencial. Destarte, esse recurso pode ser uma importante possibilidade de obtenção de dados nas pesquisas empíricas (BRAGA; GASTALDO, 2012BRAGA, A.; GASTALDO, E. Variações sobre o uso do Skype na pesquisa empírica em comunicação: apontamentos metodológicos. Revista Contracampo, v. 24, n.1, p. 4-18. 2012.).

As entrevistas foram conduzidas com o apoio de tópico-guia (GASKELL, 2002GASKELL, G. Entrevistas individuais e grupais. In: BAUER, M.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. Rio de Janeiro: Vozes, 2002. Cap. 3, p. 64-89.). Os temas abordados no tópico guia foram: 1) Dados gerais do perfil do entrevistado: idade, gênero, estado civil, formação acadêmica, tempo de empresa, departamentos e cargos que ocupou na Samarco; 2) Dados sobre o histórico profissional na Samarco antes do desastre: como foi o ingresso na empresa e o percurso profissional, como era a rotina de atividades, se haviam expectativas de carreira e quais eram, como a Samarco era vista e quais aspectos mais se identificavam e menos se identificavam; 3) Percepção dos entrevistados em relação ao desastre: como foi o dia em que ocorreu, o que sentiu, como a equipe reagiu, opiniões sobre o posicionamento da empresa e sobre aspectos do desastre; 4) Processo de tomada de decisão em aderir ao PDV: o que considerou nesse processo, como se percebem hoje como pessoa e como profissional e qual é a visão atual sobre a Samarco, e; 5) Espaço para os entrevistados acrescentarem mais alguma reflexão, caso desejassem.

Todas as entrevistas tiveram o áudio gravado com a autorização de todos os entrevistados. Depois, as entrevistas foram transcritas e submetidas a análise do programa Iramuteq, versão 0.7, alpha 2. Trata-se de um programa gratuito e com fonte aberta que permite identificar as informações essenciais de um texto por meio de distintas análises estatísticas sobre corpus textuais: das mais simples, como a lexicografia básica, lematização e cálculo de frequência de palavras, até as mais complexas, como a Classificação Hierárquica Descendente (CHD) de segmentos de texto, análise de correspondências e análises de similitude (CAMARGO; JUSTO, 2013CAMARGO, B. V.; JUSTO, A. M. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em psicologia, v. 21, n. 2, p. 513-518, 2013.). Para o presente estudo foi utilizada a CHD.

Devido à qualidade e as diferentes possiblidades de análises estatísticas, e, sobretudo, ao acesso gratuito, acredita-se que o Iramuteq possa trazer consideráveis contribuições às pesquisas da área das Ciências Humanas (CAMARGO; JUSTO, 2013CAMARGO, B. V.; JUSTO, A. M. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em psicologia, v. 21, n. 2, p. 513-518, 2013.). Especificamente, em estudos que adotam a TRS como perspectiva teórica, muitos pesquisadores defendem a relevância desses programas como instrumentos auxiliares a análise de dados (CAMARGO; JUSTO, 2013).

De acordo com Camargo (2005CAMARGO, V. Alceste: um programa informático de análise quantitativa de dados textuais. In: MOREIRA, A. S. P.; CAMARGO, B. V.; JESUÍNO, J. C.; NÓBREGA, S. M. (Org.). Perspectivas teórico-metodológicas em representações sociais. João Pessoa: UFPB/Editora Universitária. 2005. p. 511-539.), a análise quantitativa dos dados textuais não deixa de considerar a qualidade do fenômeno estudado. Segundo Lahlou (2012LAHLOU, S. Text mining methods: An answer to Chartier and Meunier. Papers on Social Representations, v. 20, n. 38, p. 1-7. 2012.), o grande diferencial é que esse método não fica suscetível à arbitrariedade de quem os codifica, diminuindo assim o subjetivismo nas análises de texto. O princípio geral da análise a ser realizada (CHD) é a do tipo lexical, ou seja, de classificar os enunciados a partir da comparação de perfis lexicais expressos pelas distribuições relativas às ocorrências lexicais (OLIVEIRA; GOMES; MARQUES, 2005OLIVEIRA, D. C. de; GOMES, A. M. T.; MARQUES, S. C. Análise estatística de dados textuais na pesquisa das representações sociais: alguns princípios e uma aplicação ao campo da saúde. In: MENIN, M. S. S.; SHIMIZU, A. M. (Org.). Experiência e representação social: questões teóricas e metodológicas. Casa do Psicólogo. 2005.p. 157-200.). Esse processo, tem como resultado a identificação de polaridades no uso das palavras, “polaridades essas que poderão ser tomadas pelo pesquisador como dados brutos nos quais poderá apoiar sua interpretação”, segundo Oliveira et al (2005OLIVEIRA, D. C. de; GOMES, A. M. T.; MARQUES, S. C. Análise estatística de dados textuais na pesquisa das representações sociais: alguns princípios e uma aplicação ao campo da saúde. In: MENIN, M. S. S.; SHIMIZU, A. M. (Org.). Experiência e representação social: questões teóricas e metodológicas. Casa do Psicólogo. 2005.p. 157-200., p.158).

