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A maternidade na perspectiva de mães adolescentes e avós maternas dos bebês

Maternity in the perspective of adolescent mothers and their mothers

Resumos

Este estudo buscou investigar o subsistema avós maternas dos bebês-mães adolescentes, de baixa renda. Averiguou-se especificamente: a reação inicial frente à gravidez, as concepções sobre o exercício da maternidade adolescente e o papel desempenhado pelas avós frente a esta situação. Elaborou-se uma entrevista semi-estruturada a partir de um estudo piloto. As entrevistas foram gravadas, transcritas e posteriormente analisadas segundo a técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (1976). Participaram da pesquisa 25 avós maternas dos bebês e 25 mães adolescentes. Verificou-se que, as reações iniciais desfavoráveis frente à notícia da gravidez prevaleceram nos relatos das adolescentes e de suas mães. No que se refere ao exercício da maternidade constatou-se que, houve uma concepção favorável, principalmente por parte das adolescentes. Contudo, algumas avós ressaltaram a imaturidade e a impaciência das mães para com suas crianças. Verificou-se também que as avós maternas dos bebês exerciam os seguintes papéis: cuidar/apoiar; ensinar/orientar; papel de mãe; avaliar e controlar.

Maternidade; Adolescente; Avós


In the present study it was investigated the subsystem adolescent mothers and their mothers from low income background. It was specifically investigated: the initial reaction to the pregnancy, the conceptions on the adolescent's maternity and the role carried out by the grandmothers. A semi-structured interview was elaborated based on a pilot study. The interviews were recorded, transcribed and later analyzed according to the technique of content analysis proposed by Bardin (1976). In this research 25 grandmothers and 25 adolescent mothers participated. It was verified that, the initial unfavourable reactions on pregnancy prevailed in the adolescents and their mothers reports. In what refers to the exercise of the maternity, it was verified that there was a favourable conception, mainly from the adolescents. However, some grandmothers emphasized aspects related to the adolescents' immaturity and impatience with their babies. It was also verified that the maternal grandmother exercised the following roles: taking care/ supporting; teaching/ guiding; mother's role; evaluating and controling.

Maternity; Adolescents; Grandmothers


ARTIGOS

A maternidade na perspectiva de mães adolescentes e avós maternas dos bebês

Maternity in the perspective of adolescent mothers and their mothers

Deusivania Vieira da SilvaI; Nádia Maria Ribeiro SalomãoII

IUniversidade de Brasília

IIUniversidade Federal da Paraíba

RESUMO

Este estudo buscou investigar o subsistema avós maternas dos bebês-mães adolescentes, de baixa renda. Averiguou-se especificamente: a reação inicial frente à gravidez, as concepções sobre o exercício da maternidade adolescente e o papel desempenhado pelas avós frente a esta situação. Elaborou-se uma entrevista semi-estruturada a partir de um estudo piloto. As entrevistas foram gravadas, transcritas e posteriormente analisadas segundo a técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (1976). Participaram da pesquisa 25 avós maternas dos bebês e 25 mães adolescentes. Verificou-se que, as reações iniciais desfavoráveis frente à notícia da gravidez prevaleceram nos relatos das adolescentes e de suas mães. No que se refere ao exercício da maternidade constatou-se que, houve uma concepção favorável, principalmente por parte das adolescentes. Contudo, algumas avós ressaltaram a imaturidade e a impaciência das mães para com suas crianças. Verificou-se também que as avós maternas dos bebês exerciam os seguintes papéis: cuidar/apoiar; ensinar/orientar; papel de mãe; avaliar e controlar.

Palavras-chave: Maternidade, Adolescente, Avós.

ABSTRACT

In the present study it was investigated the subsystem adolescent mothers and their mothers from low income background. It was specifically investigated: the initial reaction to the pregnancy, the conceptions on the adolescent's maternity and the role carried out by the grandmothers. A semi-structured interview was elaborated based on a pilot study. The interviews were recorded, transcribed and later analyzed according to the technique of content analysis proposed by Bardin (1976). In this research 25 grandmothers and 25 adolescent mothers participated. It was verified that, the initial unfavourable reactions on pregnancy prevailed in the adolescents and their mothers reports. In what refers to the exercise of the maternity, it was verified that there was a favourable conception, mainly from the adolescents. However, some grandmothers emphasized aspects related to the adolescents' immaturity and impatience with their babies. It was also verified that the maternal grandmother exercised the following roles: taking care/ supporting; teaching/ guiding; mother's role; evaluating and controling.

Key words: Maternity, Adolescents, Grandmothers.

No presente estudo, busca-se compreender a maternidade adolescente fundamentando-se na Teoria Geral dos Sistemas. Segundo Bertalanffy (1982) os sistemas – que podem ser fechados ou abertos – são um conjunto de elementos ou subsistemas que se relacionam entre si e com o meio em busca de um resultado final. O sistema "fechado" é aquele em que não existe intercâmbio com o meio, ou seja, está orientado para o progressivo caos interno, desintegração e morte. Já o sistema "aberto" é "um sistema em troca de matéria com seu ambiente, apresentando importação e exportação, construção e demolição dos materiais que o compõem" (p. 193).

A família é considerada um sistema aberto, devido ao movimento de seus membros, dentro e fora da interação de uns com os outros e com os sistemas extrafamiliares, num constante fluxo de informação. Assim, os comportamentos ou fatos ligados a um dos membros familiares influenciam e são influenciados pelos dos outros. Também é de fundamental importância ressaltar que, no grupo familiar, cada elemento que o compõe é um subsistema, assim como as díades avô(ó)-neto(a), avô(ó)-pai(mãe), marido-mulher, mãe(pai)-filho(a), entre outras.

