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Avaliação do raciocínio verbal em estudantes do 2º grau

Assessment of the verbal reasoning in high school students

Resumos

A presente pesquisa objetivou avaliar a capacidade cognitiva denominada de raciocínio verbal em estudantes do 2º grau. Trata-se da capacidade que possuímos para expressar as idéais utilizando símbolos verbais. A amostra foi composta por 658 estudantes do 2º grau, de escolas públicas e privadas de Fortaleza (CE) e o instrumento utilizado foi o Teste de Raciocínio Verbal (RV) desenvolvido por Andriola e Pasquali (1995). Através do Teste da Análise de Variância (ANOVA), compararam-se as variáveis sexo, idade e série escolar quanto ao desempenho no Teste RV, utilizando-se o software SPSS for Windows (V. 6.1).

Raciocínio Verbal; Avaliação Psicológica; Cognição


This research has as its objective the assessment of the cognitive capacity called verbal reasoning in high school students. It deals with our capacity to express ideas using verbal symbols. The random sample was composed of 658 high school students from public and private schools in the city of Fortaleza in the state of Ceará (Brazil), while the instrument used was the Verbal Reasoning Test developed by Andriola & Pasquali (1995). By using analysis of variance (ANOVA) it was possible to compare the variables: sex, age and academic level with the performance on the Verbal Reasoning Test, using the software SPSS for Windows (V. 6.1).

Verbal Reasoning; Psychological Evaluation; Cognition


Avaliação do raciocínio verbal em estudantes do 2º grau1 Nota 1 Estudo realizado no Laboratório de Pesquisas em Avaliação e Medida Psico-Educacional (LABPAM/UFC).

Wagner Bandeira Andriola

Universidade Federal do Ceará

Resumo:

A presente pesquisa objetivou avaliar a capacidade cognitiva denominada de raciocínio verbal em estudantes do 2º grau. Trata-se da capacidade que possuímos para expressar as idéais utilizando símbolos verbais. A amostra foi composta por 658 estudantes do 2º grau, de escolas públicas e privadas de Fortaleza (CE) e o instrumento utilizado foi o Teste de Raciocínio Verbal (RV) desenvolvido por Andriola e Pasquali (1995). Através do Teste da Análise de Variância (ANOVA), compararam-se as variáveis sexo, idade e série escolar quanto ao desempenho no Teste RV, utilizando-se o software SPSS for Windows (V. 6.1).

Palavras-chave: Raciocínio Verbal, Avaliação Psicológica, Cognição

Abstract:

Assessment of the verbal reasoning in high school students

This research has as its objective the assessment of the cognitive capacity called verbal reasoning in high school students. It deals with our capacity to express ideas using verbal symbols. The random sample was composed of 658 high school students from public and private schools in the city of Fortaleza in the state of Ceará (Brazil), while the instrument used was the Verbal Reasoning Test developed by Andriola & Pasquali (1995). By using analysis of variance (ANOVA) it was possible to compare the variables: sex, age and academic level with the performance on the Verbal Reasoning Test, using the software SPSS for Windows (V. 6.1).

Key words: Verbal Reasoning, Psychological Evaluation, Cognition.

Introdução

A avaliação das capacidades cognitivas tem a sua história ligada às necessidades sociais de explicação do comportamento humano, e às necessidades educacionais ligadas a melhoria do rendimento escolar dos alunos.

O interesse e desenvolvimento dos testes para avaliação do raciocínio têm que ser enquadrados em um contexto sócio-cultural específico. Assim, devemos nos reportar ao final do século XIX citando as necessidades de caráter tecnológico, as exigências em termos profissionais colocadas pela industrialização progressiva das sociedades ocidentais, o rápido aumento demográfico, a massificação do ensino e, sobretudo, as necessidades de avaliação psicológica na seleção de recrutas norte-americanos para a 1ª guerra mundial (Almeida, 1994).