É importante ressaltar que o uso desse tipo de procedimento refere-se apenas ao primeiro passo da análise do material textual. O segundo passo trata da capacidade analítica e reflexiva dos pesquisadores. Em outras palavras, o programa faz uma primeira análise de forma a dar um parâmetro inicial sobre o texto. Segundo Bauer, Gaskell e Allum (2002GASKELL, G. Entrevistas individuais e grupais. In: BAUER, M.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. Rio de Janeiro: Vozes, 2002. Cap. 3, p. 64-89.), mesmo que essa análise seja feita com muito cuidado e com modelos estatísticos sofisticados, os dados não falam por si só. É o conhecimento teórico, a experiência com o fenômeno, o conhecimento do campo e a criatividade do pesquisador que possibilitará a interpretação, a análise e a inferência sobre o material.

O conjunto de entrevistas dessa pesquisa constituiu um corpus de aproximadamente 49 mil palavras distribuídas em 3740 linhas, totalizando 85 páginas transcritas. O número de linhas superou, assim, o critério mínimo definido por Camargo (2005CAMARGO, V. Alceste: um programa informático de análise quantitativa de dados textuais. In: MOREIRA, A. S. P.; CAMARGO, B. V.; JESUÍNO, J. C.; NÓBREGA, S. M. (Org.). Perspectivas teórico-metodológicas em representações sociais. João Pessoa: UFPB/Editora Universitária. 2005. p. 511-539.) de 1000 linhas para o ótimo funcionamento do programa e o de Kronberger e Wagner (2013KRONBERGER, N.; WAGNER, W. Palavras-chave em context: análise estatística de textos. In: BAUER, M. W.; GASKELL, G. (Org.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2013. p. 416-441.) que recomenda o mínimo de 10 mil palavras. O corpus foi, portanto, considerado satisfatório.

O programa Iramuteq, por meio da Classificação Hierárquica Descendente (CHD), classifica os segmentos de texto a partir dos seus respectivos vocabulários, ou seja, divide os seguimentos de textos em classes. Dessa forma, essa etapa propõe obter classes de segmentos de texto que identificam vocabulários semelhantes entre si e, ao mesmo tempo, diferentes dos segmentos das outras classes. Faz parte das descrições das classes, as relações das palavras mais características e os participantes relacionados a cada classe. Essa análise é feita por meio do cálculo do qui quadrado (chi2) (CAMARGO; JUSTO, 2013CAMARGO, B. V.; JUSTO, A. M. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em psicologia, v. 21, n. 2, p. 513-518, 2013.).

Após a realização da CHD, o corpus foi segmentado pelo próprio programa em 1363 segmentos de textos. Desse número, 1024 segmentos foram classificados, o que representa um percentual de 75,13% de classificação. Sendo assim, esse resultado pode ser considerado viável, uma vez que atende aos critérios mínimos estabelecidos pela literatura que são 50% de classificação aceitável defendida por Camargo (2005CAMARGO, V. Alceste: um programa informático de análise quantitativa de dados textuais. In: MOREIRA, A. S. P.; CAMARGO, B. V.; JESUÍNO, J. C.; NÓBREGA, S. M. (Org.). Perspectivas teórico-metodológicas em representações sociais. João Pessoa: UFPB/Editora Universitária. 2005. p. 511-539.) e 70% indicada por Kronberger e Wagner (2013KRONBERGER, N.; WAGNER, W. Palavras-chave em context: análise estatística de textos. In: BAUER, M. W.; GASKELL, G. (Org.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2013. p. 416-441.).

Para a análise das entrevistas pelo programa foram definidas duas variáveis. A primeira refere-se à localidade de atuação dos participantes após o desastre: unidade de Ubu ou regiões atingidas pela lama. No grupo analisado 6 pessoas atuavam na unidade de Ubu e 4 pessoas atuavam fisicamente presentes nas regiões afetadas pela lama.

A segunda variável refere-se aos departamentos em que cada participante atuava. Os departamentos foram agrupados de acordo com as áreas de atuação. A primeira área corresponde à área da saúde e segurança que compreende os departamentos de saúde e de segurança. A segunda refere-se à área administrativa, que contempla os departamentos da comunicação e de suprimentos. A terceira e última corresponde à área de operação, constituída pelos departamentos de produção e manutenção. O grupo pesquisado é composto por 4 indivíduos da área da saúde e segurança, 4 da área administrativa e 2 da área de operação.

Para a análise dos dados fornecidos pelo programa, foram consideradas a literatura presente nos estudos organizacionais sobre mineração, rompimento de barragem e crimes corporativos e o quadro de conceitos e abordagens presentes na Teoria das Representações Sociais.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise feita pelo programa obteve quatro classes de segmentos de textos que apresentaram vocabulários semelhantes entre si e diferentes dos segmentos das outras classes. A partir disso, o Iramuteq organizou as análises de dados em um dendrograma que ilustra as relações entre as classes, conforme a Figura 1. A apresentação e a discussão sobre os resultados não serão apresentadas na ordem numérica das classes e sim à medida que os conteúdos de cada classe se relacionam.

Para a interpretação do dendrograma foram considerados os conteúdos (ou os seguimentos de texto) associados a cada classe. Fará parte das descrições de cada classe os extratos das entrevistas e a associação das variáveis local de atuação após o desastre e departamento de vínculo do ex-funcionário, quando for o caso.

Figura 1
Dendrograma do corpus das entrevistas realizadas com os ex-funcionários da Samarco que aderiram ao PDV

Especialmente, as classes 2 (Desligamento e dias atuais) e 3 (Uma boa empresa) apresentaram elementos que constituem as representações sociais da Samarco a partir de uma conotação positiva, avaliando-a como uma boa empresa e um bom lugar para se trabalhar.