Através da Teoria Geral dos Sistemas o que se pode compreender sobre a maternidade adolescente? Como os subsistemas mães adolescentes-avós maternas dos bebês concebem o papel de avó e o exercício da maternidade nessa circunstância? Há conflito de papéis entre avós e mães? O que implica essa situação que envolve todo o sistema familiar? Este trabalho surge como uma tentativa de responder a essas e outras indagações afins.

O presente estudo também poderá fornecer subsídios que auxiliarão não somente na compreensão da temática em pauta, mas também na fundamentação de propostas educacionais e de apoio junto a famílias envolvidas com a situação. Aliado a essas questões evidencia-se o fato de que são poucas as pesquisas acerca dos avós na realidade brasileira.

A maternidade adolescente e suas implicações no meio familiar

A maternidade é compreendida como o processo que engloba gestação, parto, puerpério e criação do(a)s filho(a)s (Spieker & Booth, 1988). Neste sentido, o exercício da maternidade requer reajustes importantes da mulher, que decorrem tanto das alterações do corpo como das conseqüentes mudanças de papéis desempenhados no meio sócio-familiar.

De acordo com Otálora, Martínez e Lomelli (1997), a maternidade está sujeita a diversas interpretações teóricas e maneiras de assumi-la. Relaciona-se aos aspectos ideológicos, históricos e culturais. Na visão de Maldonado (1981), para abordar as vivências do ciclo grávido-puerperal é importante levar em consideração: as características pessoais da mulher; se a gravidez foi planejada ou acidental e se ocorreu dentro ou fora de um vínculo estável com um homem; se se trata do primeiro filho; se a mulher já passa dos trinta anos ou é adolescente.

Alguns dos fatores que contribuem para a ocorrência da gravidez na adolescência são: a) falta de acesso a métodos contraceptivos e falta de informação sobre sexualidade e sobre o próprio corpo; b) ausência dos pais e/ou vontade de contrariá-los; c) alternativa para sair de casa ou da escola; d) pensamento mágico de que a gravidez não vai acontecer; e) tentativa de prender o namorado (a); g) testar a feminilidade; h) carência afetiva; i) desejo de ser mãe (Araújo, 1996; Gauderer, 1996; Guimarães & Colli, 1998).

Entretanto, alguns estudos (Agostini, 1988; Tiba, 1992) indicaram que, embora muitas adolescentes possam, a princípio, encarar a gravidez como um meio de obter atenção e de se fazerem sentir "crescidas" e importantes, ao final sentem-se sós, desamparadas e "aborrecidas". Algumas não superam o conflito que se estabelece quando recebem a notícia da gravidez, vivenciando a situação, freqüentemente, como um "castigo".

E para os familiares, em que implica a gravidez da adolescente? Como reagem frente à notícia da gravidez? Pesquisas (Araújo, 1996; Moreira, Bedran, Bisarria & Andrade, 1997) apontaram que as adolescentes grávidas temem, muitas vezes, comunicar o fato às famílias, adiando a revelação o máximo possível. Segundo Lagôa (1991), a reação dos pais diante da gravidez adolescente varia de acordo com a classe social. Na classe de nível sócio-econômico alto esse tipo de questão é resolvido entre mãe e filha e finda em aborto. Na maioria das vezes, tal fato não chega ao conhecimento do pai. Nas classes média e baixa, a gravidez mergulha a família na "vergonha" e no "escândalo". Questiona-se: o adiamento da notícia aos pais não poderia também significar uma estratégia para preservar o filho?

Numa visão sistêmica, é importante, observar a família nos diversos contextos e percebê-la no todo. As gerações estão interligadas, de modo que episódios ocorridos numa geração podem aparecer nas gerações subseqüentes, ainda que de forma diferente. No estudo de Paiva, Caldas e Cunha (1998), realizado com adolescentes de baixa renda, foi visto que pelo menos um membro do grupo (avós maternas dos bebês, em 70% dos casos) também já passou pela experiência de ter filhos na adolescência.

E após a vinda do bebê? Como ficam as relações familiares e o exercício da maternidade pelas adolescentes? Pesquisas norte-americanas revelaram que as mães adolescentes têm sido retratadas como sendo menos sensitivas (Ragozin, Basham, Crnic, Greeberg & Robinson, 1982), menos responsivas (Jones, Green & Krauss, 1980) e mais restritivas (Coll, Vohr, Hoffman & Oh, 1986), se comparadas com as mães tardias. No estudo de Fonseca (2000), realizado em Vale das Pedrinhas e Areia Branca (Bahia), as adolescentes também tendiam a usar práticas punitivas na educação das crianças. Algumas afirmaram ainda que, seus filhos deviam obedecer mais aos avós do que a elas mesmas. Segundo a autora, tal fato não estava necessariamente associado à faixa etária, pois a educação era tratada de acordo com os valores cultuados pela comunidade.

Alguns pesquisadores (Flaherty, Facteau & Gaver, 1987; Flaherty, 1988; Oyserman, Radin & Benn, 1993) afirmaram que na maternidade adolescente, os avós dos bebês, freqüentemente, chegam a assumir o papel dos jovens pais, especialmente nos casos em que as adolescentes moram com esses. No presente estudo, é enfatizada a figura das "avós maternas dos bebês", pois, segundo Carvalho e Moura (1998) e Hoffman (1979,1980), estas desenvolvem uma maior proximidade e atuação diante da maternidade. No entanto, Aguirre (1995) constatou que nos casos em que as adolescentes deixam o bebê aos cuidados de suas mães e, após algum tempo, tentavam reavê-lo, chegam muitas vezes a disputar a guarda da criança.

Outrossim, na pesquisa realizada por Shore (1991), houve indicações relativas à confusão de papel por parte das avós que assumiram a criação dos netos. As "avós guardiãs" (termo cunhado por Ehrle & Day, 1994, para denominar as avós que criam seu netos) também relataram menor satisfação conjugal, menor nível de união entre a díade avó-neto(a) e maior estresse com os pais das crianças.