Os instrumentos destinados a avaliação psicológica, os chamados testes, permanecem, ainda hoje, associados às necessidades de (1) identificação de crianças com baixo potencial cognitivo ou menor desenvolvimento intelectual, (2) elaboração de perfis profissionais considerando as aptidões, os interesses e a personalidade dos adolescentes e jovens, tendo em vista a sua orientação vocacional (Andriola, 1994), (3) seleção profissional objetivando identificar os sujeitos com maior adequação às exigências da função e (4) identificação do estado de demência ou deterioração intelectual dos indivíduos, sobretudo em situações clínicas e jurídicas.

Como ressaltam Wigdor e Garner (1982), pode-se afirmar que a avaliação das capacidades cognitivas permanece ainda hoje um dos domínios mais significativos de aplicação da psicologia, apesar de reconhecerem as limitações dos instrumentos. Andriola (1995 a, b) acrescenta ainda o problema da formação profissional inadequada na área psicométrica daquele que irá lidar com esses instrumentos de avaliação psicológica - o psicólogo.

Embasado nas limitações dos instrumentos e dos profissionais que os utilizam, a avaliação deve ser vista como um processo relevante para obtenção de informações sobre as capacidades cognitivas dos indivíduos testados, porém não pode ser tida como algo "milagroso" e ausente de erros e vieses.

Definição e caracterização do raciocínio

Almeida (1988 a) caracteriza a investigação e a prática psicológica da perspectiva psicometrista, com referência ao raciocínio, segundo três aspectos fundamentais. O primeiro refere-se à possibilidade de estabelecimento de uma relação entre o desempenho dos sujeitos no teste e a sua realização escolar, permitindo assim predizer a margem de sucesso esperado para cada indivíduo, além de proporcionar ao indivíduo a possibilidade de uma decisão pessoal sobre o seu futuro escolar e profissional.

O segundo aspecto é resultante do postulado que afirma que a estabilidade das características dos indivíduos permaneceriam estáveis ao longo de sua existência, designadamente após os primeiros anos de maior desenvolvimento psicofisiológico. Tal postulado fundamenta a existência de diferenças individuais permanentes quanto às capacidades intelectuais, enfocando a influência hereditária. Apesar disso, não é negada a influência das aprendizagens ou experiências sociais sobre a utilização do raciocínio.

O terceiro aspecto refere-se à distribuição dos escores obtidos pelos sujeitos nos testes seguirem as leis da curva normal, ou seja, há maior número de indivíduos cujos resultados situam-se em torno da média da população, e indivíduos cujos escores situam-se simetricamente acima e abaixo de tal valor médio. Tal lei permite a generalização dos resultados obtidos com a amostra para a população da qual é originária, sempre que for garantida a representatividade populacional.

Como o raciocínio pode ser usado em problemas com conteúdos diferenciados, os teóricos psicometristas acreditam na existência de um fator geral de raciocínio (expresso pela capacidade de estabelecer e aplicar relações entre elementos) e em aptidões primárias ou específicas (expressas pelas diferenças de contexto ou conteúdo dos elementos).

Pode-se então depreender que o raciocínio é um mecanismo cognitivo que é utilizado para solucionar problemas (simples ou complexos), em suas mais diferentes formas de conteúdos (verbal, numérico, espacial, abstrato e mecânico) através de seus componentes relacionais (de descoberta e de aplicação).

Almeida (1988 b) propõe que o raciocínio pode ser caracterizado pela aptidão do sujeito em (1) identificar os elementos de um problema; (2) conceitualizar ou compreender a sua formulação; (3) conceber formas alternativas de resolvê-lo; (4) avaliar as diferentes formas alternativas elaboradas para resolvê-lo; (5) retirar conclusões lógicas da informação fornecida e processada; (6) utilizar os componentes relacionais nos procedimentos anteriores; (7) utilizar os procedimentos anteriores independente do conteúdo e da forma da situação, e (8) avaliar a adequação da resposta elaborada considerando mais a especificidade da situação que a "opinião pessoal" sobre a mesma.