A Classe 3 (Uma boa empresa) apresenta um discurso que expressa uma relação mais positiva entre o indivíduo e a organização e reúne os principais elementos que constituem a representação social da Samarco como uma boa empresa para se trabalhar. O discurso dessa classe girou em torno de aspectos considerados positivos em relação a empresa como a preocupação com segurança e o clima positivo no ambiente de trabalho.

Nessa classe, o desastre é representado como um acidente. A mídia foi considerada um elemento equivocado por parte dos entrevistados no processo de elaboração das representações sociais do desastre e da Samarco, uma vez que as suas informações não correspondiam com a realidade construída por esse grupo. Nessa classe foi mais representativa as falas dos sujeitos pertencentes ao departamento de operação (chi2: 15,71).

A seguir estão exemplos das falas dos participantes:

Embora tenha acontecido isso [o rompimento da barragem de Fundão], parece extremamente louco eu falar isso, que segurança era o que mais me admira depois do que aconteceu com a Samarco, mas ainda assim é o que eu mais admiro (Entrevistado 1).

Eu acho que foi um fato que ocorreu [o rompimento da barragem de Fundão]. Um acidente! Todo mundo culpa o presidente. Eu tenho pena dele. Ele não quis fazer aquilo, nunca, não tem um culpado. Foi um acidente. Um acidente que ocorreu! (Entrevistado 6).

O que a mídia mostrou muito e ainda mostra até hoje é como se a Samarco fosse a culpada e não estivesse fazendo nada (Entrevistado 3).

Na Classe 2 (Desligamento e dias atuais) estão presentes os discursos sobre o processo de tomada de decisão pelo PDV e o seu reflexo nos dias atuais. O processo de decisão pelo PDV foi permeado pelo receio do desemprego, especialmente num período classificado como “complicado devido à crise econômica” (Entrevistado 2) e também pelo receio de “abrir mão da Samarco” (Entrevistado 1) devido ao entendimento de que ela era a “melhor empresa” para se trabalhar. Embora a maior parte dos entrevistados sejam pós-graduados (7 entrevistados) e todos com pelo menos dois anos de experiência em indústria, o receio do desemprego está presente no discurso. Há também nessa classe um forte sentimento de gratidão pela mineradora, atribuindo a ela as grandes conquistas que alcançaram, materiais e não materiais. Cumpre assinalar que essa classe possui maior representatividade nas falas dos sujeitos pertencentes à área da saúde e segurança (chi2: 18,51).

A seguir, alguns trechos das falas dessa classe:

Quando eu saí da Samarco, eu senti pena, porque abrir mão da Samarco é uma coisa muito difícil e sair de uma empresa dessa não é fácil, mas por outro lado eu entendi que era um ciclo novo da minha vida (Entrevistado 1).

Eu sou extremamente grata à Samarco, ao conhecimento que ela me proporcionou. Hoje eu tenho um apartamento, hoje eu tenho um carro. Eu pude conquistar coisas que em outra empresa eu acho que eu não conseguiria conquistar (Entrevistado 10).

Nessas duas classes emergiram os principais elementos constitutivos das representações sociais positivas sobre a mineradora. O clima de trabalho, os valores institucionalizados a respeito da segurança do trabalho e da mobilização para resultados e as ações de segurança que eram praticadas diariamente foram alguns dos elementos que permitiram a construção de uma representação social (MOSCOVICI, 2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.) que trata a Samarco como uma boa empresa. Estes elementos foram amplamente mencionados como diretrizes que os entrevistados seguiam na prática, tanto dentro, quanto fora da organização. Esses resultados coadunam com teorizações sobre uma das principais funções das representações sociais, que é a sua capacidade de orientar comportamentos e práticas, no estabelecimento daquilo que é lícito, tolerável ou inaceitável em um determinado contexto (ABRIC, 1998ABRIC, J. C. A Abordagem estrutural das representações sociais. In: MOREIRA, A. S. P.; OLIVEIRA, D. C. (Org.). Estudos interdisciplinares de representação social. Goiânia: AB, 1998. p. 27-38.; SARTAWI, 2015SARTAWI, M. Exploring stability and change through social representations: towards an understanding of religious communities. In: ANDREOULI, E.; GASKELL, G.; VALSINER, J. (Org.). The Cambridge Handbook of Social Representations. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 341-357.). A conduta pessoal e da empresa, neste caso, é avaliada como correta e adequada para uma parte dos entrevistados.

Nessas classes, o discurso acerca da Samarco foi significativamente demarcado por meio de elementos valorados positivamente. Expressões como “a extensão da família” (Entrevistado 9), “minha segunda casa” (Entrevistado 6) e “a Samarco era uma mãe para a gente” (Entrevistado 2) ilustram essa mobilização para associá-la a um lugar de afeto, que seria a casa, a família e a figura da mãe. Ao considerar que parte do conhecimento é mediado pelas emoções, o afeto desempenha uma importante função na seleção dos elementos que irão compor essas representações sociais (JODELET, 2001). Trata-se, nesse sentido, de uma mediação afetiva no processo de formação das representações sobre o objeto “empresa”.

As representações sociais da Samarco como “uma empresa justa” (Entrevistados 1, 2 e 10), “uma empresa boa” (Entrevistados 1, 2, 6, 7, 9 e 10) e “uma empresa séria” (Entrevistados 2 e 6) sustentam a crença de que “ela não merecia passar por isso” (Entrevistado 6), pois sempre atuou de forma responsável em seu negócio, ao contrário de “outras empresas” que não agem dessa forma. Essas avaliações serviram como base para a construção da representação social do desastre como sendo um acidente e não um crime ou ação deliberada da empresa, a despeito de dados divulgados na mídia que reforcem as últimas hipóteses.