Em suma, constatou-se que há pelo menos três situações típicas a serem observadas no relacionamento avó materna do bebê-mãe adolescente: a) a avó que assume a responsabilidade pelo cuidado infantil; b) a avó que está envergonhada com a gravidez e tem pouca confiança na maturidade da adolescente, tornando-se tão restritiva que o desenvolvimento desta enquanto mãe é inibido; c) e a adolescente que assume a responsabilidade pelo cuidado da criança, ficando a avó disponível apenas como ponto de apoio, não cuidando o tempo todo do bebê. Com base nas pesquisas até então abordadas, surgiram os objetivos do presente estudo, os quais serão apresentados a seguir.

Objetivo geral

Investigar os subsistemas avós maternas dos bebês-mães adolescentes, enfatizando o exercício da maternidade e o papel dessas avós frente a esta situação.

Objetivos específicos

Averiguar, na perspectiva das avós maternas dos bebês e das mães adolescentes: as reações iniciais frente à notícia da gravidez, as concepções acerca do exercício da maternidade adolescente e o papel que as avós desempenham durante a maternidade adolescente.

Método

Local do estudo

O estudo piloto e a pesquisa efetiva foram realizados na cidade de João Pessoa (PB), no CAME (Centro de Atendimento Médico Especial) Primavera – Unidade de Pediatria e na Maternidade Cândida Vargas.

Participantes

Todas as participantes eram provenientes de comunidades de baixa renda da grande João Pessoa e buscavam o serviço de uma das instituições em que foram realizadas as entrevistas. No estudo piloto, participaram cinco mães adolescentes e cinco avós maternas dos bebês. Na pesquisa efetiva, foram vinte e cinco mães adolescentes e as respectivas avós maternas dos bebês, totalizando cinqüenta participantes. Como critério de inclusão, as adolescentes deveriam ser primíparas, estar acompanhadas de suas mães e possuir idades variando entre treze e dezenove anos, tendo seus filhos até doze meses de idade. A seguir, serão apresentados os dados sócio-demográficos dessas participantes.

Constatou-se também que 19 (76%) das adolescentes tiveram partos normais; 5 (20%) partos césareos e 1(4%) utilizou fórceps. No que concerne à história familiar das adolescentes, verificou-se que 18 (72%) das avós maternas dos bebês foram também mães na adolescência.

Instrumento e procedimento

O instrumento utilizado no estudo piloto e no estudo final consistiu numa entrevista aberta com roteiro semi-estruturado. As adolescentes que correspondiam aos critérios de inclusão foram entrevistadas numa sala das instituições. No contato face a face com as participantes, estabelecia-se um rapport com o intuito de facilitar a relação entrevistador / entrevistado.

As entrevistas realizaram-se individualmente (primeiro com a avó do bebê e depois com a mãe adolescente), utilizando-se o gravador com autorização prévia da respondente. O tempo de aplicação era indeterminado, permitindo que as entrevistadas falassem até quando julgassem necessário. As entrevistas foram transcritas e posteriormente analisadas segundo a técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (1976).

Reunindo as entrevistas transcritas, constituiu-se o corpus da pesquisa sendo, então, preciso obedecer às regras de exaustividade, representatividade, pertinência e exclusividade. Com base nisso, realizou-se a "leitura flutuante" e, em seguida, a codificação, sendo feita a escolha pela unidade temática e pela unidade de contexto. Logo após, definiu-se as categorias e a classificação dos seus conteúdos (ver Apêndice Apêndice , as categorias, as subcategorias e um exemplo da fala de algumas das participantes).

Resultados

Os resultados são apresentados em freqüência simples das unidades de análise. Salienta-se que o critério freqüencial propicia uma hierarquia às categorias e subcategorias, indicando quantitativamente e qualitativamente os valores de referência dos modelos de comportamento presentes e permitindo identificar os temas principais e os alvos de interesses das respondentes.

Na Tabela 3, a subcategoria mais destacada, tanto no total geral quanto nos totais específicos, para as avós e as mães foi da reação inicial desfavorável, com 201 unidades de análise (77%) no total, sendo 109 (81%) unidades para as avós e 92 (73,6%) para as adolescentes. A reação neutra vem em seguida, com 22 unidades de análise (16%) das avós e 16 unidades (12,8%) provenientes das mães. Posteriormente, a reação inicial favorável apresenta 17 unidades (13,6%) advindas das mães e 04 unidades (3%) das avós.

Na Tabela 4 destacam-se no percentual geral, por ordem hierárquica, as subcategorias: concepção favorável acerca do exercício da maternidade adolescente, com 247 unidades de análise (59,5%), seguida da concepção desfavorável acerca do exercício da maternidade adolescente, com 153 unidades de análise (36,9%). A concepção neutra acerca do exercício da maternidade adolescente denota 15 unidades (3,6%).

Entre as mães percebe-se que elas destacaram a concepção favorável, com 160 unidades de análise (62%), frente a 71 unidades relativas à concepção desfavorável. Já as avós apontaram a concepção favorável com 87 unidades (50%), e a concepção desfavorável com 82 unidades (47%), ou seja, quase não houve diferença entre os percentuais.

A Tabela 5 expõe que as atividades desenvolvidas pelas avós, por ordem hierárquica, no total geral são: cuidar/apoiar, com 348 unidades (57%); ensinar/orientar, com 99 unidades (16%); papel de mãe, com 76 unidades (12%); avaliar, com 56 unidades de análise (9%); e controlar, com 34 unidades (3%). Percebe-se que todas as subcategorias foram enfatizadas principalmente pelas avós.

