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Editorial

EDITORIAL

Este número da Revista Brasileira de Educação apresenta ricas contribuições para a área de educação, no que diz respeito aos temas abordados e às diferentes vinculações teórico–metodológicas de seus autores. Nesse conjunto, como em números anteriores, privilegiamos a publicação de textos derivados de pesquisas ou ensaios que discutem temáticas originais, abrindo espaço para aqueles que apresentam abordagens teóricas inovadoras.

No primeiro artigo, "Máscaras, jovens e 'escolas do diabo'", José Machado Pais aborda o que considera um dos desafios atuais das pesquisas sociológicas: desmascarar as atuações cotidianas, procurando descobrir o que revelam ou ocultam. Detém–se sobre as máscaras que caracterizam os estilos juvenis e as tramas de significado que esses estilos escondem. Em particular, analisa a existência de máscaras no cenário das escolas retratadas como "escolas do diabo", sugerindo que algumas ações protagonizadas por alguns jovens nessas escolas ocultam formas sutis de violência a que esses jovens encontram–se cotidianamente sujeitos.

Denise Helena Pereira Laranjeira e Ana Maria Freitas Teixeira, em "Vida de jovens: educação não–formal e inserção socioprofissional no subúrbio", analisam as práticas educativas desenvolvidas por jovens, com foco na sua inserção socioprofissional, em oficinas de teatro, num curso de eletricidade e no Programa Agente Jovem. Justificam a escolha do local da pesquisa – em um subúrbio da cidade de Salvador, na Bahia – pela concentração da população jovem desfavorecida social e culturalmente, "esquecida" das políticas públicas. Mostram que os jovens enfrentam diferentes estigmas que afetam diretamente o processo de inserção socioprofissional.

Por sua vez, o artigo de William F. Pinar, "O corpo do pai e a raça do filho: Noé, Schreber e a maldição do pacto", a partir da descrição de um livro que resume e justapõe pesquisas que possibilitam aos professores estabelecer conversas sobre o currículo no qual eles e seus alunos estão engajados, lembra o pacto entre Jeová e os israelitas, no Velho Testamento, e argumenta que o racismo branco relaciona–se a este pacto, que envolve a repressão do desejo sexual entre pai e filho e a projeção da diferença sexual para os "outros". Traz, portanto, reflexões ainda pouco tematizadas na bibliografia brasileira sobre educação.

Em "Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdades e diferença", Vera Maria Ferrão Candau examina a relevância do discurso dos direitos humanos no contexto das culturas atuais, tendo como principal interlocutor o sociólogo Boaventura Sousa Santos. Indica as diferentes abordagens do multiculturalismo, assumindo a perspectiva intercultural, por sua relevância, e assinala alguns desafios que considera de especial importância para trabalhar as relações entre educação intercultural e direitos humanos.

Bernardete Gatti, no artigo "Análise das políticas públicas para formação continuada no Brasil, na última década", discute a forma como processos de educação continuada, presenciais ou a distância, têm sido implementados no contexto das políticas educacionais da União, de Estados e Municípios, na última década. Mostra a multiplicidade de iniciativas desenvolvidas em diferentes modalidades metodológicas, visando variados tipos de formação, com foco em professores de diversos níveis de ensino e suas especialidades. Coloca a questão no contexto internacional, por meio da exposição de vários documentos de organismos multinacionais. Discute ainda o papel da legislação brasileira, o impulso que propiciou às iniciativas de educação continuada no Brasil, os problemas que emergiram e as novas legislações.

Akiko Santos, em "Complexidade e transdisciplinaridade em educação: cinco princípios para resgatar o elo perdido", explora a potencialidade dos princípios holográfico (David Bohm/Edgar Morin), da complementaridade dos opostos (Niels Bohr), da transdisciplinaridade (Basarab Nicolescu), da incerteza (Werner Heisenberg) e da autopoiese (H. Maturana e F. Varela), elaborados por cientistas de diferentes áreas e integrados à teoria da complexidade e da transdisciplinaridade. Trabalha esses princípios visando ao resgate de um sentido do conhecimento para a vida, elo perdido com a prática de sua fragmentação.

Em "Imagens de um lugar de memória da Educação Nova: Instituto de Educação do Rio de Janeiro nos anos de 1930", Sonia de Castro Lopes sublinha a importância conferida àquele Instituto como um dos mais expressivos laboratórios da Escola Nova, referência para o país naquela década como centro de excelência na formação de professores. Utilizando imagens veiculadas pelo periódico Arquivos do Instituto de Educação, publicado pela primeira vez em 1934, sob os auspícios da Secretaria de Educação do Distrito Federal, busca superar a idéia da fotografia como mera ilustração para as análises escritas, considerando–a como fonte histórica que requer uma construção teórico–metodológica singular.