Essa situação, presente em uma parte dos entrevistados, pode ser explicada pela capacidade das representações sociais em anteciparem uma ação sobre a realidade (Abric, 1998ABRIC, J. C. A Abordagem estrutural das representações sociais. In: MOREIRA, A. S. P.; OLIVEIRA, D. C. (Org.). Estudos interdisciplinares de representação social. Goiânia: AB, 1998. p. 27-38.). Tal antecipação seleciona e filtra as informações com o objetivo de adequar a interpretação de uma determinada realidade à representação. Neste caso, a representação social da Samarco como uma empresa justa antecede o entendimento em relação aos motivos do rompimento da barragem. Isso é interessante na medida em que é a representação que age sobre a interpretação do fato e não o contrário. Essa condição demonstra que a realidade é elaborada segundo a natureza da representação social construída pelos sujeitos, ainda que evidências que contrariem a representação sejam apresentadas a eles. Assim, antes mesmo que qualquer prova que pudesse incriminar a empresa estivesse evidente, a representação da Samarco como empresa justa e responsável estava posta.

Cabe ressaltar que as representações sociais da Samarco como boa empresa e do rompimento da barragem como acidental, ambas mais presentes nos discursos mapeados nas Classes 2 (Desligamentos e dias atuais) e 3 (Uma boa empresa), foram mais evidentes entre os sujeitos integrantes das áreas de operação, saúde e segurança. Em suas falas, verifica-se que, devido ao alto risco de acidentes inerentes às suas funções, havia um contato diário com as exigências e valores relacionados à segurança e uma constante verificação da preocupação da empresa para com esses aspectos. Esse fato, associado a outros elementos como a formação profissional, muitas vezes apoiada e financiada pela Samarco, os benefícios recebidos, as ações de gerenciamento de imagens desenvolvidas por ela, as vivências e interações no contexto organizacional e fora dele podem explicar a avaliação positiva presente nesse discurso.

Esses resultados deixam claro a relação dos sujeitos com determinados grupos. Nesse caso, as áreas da operação, da saúde e da segurança moldaram o entendimento acerca dos objetos Samarco e desastre. Isso reforça a proposição de Doise (2010DOISE, W. O retorno da sociedade à psicologia social. In: Anais... Brasília: Simpósio gênero e psicologia social, 2010.), segundo a qual a formação do pensamento social é construída a partir do pertencimento grupal. A maneira como o sujeito interpreta a realidade é atravessada pela posição que ele ocupa no seu meio social. A formação das representações sociais se desenvolve a partir da dinâmica que compreende o posicionamento do indivíduo, o seu pertencimento aos grupos e o julgamento de um grupo em relação aos outros (DOISE, 2010DOISE, W. O retorno da sociedade à psicologia social. In: Anais... Brasília: Simpósio gênero e psicologia social, 2010.).

Além da análise empreendida sobre a dinâmica da construção de representações sociais a partir da experiência vivenciada no contexto de trabalho e da influência dos grupos de pertenças é possível verificar que os discursos dessas classes estão em acordo com os mitos criados pela empresa como informa Medeiros, Alcadipani e Oliveira (2018MEDEIROS, C. R. O.; ALCADIPANI, R.; OLIVEIRA, L. B. Mitos no Desengajamento Moral: Retóricas da Samarco em um Crime Corporativo. RAC, v. 22, n. 1, art. 4, pp. 70-91, 2018.). A análise do discurso da empresa identificou três mecanismos utilizados para informar sobre o desastre: são eles, deslocamento de culpa, minimização e distorção das consequências e rotulagem eufemística que significa o mascaramento de atividades não adequadas ou atribuição de status respeitável a essas atividades. Este último aspecto fica evidente no discurso dos entrevistados, uma vez que a empresa, ao tratar oficialmente do desastre, informa sobre a sua atuação eficiente e responsável e afirma que o evento foi um acidente (MEDEIROS; ALCADIPANI; OLIVEIRA, 2018MEDEIROS, C. R. O.; ALCADIPANI, R.; OLIVEIRA, L. B. Mitos no Desengajamento Moral: Retóricas da Samarco em um Crime Corporativo. RAC, v. 22, n. 1, art. 4, pp. 70-91, 2018.; SARAIVA; FERREIRA, 2018SARAIVA, C. M.; FERREIRA, P. T. M. A Lama da Samarco e o Crime Corporativo: uma reflexão necessária. Administração Pública e Gestão Social, v. 9, n. 2, p. 75-83, 2018.). Assim, é possível inferir, em um primeiro momento, que a gestão simbólica realizada pela empresa (seja no âmbito da área de Recursos Humanos, seja no âmbito do desastre) favoreceu a organização de uma representação por parte dos respondentes em relação a empresa com uma conotação fortemente positiva.

O rompimento da barragem, na perspectiva das classes apresentadas, foi um elemento que gerou um desacordo entre a realidade e a representação positiva da Samarco, que até então dominava aquele pensamento grupal. Nessa ordem, uma série de racionalizações foram sendo geradas a ponto de criarem insuportáveis incoerências intra e interpessoais, que somente poderiam se resolver por um retorno à representação social antiga ou por uma reestruturação do campo representacional (FLAMENT, 2001FLAMENT, C. Estrutura e dinâmica das representações sociais. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 173-186.). Diante do exposto, no contexto desse grupo ocorreu a manutenção da representação social da Samarco como positiva. A interpretação do desastre como um acidente foi a racionalização encontrada que permitiu ao grupo suportar tal contradição.