Na Tabela 6 foi destacada, no total geral, a satisfação com o papel de avó com 75 unidades (56,6%), sendo que 40 unidades (44,4%) foram provenientes das avós e 35 unidades (83%) advindas das mães. Em seguida, observa-se a insatisfação com o papel de avó, com 31 unidades (34,4%) das avós e 04 unidades (10%) das mães, totalizando 35 unidades (26,5%). Por último, vêm as respostas neutras acerca do papel de avó, com 22 unidades (16,7%) no total geral.

Discussão

Numa visão sistêmica, os comportamentos ou a ocorrência de fatos ligados a um dos membros da família influenciam e são influenciados pelos de outrem. Como bem expressou uma avó: "porque a família é como uma raiz: atingiu um, como no caso dela aí, o problema dela atingiu todo mundo dentro de casa! Devido a esse problema dela, muitos outros problemas se desencadearam...". Parafraseando Littlejohn (1982) e Capra (1982), a família possui uma natureza intrinsecamente dinâmica, caracterizada por formas estruturais flexíveis, embora estáveis, de processos subjacentes. Os membros do conjunto, as propriedades do sistema, a interdependência e a coibição, estão estritamente ligados com o meio ambiente.

Neste estudo, as avós maternas dos bebês e as mães adolescentes, eram provenientes de comunidades de baixa renda. O abandono escolar por parte destas parecia estar relacionado aos significados sócio-culturais, vinculados ao próprio exercício da maternidade, ou ser determinado pelas avós do bebê: "Ela vai ter que sair do colégio, ela estuda à tarde aí não tem quem fique com o menino" (avó); "ontem eu disse: você vai ter que escolher, ou toma conta da menina ou estuda! Eu disse isso na hora da raiva!" (avó).

Segundo Paiva et al. (1998) pessoas de nível sócio-econômico baixo convivem desde cedo com a história de gravidez e isso passa a fazer parte do dia a dia, do contexto daquelas vidas. Na presente pesquisa, constatou-se que a maioria (72%) das avós maternas dos bebês foi, também, mãe na adolescência. Tal dado, observado noutras pesquisas (Cerveny, 1996; Monteiro, Fagim, Paiva & Cunha, 1998), denuncia a influência das gerações passadas e a possível transmissão de padrões às gerações futuras.

Reação inicial frente à notícia da gravidez

No que tange à reação inicial frente à notícia da gravidez adolescente, o que se pôde observar? Como apontado anteriormente, foi alto o índice de avós que também foram mães na adolescência. Até que ponto tal fato contribuiu favoravelmente, ao se receber a notícia?

Notou-se que, apesar da existência de casos na família, reações como medo, indignação, choro, desespero e outras manifestações de sentimentos similares fizeram-se presentes naquele instante. Portanto, prevaleceram as reações iniciais desfavoráveis por parte das adolescentes (73,6% das unidades) e principalmente das avós maternas dos bebês (81% das unidades). Todavia, as adolescentes tiveram reações mais favoráveis (13,6% das unidades), se comparadas com as avós maternas dos bebês (3% das unidades).

Vale salientar que os resultados do presente estudo contrapõem-se aos resultados de pesquisas realizadas por Abreu, Quayle, Neder e Zugaib (1997) em que houve, no geral, uma aceitação por parte das próprias adolescentes e também de seus pais. Também difere dos resultados apresentados por Paiva et al. (1998), os quais, notificaram que a maioria das famílias das adolescentes (70%) aceitou a gestação. Acredita-se que, apesar destes autores terem trabalhado com garotas de baixa renda, possivelmente a variável região e o número de participantes tenha exercido influência nesse resultado. As mães e as adolescentes, investigadas em tais pesquisas, talvez sejam, por exemplo, menos conservadoras que as entrevistadas na presente pesquisa.

Um fato que merece ser observado é que 16% das avós induziram as adolescentes a abortar o bebê (ex: "... ainda tentei tirar, mas não teve jeito! Eu dei a ela chá de quebra pedra, remédio...") e 8% das avós que induziram não obtiveram êxito porque a adolescente, o pai do bebê ou os familiares deste, não aceitaram. A título de ilustração, pode-se citar o relato de uma avó: "eu pedi a ela: vê se tu toma um remédio e aborta! porque a gente não tem condição de criar, né? E ela disse: não, mainha, eu não quero tirar! Aí eu falei: então vamos conversar com os pais (avós paternos da criança) dele (pai do bebê). A gente foi lá e eles disseram 'não! não tire não! o que precisar pra criança a gente vai dar'. Ele (pai do bebê) também pediu pra não tirar."

No estudo de Paiva et al. (1998), realizado com adolescentes de baixa renda, verificou-se que as tentativas de aborto foram de 19%; 31% chegaram a pensar e 50% não tentaram. Na presente pesquisa, dentre as adolescentes que relataram ter pensado (12%) ou tentado aborto (12%), houve quem verbalizasse a influência que as avós maternas dos bebês e familiares exerciam na tomada dessa atitude: "eu até tomei remédio. Tomei um chá que fizeram, quem fez foi minha mãe. Eu não queria abortar, me sentia forçada pelos meus parentes pra abortar. Isso me causou muita angústia, eu chorava demais à noite!"

Segundo Bromberg (1996), os efeitos do aborto na adolescência prolongam-se até à vida adulta e trazem fantasmas referentes à culpa, identificados no medo de ter bebês defeituosos, aliados à baixa auto-estima e dificuldades de se entender como mulher em sua totalidade. No presente estudo, muito embora as participantes tenham falado a respeito da tentativa de aborto, pode ter ocorrido que uma(s) ou outra(s) não tenham revelado seus atos.

O exercício da maternidade adolescente

A maioria da literatura que versa sobre a maternidade adolescente apresenta uma retórica de cunho problemático, principalmente nas vertentes sociais, econômicas, familiares e psicológicas. Os discursos tendem, freqüentemente, a indicar que a jovem é solteira e não planejou a gravidez. Não obstante, há pesquisadores como Elster (1986, citado por Medrado & Lyra, 1999), que apontaram a existência de casais adolescentes com um bom desempenho na vida familiar, escolar e nos cuidados com a criança, demonstrando que o exercício da maternidade e da paternidade pode propiciar benefícios em suas vidas.