No presente caso, pode-se afirmar que o raciocínio verbal é a capacidade cognitiva utilizada na resolução de problemas cujo conteúdo seja composto por símbolos verbais. A relevância da avaliação dessa capacidade, no caso específico de estudantes do 2º grau que objetivam cursar a universidade, está associada ao fato de terem, obrigatoriamente, de submeterem-se a uma prova para avaliar o raciocínio verbal: a redação.

Sendo uma prova obrigatória e de caráter eliminatório, a avaliação do raciocínio verbal através do Teste RV, permite ao estudante ter noção de como está a sua capacidade para lidar com símbolos verbais, forçando-o a uma utilização mais freqüente da mesma que poderá resultar num maior aprimoramento. Aliás, alguns autores (Almeida, 1993; Almeida & Morais, 1992; Nisbet, 1992; Salema, 1992; Santos, 1992; Sprinthal & Sprinthal, 1993) chegam mesmo a propor um Programa de Treinamento Cognitivo para os estudantes que se mostram com baixa capacidade de raciocínio.

Dentro do contexto teórico até aqui apresentado, a pesquisa objetivou avaliar a capacidade de raciocinar utilizando símbolos verbais numa amostra de estudantes do 2º grau de escolas públicas e particulares de Fortaleza, aleatoriamente escolhidas.

Método

Amostra

Utilizou-se uma amostra composta por 658 estudantes secundaristas da cidade de Fortaleza (CE) com idade média de 17,86 anos (DP=3,19), sendo a maior parte do sexo feminino (53,5%), de escolas públicas (61,1%) e da 2ª série (40,7%).

Instrumento

A escolha do Teste de Raciocínio Verbal (RV) deve-se ao fato de ser um instrumento cujos parâmetros métricos de validade de construto, precisão e índices de dificuldade, homogeneidade e discriminação dos itens, terem sido determinados cientificamente. O Teste RV foi construído por Andriola e Pasquali (1995) e objetiva a avaliação da capacidade cognitiva denominada de raciocínio verbal de estudantes do 2º grau. Trata-se de um instrumento de medida psicológica de apuração objetiva, composto por 40 analogias verbais e com tempo limite de 10 minutos para a sua resolução. No presente estudo utilizou-se o formato lápis-papel do Teste RV, existindo também o formato computadorizado (Andriola, 1996).

Procedimento

A aplicação do Teste RV foi realizada por dois Bolsistas de Iniciação Científica (CNPq), após contactar previamente os diretores das escolas escolhidas para a coleta dos dados. Os bolsistas apresentavam as instruções para resolução do Teste RV informando os objetivos da pesquisa, o tipo de tarefa a ser executada e o tempo limite, além de solicitarem alguns dados pessoais para a descrição da amostra. Após a coleta agradeciam a participação dos alunos.

Resultados

Os dados foram então organizados em um banco de dados e analisados utilizando-se o software SPSS for Windows (V. 6.1). Inicialmente as idades foram organizadas em três faixas etárias distintas: 1ª) entre 13 e 15 anos (25,6%), 2ª) entre 16 e 18 anos (41,1%) e a 3ª) com mais de 19 anos (33,3%).

Uma análise inicial revelou que a média de desempenho da amostra total no Teste RV foi de 8,58 (DP=2,18), com amplitude variando de 1 a 16. O Quadro 1 apresenta o desempenho dos estudantes no Teste RV considerando-se as variáveis sexo, série escolar e faixa etária.


Os dados apresentados no Quadro 1 revelam que os homens obtiveram desempenho médio um pouco superior às mulheres, além de variabilidade menor. Os alunos da 3ª série obtiveram desempenho médio superior às demais, além de menor variabilidade. Considerando a idade, os alunos mais velhos obtiveram desempenho médio superior às outras duas faixas etárias, também com variabilidade menor.

Objetivando verificar se as diferenças supra referidas, quanto ao desempenho no Teste RV eram significativas, utilizou-se o Teste da Análise de Variância (ANOVA - Three Way). O resultado obtido na comparação entre os sexos foi F(1, 656)=0,005; n.s., ou seja, detectou-se a inexistência de diferença entre homens e mulheres quanto ao desempenho no Teste RV.