A Classe 4 (O desastre) abrange elementos relacionados ao rompimento da barragem em si, no que se refere aos seus impactos e às ações de reparação. Os discursos giram em torno dos acontecimentos e sentimentos relacionados ao dia do rompimento da barragem e ao dia posterior ao desastre quando chegaram a empresa e tiveram que lidar com aquela nova realidade. Vale ressaltar que a concentração maior deste conteúdo está nos segmentos de textos retirados dos discursos das pessoas que deram suporte diretamente às regiões afetadas (chi2: 24,94).

A seguir são registrados exemplos de algumas falas:

Colatina, por exemplo, é uma cidade que nunca teve um poço de água. Vivia faltando água e, no auge do problema, a Samarco estava gastando milhões lá com água mineral (Entrevistado 2).

Foi um choque para a gente acreditar que um dia aquilo ali poderia romper, apesar da gente achar que tudo é possível, porque eles pregavam muito para a gente que eles gastavam muito naquela barragem de rejeitos (Entrevistado 4).

Os relatos dessa classe foram direcionados para o entendimento de que as ações de reparação fornecidas pela empresa vieram para beneficiar os locais atingidos, que já se encontravam carentes de infraestrutura. Para exemplificar, falou-se da situação degradante que o Rio Doce já se encontrava devido à seca, ao desmatamento e à poluição; da falta de água que já existia em Colatina e da falta de tratamento de esgoto de Colatina e Governador Valadares. As ações de reparação foram representadas como uma oportunidade de melhoria para essas regiões, e não como uma obrigação de reparação por parte da empresa.

Segundo algumas falas, houve situações tidas como abusivas por parte das pessoas atingidas. De acordo com este entendimento, a Samarco se “deixou saquear pelas pessoas” (Entrevistado 2), pois seria “uma empresa muito íntegra, muito honesta e estava se sentindo muito culpada” (Entrevistado 2). Essas percepções sobre os comportamentos abusivos dos atingidos pelo desastre remetem a uma das funções das representações sociais, que é de justificar, a posteriori, comportamentos e tomadas de posição (ABRIC, 1998ABRIC, J. C. A Abordagem estrutural das representações sociais. In: MOREIRA, A. S. P.; OLIVEIRA, D. C. (Org.). Estudos interdisciplinares de representação social. Goiânia: AB, 1998. p. 27-38.). Em outras palavras, as representações sociais influenciam na avaliação das ações, possibilitando aos indivíduos explicar e justificar comportamentos em determinadas situações. Nesse caso, as representações sociais da Samarco de ser uma empresa íntegra e justa justificariam um suposto comportamento de “se deixar saquear pelas pessoas” (Entrevistado 2).

Nesse contexto de construção da representação social do objeto desastre, verifica-se que o processo de elaboração sofre uma defasagem em relação ao seu referente (JODELET, 2001). Nesse caso, verifica-se à subtração de características pertencentes ao objeto. Nessa lógica, haverá no campo representacional do desastre apenas aspectos com significados positivos. O discurso da Classe 4 (O desastre) contemplou os elementos relacionados às ações de reparação da Samarco e os seus consequentes benefícios na elaboração da representação social do desastre. O fenômeno do desastre em si, com todos os impactos negativos gerados à sociedade foi subtraído do seu processo de elaboração, estando presente de forma mais evidente os elementos que se referem às ações de reparação realizadas pela empresa.

As dimensões positivas sobre a mineradora são tratadas sob diferentes perspectivas nas classes até aqui apresentadas. Entende-se que tais representações sociais foram elaboradas a partir de processos de difusão e comunicação em contextos dentro e fora da organização, seja por meio de dinâmicas interacionais, seja pelo sistema de crenças e normas sociais (DOISE, 2002DOISE, W. Da psicologia social à psicologia societal. Psicologia Teoria e Pesquisa, v. 18, n. 1, p. 27-35, 2002.), dos discursos proferidos pela empresa (Medeiros, Alcadipani e Oliveira (2018MEDEIROS, C. R. O.; ALCADIPANI, R.; OLIVEIRA, L. B. Mitos no Desengajamento Moral: Retóricas da Samarco em um Crime Corporativo. RAC, v. 22, n. 1, art. 4, pp. 70-91, 2018.) e também a partir das experiências pelos quais os sujeitos passaram (JODELET, 2005JODELET, D. Experiência e representações sociais. In: MENIN, M. S. S.; SHIMIZU, A. M. (Org.). Experiência e representação social: questões teóricas e metodológicas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005. p. 23-56.).

Por fim, na Classe 1 (Samarco negligente) estão os discursos que abrangem o entendimento de que o desastre foi resultado de uma postura negligente da Samarco. Vale ressaltar que os segmentos de textos mapeados nessa classe foram mais presentes nos discursos dos participantes da área administrativa (chi2: 18,52). A seguir, alguns exemplos das falas dos participantes:

Então se pensou muito ali na produção, no ganho de produção mesmo e foram negligenciados os fatores de segurança. Foi negligência mesmo! (Entrevistado 9).