Na presente pesquisa, constatou-se que, no geral, as unidades de análise mais destacadas apresentaram uma concepção favorável acerca do exercício da maternidade. Isso vem, de uma certa forma, desmistificar a idéia de que a maternidade na adolescência é sempre um "terremoto" na vida dessas jovens. Como exemplo, os relatos: "Eu não acho que sou nova demais pra ser mãe, porque tem gente que tem tanta idade e tem a cabeça igual a minha (...) pra mim mesmo é um prazer cuidar da minha filha!" (adolescente); "Ela é muito nova e eu até me admirei porque ela cuida muito bem do filho dela..." (avó)

Como aduziram Abreu et al. (1997), tornando-se mães estas adolescentes encontraram uma definição que, segundo imaginam, permite sair da condição de menina, identificando-se com a figura de sua própria mãe, e cumprindo também a determinação social da maternidade: "Eu via e achava bonito minha mãe cuidar do meu irmão caçula, tinha vontade de cuidar também... quando eu brincava de boneca eu fazia comidinha, assim, de mentirinha, e dava como se fosse meu filho(...) aí hoje graças à Deus hoje eu tenho a minha boneca! Realizei meu sonho!"(adolescente)

No entanto, comparando o resultado entre os grupos, percebeu-se que o aspecto favorável da maternidade foi mais enfatizado no grupo das adolescentes (62% favorável) do que no grupo das avós (47% desfavorável). Assim, determinadas avós também apontaram um discurso marcado por aspectos ligados à imaturidade (ex: "ela não é uma pessoa madura pra criar essa criança") e impaciência (ex: "ela não tem paciência com a menina!") das adolescentes para com seus bebês.

Determinadas avós também denunciavam ações violentas com a criança por parte das adolescentes, como exemplo: "ela bate nele e não é pouco não, é toda hora! Dá na cara dele, empurra"; "ela vai acabar matando esse inocente!"; "Ela queria jogar o menino fora! Às vezes ela não quer o menino e não quer ouvir o choro dele, manda tirar o menino dela. Quando ela tá num sono bom diz: ah, mainha tira esse menino véi daqui!"

Nos Conselhos Tutelares, a violência doméstica (por parte de pais adolescentes, pais adultos ou responsáveis) compreende o maior número de ocorrências e normalmente as denúncias partem de vizinhos e são anônimas por medo de represálias dos agressores (Barros, 2001). Na presente pesquisa, os vizinhos de adolescentes entrevistadas exerciam influência nos cuidados com o bebê agredido. Como exemplo, a expressão que se segue: "... Ontem ela deixou o menino sozinho e foi para o colégio, aí os vizinhos ligaram pro meu trabalho, pra eu ir pra casa pegar o menino que estava o tempo todinho gritando, chorando, trancado dentro de casa! Uma criança que só tem oito meses! (...) Eles vão denunciar as coisas que ela faz com o menino!"(avó).

Nesta discussão, vale ressaltar que os maus tratos denunciados foram comunicados às autoridades da instituição, para que tomassem as providências necessárias, fazendo cumprir a determinação do artigo 245o do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que prescreve pena de multa de três a vinte salários de referência aos profissionais, escola ou creche que deixar de comunicar à autoridade os casos, envolvendo ou maus tratos contra crianças ou adolescentes.

O papel das avós maternas dos bebês na maternidade adolescente

Como as mães e as avós maternas dos bebês, entrevistadas neste estudo, concebiam o papel de avó? Para as participantes, cuidar/apoiar foi o papel mais desempenhado pelas avós. Em seguida, vêm: ensinar/orientar; o papel de avó é o mesmo que o papel de uma mãe; avaliar; e controlar. Todos foram apontados com mais veemência pelas avós, principalmente os dois últimos, provavelmente porque, além de falarem mais durante toda a entrevista, se comparadas com as mães, as avós se sentiam mais a vontade para verbalizarem conteúdos acerca de suas próprias vivências.

Os suportes sócio-emocionais oferecidos pelos avós podem ser significativos para a mãe e sua criança (Unger & Cooley, 1992). Os resultados da presente pesquisa corroboraram os estudos de Flaherty et al. (1987) e Flaherty (1988), em que as avós desempenhavam, na maternidade adolescente, os papéis de: conduzir reuniões de família para, por exemplo, organizar o enxoval do bebê; cuidar do bebê e da adolescente; ensinar a adolescente a cuidar do bebê; avaliar as condições de saúde do bebê; criar o bebê; destinar recursos financeiros e emocionais; e controlar a adolescente e o bebê.

Talvez pelo fato da maioria das adolescentes morar com a família de origem (56%), a avó assumia mais a função de cuidar/apoiar, desenvolvendo, muitas vezes, o papel de mães substitutas. Esses resultados são similares aos das pesquisas de Paiva et al. (1998) e Vechiolla e Maza (1989). O estudo realizado em Recife por Aguiar e Dias (2000), também confirmou que as avós eram mães e avós ao mesmo tempo.

Na presente pesquisa, muitas vezes, o bebê chamava a avó de mãe, fortalecendo a idéia de que a avó é mãe e avó ao mesmo tempo, exemplo: "... a minha mãe cuida mais do que eu, que eu moro com ela, aí é tanto que ela não me chama de mãe, chama a minha mãe que é avó de mãe." Este resultado está de acordo com os dados apresentados por Lagôa (1991), quando mencionou que muitas dessas adolescentes não agüentavam a situação e entregavam os filhos para suas mães, sendo essas crianças criadas como irmãs. Tal vertente foi verbalizada diretamente por uma das adolescentes: "... eu sou filha e tem ela que é neta dela e ela cria como se fosse filha dela, como se fosse minha irmã."