Carlos Herold Junior, em "Os processos formativos da corporeidade e o marxismo: aproximações pela problemática do trabalho", procura evidenciar a mútua importância que possuem os estudos sobre a formação da corporeidade e as reflexões baseadas no materialismo histórico. Observa que, ao atrelar a análise do corpo às transformações no mundo do trabalho, pode–se aprofundar as possibilidades das análises sobre o corpo na atualidade e com isso espera mostrar que a análise do corpo se constitui em uma importante temática para as reflexões sobre a sociedade capitalista, da mesma forma que a reflexão sobre as transformações na forma de trabalho dessa sociedade oferecem possibilidades valiosas aos estudiosos da corporeidade.

No artigo "Arte e metáforas contemporâneas para pensar infância e educação", Luciana Gruppelli Loponte discute a relação entre arte, educação e infância com base nas seguintes questões: De que forma podemos saber mais sobre a infância a partir de metáforas da arte contemporânea? O que a arte contemporânea pode dizer para a docência da infância? De que modo a docência vê a infância e sua arte? Podemos pensar em uma dimensão estética da formação docente para a infância? Na esteira dessas questões, debate também sobre o lugar da arte nas políticas públicas para educação infantil, especialmente no que diz respeito à formação docente e à ampliação do ensino fundamental para nove anos.

Roberto Abdala Junior, em "O cinema na conquista da América: um filme e seus diálogos com a história", aborda uma questão clássica, presente entre professores e cineastas: os filmes e os processos de aprendizagem. Baseado em trabalhos de James Wertsch, psicólogo que procura encontrar "aproximações" entre as teses de Vygotsky e Bakhtin, busca demonstrar que os argumentos desse autor e de outros que estudam o cinema – também sob viés bakhtiniano – podem ser articulados no sentido de sugerir estratégias para empregar filmes nos processos de construção do conhecimento histórico, escolar ou não. Ao final, a partir do filme 1492 – A conquista do paraíso, de Ridley Scott, propõe um exercício prático, operacionalizando a argumentação formulada anteriormente.

Apresentado por Maria Teresa Freitas e Dario Fiorentini, o artigo "Desafios e potencialidades da escrita na formação docente em matemática", resulta de pesquisa que teve como objetivo investigar como futuros professores da licenciatura respondem à experiência de uma disciplina de formação matemática que privilegia o registro escrito discursivo e reflexivo. A investigação narrativa foi eleita como método de pesquisa, contando com registros etnográficos, entrevistas, relatórios e mensagens pela internet. Subsidiada teoricamente pelos estudos histórico–culturais, o texto traz uma das narrativas de formação, evidenciando aspectos importantes da presença da escrita na constituição pessoal e profissional do professor.

O último artigo do conjunto, "Relação com o saber na aprendizagem matemática: uma contribuição para a reflexão didática sobre as práticas educativas", de autoria de Veleida Anahi da Silva, refere–se à pesquisa realizada em Sergipe, com 362 alunos da 1ª à 5ª série do ensino fundamental, buscando compreender os fundamentos e processos da relação dos alunos com a aprendizagem matemática e verificar a importância da pesquisa de campo para desvelar as representações e os saberes ocultos no processo ensino–aprendizagem. O referencial teórico repousa nas pesquisas de Bernard Charlot e de Claudine Blanchard–Laville sobre a relação com o saber. Os resultados destacam que os alunos se relacionam com objetos e práticas cotidianas, como contar o dinheiro, mais do que com objetos especificamente matemáticos, o que oferece bons indicadores para uma reflexão na ótica da didática.

O presente número reproduz ainda dois importantes documentos lidos na sessão de abertura da 30ª Reunião Anual da ANPEd, realizada em Caxambu, Minas Gerais, de 7 a 10 de outubro de 2007: "Trinta por trinta: dimensões da pós–graduação em educação", de Carlos Roberto Jamil Cury, e "A retomada de compromissos históricos aos 30 anos da ANPEd", de Luiz Antônio Cunha. O primeiro historia a criação da associação e o segundo propõe que sejam retomados seus compromissos históricos, em particular a avaliação do conjunto dos programas de pós–graduação em educação e a defesa do ensino laico, público e gratuito.

E, como de hábito, o número é complementado com resenhas sobre livros editados recentemente.

A Comissão Editorial

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2008
  • Data do Fascículo
    Abr 2008
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