Para mim foi pura negligência, as consequências foram nefastas para vários níveis da sociedade, pararam cidades que dependiam muito da Samarco. Foi culpa dos diretores da Samarco daquilo ter acontecido. Não vejo mais a Samarco com os olhos que eu tinha antes. Se eu pudesse resumir mesmo o que foi o desastre, eu falaria que é negligência (Entrevistado 4).

A mídia foi significativamente mencionada como um importante meio de comunicação que colaborou na elaboração dessa representação social do desastre. Nesse cenário, afirmações sobre mudanças de opinião a respeito da conduta da empresa, que antes era tida como segura e responsável e, após o desastre, passou a ser vista como negligente demonstram o sentimento de decepção pela ação da mineradora. A seguir alguns extratos das falas dos participantes:

Eu achava que realmente tinha sido um acidente, mas depois, vendo o que a mídia mostrava, eu descobri meses depois e vi que não era (Entrevistado 5).

Para mim o desastre foi uma quebra de confiança na empresa que eu trabalhava. Eu, para ser sincera, não tenho mais vontade de voltar para essa área de mineração (Entrevistado 8).

Na Classe 1 (Samarco negligente), a compreensão foi de que a Samarco foi negligente e essa conduta foi associada ao motivo do desastre. O desastre representou, para esses participantes, uma quebra de confiança pelas associações que faziam em relação à empresa. Esse discurso evidenciou a presença de uma representação positiva sobre a empresa no período anterior ao rompimento da barragem, que foi questionada em consequência ao desastre.

O desastre foi amplamente divulgado em diversos meios de comunicação (televisão, rádio, mídia impressa e internet), e continua gerando repercussão anos após o ocorrido, como se pode ver pelos debates que foram apresentados na introdução deste texto. A cobertura do desastre pela mídia permeou a realidade dos participantes dessa pesquisa e passou a atuar de maneira efetiva nas suas vivências cotidianas, contribuindo de maneira significativa no processo de construção das representações sociais do desastre ocorrido em Mariana (MG). Nesse contexto, é importante retomar as reflexões de Moscovici (2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.) sobre a necessidade de considerar a mediação exercida pela mídia para compreender o processo de formação das representações sociais nas sociedades contemporâneas. Essa análise é importante nesse processo, visto que a comunicação de massa é um componente cultural de forte influência nas representações da sociedade.

Além da cobertura midiática, as redes sociais, as conversas com amigos e familiares também estiveram presentes no processo de construção e negociação das representações sociais da Samarco e do desastre nos discursos da Classe 1 (Samarco negligente). Por meio delas, os participantes puderam acessar opiniões de amigos e familiares e rever posições. Segundo os entrevistados, no período recente ao desastre, a primeira reação foi tentar defender a empresa. No decorrer do tempo, esse desejo foi dando lugar a uma postura mais resignada, mais convencida de que o desastre havia sido resultado da negligência da Samarco. Dessa forma, as informações acessadas tanto na mídia quanto nos grupos sociais de convivência favoreceram a reorganização da representação social da Samarco e do desastre. Isso reforça as reflexões de Moscovici (2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.) ao defender que a conversação é o primeiro gênero de comunicação através do qual o conhecimento do senso comum é gerado e que a mídia participa do processo de construção das representações sociais de maneira relevante.

Esse pensamento a respeito da negligência da Samarco encontra-se mais representativo nos discursos dos participantes das áreas administrativas. Uma possível interpretação para essa diferença relaciona-se a própria natureza das atividades administrativas mencionadas pelos entrevistados. Em tais atividades o risco de acidente é considerado baixo, e de acordo com os relatos dos participantes, o contato com os discursos e procedimentos de segurança proferidos e exigidos pela Samarco é consideravelmente menor quando comparados aos setores da operação. Essa realidade pode explicar o distanciamento dos sujeitos com os valores de segurança pregados pela Samarco e sua compreensão a respeito dos motivos do desastre. Tal condição mostra-se relacionada ao conceito de Doise (2010DOISE, W. O retorno da sociedade à psicologia social. In: Anais... Brasília: Simpósio gênero e psicologia social, 2010.) já citado sobre a influência que a posição do indivíduo no meio social exerce na interpretação da realidade e, consequente, tomada de posição.

As transformações das representações sociais da Samarco e do desastre retratam ainda outra condição abordada por Flament (2001FLAMENT, C. Estrutura e dinâmica das representações sociais. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 173-186.), diferente do que já foi apresentado sobre o retorno às representações sociais antigas. Trata-se de um contexto em que há um desacordo entre o novo elemento e a representação. Tal situação ocorre quando esse elemento contradiz explicitamente a representação precedente, surgindo a partir daí o que ele chama de “esquemas estranhos” (FLAMENT, 2001FLAMENT, C. Estrutura e dinâmica das representações sociais. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 173-186., p. 180); assim, a representação social se transforma de maneira brutal. A análise da Classe 1 (Samarco negligente) mostrou que o desastre atuou como um elemento estranho que questionou profundamente aspectos que constituíam as representações positivas sobre a Samarco e contribuiu para a reestruturação das representações sociais.

