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Juventude e escolarização (1980-1998)

RESENHAS

Denise Cordeiro Terra

Professora da Faculdade de Formação de Professores da UERJ e doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF

SPOSITO, Marília Pontes (org.). Juventude e escolarização (1980-1998). Brasília: INEP/MEC, 2002, 317p. (Série Estado do Conhecimento nº 7)

Um mergulho em busca do aprofundamento da discussão sobre o tema da juventude na educação é o norte desse estudo, que abarca cerca de 4,4% do total das teses e dissertações produzidas na área da educação, tomando como referência os catálogos de teses de programas de pós-graduação em educação e o CD-ROM da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), no período de 1980 a 1998. É fruto do trabalho de um grupo de pesquisadores originários de diferentes instituições, sob a coordenação geral de Marília Sposito (USP e Ação Educativa), com apoio da FAPESP, do CNPq e do INEP. A pesquisa privilegia como recorte o campo da sociologia, embora incorpore os estudos fundamentados no campo da psicologia, considerando a expressiva produção discente na área.

Sposito inicia a obra com o artigo "O estado do conhecimento sobre juventude e educação", no qual expõe os caminhos investigativos utilizados para tematizar a juventude como categoria sociológica, no campo da educação. De pronto, deixa claro que os esforços para a compreensão nessa categoria sejam de difícil configuração, pois os critérios que a constituem, enquanto sujeitos, são de ordem histórica e cultural (p. 7). Faz, para tanto, uma revisão exaustiva de vários autores, dentre eles Pais, Dubet, Donfut, Salem, Melucci, Peralva e Viana, que se destacaram por indicar que a juventude, como categoria sociológica, está imbricada por uma tensão indissolúvel entre a idéia de fase ou ciclo de vida, com contornos socioculturais e modos de inserção na organização estrutural da sociedade. O referencial teórico produzido por Sposito permite, portanto, perceber a polissemia como questão inerente à investigação sobre juventude, enfatizando a busca pela compreensão dos modos de ser da juventude existente. A autora explicita, a seguir, os dados e os critérios adotados para a produção teórica do estudo que identificou, analisou e descreveu, num conjunto de cerca de 332 dissertações e 55 teses, e anexa tabela relativa à distribuição das mesmas por orientadores.

Os autores dos artigos seguintes examinam de modo mais específico os sete eixos articuladores da produção, os percursos investigativos, suas orientações metodológicas, atributos positivos e lacunas. O estudo sobre "Aspectos psicossociais dos adolescentes", realizado por Maria Cecília Cortez C. Souza (USP), abre o conjunto centrado na análise da produção acadêmica que privilegiou o diálogo com a psicologia da educação, especialmente a partir da década de 1980, representando 19,7% dos temas encontrados nas teses e dissertações. Essa produção enfatiza o exame dos aspectos psicossociais do comportamento dos adolescentes, envolvendo valores, julgamento moral, capacidade crítica, sexualidade, representações, drogas, relações familiares, gênero e identidade.

A relação do jovem com a escolarização é detidamente recuperada nos três artigos seguintes, que abordam respectivamente a perspectiva do aluno do ensino fundamental e médio e a experiência do aluno da educação básica e de estudantes universitários que trabalham (jovens no ensino superior). O artigo "Juventude e escola", de Juarez Dayrell (UFMG), analisa os resultados da ação escolar do ponto de vista dos jovens. O avanço dos estudos nesse campo tem apontado para a compreensão das culturas juvenis, embora o autor destaque a pouca tematização da categoria sociológica da juventude na pesquisa educacional. Neles, prevalece os aspectos estritamente pedagógicos, reduzindo o jovem à condição de aluno, sem considerar as múltiplas dimensões da experiência escolar e sem problematizar o jovem no espaço urbano e indicar as práticas educativas para além da escola.

Em "Jovens no mundo do trabalho e escola", Maria Carla Corrochano (doutoranda da USP) e Marilena Nakano (da Fundação Santo André) revelam como a partir da década de 1980/1990, os estudos do campo trabalho-educação vão influenciar o alargamento do olhar sobre a juventude trabalhadora para além do espaço escolar, incorporando, fundamentalmente, a dimensão do trabalho nas análises sobre a escola, especialmente as de nível médio, no bojo da política educacional e da nova LDB. Indica ainda a profunda ausência de estudos sobre o jovem desempregado no Brasil (como ele vive e suas ocupações no mercado informal, por exemplo).

Em "Estudantes universitários", Paulo César Rodrigues Carrano (UFF) destaca a concentração de estudos sobre o tema na década de 1980, possivelmente pela busca de compreensão dos efeitos da Reforma Universitária que provocou a ampliação da oferta de ensino superior privado, sobretudo noturno, e alterou as formas de acesso por meio de mudanças nos exames vestibulares, além da forte presença dos debates em torno da autonomia universitária no contexto de redemocratização da sociedade brasileira. As teses e dissertações enfocam o aluno, jovem trabalhador, seu ingresso no ensino superior noturno, a expansão da oferta, a evasão nos cursos, as trajetórias escolares e as escolhas profissionais do estudante. Carrano expõe, na apreensão dos trabalhos, a hipertrofia da categoria juventude, quando muito apreendendo o jovem a uma provisória identidade estudantil. Os trabalhos privilegiam, em sua maioria, o estudo das situações presentes num quadro de democratização da universidade, enfatizando o estudante das camadas populares e camadas médias emergentes.

Tomando como foco o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), nos anos de 1990, e os trabalhos voltados para o exame dos jovens outsiders, ou seja, aqueles que vivem em extrema condição de pobreza e acirrados processos de exclusão, Ana Paula de Oliveira Corti (mestranda da UFSCar) produz o artigo "Adolescentes em processo de exclusão social". Segundo a autora, o interesse dos pesquisadores que desenvolveram teses e dissertações passam a centrar-se, então, na faixa etária anterior à maioridade, conforme marca o recorte legislativo, o que traz como novo vocabulário político identificador as denominações "meninos e meninas de rua" e cria outras lacunas na produção do conhecimento.

Em "Jovens e participação política", Paulo César Rodrigues Carrano (UFF) analisa as teses e dissertações agrupadas na categoria participação política do jovem estudante e da socialização política e cidadania. Destaca-se, nesse campo, a maior tradição dos estudos sociológicos sobre juventude, voltados para os processos de mobilização social e ação política dos jovens.

Por último, Marília Pontes Sposito (USP) e Ana Paula de Oliveira Corti (mestranda da UFSCar) dão relevo aos "Temas emergentes", dando voz aos poucos estudos sobre a juventude e sua relação com a violência escolar; a influência da mídia escrita e televisiva sobre a adolescência e, por último, a nova presença dos grupos juvenis e seu papel atuante e mobilizador do ponto de vista cultural.

De fato, como o título da publicação expressa, o estado de conhecimento realiza uma fecunda investigação sobre a juventude e sua interface com os processos de escolarização. O amplo mapeamento dos estudos permite pensar projetivamente e abre novas possibilidades para a compreensão da maneira pela qual os indivíduos constroem sua socialização, como os atores se socializam e se constituem como sujeitos, em função das experiências vividas, ampliando o sentido do educativo. Essa obra, em síntese, constitui-se em fonte de pesquisa e reflexão por parte dos educadores e pesquisadores interessados em desenvolver estudos no campo da juventude e sua relação com a escolarização.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Out 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 2003
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