Em um dos casos, chegou-se a perguntar como a adolescente se via na situação de ver sua filha criada por sua mãe, e a resposta foi a seguinte: "... eu acho ótimo, porque eu vendo ela cuidar da minha filha, da minha própria filha eu aprendo a cuidar assim no futuro, não agora, mas futuramente quando eu for ter outro eu já aprendo mais, né?"

Concorda-se, aqui, com Cooley & Unger (1991), ao revelarem que há também papéis mal adaptados, no que se refere ao apoio dado pelas avós. Nesses casos ocorre muitas vezes, o fenômeno conhecido como conflito de papel, definido por Salem (1980) como a ocorrência simultânea de dois (ou mais) conjuntos de pressões, de tal forma que o cumprimento de uma delas tornaria difícil ou mesmo impossível o cumprimento da outra.

Como se pode observar, na presente pesquisa constataram-se os conflitos de papéis entre ser mãe e ser avó, por parte das avós. Como exemplo, menciona-se o relato de uma das avós que vivenciavam esta situação: "eu nem sei o que é ser avó, acredita? Eu acho que uma avó dá menos atenção do que uma mãe verdadeira. Mas, eu acho que dou mais atenção a ele (bebê) do que propriamente a mãe. Tudo é comigo! Só o peito que eu não posso dar e até já dei! (...) Aí eu me sinto quase como uma mãe."

Vale ainda relatar situações em que alguns avós maternos chegavam a manifestar o desejo de registrarem a criança, como exemplo: "... depois que a criança apareceu nós gostamos muito, eu queria até registrar em meu nome" (avó); "... meu pai (avô do bebê) não queria que ele (pai do bebê) registrasse a criança no nome dele (pai do bebê); ficou intrigado comigo e até hoje não fala com o meu esposo por causa disso porque ele queria o menino pra ele, registrar com o nome dele." (adolescente)

Também na pesquisa realizada por Shore (1991), houve indicações relativas à confusão de papel entre aqueles que assumiram a criação dos netos. As avós guardiãs também relataram menor nível de satisfação conjugal, união entre a díade avó-neto(a) e maior estresse com os pais das crianças. Na pesquisa de Atalla (1996), realizada na cidade de São Paulo, com avós que se responsabilizavam em cuidar do neto(a), constatou-se que elas viam-se diante de um conflito, derivado do fato de terem de fazer face a um compromisso que deveria ser, prioritariamente, de suas filhas. Outrossim, todas as avós apresentaram dificuldades em colocar limites rígidos para as crianças.

No estudo de Santos e Hamú (1998), desenvolvido através da experiência de trabalho na Seção Psicossocial Forense do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, foi visto que as questões não resolvidas entre avós e mães interferiam no direito destas últimas exercer o seu papel de mãe. A avó que não conseguia se deparar com o fato de já estar em outra fase do ciclo de vida, queria dar continuidade ao exercício do papel materno trazendo para junto de si um(a) neto(a).

No presente estudo, constatou-se que a participação de algumas adolescentes no programa de apoio à gestante, oferecido pelas instituições em que foram realizadas as pesquisas, favoreceu uma melhor compreensão acerca do seu exercício materno. Houve relatos apontando que, durante os encontros dos grupos de apoio, aprendia-se a desenvolver cuidados diários com o bebê. Nesse sentido, a delimitação de papéis provavelmente chegava a ser mais elaborada. Determinadas adolescentes expressaram, por exemplo: "ela deve ser uma orientadora, mas não deve assumir o papel de mãe."; "A avó deve só orientar quando a gente tá precisando de alguma coisa, mas não ter aquela responsabilidade de dar tudo, de cuidar de tudo. A gente que é mãe é que tem a responsabilidade com o menino, foi a gente que fez..."

Não se pode deixar de mencionar que certas adolescentes afirmavam que o avô materno e os avós paternos da criança desempenhavam um papel significativo em suas vidas. Nas situações cujas avós maternas do bebê se viam bastante atarefadas por trabalhar fora do lar, não dispondo de tempo para ajudar a adolescente, a ajuda dessas figuras também era de suma importância. Como ilustração, seguem os relatos das adolescentes: "Se meu pai passar um dia sem ver o neném ele chora!"; "... minha mãe não é uma avó que está sempre presente porque trabalha e passa mais tempo fora. Já a outra avó dela (bebê), é o contrário, às vezes toma conta dela pra mim.";"... meus sogros gostam muito do menino, são pessoas muito amáveis. Eles são do tipo que toda hora beijam..."; "Ela (avó paterna do bebê) sempre trata bem o neto. E o avô (paterno) dele (bebê) também."

Em contrapartida, também houve casos de mães que reclamavam da relação dos avós paternos com o neto, como exemplos: "meus sogros já não tem muita paciência com ele (bebê)."; "Minha sogra, ela grita muito, diz que é doente e que não pode ficar com ele."; "... a outra avó, a mãe do meu marido, não dá atenção ao menino, eu acho que ele vai se sentir desprezado por uma avó e mais aconchego com a outra."

A partir dos dados até então abordados, o que se pode dizer sobre o exercício do papel de avó? Será que as avós estavam satisfeitas com o seu papel? E as adolescentes, estariam elas satisfeitas ou insatisfeitas com o papel desenvolvido pelas avós maternas dos bebês? Na presente pesquisa, verificou-se que, a satisfação com o papel de avó prevaleceu para ambas as entrevistadas, principalmente entre as adolescentes.