Segundo Flament (2001FLAMENT, C. Estrutura e dinâmica das representações sociais. In: JODELET, D. (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 173-186.), realizar uma mudança em uma representação social não é simples. Precisa haver algum elemento que a contradiga e, mesmo assim, não é certo que a transformação ocorra. Nessa perspectiva, foram identificados nesta pesquisa dois diferentes processos, respectivamente correspondentes às categorias de mudança e estabilidade descritas por Sartawi (2015SARTAWI, M. Exploring stability and change through social representations: towards an understanding of religious communities. In: ANDREOULI, E.; GASKELL, G.; VALSINER, J. (Org.). The Cambridge Handbook of Social Representations. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 341-357.). Para um grupo, a reestruturação do campo representacional se deu no sentido de alterar a representação social central (a Samarco de boa empresa para negligente e o desastre como consequência dessa postura); para outro, a reestruturação ocorreu no sentido da manutenção da representação (a Samarco como boa empresa e a representação do desastre como acidente, ancorada na representação social central). Isso coloca em evidência o fato de que a transformação de representações sociais não ocorre de forma homogênea em diferentes grupos sociais, ainda que inseridos em contexto organizacional semelhante. Esses resultados reforçam a proposta de Doise (2002DOISE, W. Da psicologia social à psicologia societal. Psicologia Teoria e Pesquisa, v. 18, n. 1, p. 27-35, 2002.), que afirma que a elaboração das representações sociais ocorre por meio das crenças, normas e valores do grupo de pertença.

A discussão até aqui mostrou os elementos que estão presentes na organização e na gênese de uma representação social, quais sejam a conversação, a experiência, a mídia, os discursos proferidos pela empresa e os afetos, além das crenças, valores e normas. Contudo, apoiado em Howarth (2006HOWARTH, C. A social representation is not a quiet thing: Exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, v. 45, n. 1, p. 65-86, 2006.) entende-se ser relevante refletir, por exemplo, sobre as seguintes perguntas: Quais são as consequências de adotar uma ou outra dessas diferentes versões? Quem ganha e quem perde no campo de batalha da representação social?

Os resultados apresentados evidenciam que as representações tanto podem ser usadas para defender e, assim, sustentar construções particulares da realidade quanto para resistir a determinadas versões da realidade. Neste caso, entende-se que o campo representacional se organiza em dois eixos opostos: o eixo da racionalidade econômica e o eixo da racionalidade socioambiental.

Do ponto de vista da racionalidade econômica, observa-se um direcionamento da definição do que é o real cuja interpretação favorece discursos instrumentais corporativos. Por outro lado, do ponto de vista da racionalidade socioambiental, a versão da realidade seria orientada para resguardar interesses do que se entende como sociedade e meio ambiente, invertendo o jogo de forças no campo de batalha representacional. Opõem-se, neste campo simbólico, de um lado, as grandes empresas, executivos, acionistas, e, de outro, a sociedade e o meio ambiente.

Nessas disputas, em que ambas as racionalidades identificadas se apresentam como opostas, destaca-se a importância de eventos, de informações e da própria mídia na estabilização e desestabilização das interpretações sobre a realidade, e a profunda ligação que essas realidades possuem com o mundo social e sua manutenção ou mudança. É possível inferir, assim, que a racionalidade econômica reforça o consenso hegemônico capitalista, enquanto a racionalidade socioambiental, ainda que não conteste completa ou explicitamente o sistema, pode abrir caminho para expressões contra-hegemônicas, representando assim formas de resistência a ele.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao examinar as representações sociais da Samarco e do desastre a partir da perspectiva de um grupo de ex-funcionários que aderiram ao PDV, foi possível concluir que a construção simbólica referente à mineradora atravessou, sob diferentes perspectivas, o processo de construção das representações sociais do desastre. Assim, a formação das representações sociais da Samarco e do desastre para esse grupo mostrou-se associada a contextos sociais, culturais e ideológicos, a crenças e valores, à influência dos grupos de pertença e à mídia, reforçando entendimentos já estabelecidos na literatura.

Observou-se que a formação do pensamento social sobre o desastre apresentou distintas visões, resultado do processo de construção, negociação e disputa sobre a interpretação da realidade. A compreensão do desastre como um fenômeno acidental mostrou-se ancorado sobre o simbolismo positivo da Samarco presente naquele discurso social. Em contrapartida, o entendimento de que o desastre foi resultado de uma postura negligente da mineradora mostrou-se ancorado em questões individuais, nas relações sociais e na mídia.

A presença dessas distintas representações sociais em ambos os grupos de pertença, grupo administrativo e grupo da operação, saúde e segurança, considera as diferenças de posições que os participantes ocupavam no tecido das relações sociais da Samarco. Assim, as diferenças de representações sociais em relação aos objetos sociais “Samarco” e “desastre” podem ser explicadas, entre outros fatores, a partir das diferentes pertenças, uma vez que o meio social em que o indivíduo está inserido influencia na sua interpretação da realidade (DOISE, 2010DOISE, W. O retorno da sociedade à psicologia social. In: Anais... Brasília: Simpósio gênero e psicologia social, 2010.).

O ocorrido representou uma ruptura na história da Samarco e uma revisão no padrão dos pensamentos típicos daquele grupo. Segundo Moscovici (2000MOSCOVICI, S. Representações Sociais: Investigações em psicologia social. 11. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000.), o caráter das representações sociais fica mais evidente especialmente em períodos de crise e mudanças. As representações sociais se mostram mais transparentes, pois os limites entre o que é privado e o que é público se tornam confusos. Esse é exatamente o momento no qual os indivíduos estão mais propensos a falar, as memórias coletivas são mais acessadas e o comportamento é mais espontâneo. O desastre tornou o que era familiar em algo não familiar e, por isso, os indivíduos foram motivados a entender esse fenômeno perturbador.

