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EDITORIAL

Inauguramos o nono ano da Estudos de Psicologia com um conjunto bem atraente de trabalhos. Como periódico dedicado a todos os setores da Psicologia, agrada-nos poder publicar uma discussão sobre "A Psicologia como campo de conhecimento e como profissão de ajuda", levada a cabo por Emmanuel Z. Tourinho, Marcus B. Carvalho Neto e Simone Neno. Em linhas gerais, as demais contribuições desta edição podem ser vistas se distribuindo ao longo dessas duas vertentes, ainda que se constate ampla variedade de temas, métodos de análise e fundamentações filosóficas adotadas, como é característico em Psicologia. Estimular a reflexão sobre as várias formas de atuação em Psicologia, proporcionando o necessário abastecimento de fatos e idéias constitui parte dos objetivos desta Revista.

Assim é que neste número temos uma reflexão histórica e teórica de Reinier Rozestraten sobre o papel dos cognitivistas pioneiros, em que temas clássicos como pensamento, percepção e consciência nos são apresentados tal como estudados em princípios do século XX. Também somos levados a conhecer a polêmica em torno da hipótese freqüentista relativa ao raciocínio sobre probabilidades condicionais, no trabalho de David O'Brien, Antonio Roazzi e Maria da Graça B. B. Dias.

Dois trabalhos se debruçam sobre a importância do texto como elemento comunicacional e, portanto, com implicações quase diretas para contextos aplicados, seja em educação ou outros setores. Jerusa F. Salles e Maria Alice M. P. Parente analisam a compreensão da leitura textual por escolares dos primeiros níveis do ensino fundamental, enfatizando a influência da idade e da escolaridade. Vivianny Meirelles e Alina G. Spinillo focalizam o outro extremo: a produção do texto. O fazem, entretanto, a partir da situação de surdez de adolescentes e concluem que a coesão textual constitui grande dificuldade para os surdos, sejam eles oralizados ou usuários da linguagem de sinais.

Se a comunicação escrita tem papel central na formação escolar básica, esse também é o caso das habilidades de "fazer contas". É o que discute Jane Correa, ao tratar da resolução oral de tarefas de divisão. Pais e mães leitores deste periódico que acompanham (ou já acompanharam) seus filhos em tarefas de casa durante os primeiros anos escolares talvez possam compreender melhor nesse artigo as dificuldades enfrentadas e estratégias utilizadas pelas crianças.

A Psicologia Organizacional é o âmbito de aplicação de dois trabalhos sobre instrumentos de medida. Tatiane Paschoal e Álvaro Tamayo apresentam a validação de uma escala de estresse no trabalho dedicada tanto a pesquisas empíricas como à aplicação em organizações, uma vez que é de fácil aplicação e serve a ambientes de trabalho e ocupações diversas. Clima organizacional é o objeto da escala apresentada por Jacob A. Laros e Katia E. Puente-Palacios, que, no entanto, enfatizam em seu artigo mais os aspectos metodológicos, ao descrever o processo de validação cruzada da estrutura fatorial obtida, empregando amostra de tamanho bem superior ao habitual.

Assim como os dois últimos, vários outros artigos se situam no que poderíamos chamar de ante-sala da aplicação, pois discutem conceitos, dimensões e contextos relevantes para a prática profissional em Psicologia Clínica, Social/Comunitária, Escolar e do Desenvolvimento.

O contexto de vulnerabilidade e exclusão social a que estão expostos adolescentes infratores e suas famílias é o tema do estudo realizado por Maria Cristina Feijó e Simone G. Assis. Também vulneráveis estão as mulheres usuárias de ansiolíticos estudadas por Lúcia de Fátima Carvalho e Magda Dimenstein, dada sua condição de vítimas das (des)atenções do modelo de saúde que contribui para o acirramento de sua dependência.

Acompanhar o dia-a-dia de um filho com doença crônica é tarefa árdua, constituindo o objeto da investigação relatada por Elisa K. Castro e Cesar A. Piccinini, que concluem por destacar a importância de um enfoque preventivo da questão, no sentido de ajudar os parentes a se preparar para as inevitáveis dificuldades. As implicações do biológico para o psicossocial também estão no foco de dois outros artigos. Ana Maria M. Borlot e Zeidi A. Trindade estudaram o significado de maternidade, paternidade, casamento e filho biológico em casais que optaram por tecnologias de reprodução assistida, face a constatação da infertilidade de um dos membros do casal. Paula T. Fernandes e Elisabete A. P. Souza analisam a percepção da epilepsia — em particular da criança epilética — por professores do ensino fundamental, e sinalizam para a ocorrência de estereotipias, que persistem a despeito do conhecimento sobre o problema.

Como um raro exemplo de investigação psicológica de questões rurais em nosso meio, Francisco J. B. Albuquerque, Jorge A. P. M. Coelho e Tatiana C. Vasconcelos relatam as relações que observaram entre políticas públicas do setor e a situação dos projetos de assentamento, mostrando que assentados e técnicos compartilham "crenças de que a organização do assentamento em forma de parcela é mais adequada para o seu bom funcionamento do que em forma de agrovila". Moral, direitos humanos e participação social constituem o centro das atenções de Cleonice Camino, Leoncio Camino, Cícero Pereira e Márcia Paz, em trabalho que analisa a representação de direitos humanos apresentada por universitários, contrastando percepções daqueles estudantes relativas ao seu próprio envolvimento e ao envolvimento do governo com a questão.

A inclusão social de alunos portadores de deficiência mental entre estudantes do ensino fundamental regular foi o tema investigado por Marcus W. Batista e Sonia R. R. Enumo, que combinaram observação de comportamento com escalas de avaliação sociométrica para concluir que tais alunos são menos aceitos e mais rejeitados do que seus colegas. Edna Martins e Heloisa Szymanski investigaram como se dá a representação de família por crianças que vivem em uma instituição sob a responsabilidade do Estado, tendo empregado a análise de episódios de brincadeira livre para constatar a prevalência do modelo de família nuclear.

A problemática da AIDS é relacionada à crença no mundo justo por Vilma C. Regato e Eveline M. L. Assmar, que analisam a atribuição de causalidade do problema tal como realizada diferenciadamente por pacientes e médicos, aqueles favorecendo causas externas e estes as internas, o que gera formas diversas de enfrentamento e evidentes implicações para a prática de profissionais de saúde. E vem do universo da prática profissional o último trabalho deste número. Maria da Graça S. Padilha e Paula I. C. Gomide descrevem os cuidados envolvidos no acompanhamento terapêutico de adolescentes do sexo feminino vítimas de abuso sexual, evidenciando que a exposição gradual ao tema pode contribuir para a aceitação do abuso na própria história de vida e também para prevenir a revitimização.

Esperamos que você, leitor, tire proveito dos conhecimentos e fazeres da Psicologia presentes nesta edição.

José Q. Pinheiro

Editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Set 2005
  • Data do Fascículo
    Abr 2004
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