Para certas adolescentes, as avós estavam tendo a oportunidade de serem melhores do que foram enquanto mães. Quanto a isto, basta ver este relato: "Eu acho que ela tá se esforçando o máximo pra ela (bebê), o que ela não fazia por mim!" Como bem apontaram Maldonado e Goldin (1995), a condição de ser avô(ó) diz respeito a uma oportunidade que os indivíduos possuem de reconhecer seus erros, de rever suas posições e pontos de vista. Assim, é comum trazerem consigo uma certa experiência de vida, a qual permite uma melhor reflexão acerca das conseqüências de suas próprias atuações enquanto pais.

Algumas das avós entrevistadas chegaram a afirmar que se sentiam culpadas pelo que havia acontecido com a filha adolescente. Outras relataram que foi um erro as adolescentes terem sido mães, mas amavam a criança e se sentiam realizadas com o papel que exerciam. Também no estudo realizado por Crawford (1981) foi visto que as avós perceberam os netos como fonte de felicidade.

As avós que apresentaram insatisfação com os papéis desenvolvidos mencionaram o que também foi notado por Aguiar e Dias (2000), ou seja, que sonhavam com casamentos tradicionais para as filhas; nunca imaginaram ser avó tão cedo e diziam ter mais preocupação e responsabilidades. Detectou-se ainda que, para algumas avós a dificuldade em ser chamada de "avó" fazia com que a insatisfação com o papel viesse à tona: "Eu disse até que o menino (neto) era pra me chamar de tia, porque eu não me acho velha!"

Vale salientar a complexidade dos laços familiares, a repetição de histórias como legados geracionais, e o envolvimento entre as gerações pareciam favorecer a assimilação do papel de avô(ó). Retratando essa idéia, apresenta-se o relato de uma avó: "... o meu avô é tataravô dele (bebê) e eu chamo meu 'avô' de 'pai'. Certo dia eu disse pra ele que eu não pensava em ser avó, e tão de repente! Aí ele disse: minha filha é assim mesmo, faz parte da vida! Eu também fui avô muito cedo!"

Considerações finais

Cabe mencionar que as entrevistas foram realizadas em instituições e não em casa, o que dificultou o acesso aos outros membros da família. Por outro lado, foi a maneira de se viabilizar o projeto tendo em vista as dificuldades de acesso às residências das participantes. Através dos subsistemas avós-mães, verificou-se que as mudanças (adolescência, gravidez, nascimento, entre outras) vivenciadas, alteraram o equilíbrio dinâmico da família, sendo necessária a mobilização de recursos internos de seus integrantes, no sentido de conservar um mínimo de suporte para se vivenciar a situação.

Nesta pesquisa, 72% das avós maternas dos bebês também foram mães na adolescência. Tal dado denunciou a influência das gerações passadas e a possível transmissão de padrões às gerações futuras. Apesar da maioria das adolescentes possuir mães que também foram mães na adolescência, constatou-se que prevaleceram as reações iniciais desfavoráveis frente à gravidez, por parte das mães e principalmente por parte das avós maternas dos bebês.

Algumas adolescentes tentaram o aborto. Dentre as que pensaram (12%) ou tentaram (12%), houve quem verbalizasse a influência que as avós maternas dos bebês, outros familiares e até mesmo vizinhos e colegas exerciam na tomada dessa decisão. A justificativa para que isso tenha ocorrido se dá, provavelmente, pela própria experiência que essas avós tiveram enquanto mães adolescentes, e pelos tabus ou dificuldades financeiras e emocionais que enfrentaram ou ainda enfrentam na vida.

Notou-se que algumas adolescentes, com medo de comunicar o fato à família, com dificuldades em aceitar a própria gestação ou até mesmo pela falta de instrução, postergavam sua ida aos postos de saúde não favorecendo, portanto, os cuidados essenciais que o período da gravidez requer. Acredita-se que a idade das adolescentes não pode, isoladamente, ser considerada como causa de conseqüências adversas da gravidez. Em geral, as condições sócio-econômicas ou inadequadas de acompanhamento em torno do processo podem ter contribuído para esse resultado.

No que concerne ao exercício da maternidade, as unidades de análise mais destacadas apresentaram uma concepção favorável. Isso vem de certa forma desmistificar a idéia de que a maternidade na adolescência é sempre desfavorável na vida dessas jovens. Todavia, comparando os grupos, observou-se que o aspecto favorável da maternidade foi mais enfatizado no grupo das adolescentes do que no grupo das avós. Nesse sentido, determinadas avós também apresentaram discursos ligados à imaturidade e impaciência das mães adolescentes para com seus bebês. Percebeu-se ainda que as diferentes formas de ver a maternidade, por parte das adolescentes, estavam interligadas a vários fatores, destacando-se o apoio oferecido pelas avós e pelos pais dos bebês.

Referente ao papel da avó materna do bebê, verificou-se que o mais exercido foi cuidar/apoiar a mãe adolescente e sua criança, com a avó tornando-se, muitas vezes, mãe substituta do neto(a). Aqui, vale mencionar que, mesmo denotando satisfação com o papel que vivenciavam, algumas avós apontavam queixas acerca de conflitos existentes no exercício de sua função.

Detectou-se ainda que muitas vezes, o bebê chamava a avó de mãe, corroborando a idéia de que a avó é mãe e avó ao mesmo tempo. Acredita-se que se delimitando os papéis o (a) neto(a) tenha uma melhor oportunidade de vivenciar, de trocar experiências com os avós enquanto avós e não enquanto pais.

Implantar nas escolas, nos postos de saúde ou em instituições afins, uma rede de apoio às famílias e às adolescentes é primordial. Para futuras pesquisas merecem ser investigados a figura do pai do bebê e o papel desempenhado pelos avôs maternos e avós paternos nessa situação. Poderiam ser realizados, também, estudos com outros membros familiares envolvidos na questão, averiguando-se o suporte oferecido pelos avós ou comparando grupos de baixa e média renda.