Esse processo colocou em evidência a negociação e o conflito de interpretações diferentes sobre a realidade. Dessa forma, o rompimento da barragem questionou modelos de pensamentos que dominavam o discurso social desse grupo, dando lugar a disputas por novas interpretações da realidade. Foi observado um esforço grande por parte de um grupo para a manutenção da representação social e a organização de uma nova representação social. A presente pesquisa contribui, portanto, ao lançar luzes sobre essa relação dialética, entre manutenção e mudança, e também sobre a negociação e conflito, mostrando empiricamente como as representações sociais se organizam diante de eventos marcantes.

Outra contribuição desse estudo para o campo da Administração e dos Estudos Organizacionais se situa na constatação empírica das influências que os sistemas de crenças e normas sociais consolidadas pela própria organização exercem no processo de elaboração das representações sociais sobre ela mesma. A representação social da Samarco mostrou-se elaborada a partir de crenças compartilhadas entre os seus diferentes membros e a partir das produções ideológicas e culturais que pareceram ser características da própria organização, que compreendem os seus sistemas de crenças, representações, avaliações e normas sociais. Dessa forma, a representação social do desastre como um fenômeno acidental, considerada por parte dos entrevistados, encontra-se num continuum desse processo. Sua construção mostrou-se ancorada na representação social da Samarco considerada positiva naquele contexto. Em outras palavras, para se compreender a representação social do desastre como acidente, faz-se necessário entender a representação social da Samarco naquele contexto.

A presente pesquisa também contribui, pois evidencia o conflito e a disputa presente nas diferentes interpretações da realidade. Essa disputa refere-se a constante (re) negociação do que é aceito como realidade em um dado momento. Isso ocorre devido às diferenças de poder na ordem social. Certos grupos têm diferentes graus de acesso à esfera pública e têm diferentes meios para apresentar e/ou contestar reivindicações do "real" (HOWARTH, 2006HOWARTH, C. A social representation is not a quiet thing: Exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, v. 45, n. 1, p. 65-86, 2006.). Neste caso, observa-se a presença da racionalidade econômica como influência relevante na organização da representação social, mas que encontra resistência na racionalidade socioambiental.

O desastre em Mariana (MG) causou grandes impactos sociais, econômicos e ambientais e, mesmo diante desse contexto, cinco anos após o rompimento da barragem, ainda ninguém foi preso ou responsabilizado. O crime de homicídio foi retirado do processo. As mortes foram consideradas pela justiça como consequência da inundação causada pelo rompimento. As comunidades destruídas não foram reconstruídas (FREITAS, 2020FREITAS, R. Tragédia de Mariana, 5 anos: sem julgamento ou recuperação ambiental, 5 vidas contam os impactos no período. O Globo, Minas Gerais, 5 nov. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2020/11/05/tragedia-de-mariana-5-anos-sem-julgamento-ou-recuperacao-ambiental-5-vidas-contam-os-impactos-no-periodo.ghtml. . Acesso em: 27 dez. 2020.
https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/not...
). Cerca de 10 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério, liberados pelo rompimento, ainda jazem no fundo do reservatório da usina hidrelétrica Candonga (SILVEIRA, 2020SILVEIRA, S. Após 5 anos, rejeitos da Samarco ainda estão no lago de hidrelétrica. O eco, 29 nov. 2020. Disponível em: https://www.oeco.org.br/reportagens/apos-5-anos-rejeitos-da-samarco-ainda-estao-no-lago-de-hidreletrica/. Acesso em: 15 dez. 2020.
https://www.oeco.org.br/reportagens/apos...
). Os rios e o oceano atingidos ainda sofrem com os impactos, que vão da contaminação de metais até o desaparecimento de espécie de peixes (FERNANDES, 2020FERNANDES, V. Cinco anos após lama, rio e mar ainda sofrem com contaminação, diz estudo. A Gazeta, Vitória, 5 nov. 2020. Disponível em https://www.agazeta.com.br/es/cotidiano/cinco-anos-apos-lama-rio-e-mar-ainda-sofrem-com-contaminacao-diz-estudo-1120. Acesso em: 27 dez. 2020.
https://www.agazeta.com.br/es/cotidiano/...
).

Para além das contribuições teóricas evidenciadas neste artigo, entende-se que o próprio acesso aos sujeitos pesquisados, ainda mais em um momento tão sensível quanto o período recente do pós-desastre, caracteriza-se como aspecto relevante deste estudo. A ocorrência de um fenômeno de enormes proporções como este abre muitas possibilidades de análise para além dos dados objetivos do desastre. Neste caso, têm-se os dados subjetivos associados à maneira que esse fenômeno foi representado socialmente por pessoas diretamente ligadas à organização.

Por fim, a proposta dessa pesquisa foi articular a Teoria das Representações Sociais com o campo dos Estudos Organizacionais, pois entende-se que essa articulação possibilita novas reflexões sobre os objetos que foram estudados e assim, contribuir para ampliar a discussão de tais estudos para outros campos dos saberes.

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  • 1
    O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de financiamento 001.
  • 2
    Recebido em 29/6/2020, aceito em 24/2/2021.
  • 6
    O referido programa consistiu em oferecer alguns benefícios, além dos definidos pela CLT, para aqueles que aderissem ao programa até final de julho de 2016. Na época, o número de empregados era na ordem de 3500 funcionários. Aderiram ao PDV um total de 924 pessoas, sendo 455 no Espírito Santo e 469 em Minas Gerais (SAMARCO, 2016).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2020
  • Aceito
    24 Fev 2021
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