Comparando-se os respondentes quanto a série escolar, o resultado foi F(2, 655)=1,505; n.s., ou seja, também detectou-se a inexistência de diferenças entre as três séries quanto ao desempenho no Teste RV.

Por último, a comparação entre as três faixas etárias resultou no valor F(2, 655)=0,856; n.s., ou seja, repetiu-se a tendência verificada entre os sexos e as séries quanto a inexistência de diferenças significativas no desempenho dos sujeitos submetidos ao Teste RV.

Conclusões

Sobre os resultados obtidos a partir da pesquisa, observou-se a inexistência de diferenças entre homens e mulheres na utilização do raciocínio verbal utilizando-se o formato lápis-papel do Teste RV. Também observou-se igual tendência entre os sujeitos das faixas etárias consideradas no estudo. Tais dados corroboram os resultados obtidos por Andriola e Pasquali (1995).

Quanto às séries escolares, também não encontraram-se diferenças significativas quanto ao raciocínio verbal, refletindo desempenhos similares dos estudantes no Teste RV. Os resultados aqui obtidos vão de encontro aos resultados encontrados por Almeida (1988a), que observou uma elevação no desempenho dos estudantes à medida em que avançavam nas séries escolares.

A observação que deve ser considerada é que não se encontrou qualquer diferença significativa no desempenho dos estudantes utilizados nesse estudo, mesmo comparando-os segundo o sexo, a idade e a série escolar. Uma explicação plausível é que trata-se de uma amostra de estudantes extremamente homogênea quanto a capacidade avaliada.

Quanto a avaliação do raciocínio, deve ser mencionado que se tratade uma atividade relevante para a compreensão de problemas freqüentes na área da psicologia escolar, sobretudo aqueles associados às dificuldades de aprendizagem e baixo rendimento escolar dos estudantes. Também poderá ser de grande utilidade para as atividades de orientação vocacional e profissional de adolescentes e pré-universitários.

Apesar da importância, a avaliação é um processo complexo em que erros e vieses não estão ausentes. Assim, a escolha dos instrumentos a serem utilizados num processo dessa natureza é algo que deve estar cercado de muito cuidado. O psicólogo deverá certificar-se de que o(s) instrumento(s) que utilizará possuem algumas qualidades imprescindíveis. Refiro-me às suas características métricas tais como, a validade de construto, a fidedignidade, às características dos itens (dificuldade, homogeneidade e discriminação), além das normas de apuração dos resultados.

O conhecimento sobre as qualidades métricas que um instrumento de medida psicológica deve possuir só é conseguido através de uma sólida formação na área psicométrica! É justamente nessa área que os cursos de graduação têm extrema necessidade de bons especialistas, o que tem gerado uma formação incompleta dos futuros psicólogos. Ressalte-se que são exatamente esses que atuarão, num futuro muito próximo após a sua formação, nos Hospitais, Escolas, Clínicas e Empresas nas atividades ligadas, de forma direta ou indireta, à avaliação.

Sobre o autor

Wagner Bandeira Andriola é professor do Departamento de Fundamentos da Educação, Mestrado em Avaliação Educacional, da Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal do Ceará. Coordenador do LABPAM/UF. Especialista em Psicometria e Mestre em Psicologia Social e do Trabalho pela Universidade de Brasília. Endereço para correspondência: UFC/FACED/Departamento de Fundamentos da Educação/Mestrado em Avaliação Educacional, rua Waldery Uchoa, 01 - Benfica - Fortaleza (CE) - CEP 60020-110 - Fone/Fax: (085) 283-3926. E-mail: andriola@ufc.br.

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  • Nota

    1 Estudo realizado no Laboratório de Pesquisas em Avaliação e Medida Psico-Educacional (LABPAM/UFC).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Maio 2001
    • Data do Fascículo
      Dez 1997
    Programa de Pós-graduação em Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Psicobiologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte Caixa Postal 1622, 59078-970 Natal RN Brazil, Tel.: +55 84 3342-2236(5) - Natal - RN - Brazil
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