Recebido em 14.01.02

Revisado em 08.08.02

Aceito em 12.11.02

Deusivania Vieira da Silva, mestra em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba, é doutoranda em Psicologia na Universidade de Brasília. Endereço para correspondência: EQN, 410/411, Bloco A, Ed. Studio Center, Sala 61, Asa Norte, 70865-000, Brasília, DF. Tel.: (61)273.5809; (83)226.6652. E-mail: deusivania@yahoo.com.

Nádia Maria Ribeiro Salomão, doutora pela Manchester University (Reino Unido), é professora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba. Endereço para correspondência: Rua Major Ciraulo, 745, apto. 1101, Manaíra, 58038-291, João Pessoa , PB. Tel.: (83)216.7006. E-mail: nmrs@uol.com.br.

Apêndice

Definição das Categorias

Categoria 1: Reação Inicial frente à Gravidez da Adolescente na Perspectiva das Avós (RIGA) – nesta categoria estão presentes os conteúdos que indicam as reações iniciais das avós maternas do bebê, frente à gravidez das mães adolescentes.

a) Reação Inicial Favorável (RIFA): "Eu fiquei feliz... foi tudo bom pra mim!"

b) Reação Inicial Desfavorável (RIDA): "Eu sofri muito, chorei muito, me descontrolei!..."

c) Reação Inicial Neutra (RINA): "Eu agi normalmente, isso acontece todos os dias!"

Categoria 2: Concepção sobre o Exercício da Maternidade Adolescente na Perspectiva das Avós (CEMA) – nesta categoria encontram-se as concepções acerca de como as avós maternas do bebê concebem as adolescentes enquanto mães:

a) Concepção Favorável (CFA):"Ela é uma mãe excelente! Ela é carinhosa..."

b) Concepção Desfavorável (CDA): "Ela não era pra ser mãe agora! não tem amor..."

c) Concepção Neutra (CNA): "Não tenho o que dizer dela, ela é uma mãe igual às outras."

Categoria 3: O Papel de Avó na Maternidade Adolescente na Perspectiva das Avós (PPA) – referente à auto-concepção das avós acerca de seu papel na maternidade adolescente.

a) Papel de avó = Papel de Mãe (PAMA): "Sou mãe e avó, tudo ao mesmo tempo!"

b) Cuidar / Apoiar (PACA): "Cuido muito deles (mãe e bebê), tudo eu acompanho!"

c) Ensinar (PAEA): "Agora ela já sabe algumas coisas sobre o bebê, porque eu ensinei."

d) Controlar (PACOA): "Tudo eu tenho que ver a hora pra ela! Tenho que controlar."

e) Avaliar (PAVA): "Não é bom criar (bebê) mimado e, sim, como a gente ta criando."

Categoria 4: A Satisfação ou Insatisfação com o Papel de Avó na Perspectiva das Avós (SIPA) – referente aos conteúdos que denunciam a satisfação ou insatisfação das avós em relação ao seu papel na maternidade adolescente. Também abrange os conteúdos neutros:

a) Satisfação com o Papel (SCPA): "Eu gostei de ser avó! Tô curtindo muito, gosto muito."

b) Insatisfação com o Papel (IPA): "O papel de avó é padecer duas vezes!"

c) Respostas Neutras (RNA): "pra mim não é difícil ser vó, acho normal."

Categoria 5: Reação Inicial da Mãe Adolescente frente à Gravidez (RIMG) – nesta categoria estão presentes as unidades de análise que indicam as reações iniciais das mães adolescentes frente à gravidez:

a) Reação Inicial Favorável (RIFM): "Quando eu soube eu fiquei tão feliz!"

b) Reação Inicial Desfavorável (RIDM): "deu vontade de me jogar debaixo de um carro!"

c) Reação Inicial Neutra (RINM): "Eu fiquei normal, pra mim foi da vida mesmo."

Categoria 6: Concepção acerca do Exercício da Maternidade Adolescente na Perspectiva da Mãe Adolescente (CEMM) – nesta categoria, encontram-se os conteúdos acerca de como as mães compreendem o exercício próprio da maternidade:

a) Concepção Favorável (CFM): "É um prazer cuidar da minha filha!..."

b) Concepção Desfavorável (CDM): "Eu não gostei de ser mãe."

c) Concepção Neutra (CNM): " Acho que ser mãe é da vida mesmo."

Categoria 7: O Papel de Avó na Perspectiva das Mães Adolescentes (PAM) – referente à concepção das mães acerca do papel desempenhado pelas avós maternas do bebê.

a) Papel de avó = Papel de Mãe (PAMM): "ela é mais do que avó, ela é uma mãe mesmo!"

b) Cuidar / Apoiar (CAM): "Ela dá mingau, banho, dá roupa, tudo pra ele."

c) Ensinar (EM): "Ela me ensina a cuidar...tudo eu já aprendi com minha mãe a fazer."

d) Controlar (CM): "minha mãe (avó) fica me controlando."

e) Avaliar (AVM): "... e eu não sabia o que era, ela dizia: essa menina tá com dor..."

Categoria 8: A Satisfação ou Insatisfação com o Papel Exercido pelas Avós Maternas dos Bebês na Perspectiva das Mães Adolescentes (PPM) – nesta categoria encontram-se conteúdos das mães adolescentes que denunciam a satisfação ou insatisfação com o papel exercido pela avó materna do bebê. Também abrange conteúdos neutros:

a) Satisfação com o Papel Exercido pela Avó Materna (SPAM): "Ela é super dedicada!"

b) Insatisfação com o Papel Exercido pela Avó Materna (IPM): "Acho ruim o que ela faz."

c) Respostas Neutras (R/NM): "ah, ela é uma avó normal"

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Apêndice

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Out 2003
  • Data do Fascículo
    Abr 2003

Histórico

  • Aceito
    12 Nov 2002
  • Revisado
    08 Ago 2002
  • Recebido
    14 Jan 2002
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